segunda-feira, 13 de abril de 2020

25.88 “Os Sinos d’Alpendurada”


“Os Sinos d’Alpendurada”, um folhetim de Alberto Pimentel, publicado no “Jornal do Porto”, em 12 de Março de 1870, narra uma estória passada durante a reconquista cristã da península ibérica com os ingredientes comuns a muitas outras, afectas a outras regiões, das quais, uma das mais conhecidas tem que ver com o topónimo e lugar de Montezelo, do concelho de Gondomar, ligada a uma batalha ocorrida junto ao rio Tinto e outra, conta a lenda de Gaia, que Almeida Garrett imortalizou.
Aquelas narrativas são, geralmente, lendas, que muitas das vezes são transmitidas oralmente, de geração para geração, e constituem uma versão popular de factos históricos.
A sinopse daquelas estórias contempla, regra geral, uma paixão, correspondida ou não, entre uma cristã e um mouro, contrariada por alguém com ascendente sobre um dos membros do casal, e que acaba sempre por um desenlace trágico e mortal, provocado por um dos intervenientes ou, normalmente, em consequência de um mal-entendido.
Foram tempos, em que o território era ocupado alternadamente por cristãos e mouros, em surtidas e escaramuças constantes, quando o rio Douro era uma verdadeira fronteira natural e em que o Porto era uma sentinela importante, nesse contexto.
A narrativa de Alberto Pimentel reportava-se ao acontecido em meados do século XI, em Alpendurada, concelho de Marco de Canavezes, e ter-lhe-ia sido transmitida pela “tia Agueda”.
Alpendurada dizem, por se encontrar “pendurada” nas rochas do Monte Arados, entre as margens esquerda do rio Tâmega e a direita do rio Douro.
O mosteiro de Alpendurada tem origem num oratório a São João Baptista, em meados do século XI, servindo a Ordem Beneditina e mantendo ainda, hoje, as celas dos monges a austeridade de outros tempos.
Em 1065, já é um pequeno ermitério (local isolado de meditação, oração e contemplação e de residência de um eremita) evoluindo, nos anos seguintes, para um pequeno mosteiro.



“Convento Beneditino, situa-se na freguesia de Alpendurada e Matos, no concelho de Marco de Canaveses, entre os rios Tâmega e Douro. Anterior à fundação da nacionalidade, data da primeira metade do século XI. Foi um convento importante na época de D. Afonso Henriques que lhe concedeu coutos e honras. Um dos locais mais importantes na época era a biblioteca, onde se guardavam documentos importantes do reino”.
Fonte: “infopedia.pt/”



O mosteiro sofreu trabalhos importantes de ampliação e de restauro nos séculos XVII e XVIII, contudo, ainda mantém muitos dos seus traços Românicos, como na cozinha medieval, onde hoje se organizam, para turistas, ceias medievais.




Fachada lateral do mosteiro de Alpendurada, com igreja ao fundo – Ed. SIPA



Fachada do mosteiro de Alpendurada – Ed. SIPA



A importância desta região, e a sua conexão com o Porto, tem que ver com a expulsão dos muçulmanos c. de 1035, durante o processo de reconquista cristã, que irá conduzir à refundação da antiga cidade de Cale ou Gaia, com o nome de Vila Nova e, em sequência, ao renascimento do burgo do Porto.
Assim, em Alpendurada, entre 1054 e 1059, ocorre a fundação do Mosteiro pelo abade Velino, em torno de um oratório dedicado a São João Baptista; em 1059, D. Sisnando Viegas (1049-1085?) consagra a igreja; em 1065, Velino oferece o pequeno ermitério a Exemeno (monge eremita), entrando na esfera do monaquismo visigótico; em 1072, o padroado do mosteiro pertence a Mónio Viegas (não confundir com Moninho Viegas), que introduz melhoramentos, amplia a igreja e manda fazer uma imagem de São João Baptista, em prata; em 1073, após o falecimento de Gavino Froilaz, os seus bens são deixados ao mosteiro.
Diga-se que D. Moninho Viegas, algumas décadas antes, em 990, tinha fundado, bem perto, o Mosteiro de Santa Maria de Vila Boa do Bispo.
Este mosteiro está implantado, tal como o mosteiro de Alpendurada, na margem esquerda do Tâmega, distando dele, 7 Km.



Mosteiro de Santa Maria de Vila Boa do Bispo – Fonte: “rotadoromanico.com/”




Os Sinos d'Alpendurada









terça-feira, 7 de abril de 2020

(Conclusão) - Actualização em 14/04/2021


Dirigindo novamente a atenção para a Rua de Álvares Cabral, verificamos que, no seu lado norte, predominam as habitações unifamiliares de três pisos, cuja edificação é, em grande parte, uniformizada.
Alguns prédios de múltiplos andares, construídos mais recentemente, dão-nos, no entanto, conta de uma deriva arquitectónica que choca com a dos primórdios, do início do século XX.
Em 1902, é mandada construir por determinação do proprietário de um terreno, de seu nome, Alberto Nunes de Matos, uma casa na Rua Álvares Cabral, 263, sob a licença nº 157/1902 e, junto dela, sob licença camarária nº 199/1902, uma outra, no nº de polícia, 259, propriedade de Ernesto António Lopes, ambas com projecto de Rigaud Nogueira.




Rua Álvares Cabral, 259 e 263



Em Junho de 1902, o proprietário Dionísio Pereira dos Santos solicitava à Câmara Municipal do Porto licença para a construção de 5 prédios no lado norte da rua.



Desenho apenso a projecto de 1902, para construção de 5 prédios, sitos na Rua de Álvares Cabral, entre os nºs de polícia, 353 a 381 – Fonte: AHMP




No lado sul da Rua de Álvares Cabral, começaram a nascer, alternando com as casas unifamiliares, outras tipologias de construção, que já contemplavam a vivenda multifamiliar e até o palacete.
É, por aqui, também, que a Secção Regional do Norte da Ordem dos Arquitectos (SRN/OA) decidiu, há poucos anos, instalar a sua sede, na Rua de Álvares Cabral, 144, após a recuperação de duas vivendas geminadas, centenárias, depois de ter passado pela Rua da Restauração, em chão que em tempos tinha sido do Museu da Restauração (ou Museu do Allen) e, mais tarde, a partir de 1 de Julho de 1993 (Dia Mundial da Arquitectura), pela Rua D. Hugo.



Secção Regional do Norte da Ordem dos Arquitectos, na Rua de Álvares Cabral, 136-150



Em 1917, as duas casas geminadas estavam ocupadas pelo seu proprietário de nome, António da Silva Castro que solicitava em Abril, autorização à Câmara Municipal do Porto, para construção de uma água furtada, cozinhas e de uma garagem.
Com projecto de 1902, João Cardoso Júnior haveria de construir uma casa, onde durante vários anos esteve sedeada a Secção Regional Norte da Ordem dos Médicos (SRNOM), na Rua de Álvares Cabral, 76.



Desenho de fachada apenso a projecto de Maio de 1902, para construção de um prédio, sito na Rua de Álvares Cabral, 76 – Fonte: AHMP



Rua de Álvares Cabral, 76 – Fonte: Google maps



Em 1930, António Maria Lopes decide erguer, na Rua de Álvares Cabral, 302-316, um prédio com projecto do arquitecto Aucíndio Ferreira dos Santos.



Desenho de fachada de prédio, apenso a projecto de Fevereiro de 1930, sito na Rua de Álvares Cabral, 76 – Fonte: AHMP



Rua de Álvares Cabral, 302-316



Projectado por Joel Pereira, em 1899 e assinado por João de Matos, deparamos-nos com o Palacete de António Glama, na Rua de Álvares Cabral, 384.



Palacete de António Eduardo Glama (1859-1922) – Fonte: Google maps


Joel da Silva Pereira (1861-1899) cursou Arquitectura Civil na Academia Portuense de Belas Artes, entre 1873 e 1881. Prosseguiu os estudos como pensionista, com “subscrição particular”, em Paris.
Para além do Palacete de António Eduardo Glama, Joel da Silva Pereira projectou, em 1893, a Fábrica Confiança na Rua de Santa Catarina.
É-lhe atribuída, também, a autoria do projecto (1896) do edifício neoclássico de Boaventura Rodrigues de Sousa, sito na Avenida da Boavista, n.º 1354, onde estiveram instalados o Colégio de Nossa Senhora do Rosário e o Colégio dos Maristas e que, em 2013, seria classificado como monumento de interesse público.
Em 1897, projectou o edifício do Hospital Maria Pia, na Rua da Boavista, submetido a licenciamento pela Comissão Administrativa do Real Hospital de Crianças Maria Pia, com sede na Rua da Carvalhosa, nº 80.
É autor dos projectos da sede do Banco Pinto Fonseca & Irmão (1895), para a Praça de D. Pedro (actual Praça da Liberdade), da casa do banqueiro Manuel Pinto da Fonseca,na Avenida da Boavista e, ainda, dos Grandes Armazéns Hermínios, edificados no lugar do Teatro Baquet (que ardera em 1888), entre as ruas 31 de Janeiro e de Sá da Bandeira, no Porto.


segunda-feira, 6 de abril de 2020

25.87 Rua de Álvares Cabral – Património de Interesse Público


A Rua de Álvares Cabral, que foi aberta há cerca de um século, encerra um património representativo do que foi a construção na viragem dos séculos XIX-XX e que, por isso, foi alvo de classificação patrimonial como "conjunto de interesse público", em Dezembro de 2012.
Ela foi traçada em terrenos da Quinta dos Pamplonas, uma vasta quinta, também conhecida por Quinta de Santo Ovídio que ia desde da Rua de Cedofeita ao Campo da Regeneração (actual Praça da República).
Grandes e pequenos proprietários, industriais, capitalistas, profissionais liberais (médicos, advogados), brasileiros de torna-viagem, comerciantes e funcionários públicos são os compradores dos lotes resultantes da divisão do terreno.



“ (…) no final de Oitocentos, na posse dos condes de Resende - e reflexo dos tempos de falência da aristocracia -, esta família deparava-se com graves problemas de liquidez. Manuel Benedito de Castro Pamplona, 6.º conde de Resende (e sogro de Eça de Queirós), fez, então, uma proposta inesperada ao município: abriria no percurso do boulevard da quinta uma nova rua, que, sacrificando o palacete, faria a ligação pública entre o Campo da Regeneração e Cedofeita. O conde via aqui uma oportunidade única de valorizar a sua propriedade, que assim passaria a conter duas novas frentes urbanas, que ele iria saber explorar convenientemente.
Não era esta a via que tinha sido prevista no plano ordenador da zona, mas depois de três anos de debate na câmara e de formalidades judiciais, em 1895 o município autoriza a abertura da rua. O conde de Resende avança com a obra e, simultaneamente, com um célere processo de loteamento da nova artéria - inicialmente, é chamada dos Pamplonas -, subdividindo-a em 144 fracções de seis metros de largura, a medida-padrão que vinha do tempo medieval e assim "democratizava" o acesso à frente urbana.”
Fonte: Jornal Público (20 de Março de 2011)



Palacete (fachada voltada a poente, para a Rua de Cedofeita) da Quinta de Santo Ovídio, em 1833 – Gravura de Joaquim Villanova




Foto do palacete, na mesma perspectiva da gravura anterior, onde já se observam os trabalhos para a abertura do arruamento que virá a ser a Rua de Álvares Cabral




Os primeiros projectos são assinados por mestres-de-obras, condutores de obras públicas e também engenheiros, com destaque para Rigaud Nogueira, que terá emprestado o seu traço a algumas obras, aparecendo os arquitectos, apenas mais tarde, a partir das décadas de 1920-30.
Entre os arquitectos que deixaram a sua marca em Álvares Cabral, estão nomes como João Marcelino Queirós, José Ferreira Peneda, Aucíndio Ferreira dos Santos, Rogério de Azevedo e Júlio José de Brito.
Muitos dos que escolhem construir por aqui a sua habitação, vão também, em lotes que adquirem para o efeito, construir prédios para rendimento.
Quem sobe a rua no sentido Cedofeita-Praça da República, apercebe-se duma certa uniformidade arquitectónica do lado esquerdo (passeio norte) em contraste com a sucessão de vivendas que se alinham no passeio sul. 
No topo da rua, com a fachada principal voltada para a Praça da República, deparamo-nos com um palacete em ruínas, em virtude de um incêndio ocorrido em 2008 que, durante anos, foi sede do Instituto Francês do Porto que, em Fevereiro de 1952, passaria a ocupar, também, em complemento, instalações na Rua de Sá da Bandeira, nº 651.



Edifício DKW, na Rua de Sá da Bandeira
 
 
Para o edifício acima, denominado de “DKW”, se transferiu em 1952, em parte, o Instituto Francês.
Aquele icónico edifício foi projectado por Arménio Losa e Cassiano Barbosa, em 1946, para escritórios e habitação, tendo ficado concluído em 1951.
O seu nome – DKW – deve-se à marca de automóveis alemães (criada em 1916 e extinta em 1969) que aí tinha os seus escritórios. Posteriormente, o edifício albergou durante muitos anos os escritórios da IBM no Porto.
A partir de 30 de Setembro de 2004, terminaria a presença, de décadas, do Instituto Francês na cidade do Porto.
Fundado no início da década de 1940, o Instituto Francês, ainda no início da década de 1950, ocupava instalações na Rua Cândido dos Reis.
Os primeiros anos do Centro Portuense do Instituto Francês em Portugal (Instituto Francês no Porto) vão ter como director, a partir de 1944 até 1947, do Prof. Paul Teyssier, que chega oriundo da Ecole Française de Lisbonne, o futuro Instituto Francês, onde tinha estado a leccionar entre os anos 1941 a 1944.
Paul Teyssier (Argentan, 12 de Dezembro de 1915 – Meudon, 10 de Janeiro de 2002) foi um linguista, lusitanista e tradutor francês. Ficou conhecido, principalmente, por ter escrito uma das primeiras gramáticas de português, publicadas na França.
O prédio na Praça da República onde, durante anos, se manteve também sedeado o Instituto Francês do Porto, foi mandado construir em 1898, pelo conde de Alves Machado, de seu nome Manuel Joaquim Alves Machado, nascido em 1822, na Quinta de Barbeita, junto a Cabriz, freguesia de Cerva, concelho de Ribeira de Pena.
O prédio na Praça da República onde, durante anos, se manteve também sedeado o Instituto Francês do Porto, foi mandado construir em 1898, pelo conde de Alves Machado (Cerva, 4 de Fevereiro 1822 — Porto, 4 de Abril de 1915), de seu nome Manuel Joaquim Alves Machado, nascido na Quinta de Barbeita, junto a Cabriz, freguesia de Cerva, concelho de Ribeira de Pena. 
Era filho de Bernardo José Alves Machado (lavrador) e de Maria Rosa da Costa Machado.
O conde de Alves Machado comprou o terreno a 8 de Julho de 1896, tendo solicitado a respectiva licença de construção a 18 de Julho de 1898. O projeto é do Eng. Estêvão Torres e o mestre-de-obras foi José Joaquim Mendes.
Após a construção do prédio, o conde de Alves Machado, que vivia no Hotel Francfort, empresta-o, em 1902, ao banqueiro Joaquim Pinto da Fonseca, com o mesmo nome de seu pai, o também banqueiro Joaquim Pinto da Fonseca (1816-1897), um dos fundadores do Banco Fonsecas, Santos & Vianna, que conhecia ainda dos tempos passados no Brasil.
Deste prédio, actualmente, em ruína completa, parece que se irão salvar as suas fachadas primitivas.




Palacete (construção do século XIX) na Praça da República, 75, em 1958, onde funcionou o Instituto Francês – Ed. Teófilo Rego



Emigrado no Brasil, com 12 anos de idade, o conde de Alves Machado exerceu actividade principal ligada ao comércio de café, entre muitas outras.
Em 1873, depois de uma longa viagem pela Europa, fixou residência no Porto, no Hotel Francfort, onde viveu cerca de 40 anos, nunca chegando, por isso, a ocupar a casa na Praça da República.
Acabará também por receber por herança de um seu irmão, José Bernardino Alves Machado, um palácio, situado na Rua do Salitre, 66, em Lisboa, mandado poe ele construir em 1875.
Alves Machado foi agraciado com o título de Visconde em 1879, por D. Luís e elevado a Conde, por D. Carlos, em 1896.
São conhecidos os diversos actos de grande amizade protagonizados pelo conde de Alves Machado para com o imperador do Brasil D. Pedro II, durante exílio deste, nomeadamente custeando as despesas de funeral da imperatriz e auxiliando pontualmente o imperador na sua estadia em Paris.
D. Manuel II também no exílio foi auxiliado algumas vezes, em dinheiro, pelo conde.
O conde de Alves Machado teve uma vida privada cheia de mistérios.



“Mas falemos do lado mais privado da vida de Manuel Joaquim Alves Machado...
Rio de Janeiro, dia 26 de abril de 1855... D. Maria de Jesus Almeida, solteira, dá à luz uma menina à qual chamou Amélia. Essa menina foi criada por Manuel Joaquim, segundo ele como "filha"... Uns anos mais tarde, no Porto, em 1862, nasceu Manuel, que também foi criado como "filho"... Bem, segundo descendentes de Amélia, Alves Machado de apelido, eram filhos dele e as evidências assim o apontam! O que é certo, é que, em 1870, Manuel Joaquim faz o seu primeiro testamento e grande parte dele fala destas duas crianças "criadas como filhos", às quais tinha "afeição como pai" assegurando o seu futuro financeiramente, assim como o da mãe deles, ao mesmo tempo que também deixa quantias em dinheiro a outra mulher de nome D. Antónia Bernarda Dolores Rodrigues, que mais tarde será mãe de outra sua filha ilegítima.
Na verdade nunca casou nem assumiu algum relacionamento ou filhos desses relacionamentos! Mas sempre os contemplou quer no primeiro, quer nos dois testamentos que o seguiram, apesar de deixar bem claro que "nunca tivera filhos". Esta afirmação será o seu maior problema no final da vida!
Amélia Alves Machado, sua "filha", casou com um grande amigo seu chamado José António Machado e Moura, natural do lugar de Asnela, em Cerva, Ribeira de Pena. Quando vieram para Portugal moraram numa quinta do séc. XVIII na freguesia de Atei, em Mondim de Basto, chamada Quinta da Dónega, que também ficou conhecida por "Casa dos Machados", segundo Eduardo Teixeira Lopes, comprada por Manuel Joaquim Alves Machado à família Teixeira Coelho, da Casa do Outeiro, em Veade, Celorico de Basto. E desta união nasceram seis filhos, dois rapazes e quatro raparigas. Eles chamados Pedro e Paulo Machado e Moura e elas chamadas Maria Engrácia, Orminda, Cristina e Laura Machado e Moura. Estes "netos" foram também contemplados em dois dos testamentos, em 1875 e 1890.
(…) A 11 de janeiro de 1891 morre a "filha" Amélia Alves Machado, muito jovem de 35 anos, na sua Quinta da Dónega, em Atei, sendo sepultada na capela da casa. O conde perde uma "filha" mas já tinha outra... Maria Celestina Alves Machado. Começa aqui outro capítulo do enredo de uma verdadeira novela Camiliana!
Maria Celestina havia nascido a 24 de janeiro de 1885, na cidade do Porto. Era filha natural da já falada D. Antónia Bernarda Dolores Rodrigues, portuguesa nascida a 14 de agosto de 1843. Esta senhora conheceu o conde, que na altura ainda não o era, por ocasião de uma viagem que este fez a Portugal e terá mantido com ele um relacionamento que durou anos... Para variar, o conde nunca reconheceu nada! Parece que família não era com ele. Maria Celestina seria fruto dessa relação bastante conturbada e tensa.”
Cortesia de Joaquim Castro Gonçalves (ocastromanco.blogspot.com)



D. Antónia Rodrigues, mãe da sua última filha Maria Celestina, manda construir uma casa, em terreno contíguo ao do palacete que o conde havia mandado construir, em 1898, na Praça da República, mesmo nas traseiras deste.
O prédio de D. Antónia Rodrigues, com fachada principal voltada para a Rua de Álvares Cabral, tem “Licença de obra nº 19/1899”, e Manuel Alves Ferreira é o técnico da obra.
A expectativa de uma vivência conjunta do casal, nunca se viria a concretizar, pois Alves Machado continuaria a viver no Hotel Francfort.
Maria Celestina Alves Machado, a última filha do conde, que se saiba, acabaria por casar com o historiador portuense José Júlio Gonçalves Coelho, vindo a receber um dos filhos do casal, o título de 2º Conde de Alves Machado.
Porém, este casamento não foi do agrado do conde.


“Maria Celestina cresce e apesar da desaprovação do "pai" resolve casar com o juiz e escritor José Júlio Gonçalves Coelho, um homem muito mais velho do que ela. O conde teimoso proíbe o casamento, mas não adianta! Furioso deserda-a! Maria Celestina já não constará do próximo testamento feito em 1904. Começa aqui a batalha pela herança!
Maria Celestina não se conforma com a decisão do "pai" e na tentativa de pela lei contrariar a situação resolve intentar em tribunal uma ação de investigação de paternidade ilegítima. Foi o fim da sua relação "pai e filha". O conde ficou furioso, afinal se quisesse reconhecê-la tinha o feito, mas nunca o fez, sempre o negou oficialmente. Esta ação em tribunal viria a arrastar-se por 10 anos! Sim, 10 anos! Já na altura a justiça também era lenta, muito lenta.
Mas o caricato da situação não ficou por aqui... O conde resolveu "mexer os cordelinhos" para seu favor e subornou o Juiz do Supremo Tribunal de Justiça com 50 000 escudos e jóias para a Palmira, a amante do juiz. A situação foi descoberta e exposta na imprensa! O desfecho foi a favor de Maria Celestina que se viu reconhecida finalmente como filha através do Supremo Tribunal de Justiça a 17 de dezembro de 1912”.
Cortesia de Joaquim Castro Gonçalves (ocastromanco.blogspot.com)


Entretanto, o conde resolveu deixar toda a sua fortuna do Brasil, que incluíam várias fazendas e outros imóveis, à filha do seu grande amigo e já falecido, o imperador D. Pedro II, a princesa Isabel.
A lei no Brasil, ao contrário da portuguesa, não permitia a investigação de paternidade ilegítima e para impedir que Maria Celestina contrariasse a sua vontade, o conde, já com 91 anos, viaja para o Brasil, em 1913, para se naturalizar brasileiro. Só assim como verdadeiro cidadão brasileiro poderia impedir pela lei que os seus bens fossem parar à mão de Maria Celestina. O conde passou, assim, a possuir a dupla nacionalidade.
Claro que, mais tarde, Maria Celestina a 4 de Agosto de 1915, entra na secretaria do Supremo Tribunal de Justiça do Brasil com um pedido de homologação da sentença obtida em Portugal e o assunto só teria um termo, ao fim de 6 anos, quando as duas partes envolvidas, Maria Celestina e a princesa Isabel chegaram a acordo.
Na realidade em 20 de Outubro de 1917, dois anos após o falecimento do conde Alves Machado, é conhecida, publicamente, a decisão do Tribunal Federal do Brasil sobre a contenda.
 


 

In revista “O Tripeiro”, 7ª Série, Outubro de 2017


O edificado, na Rua de Álvares Cabral, nº 399-401, contíguo à residência do conde Alves Machado, mandado erigir por D. Antónia Bernarda Dolores Rodrigues e que seria herdado por sua filha Maria Celestina, encontra-se, há anos, em estado de ruína.




Notícia da morte do conde de Alves Machado - In Ilustração Portuguesa, 2ª Série, nº 479, Lisboa, 26 de Abril de 1915


Por este lado norte, no nº 159, da Rua de Álvares Cabral, esteve um estabelecimento de ensino profissional icónico da cidade do Porto, por onde passaram milhares de alunos - a Escola de Esteno -  Dactilografia, “A Tecla” - fundada em 1958, por Dona Consuelo Costa, que rivalizava com uma outra escola do género com instalações no Palácio Atlântico, à Praça D. João I – “A Maratona”.


Publicidade à Academia Tecla, In Jornal de Notícias de 05 de Maio de 1991 - Cortesia de Fernando Barreto


Academia Tecla, na Rua de Álvares Cabral


(Continua)



segunda-feira, 30 de março de 2020

25.86 Barbearias históricas



No século XIX, as barbearias não se limitavam apenas às acções de asseio capilar, como narra o texto que se segue.


“Antigamente há sessenta e tal anos, nos arredores do Porto, algumas barbearias tinham por cima da porta uma bacia de metal amarelo, com recorte semicircular e um grande queixal de madeira, pintado, pois alguns mestres barbeiros também tiravam dentes, ou por outra, arrancavam-nos com o alicate à força de pulso! E o paciente sujeitava-se, porque pagava menos, embora visse as estrelas ao meio dia! Anestesia era coisa fora do conhecimento do barbeiro. Tinham que servir os tanoeiros e “matulas” dos armazéns de vinho do Porto que trabalhavam de sol a sol, mas que nesses dias despegavam às 3 horas da tarde. Estes trabalhadores viviam nos arrabaldes tendo de andar a pé 2, 3 e mais léguas, e queriam chegar a casa barbeados para na manhã de Domingo irem à Missa com decência. Nesse tempo havia uma barbearia… que nas noites de sábado para Domingo reunia melhor freguesia, e lá se estava até à uma ou duas horas da madrugada à espera de vez… Naquele tempo uma barbeadela custava 30 a 40 reis”. 
In O Tripeiro, Série V, Ano V – Fonte: “portoarc.blogspot.com/”




Barbeiro, Sangrador e Tira-Dentes




Barbearia do século XIX – Fonte: “portoarc.blogspot.com/”



O texto que se segue, descreve a barbearia do senhor Pereira, que estava naqueles tempos na moda, e que Camilo Castelo Branco bem conhecia.







Noutros tempos, um cantinho aconchegado servia de barbearia – Fonte: “portoarc.blogspot.com/”




Barbearia Porto


A Barbearia Porto abriu as suas portas em 1936, na Rua do Almada e desde 10 de Fevereiro de 1946, está na Rua do Dr. Magalhães Basto.
Depois de encerrar, cerca de 1 ano e meio, abriu novamente com uma sociedade de dois irmãos, Nuno e Carlos Silva, em 21 de Novembro de 2015.
Desde 1946 a tratar do visual dos homens do Porto, a Barbearia Porto renovou o seu espaço e conceito, sendo, agora, igualmente, um espaço de convívio onde se pode beber uma boa cerveja, fazer tatuagens ou até mesmo, fumar um charuto.



Interior da Barbearia Porto – Ed. Manuela Campos




Barbearia Tinoco – Oficina do Cabelo (Cabeleireiro Sousa)


O edifício da barbearia terá sido construído por volta de 1917, na sequência do alargamento da Rua de Sá da Bandeira. 
Esta barbearia, situada na Rua de Sá da Bandeira, nº 13, abriu em 1929.
A Barbearia Tinoco é uma obra, portanto, de 1929, dos arquitectos Manuel Marques e José Penêda.
Na sobreloja com a respectiva sala de espera funcionou, em tempos, um calista.
A decoração da antiga Barbearia Tinoco, até há pouco tempo designada por Cabeleireiro Sousa, já faz parte do património do Porto.
O destaque vai para os lavatórios em mármore, o chão revestido com mosaicos em leque, as cadeiras em ferro e os enormes espelhos, num conjunto com clara inspiração Art Déco.
E, há ainda o velho aquecedor de toalhas a vapor, que depois eram colocadas no rosto dos clientes.
Aqui trabalharam, há mais de três décadas, das primeiras mulheres barbeiras da cidade do Porto - Helena e Emília.




Barbearia Tinoco – Ed. Manuela Campos



No início da década de 1930, abria também, bem próximo, no nº 69 da Rua 31 de Janeiro, a “Barbearia Daniel”, no mesmo local em que hoje está a “Barbearia Santo António”.




Barbearia Santo António – Fonte: “barbeirosportuenses.blogspot.com”



Salão Veneza


O Salão Veneza, situado na Rua de Elíseo de Melo, está aberto desde 1966.
Nas suas poltronas bordeaux, já se sentaram figuras incontornáveis da nossa história.



Salão Veneza, na Rua Elísio de Melo, primeira loja, à direita




Barbearia Apolo (encerrada)


Localizava-se esta barbearia, na Rua Formosa, nº 32, desde meados dos anos 50, tendo transitado do Largo do Padrão, onde estava na década de 1940.
Foi fundada por Manoel Silva, um profissional com vários prémios ganhos em concursos realizados em França, e por Domingos Xavier.
Após o falecimento deste, a sua quota foi dividida pelos restantes trabalhadores, todos eles irmãos, oriundos de Ponte de Lima - António, José e João, todos de apelido Almeida Pereira.
No início da década de 1990, após o falecimento de Manoel Silva, a direcção da barbearia, até aí nas suas mãos, passou para o âmbito de António Pereira, um apoiante fanático do F. C. Porto.
Por isso mesmo, a barbearia era visitada por muitos jogadores daquele clube, casos de Hernâni Ferreira da Silva e Virgílio Mendes.
A equipa de barbeiros da Apolo, na década de 1970, foi reforçada com a presença da Goreti, sobrinha do José Pereira.



No primeiro estabelecimento esteve, até ao seu fecho, a Barbearia Apolo, entre o Largo do Padrão e a Rua Dr. Alves da Veiga - Fonte: Google maps



Após o fecho da barbearia, há cerca de 10 anos, quando António passando já dos 80 anos se reformou, Goreti continuaria a exercer numa sala, na Rua Formosa, em frente do antigo estabelecimento e a atender uma clientela que lhe continua fiel, sendo, provavelmente, a mais antiga barbeira ainda em actividade na cidade do Porto.




Barbearia Invicta



A Barbearia Invicta localiza-se na Praça Carlos Alberto, nº 123, 1º piso.
Em 1 de Abril de 1968, seria inaugurada a Barbearia Invicta, no Largo do Carmo, fundada por José Aventino da Silva, José Mendes de Babo, Aníbal do Carmo Soares e Joaquim Pereira Júnior. 
José Mendes de Babo seria um dos primeiros dirigentes da Escola Profissional de Barbeiros, Cabeleireiros e Ofícios Correlativos do Distrito do Porto, inaugurada em 17 de Outubro de 1961, e cujo primeiro director foi José Baptista Rodrigues Frias, falecido pouco depois.



“José Aventino da Silva já perdeu a conta às cabeças famosas que se entregaram nas mãos. D. Manuel Clemente confiou-lhe o corte de cabelo e Rui Rio também. A clientela atira-lhe que só liga aos ilustres, mas a resposta é pronta: "Ilustres são todos os que se sentam na minha cadeira". A Invicta, fundada por José e dois sócios há 47 anos, sobreviveu à queda das mais antigas barbearias do Porto, "derrotadas pelos Beatles". Entre os troféus, pontifica a navalha de barba do Zé do Telhado”.
Cortesia de Isabel Paulo, In “Expresso” de 25.03.2016



Interior da Barbearia Invicta – Ed. Lucília Monteiro, In “Expresso” de 25.03.2016




Barbearia Garrett


A Barbearia Garrett situa-se na Rua Ramalho Ortigão, nº 16.


“Com mais de 50 anos de história, a Barbearia Garrett, localizada no coração do Porto, já viu por lá passar incontáveis pessoas. Acácio Branco, o proprietário, é o mestre-de-cerimónias.
E era de mestre para mestre, da barbearia ao futebol, que atendia José Maria Pedroto, quando, na década de 50, enquanto futebolista, se instalou na cidade.
Barrigana, Virgílio e Carvalho, por exemplo, também por lá passaram, na década de 50 e 60. Nos tempos que correm, a corrida dos jogadores poderá ser para outros cenários, mas nada apaga a ligação histórica ao FC Porto”.
Fonte: “fcporto.pt”



Interior da Barbearia Garrett – Fonte: “dotempoedaluz.blogspot.com”



José Maria Pedroto, na década de 1950, explorava próximo da Barbearia Garrett, o café Apolo.



Café Apolo e a Câmara Municipal ao fundo – Fonte: Google maps




Barbearia Norton


A Barbearia Norton fica na Rua de Entreparedes, nº 4, à Praça da Batalha.

“O Sr. José Carvalho, que exerce o seu ofício naquele lugar há ‘30 e tal anos’, não sabe responder precisamente há quanto tempo a barbearia existe. Nome de família dos antigos proprietários, a Barbearia Norton foi, até hoje, a barbearia que esteve mais movimentada, a nível de clientes, enquanto estive a conversar com o proprietário”.
Cortesia:”barbeirosportuenses.blogspot.com”



Barbearia Norton – Fonte: Google maps




Barbearia Sport (encerrada)


Esta barbearia foi fundada em 1942 e localizava-se, ultimamente, na Rua das Carmelitas, nº 17.



Interior da Barbearia Sport - Fonte: “dotempoedaluz.blogspot.com”



Salão Ferreira


Esta barbearia fica na Rua das Oliveiras, nº 53.



Salão Ferreira


Interior do Salão Ferreira - Fonte: “dotempoedaluz.blogspot.com”




Barbearia Brazão (Desaparecida)


Por meados do século XX, na Rua das Flores, nº 25, instalada em parte do icónico edifício dos Maias, estava a Barbearia Brazão.



Barbearia Brazão na Rua das Flores, semi-escondida, à direita da foto



Barbearia Pereira


Pela década de 1940, na Rua de Sampaio Bruno, estava sedeada a Barbearia Pereira.



Barbearia Pereira, na Rua de Sampaio Bruno, junto da “Casa da Sorte” (lotarias) – Fonte: AHMP



Perspectiva actual, idêntica à da foto anterior




“Salão da Lapa”, ou Barbearia do Senhor Moreira, ou Barbearia da Lapa
 
 
 
Dizem que é a mais antiga barbearia em actividade.
Abriu as suas portas em 1865, esteve sempre nas mãos da mesma família até à comemoração do seu centenário, sendo por isso distinguida pela União dos Grémios dos Comerciantes do Porto, e foi adquirida por José Moreira Moreira, por 10 contos, em 1966.
O novo proprietário tinha começado a aprender o ofício aos 18 anos, em Matosinhos, com o primo e tios.
 
 
 
Salão da Lapa, na Rua da Lapa, n.º 56