domingo, 3 de dezembro de 2023

25.215 Praça da Batalha e algumas das suas requalificações

 
Em pleno século XIV, grande parte das construções da cidade já se encontravam do lado de fora da muralha primitiva, que se limitava a proteger o morro da Sé.
Foi a vulnerabilidade do burgo a eventuais ataques, nomeadamente, à sua zona ribeirinha, que levou à construção de uma nova muralha no século XIV, bastante mais extensa do que a anterior.
Começada no reinado de D. Afonso IV, a muralha só seria concluída em 1376, já no reinado de D. Fernando (1345-1383), razão pela qual a cerca defensiva ficou conhecida como Muralha Fernandina.
No século XVI, a área da cidade junto da Porta de Cima de Vila era referida como o Campo do Pombal e, mais tarde, por Terreiro de Nossa Senhora da Batalha.
Da porta de Cima de Vila saía um caminho para o Bonfim, Valongo e Penafiel que passava pelo adro da ermida de Santo Ildefonso (mais tarde, igreja da mesma invocação) e, um outro, que pelo Arrabalde (S. Lázaro) rumava a Campanhã.
Na realidade, cerca de 1600, já existiria, do lado de fora das muralhas, junto da porta de Cima de Vila, uma capela.
Antes, como era habitual, no interior da muralha fernandina, já se prestava o culto à imagem daquela invocação (exibida numa edícula) e, ainda, à Senhora dos Remédios.
No século XVIII, a área sofreu grandes transformações, na sequência da decisão de demolir a muralha, tendo sido deliberado, em 1792, transferir a referida capela para um local mais próximo do Real Teatro S. João, para um sítio de "umas casas velhas e caídas que foram de João Pereira Falcão e terreno a elas contíguo".
A nova capela foi erguida em 1799 e acabaria por ser demolida, em 1924, durante uma outra intervenção urbanística.


 
 

Capela de Nossa Senhora da Batalha, no seu local derradeiro, c. 1900

 
 

Capela de Nossa Senhora da Batalha, observando-se, ainda, o Real Teatro S. João, c. 1900

 
 
Seria nos finais do século XVIII, quando foi edificado o "Palácio da condessa de Pangim" chamado, mais tarde, palacete dos Guedes da Quinta da Aveleda e erigida a nova capela de Nossa Senhora da Batalha, que a praça foi alvo de melhoramentos importantes.
Acresce que, em 1796, já tinham arrancado as obras para construção do Real Teatro de S. João, que vai ser inaugurado no dia 13 de Maio de 1798 (data de aniversário do futuro rei D. João VI).
Para que fosse possível levantar o teatro, foi necessário derrubar um troço da muralha fernandina e, ainda, expropriar cinco prédios que por lá existiam.
Em 1793, seria, então, derrubada, também, a porta de Cima de Vila.
O texto que se segue dá uma ideia de como eram vividas as visitas pelos portuenses ao Real Teatro S. João.
 
 
“Não era sem certos cuidados que algumas famílias se dispunham a ir ao teatro. A mãe dá ordem à criada que faça a ceia; o pai diz ao galego que ponha duas velas de cêbo no lampião de folha. Apenas o jantar terminou e o último palito fez a limpeza dentária, vai a família dormir a sesta, porque tem de perder a noite. À hora própria lá segue a família para o teatro, porque é bom ir cedo e sem fadiga. O chefe de família leva duas pistolas no bolso para o que der e vier; atrás, a criada com o merendeiro, os frangos assados, a vitela, as azeitonas, a pingoleta etc. Chegam as damas ao camarote, estendem as mantilhas de lapim para fora da borda e colocam-nas cuidadosamente nuns arcaicos lanceiros de pau que havia nos camarotes; ao fundo a criada senta-se junto ao cesto da ceia. Os espectadores começam a encher o teatro e o Aniceto vem distribuir pelas estantes da orquestra os diversos papéis da partitura; trabalho que faz pacificamente, excepto se algum frequentador das varandas lhe grita de lá; - Oh Clemente, quebraste a infusa! – porque então o homem perde a cabeça, troca os papeis e dá por paus e pedras.
Os janotas cumprem a sua elegante missão de conquistadores; as damas choram ou sorriem, como as situações da peça o exigem; à hora própria, aproveitam-se os intervalos para a ceia e tudo corre no melhor dos mundos, se os artistas não desafinam e se as tormentas teatrais não provocam as pateadas.
Que velhos costumes e clássicos hábitos da velha sociedade que dormia a sesta e ia cear ao teatro!” 
In revista “O Tripeiro”, Volume V
 
 
 

Teatro S. João - Gravura em revista “O Tripeiro”, 5ª Série, Vol I, pág 119

 
 

Desenho do interior do primitivo Teatro S. João


 
 

Planta da Praça da Batalha, em 1854
 
 
 
 
Legenda:
 
B – igreja de Santo Ildefonso;
C – Palacete da condessa de Pangim;
D – Capela de Nossa Senhora da Batalha;
E – Real Teatro de São João;
1 – Rua de Santa Catarina;
2 – Rua de Santo António (actual 31 de Janeiro);
3 – Rua de 23 de Julho (actual Rua Santo Ildefonso);
4 – Calçada da Teresa (actual Rua da Madeira);
5 – Rua de Cima de Vila;
6 – Travessa de Cima de Vila;
7 – Travessa do Cativo;
8 – Rua de Augusto Rosa;
9 – Rua de Entreparedes
 
 
 
Entretanto, no ano de 1860, um edital do Governo Civil determinou que a Praça da Batalha passasse a englobar o denominado Largo de Santo Ildefonso (fronteiro à igreja).
A Praça da Batalha passa a contemplar dois espaços.
Um deles, o antigo Largo de Santo Ildefonso, tem a forma trapezoidal orientado no sentido Nordeste – Sudoeste e é dominado pela igreja de Santo Ildefonso.
O outro, orientado no sentido Noroeste – Sudeste, é longilíneo e limitado a Norte pelo antigo Palácio da condessa de Pangim e o Cinema Batalha e, a Sul, pelo Teatro Nacional de S. João, com a estátua de D. Pedro V dominando o espaço, com implantação descentrada.
Na década de 1860, a Praça da Batalha é alvo de uma nova intervenção importante como resultado da instalação no local de uma estátua em memória de D. Pedro V.
Assim, o monumento da autoria de Teixeira Lopes, pai (1837-1918), cuja primeira pedra foi lançada em 11 de Julho de 1862, pelo general visconde de Rivas, seria inaugurado em 1866.
Para isso, o local teve que ser alvo de um desaterro, que implicou que o Palácio da condessa de Pangim ficasse com o seu piso térreo a uma cota mais elevada. A solução foi atribuir uma indemnização aos proprietários para um rebaixamento interior daquele piso.
 
 
 
 

Imagem, mais remota, que existe do Palácio da condessa de Pangim – Gravura de Joaquim Villanova de 1833


 
 

Nesta foto, em comparação com a gravura anterior, é possível adivinhar o desaterro a que a área foi sujeita, pela altura das janelas do 1º piso

 
 
 
Um pouco antes, em 1853, já o pavimento que, até aí, era de pedra miúda e com passeios muito irregulares, seria inteiramente substituído por macadame.
Foram, então, delimitadas as vias de circulação e criada uma plataforma central em calçada portuguesa, demarcada com árvores, definindo um espaço de estar.
Em conclusão: no centro da praça, foi colocado, o monumento de homenagem ao rei D. Pedro V (1837-1861).
Em meados do séc. XIX, a praça já era zona de hotéis, restaurantes e cafés e, assim, continuaria, até à chegada do novo século.
O grande surto urbanístico da Batalha começou, em 1881, quando se deu início aos trabalhos de construção da ponte de Luís I, que culminou com a inauguração, em 1886, do tabuleiro superior e com a conclusão, em 1888, do seu tabuleiro inferior.
Em sequência, para permitir o acesso da Praça da Batalha às Fontainhas, em 1887, foi aberta a Rua Nova da Batalha, actualmente designada por Rua de Alexandre Herculano.


 
 

Praça da Batalha, em 1898

 
 
Na madrugada de 11 para 12 de Abril de 1908, um violento incêndio reduziria o Real Teatro de São João a um montão de escombros calcinados. Poucos anos depois, iniciou-se a construção de um novo edifício, a cargo do arquitecto José Marques da Silva (1869-1947). A obra foi uma oportunidade para o realinhamento dos prédios das imediações, com o objectivo de aumentar o espaço que antecedia o teatro.
Em 1913, sucedendo à sala de projecção do cinema Salão High Life, vinda da Cordoaria, e onde esteve sedeada, antes, "A Construtora", de Campos & Morais, armazém de ferragens e materiais de construção, surgiria o novo edifício do Cinema Batalha que iria dar origem, em 1943, a um outro, que ainda hoje existe.
A 7 de Março de 1920, era inaugurado o novo Teatro S. João.
Em 1924, foram demolidos diversos edifícios, incluindo a capela que albergava a imagem de Nossa Senhora da Batalha, que passou para a Casa do Cabido da Sé do Porto, onde ainda se encontra.


 
 

Praça da Batalha, c. 1923

 
 
 Na década de 1950, atendendo a um aumento do trânsito auto, foi derrubada uma parte das árvores existentes, e a placa central passou a ser uma simples passagem de transportes públicos, ficando as vias periféricas para o trânsito auto.


 
 

Praça da Batalha, em 1950 – Bilhete postal


 
 

Praça da Batalha, em 1962
 
 
 
A situação descrita vigorou até 1982, quando aconteceram obras de certa monta, na sequência de um novo projecto camarário.

 
 
 

Praça da Batalha, em obras de requalificação, em 1982
 
 
 
A Praça da Batalha é, então, dotada de um pavimento tipo “calçada portuguesa”.

 
 

Praça da Batalha, c. 1985 – Bilhete postal
 
 
 
A última intervenção na praça vai ocorrer aquando da realização do evento “Porto - capital europeia da cultura, em 2001”.
O projecto para este local da cidade, é da autoria dos arquitectos Adalberto Dias (n.1953), Fernando Távora (1923-2005) e Bernardo Távora (n.1958).
Do que foi proposto, seria reintroduzida uma plataforma central e um novo alinhamento de novas árvores.
O átrio do Teatro Nacional de S. João seria prolongado para o exterior, a exemplo do que acontecia no século XIX.


 



Teatro Nacional de S. João e o seu acesso principal, actualmente
 
 
 
 
A estátua de D. Pedro V sofreria um reposicionamento, passando a situar-se no enfiamento da entrada do antigo Palácio da condessa de Pangim, agora, um hotel.


 

Praça da Batalha, em Maio de 2000 – Cortesia de Paula Catrica
 
 
Uma fonte circular passou a estabelecer a articulação com o espaço fronteiro à igreja de Santo Ildefonso.


 

Praça da Batalha, após intervenção em 2001, observando-se a estátua no seu novo poiso e a nova fonte circular – Cortesia de Paula Catrica
 
 
 
No que à área adjacente à igreja diz respeito, ficaram por recolocar as escadas entre a igreja de Santo Ildefonso e a Rua de 31 de Janeiro e, ainda, o obelisco que lá esteve até há cerca de 100 anos e, entretanto, foi recolhido no terreno interior, que foi antigo cemitério.



 
 

Igreja de Santo Ildefonso ostentando o seu obelisco e com escadaria comunicando com a Rua de Santo António – Gravura de Joaquim Villanova em 1833
 
 
 
 

Igreja de Santo Ildefonso, c. 1910, com a escadaria de ligação à Rua de Santo António, encimada com o icónico obelisco – Ed. Alvão
 
 
 
Nesta última requalificação na praça seria introduzido o serviço de carros eléctricos, num canal central e, na periferia, uma via para veículos automóveis.

 
 

Praça da Batalha, actualmente

sábado, 25 de novembro de 2023

25.214 Alguns depoimentos de visitantes estrangeiros sobre o Porto

Ao longo dos anos, vários visitantes estrangeiros acharam por bem deixar registos para a posteridade sobre a impressão que a cidade do Porto lhes tinha causado.
Em meados do ano de 1699, o franciscano francês Frei François de Tours, em caminho para Santiago de Compostela, passando pelo Porto, escrevia:


 
 

 
 
 
E, acrescentava,


 
 

 
 

O Porto, em 1669 – Gravura de P. M. Baldi





Giuseppe Gorani (1740-1819), diplomata para uns, espião para outros, que chegou a privar com o Marquês do Pombal, sobre o Porto, escreveria:
 
 
 





Porto – Gravura do gravador Manuel Marques Aguilar, em 1797
 
 
 
 
Arthur William Costigan, em 1778-79, percorreria o País para conhecer as fortificações portuguesas e, passando pelo Porto, dizia, na obra Cartas sobre a Sociedade e os Costumes de Portugal, publicada pela primeira vez, em 1810:


 








Lady Jackson, autora, em 1873, da obra “Formosa Lusitânia”, traduzida para português por Camilo Castelo Branco, produziria extensa prosa sobre o quotidiano dos portuenses.

 
 
“Catherine Elliot (1842- 1891) foi casada com um diplomata inglês, George Jackson, colocado a certa altura em São Paulo de Luanda por estar encarregue da abolição de escravos. Foi aí que a futura escritora – que começou por publicar livros sobre a história da Europa, e mais tarde se dedicaria à literatura – aprendeu alguma coisa de português, que lhe seria útil na sua viagem a Portugal. Viúva na altura, Lady Jackson viajou sozinha pelo país, entre julho e outubro de 1873”.
Fonte: Revista Visão


 
 


 
 

Porto, em 1859
 
 
 

Rua de Santo António, em 1890, com a Rua dos Clérigos, em fundo – Centro Português de Fotografia

 
 
 
Maria Rattazzi (Irlanda 1833 - Paris 1902) foi, por sua vez, uma escritora que visitou Portugal, entre 1876 e 1879, três vezes e que, na segunda metade de 1879, passou pelo Porto. Na sequência daquelas visitas, numa delas, esteve presente no casamento do rei D. Carlos.
Acabaria por publicar o livro intitulado “Portugal de Relance”, que provocaria a ira, principalmente, de Camilo Castelo Branco, que não apreciou o tom humorístico da obra que, originalmente, teve o título "Le Portugal A Vol D’Oiseau". 
A polémica na qual se envolveu a intelectualidade nacional, que se juntou a Camilo, ficou conhecida como a “Questão Ratazzi”.
Sobrinha-neta de Napoleão Bonaparte, Maria Letizia (nome de solteira) foi casada três vezes, uma delas com um ministro de Victor Emanuel II.
Era também conhecida por Madame Solmes, apelido que lhe advinha de um anterior casamento realizado, em 1849, com um alemão, Frederico de Solms de quem enviuvou em 1863. Nove dias depois casou com um italiano, Conde Urbano Rattazzi, que faleceu em 1873. Sete anos mais tarde casou com um espanhol, D. Luis de Rute de quem também enviuvou em 1889.


 
 

sábado, 18 de novembro de 2023

25.213 Comerciantes que escolheram a Foz do Douro para aí residirem

 
 
Localizada no concelho de Tabuaço, na freguesia de Valença do Douro, a Quinta do Seixo tem uma história bem antiga.

 
 

Quinta do Seixo, em Valença do Douro
 
 
 
Em 1788, nas demarcações marianas (D. Maria I), a área que a Quinta do Seixo ocupava, viria, finalmente, a ser incluída na marca vinhos de Feitoria, ou seja, área de vinhos para exportação através da Feitoria Inglesa do Porto.
Sobre a decisão inicial, de não inclusão da propriedade naquela qualidade, verificada ainda no consulado do Marquês do Pombal recorreria, sem êxito, José Ribeiro Monteiro, em 1759.
Já, em pleno século XVIII, a Quinta do Seixo pertenceria a Miguel Almeida Caiado, proprietário de terras no Alto Douro e 9º Morgado da Pesqueira e 7º de Penedono.
A família Almeida Caiado tinha residência em S. João da Pesqueira, na actual freguesia de Trevões, cabeça de concelho até 1836. Posteriormente, a Quinta do Seixo passa para o filho António Almeida Coutinho Lemos, 1º Barão do Seixo (título criado por D. Maria I, a 19 de Julho de 1845).
O 1º Barão do Seixo (1818-1869) foi fidalgo cavaleiro e administrador do vínculo dos Almeida Caiado, em Trevões e dos da Pesqueira e Penedono e Senhor das Quintas do Seixo e do Cachão, atingindo simultaneamente o estatuto de grande negociante e proprietário no Douro.
Cavaleiro da Ordem da Torre e da Espada desempenhou, ainda, entre 1858 e 1867, o cargo de Presidente da Direcção da Administração da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, criada por Pombal em 1756.

 
 

Notícia de reunião da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro presidida pelo Barão do Seixo – In jornal “O Commercio do Porto” de 30 de Setembro de 1861
 
 
 
 
Em 1851, o Barão do Seixo terá passado por algumas dificuldades económicas, razão pela qual, um seu credor, Constantino do Vale Pereira Cabral (1806-1873), um capitalista e negociante da praça do Porto e proprietário da Quinta de Sarzedinho, vai tornar-se dono de um grande stock de vinhos do Barão do Seixo.


 
 

Quinta do Seixo, em Valença do Douro – Ed. Revista Visão

 
 
Na mesma ocasião, Constantino do Vale Pereira Cabral adquire a Quinta do Cachão, também propriedade do Barão do Seixo, procedendo, em 1853, à construção da adega.
Esta quinta localizava-se na freguesia de Vale da Figueira, concelho de São João da Pesqueira, tendo apenas existência, a partir de 22 de Outubro de 1792, com o rompimento e destruição do bloco granítico, que atravessava o rio Douro, de lado a lado, no Cachão, cuja execução tinha começado em 1780,  permitindo, então, a navegação do rio até à fronteira e possibilitando, assim, o aproveitamento dos terrenos nessa região.
 
 
 

Cachão da Valeira – Albumina de Emílio Biel
 
 
 
Por esse motivo, a Quinta do Cachão foi por muito tempo conhecida como «Quinta Nova». 
Terá sido fundada, então, em 1845 pelo Barão do Seixo, que iniciaria a plantação da vinha.
Por outro lado, para administrar o património que Constantino do Vale Pereira Cabral obteve do Barão do Seixo, vai ser incumbido da função um sobrinho de Constantino Cabral, conhecedor do negócio dos vinhos, Miguel de Sousa Guedes (1829-1913), que irá expandi-lo, a partir da década de 1880, de tal modo que, já na posse da Quinta de Valdigem, irá acabar por adquirir para seu próprio património a Quinta do Seixo, a Quinta das Carvalhas, a Quinta das Baratas, a Quinta das Covadas, a Quinta de Santo António ou do Zeferino e a Quinta da Pedra Caldeira.
Desde a abolição dos vínculos, em 1863, que tinham começado a surgir no território novas propriedades e houve quem soubesse tirar partido da situação.
Em 1909, Miguel de Sousa Guedes irá dar sociedade ao seu irmão mais novo, Agostinho Pereira Cabral de Sousa Guedes (1846-1931), com a firma “Miguel de Sousa Guedes & Irmão”, entretanto, formada e que, passaria a ser, uma referência no negócio dos vinhos.
Miguel de Sousa Guedes irá ser vice-cônsul dos Estados Unidos da América e Agostinho de Sousa Guedes, cônsul do México no Porto.
Estes dois irmãos, que no negócio dos vinhos conseguiram uma fortuna colossal, acabariam por escolher a Foz do Douro para residirem.
Assim, em 1888, Miguel de Sousa Guedes pela licença de obra nº 341, construía o seu palacete no ângulo da Rua do Passeio Alegre e Rua da Bela Vista.

 
 

Desenho de fachada voltada para a Rua do Passeio Alegre, anexo ao projecto afecto à licença nº 341/1888
 
 
 
 
Em 1889, Miguel de Sousa Guedes pela licença de obra nº 523, dava os últimos retoques no seu palacete com fachada voltada para a Rua da Bela Vista.
 

 


Desenho de fachada do prédio dos Sousa Guedes, voltada para a Rua da Bela Vista, anexo ao projecto afecto à licença nº 523/1889
 
 
 
 
 

Palacete da família Sousa Guedes ("Imóvel com Interesse Patrimonial"), na Rua do Passeio Alegre - Fonte: pt.wikipedia.org/

 
 
 
Entretanto, em 1884, Miguel de Sousa Guedes já tinha começado a construir um outro icónico palacete na Rua Alto de Vila, antes, a Rua de Cimo de Vila, onde ia desembocar a antiga Rua da Florida, que se passaria a chamar Rua Miguel de Sousa Guedes.
O referido palacete aloja, hoje, um condomínio fechado.



 

Antigo palacete de Miguel Sousa Guedes (1829-1913), na Rua Alto da Vila, Foz do Douro, que seria demolido nos anos 80 – Ed. “O Progresso da Foz”; Álbum: 32 Postais antigos da Foz I, nº 16; AHMP
 
 
 
 

Vista actual do local da foto anterior – Fonte Google maps
 
 
 
 
Por sua vez, Agostinho de Sousa Guedes, co-proprietário dos bens afectos à firma Miguel Sousa Guedes & Irmão foi, ainda, proprietário da casa do Outeiro, em Tuias, Marco de Canaveses, da casa de Lagoas, em Lousada e da Quinta da Fonte Moura, no Porto.
A casa do Outeiro transformada, actualmente, num alojamento local, a Outeiro Tuias – Manor House, continua a ser propriedade dos Sousa Guedes.
 
 
 

Casa do Outeiro, Tuias – Cortesia de Nelson Garrido

 
 
Agostinho de Sousa Guedes escolheria, também, para sua residência o Passeio Alegre, num palacete no ângulo daquela rua com a Rua Santa Anastácia.



 

Rua do Passeio Alegre, 1012 – Fonte: Google maps
 
 
 
A Empresa Miguel de Sousa Guedes & Irmão, Lda, atravessaria todo o século XX como uma referência na comercialização de vinhos, mas, em 1973, transferiria para a Real Companhia Velha todos os bens do seu activo, completando, definitivamente, a integração naquela companhia, acabando a sociedade constituída pelos irmãos Guedes por ser dada por extinta.
Aliás, já em 1953, Manuel da Silva Reis tinha adquirido a Quinta das Carvalhas.


 




Nos dias de hoje, quanto às icónicas quintas do Douro, que foram pertença do Barão do Seixo, no século XIX, a Quinta do Seixo, em 1979, foi vendida à firma A. A. Ferreira S.A. e, em 1987, quando esta foi adquirida pela Sogrape Vinhos, passou a fazer parte do seu património, que se estenderia às marcas “Ferreira”, para vinhos do Porto, e “Casa Ferreirinha”, para os vinhos Douro.
Quanto à emblemática Quinta do Cachão, acabará nos nossos dias nas mãos de uma firma bairradina – as Caves Messias.
 
 
“Em 1873 o Eng. Afonso do Valle Coelho Pereira Cabral, herda a quinta de seus pais. A construção da casa data de 1910. Após a morte deste, em 1946, a Sociedade Agrícola e Comercial dos Vinhos Messias, S.A. (Caves Messias) adquire a quinta e dois anos mais tarde começa a sua renovação e integração da Quinta do Rei, comprada à «Gonzalez Byass». Em 1973 Messias Baptista, fundador das Caves Messias, retira-se da administração da empresa que passa a ser gerida pelos seus descendentes. Em 1982, a casa sofre uma nova remodelação”.
Fonte: arquivo.museudodouro.pt/
 
 
 

Quinta do Cachão, em 2023 – Ed. Caves Messias

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

25.212 Cadouços

Em 22 de Junho de 1859, a Câmara do Porto aprovava uma obra para a Rua da Senhora da Luz, na Foz do Douro, que implicava o realinhamento daquela rua.
 
 
 

Alinhamento da Rua Senhora da Luz, com área a eliminar, em destaque, em 22/6/1859
 
 
Legenda:
 
1- Terrenos de Tomás José Pinto da Silva
2- Fonte da Praia
3- Rua da Senhora da Luz
4- Fonte de Cadouços
 
 
 
Começava, assim, uma intervenção na área, que iria ter continuidade pouco depois.
Em 12 de Junho de 1861, o jornal “O Comercio do Porto” noticiava que, na sequência de uma reunião camarária, tinha sido aprovado levantar um novo jardim junto da Rua Senhora da Luz, na Foz do Douro, tornando-se necessário, então, levar tal decisão ao conhecimento do Conselho de Distrito, para a respectiva aprovação.
 
 
 




Na oportunidade, a Câmara do Porto aprovaria a obra representada na planta seguinte.

 
 

Ruas, em projecto, entre as ruas da Senhora da Luz e Alto de Vila, bem como a praça projectada (1/8/1861 e 16/1/1862)

 

Legenda: 
 
1-Rua Senhora da Luz
2-Rua Alto da Vila
3-Bouça de Cadouços e Praça (em projecto)
4-Rua (em projecto)
5-Nova rua
6- Circo da Luz
7-Rua de S. Bartolomeu
8-Fonte
9-Propriedade de José Cardoso Pereira
10-Quintal de Francisco Cardoso da Cunha
11-Rua nova (Rua de Cadouços)
12-Caminho de serventia das propriedades de José Pereira Cardoso e Maria Teodora da Costa (Rua da Fonte Luz)
13-Travessa dos Banhos
14- Propriedade de diversos

 
 
Como se pode observar, na planta está localizado um circo.
Acontece, que mesmo antes da urbanização da Bouça de Cadouços, cujo projecto final seria aprovado em 9 de Agosto de 1866, já antes, durante a época balnear, era montado esse divertimento circense.
Em 29/8/1869, foi lá inaugurada, naqueles terrenos, uma praça de touros, pelo alquilador Raimundo dos Santos Natividade, com uma grande enchente.
A mencionada, anteriormente, Rua do Alto da Vila tinha obtido aquele topónimo na reorganização toponímica de 1860, pois, antes, era a Rua de Cimo de Vila. Para evitar confusões com a artéria portuense, deu-se a alteração.


 
 

Topónimos da Foz do Douro alterados em 1860

 
 
Na mesma ocasião, como se observa no quadro anterior, a Rua da Boa Vista passaria a ser a Rua da Bela Vista e, a partir de 1937, passou a Rua Raúl Brandão.
 
 
 
 

Perspectiva actual da Rua de Raul Brandão – Cortesia de Carlos Romão (A Cidade Surpreendente – blogue)
 
 
 
A mudança encetada, em 1860, na reorganização da toponímia da cidade, teve lugar quando foi governador civil do Porto, José Freire de Serpa Pimentel (1814-1870), o 2º visconde de Gouveia, sendo a ele devido, também, a ordenação dos números de polícia das habitações, de tal modo que, as portas fossem ímpares, de um lado de cada rua e pares do outro lado.
A Estação de Cadouços, situada na antiga Bouça de Cadouços, na Foz do Douro, era uma estação de fim de linha do “Americano”, veículo puxado por cavalos, que foi o antecessor do carro eléctrico, que serviu também a “máquina”, um pequeno comboio a vapor.
Hoje, temos por lá, o Largo do Capitão Pinheiro Torres Meireles.

 
 
 

Estação de Cadouços, em planta de Telles Ferreira de 1892
 
 
 
Na planta anterior, é possível observar-se parte do trajecto da “máquina”, em Cadouços.
 
 
A “Máquina” nº 5, aproximando-se de Cadouços, passando num viaduto localizado, na planta anterior, com a letra A

 

Gare da Estação de Cadouços, em primeiro plano



Atrás do edifício da Estação de Cadouços seria levantado um outro que funcionou, ao longo dos anos, como restaurante e casino.
 
 
 

Restaurante de Cadouços, nos finais do séc. XIX – Ed. Le Temps Perdu

 
 
 
 

A meio da foto, a gare da Estação de Cadouços e, atrás, parcialmente visível, o edifício que foi Clube de Cadouços e Restaurante/Casino


 
 

Mesma perspectiva (NE para SW), da foto anterior, obtida a partir da Rua Monsenhor Manuel Marinho
 
 
 
 

Largo de Cadouços, c. 1905
 
 
Na foto acima, no edifício, à direita, funcionou (entre 1881 e 1910) o Clube de Cadouços, de acesso restrito, bem como um popular restaurante e casino.
Em 1925, quando a Estação de Cadouços já estava fora de serviço, para o qual tinha sido levantada, a Câmara do Porto decidiu ajardinar o espaço envolvente.
Por volta de 1930, a antiga estação terá sido demolida.
 
 
 

Projecto para ajardinamento junto da Estação de Cadouços, em 2 de Junho de 1925
 
 
 
1- Estação de Cadouços (c. 1877-c. 1925)
2- Travessa de Cadouços
3- Travessa da Estação (atravessava a Rua da Fonte de Cadouços, em viaduto)
4- Fontanário
5- Rua da Cerca