quarta-feira, 27 de setembro de 2017

(Continuação 10)


«A Quinta e Casa Burmester, sitas no nº 1055 da Rua do Campo Alegre, foram baptizadas com o apelido dos seus donos mais recentes, antes de a propriedade passar a fazer parte integrante do património imobiliário da U. Porto, em 1957. Chamava-se "Quinta do Campo Alegre" quando, em 1896, foi comprada por 2 contos de réis a Eduardo Alves da Cunha e mulher, Anna Luiza Marques d’Oliveira Cunha, pelo negociante Gustavo Adolfo Burmester. A aquisição da quinta e dos respectivos rendimentos, outrora pertencentes à sociedade comercial António Alves da Cunha & Companhia, teve lugar a 11 de Maio de 1896. A escritura de venda descreve-os da seguinte maneira:
"Campo de terra lavradia denominado "Campo Allegre" com uma casa para caseiro, poço d’agua com engenho e mais pertenças, sito na rua do Campo Alegre com uma porta d’entrada que tem o número seiscentos e vinte e um, freguezia de Massarellos, d’esta cidade, confrontando do norte com a dita rua do Campo Alegre, do poente com viella publica, denominada do Monteiro, do sul com o campo de Egydio Teixeira Duarte e do nascente com Pedro Maria da Fonseca Araújo e António Gonçalves da Silva; é de natureza de prazo, foreiro no domínio directo ao Priorado de Cedofeita, hoje massa commum da Collegiada, com o foro annual de sessenta e nove litros e quarenta centilitros de trigo, igual porção de centeio, sessenta e cinco litros, seiscentos e vinte e cinco decimililitros de milho, dezesete litros e trinta e cinco centilitros de cevada, meio carro de palha triga, quatro gallinhas e o laudemio de quarenta-um".
No ano seguinte ao daquela transacção, a Câmara Municipal do Porto autorizou o novo proprietário, Gustavo Adolfo Burmester, a construir uma casa de habitação dentro do perímetro da quinta, conforme o projecto aprovado a 22 de Fevereiro e "com tanto que o fundo da fossa seja arredondado em arco de circulo com a flecha de 1/10 do seu comprimento e todos os ângulos interiores da mesma forma na ligação das paredes com o fundo tambem arredondadas em arco de circulo de 0,25 m de raio, e ficando sujeito ao disposto nas respectivas posturas e mais deliberações municipaes. Porto, Paços do Concelho, 5 de Março de 1897. (…)".
Nessa mesma data, Gustavo Burmester assumiu, ainda, o seguinte compromisso com a edilidade portuense: a casa a construir seria em granito duro e cal hidráulica, as paredes exteriores do rés-do-chão teriam a espessura de 0,70 m, isto é, mais 10 cm do que as do primeiro pavimento e mais 15 cm do que as a edificar por cima destas. As paredes interiores teriam 0,30 m de espessura. Assim como se comprometeu a observar os restantes requisitos apresentados pela Câmara e que eram os seguintes:
"A armação bem como o travejamento será de pinho de riga, tendo a armação as dimensões de 0,10 x 0,15 para as peças principaes;  0,08 x 0,12 para as secundarias e 0,06 x 0,08 para barrotes. Nos travejamentos a secção será de 0,10 x 0,25 e a distância de eixo a eixo de 0,55. As condicções d’esgoto dentro do edifício serão de chumbo de 0,10m de diâmetro, e as exteriores até a fossa de tubos de grez de 0,20m de diâmetro. A fossa será construída de pedra, e revestida de argamassa de cimento e areia.".
Pouco tempo depois chegou à Câmara Municipal do Porto novo requerimento de Gustavo Burmester, que pretendia obter autorização para vedar a sua propriedade da Rua do Campo Alegre "tanto pelo lado d’esta rua como pelo lado Poente, por onde confronta com o caminho tortuoso que da dita rua segue para o Alto d’Arrabida". Para fazer face às despesas que a Câmara teria de suportar, Gustavo Burmester doou ao município, como contrapartida, a porção de terreno necessária para alinhar o arruamento, cuja largura seria de cinco metros, tal como constava da planta que o requerente apresentou ao mesmo tempo. A escritura de cedência do terreno foi lavrada em 14 de Agosto de 1897. Este alinhamento implicou a anuência de João Henrique Andresen, proprietário da casa vizinha do lado poente, a qual também acabaria na posse da U. Porto, na segunda metade do século XX.
Entretanto, prosseguiram as melhorias introduzidas na habitação. Na viragem do século, com a montagem de um motor a gás (sistema "OTTO, de 1,5 cavalos"). Mais tarde, com a construção de um portão na Travessa de Entre-Campos (lado poente) e com a exploração de uma instalação eléctrica destinada a iluminar a residência. Em 1922, com a assinatura de um contrato com a Companhia das Águas do Porto para fornecimento diário de 73 litros de água.
Do lado nascente, a Quinta Burmester confrontava com um prédio pertencente a Primo Monteiro Madeira, sito no número 877 da Rua do Campo Alegre. Necessitando de reparar umas construções exteriores a esse prédio, Primo Madeira enviou uma carta a Maria Henriqueta Leite Guedes Burmester, viúva de Gustavo Adolfo Burmester, em Dezembro de 1943, pedindo-lhe autorização para encostar os telhados daqueles imóveis ao muro que separava os terrenos de que ambos eram proprietários.
Em 1957, a Quinta e Casa Burmester foram entregues pelo Estado à Faculdade de Ciências, em compensação dos cortes infligidos na área pertencente ao Jardim Botânico, na sequência da construção dos acessos à Ponte da Arrábida. Alguns anos mais tarde, quando se revelaram insuficientes as instalações da Faculdade de Letras, o Jardim Botânico prescindiu de parte da propriedade em favor desta Faculdade. Luís de Pina, director da Faculdade de Letras criada em 1961, supervisionou e acompanhou de muito perto as obras de beneficiação que foi necessário levar a cabo para que o Palacete Burmester acolhesse professores e alunos».
Fonte: “sigarra.up.pt”


A Travessa de Entre-Campos, referida no texto anterior, era, à data, a Viela do Monteiro.

 

Casa Burmester, fachada Norte

Fachada Norte, outra perspectiva – Ed. “sigarra.up.pt”



Fachada Sul – Ed. “sigarra.up.pt”

2ª habitação – Ed. “sigarra.up.pt”

Portão de entrada para o jardim, pela Rua do Campo Alegre - Ed. “sigarra.up.pt”



No fim da década de 1960, pela situação vivida pela Faculdade de Letras da Universidade da UP, de exiguidade das suas instalações, alguns dos seminários dos seus cursos instalaram-se no Palacete Burmester, entretanto, já na posse da Universidade do Porto.
A partir de 1977, em novas instalações erguidas, em terrenos das traseiras do palacete e que faziam parte da primitiva quinta, que se destinavam, inicialmente, ao Instituto Botânico, cujo Jardim Botânico se situava em área contígua, na denominada Casa Andresen, se instalou a Faculdade de Letras da UP.
Assim, nessas instalações, que foram chamadas de “Complexo Pedagógico”, se concentraram, em 1977, todas as secções da Faculdade de Letras da UP, que se encontravam dispersas por vários edifícios da cidade.

 
 
Complexo Pedagógico, actual “Departamento de Ciência de Computadores da Faculdade de Ciências da UP”
 
 
 
Em 1 de Abril de 2022, foi inaugurada no Palacete Burmester, à Rua do Campo Alegre, a “Casa dos Livros”, da responsabilidade da Faculdade de Letras.
Aqui, passou a estar o acervo de Eugénio de Andrade, que se juntou a outros, nomeadamente, de Vasco Graça Moura, do poeta Albano Martins ou acervos digitais como os de Heriberto Helder e Manuel António Pina.

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