"Em 1891, o Porto dispõe já de mais de 2 500
candeeiros, instalando-se nesse ano mais 107 em toda a cidade e mais 42 de luz
intensiva entre a Batalha e os Clérigos, cabendo 40 destes candeeiros à Rua de Santo
António, Praça de D. Pedro e Rua dos Clérigos. Dez anos depois, há já mais de 3
800 candeeiros colocados, registando-se um aumento significativo do consumo
particular."
Cortesia de Ana Cardoso Matos - O Porto e a Electricidade, Museu da Electricidade, EDP Lisboa 2003
Fábrica do Gás e
Central Eléctrica do Ouro
“A primeira
referência à iluminação pública no Porto data de 1771. A Rua Nova, mais tarde
Rua dos Ingleses, foi palco da instalação dos primeiros “lampiões” da cidade.
Um requerimento, assinado pelos moradores, deu origem a um documento oficial da
autarquia que mandava que “se coloquem lampiões na dita rua, sendo a
conservação e costeio por conta dos moradores”. No início de 1772 procedeu-se à
sua instalação.
Um artigo do
«Jornal de Notícias» do início do século XX transcreveu assim o teor do
documento feito pelos moradores da época:
“A grande
utilidade que têm os moradores das cidades onde de noute estão as ruas
iluminadas, como se pratica nas melhores da Europa, é mais considerável do que
se imagina, pois, não somente dá gosto e livra de quedas e maus encontros a
quem por elas anda, mas evita os roubos tanto às pessoas como nas casas”.
Foi
particularmente na segunda metade do século XIX que se começou a
aproveitar as inovações técnicas e científicas impulsionadas pela Revolução
Industrial europeia.
Em 1851 «quando
veio ao Porto a Rainha D. Maria II» viu-se, pela primeira vez, «o gás
hydrogénio em arco triunphal armado ao cimo da rua de São João» (in O
Tripeiro, 1908), sendo a primeira experiência de iluminação a gás na
cidade.
Em 1855 o gás
chegava já à Rua das Hortas (troço inicial da Rua do Almada) à qual se seguiram
as ruas de Santo António e Clérigos. Em 1892 a cidade contava já com 2607
candeeiros espalhados por várias zonas, incluindo a Batalha. A entidade
encarregue do fornecimento de iluminação à cidade era a Companhia do Gás
da qual os moradores se queixavam que deixava as ruas em estado lastimável após
a colocação dos candeeiros. Esta argumentava com o facto de não reparar os
pavimentos porque teria de os abrir novamente para instalação do gás para
utilização dos particulares (em 1893 havia já cerca de mil e oitocentas
candidaturas de moradores).
Os cerca de três
mil candeeiros espalhados pelo centro da cidade do Porto, em 1893, por serem
novidade foram protagonistas de algumas histórias curiosas. Num artigo de «O
Comércio» desse mesmo ano, podia-se ler o seguinte aviso: «Previne-se um
sujeito que todas as noutes apaga um dos lampeões de gaz que se abstenha de
continuar com esta gracinha, se não quizer passar pelo desgosto de que seja
entregue ao domínio público o seu nome”.
Pensa-se que terá
sido em 1895, com o advento da electricidade, que se substituiu os candeeiros a
gás nas ruas portuenses, já que foi nesta data que começaram a circular os
primeiros carros eléctricos (o Porto foi a primeira cidade do país a ter estes
veículos que só terão iniciado a marcha na capital em 1901).
Texto de Marta
Almeida Carvalho, em Porto Pioneiro
Concurso para iluminação a gás no Porto – Caderno de
Encargos (Fevereiro de 1853)
"1ª O
Empresário ou Companhia de iluminação a gás é obrigado a estabelecer o aparelho
de destilação, condensadores, depuradores e gasómetros fora de barreiras, em
lugar não povoado, e só lhe será permitido o colocar dentro da cidade
gasómetros para depósito de gás, precedendo, para isso, autorização da Câmara,
e ouvindo o Delegado de Saúde.
2ª A Câmara oferece
gratuitamente para este efeito o terreno, que for demarcado da denominada Quinta
do Prado do Bispo, próximo do cemitério público, na margem direita do rio
Douro, podendo o Empresário ou Companhia utilizar-se dele durante o tempo do
seu contrato, findo o qual ficará outra vez pertencendo ao município.
3ª Outro qualquer
terreno, que nos termos do artigo 1º melhor possa convir ao Empresário ou
Companhia, será por ele obtido e pago à sua custa, precedendo aprovação da
Câmara e ouvido o Delegado de Saúde.
4ª O número dos
candeeiros a gás não será inferior ao da actual iluminação a azeite…
Seguiam-se as
restantes alíneas até à 29ª, antes de 2 condições transitórias e assinava o
Escrivão da Câmara, Domingos José
Alves de Sousa"
Fonte: “aportanobre.blogspot”
Em 3 de Outubro de
1855, o jornal “O Porto e a Carta”, na pág. 2, noticiava que desde o dia
anterior, tinha passado a existir iluminação a gás em toda a Rua das Hortas e
parte da Rua Nova do Almada.
A 5 de Dezembro de
1855, o jornal “O Porto e a Carta” noticiava que “a iluminação a gás é boa na Rua de Santa Catarina, mas há que
reduzir a distância a que se encontram os candeeiros”.
Em 1855, a fábrica
do gás estava estabelecida na Arrábida, em local que ficava longe da cidade,
para o que deve ter contribuído o baixo valor dos terrenos e factores de
segurança.
A aventada
possibilidade de ocupar terrenos da Quinta do Prado não se concretizou.
Um dos edifícios
deste conjunto, porventura o mais antigo, foi instalado ao lado do já existente
gasómetro, e teve a sua planta aprovada na Câmara em Agosto de 1856 (é o que
vemos abaixo).
Projecto da fachada
do novo edifício da Fábrica de Gás – Fonte: “aportanobre.blogspot”
“O projecto do
edifício foi entregue ao engenheiro electrotécnico parisiense Lucien Neu,
proprietário da empresa Vieillard & Touzet, tendo-lhe sido também incumbida
a direcção da obra. Atendendo à distância a que se encontrava a sede,
localizada em Lisboa, para operacionalizar algumas obras foram subcontratadas
com empresas da cidade do Porto: os trabalhos de alvenaria foram realizados por
Manuel Ferreira da Silva Janeira, mestre-de-obras da Foz do Douro, a elaboração
do plano de cobertura e a realização de toda a parte metálica da construção foi
entregue à Companhia Aliança de Massarelos e executada, sob a direcção de
Henrique Carvalho da Assunção.”
Com a devida vénia a Ana Cardoso de Matos (A Companhia
do Gás e a Sociedade Energia Eléctrica
do Porto (1889- 1920) Universidade de Évora
A História do Porto,
coordenada por Luís A. Oliveira Ramos, afirma que o gás “começa a
cobrir a cidade a partir de 1855”.
Assim, em 3 de Janeiro de 1855, é autorizada a instituição da “Companhia
Portuense de Iluminação a Gás”.
Em Abril de 1856, várias ruas da cidade recebem a iluminação a gás.
É o caso da Praça Carlos Alberto que, em 1 de Abril de 1856, passaria a
ser servida pela iluminação a gás.
“Em 1862, há 1157
candeeiros públicos, e no ano seguinte 1373”.
Em 1 de Novembro de 1869, o jornal “Comércio do Porto” noticiava que o
inspector da iluminação contava 1394 lampiões na cidade, 94 na Foz e em
Lordelo.
Em 1 de Setembro de 1889, a “Companhia de Gaz do Porto”, constituída
em 25 de Junho de 1889, toma conta da fábrica antiga.
Em 1890, eram mais
de 2500 lampiões e, em 1900, mais de 3500. Entretanto, começou o fornecimento
de gás a particulares.
Publicidade ao “Bico
Auer”, com representação no Porto na rua Rainha D. Amélia (actual Rua de
Cândido dos Reis)
No fim do século
XIX, começaria a ser usado na iluminação o “Bico de Auer”, com uma eficiência
superior, às tradicionais formas de queima do gás.
Por este novo processo,
a combustão gasosa de uma mistura de gás e oxigénio do ar levava à
incandescência, não do carbono em suspensão, mas de uma matéria sólida que
emitia mais luz que o carvão.
Aquela combustão
gasosa originava uma chama muito quente, mas sem brilho que, no entanto,
tornava incandescente uma “camisa” constituída por sais terrosos de certas
terras raras, como o óxido de tório.
Em 26 de Março de
1897, começavam a ser colocados os candeeiros de iluminação a gás, nas ruas de
Santa Catarina, Formosa e Santo Ildefonso.
Em 31 de Janeiro de
1898, começava a ser montada a canalização para a iluminação a gás na Rua da
Madeira e a 3 de Outubro daquele ano era inaugurada, com 36 candeeiros, a
iluminação da parte ajardinada da Praça Mouzinho de Albuquerque.
Entrado o século XX,
continuava a expansão da iluminação pública, a gás.
Em 29 de Outubro de
1901, é inaugurada com animadas festas populares, a iluminação a gás na Praça
Coronel Pacheco.
Iluminação a gás, na
Praça da Batalha – Postal
Iluminação a gás, na
Rua dos Ingleses (Rua do Infante), em 1893 – Gravura de T. M. Johnson
A iluminação a gás,
na Rua de Santo António, no final do século XIX
Candeeiro a gás
(mais tarde, electrificado) localizado na Sé
Mais recentemente, praticamente, em frente a Massarelos, no
chamado Cais do Cavaco, esteve uma outra empresa ligada também ao fornecimento
de gás e não só – “A Mobil”.
Vista parcial das instalações da Mobil, no Cais do Cavaco, em V. N. de Gaia –
Fonte: Biblioteca da Câmara Municipal de V. N. de Gaia
Produção e distribuição de energia eléctrica
Em 1886, foi introduzida a luz eléctrica no Porto, com uma
pequena central da Companhia Luz Eléctrica, que se situava no pátio das traseiras
do edifício do Ateneu Comercial do Porto, na Rua Passos Manuel e fornecia uma restrita zona da baixa da cidade
correspondente às ruas de Santo António, Clérigos, Praça da Liberdade e Santa
Catarina.
Depois da central eléctrica da Companhia Eléctrica ter
sido alvo de um incêndio em 1898, transitou para a Companhia do Gás do Porto que, em condições muito precárias, continuou
a assegurar, o fornecimento de electricidade a esta rede.
Tendo sido fundada
em 1907, com o fim de assumir todos os direitos e obrigações vigentes entre a
Câmara do Porto e a Companhia do Gás, no que dizia respeito à concessão da luz
eléctrica necessária à iluminação pública e ao consumo doméstico, a Sociedade de Energia Eléctrica do Porto
construiu a Central do Ouro, junto à
Fábrica do Gás.
No que diz respeito
aos transportes públicos, já em 1911, decorriam as obras da Central Termoeléctrica de Massarelos
tendo, em 1915, encerrado a antiga Central
da Arrábida, que teria uma parte dos seus equipamentos absorvidos pela
nova unidade, permitindo iniciar uma nova fase de alimentação da rede urbana de
carros eléctricos.
O edifício de
Massarelos foi sendo, ao longo dos anos, estruturalmente melhorado. Entre 1921
e 1924, a Central de Massarelos sofreu as primeiras obras de ampliação. Dando
lugar às novas caldeiras e chaminé.
“Luz elétrica na rua
de Santo António: começou ontem a ser instalada. Vai ser o rendez-vous da nossa
sociedade. Para isso, devem desaparecer os casebres demolidos do início da
rua.”
In “Jornal do Porto”, 3 Setembro de 1890, p. 2
Só, em 1908, se
construiu a Central Eléctrica do Ouro,
que foi substituindo a iluminação a gás por eléctrica.
Junto ao cais do
Ouro, encontrava-se já a Fábrica
do Gás, quando a esta se juntou a Central de Electricidade em 1908, e
que veio substituir a Central da Rua Passos Manuel,
pertencente à Sociedade de Energia Eléctrica do Porto, criada em 1907.
“A partir de 1888 a Companhia Luz Eléctrica, que possuía
uma central eléctrica na rua Passos Manuel, passou a fornecer energia eléctrica
aos particulares num perímetro compreendido entre a estrada de Bonjardim,
passando pela rua de Santo António, até a entrada da rua de Santa Catarina.
Apesar de se tratar de uma zona restrita da cidade não
deixa de ser importante o vanguardismo desta iniciativa.
Em 1898, após ser afectada por um incêndio, a central
eléctrica da Companhia Eléctrica transitou para a Companhia do Gás do Porto,
que continuou a assegurar, ainda que em condições cada vez menos satisfatórias,
o fornecimento de electricidade a esta rede.
Em 1907 foi fundada a Sociedade de Energia Eléctrica do Porto com o fim de assumir todos
os direitos e obrigações vigentes entre a Câmara do Porto e a Companhia do Gás
no que dizia respeito à concessão da luz eléctrica.
Para garantir a produção de electricidade necessária à
iluminação pública e ao consumo doméstico, esta Sociedade construiu a Central
do Ouro.
Cortesia de Ana Cardoso Matos - O Porto e a Electricidade, Museu da Electricidade, EDP Lisboa 2003
A Fábrica do Gás e a nova Central Térmica do Ouro (destinada
à produção de electricidade) eram abastecidas de carvão desembarcado no cais do
Ouro, como se observa na foto abaixo.
Aquela Central Térmica do Ouro foi equipada com quatro
caldeiras fornecidas pela casa "Biétrix", e na sala das máquinas
foram instalados três grupos geradores (dois de 750 KW e outro de 250 KW), e
posteriormente uma turbina de 1 500 KW.
“A Central Térmica do
Ouro foi construída entre Abril de 1907 e Julho de 1908, junto dos gasómetros
da Companhia Portuense de Iluminação a
Gás (CPIG), em Lordelo do Ouro, por uma empresa sua subsidiária - a Sociedade Energia Eléctrica do Porto (SEEP)
-, a fim de produzir e distribuir electricidade. Em Outubro de 1906, a Câmara
Municipal do Porto tinha autorizado a CPIG - uma empresa que veio a integrar as
Companhias Reunidas de Gás e Electricidade (CRGE), de Lisboa, por sua vez,
dependentes, a partir de 1913, do grupo franco-belga Société Financière des
Transports et d'Entreprises Industrielles (SOFINA) - a transferir a concessão
para a produção e distribuição de energia eléctrica para uma sociedade anónima
a criar, a já referida SEEP, com o objectivo de explorar a referida concessão.
O projecto arquitectónico das instalações da Central Térmica do Ouro foi da
responsabilidade de Fernand Touzet, um engenheiro especializado na construção
de edifícios industriais, particularmente na região de Lisboa, e que veio a
construir também a primeira Central Tejo, concluída nos finais de 1911. Não
obstante as dificuldades decorrentes do terreno disponível terem imposto alguns
constrangimentos, nomeadamente a colocação do edifício com uma orientação
oblíqua em relação à via pública, como apontou António Santos num recente
artigo sobre a "Arquitectura da Electricidade em Portugal", não
permitindo um "tratamento uniforme e valorizador do conjunto a partir do
único alçado susceptível de qualificar a sua arquitectura", o edifício da
Central apresenta uma harmonia de linhas e proporções que lhe conferem uma
identidade particular”.
Cortesia de José Manuel Lopes Cordeiro; Jornal “Público” de
29 de Abril de 2001
A Central Eléctrica e a Fábrica de Gás, no cais do Ouro
Central Eléctrica, anexa à Fábrica do Gás, em primeiro plano
Na foto acima, a cerca de 100 metros da Ponte da Arrábida, o
que restou das instalações da Central Eléctrica do Ouro (em primeiro plano) e
das referentes à Fábrica do Gás, tendo já sido demolidas todas as estruturas em
volta da pequena construção (central), que ainda se mantem de pé.
“De facto, com o
decorrer dos tempos, as dificuldades de abastecimento de coque, agravadas
durante a I Guerra Mundial, e a crescente incapacidade das caldeiras cuja
potência não satisfazia o crescente aumento da procura, ditaram a
municipalização da SEEP, em 17 de Maio de 1918 - tanto mais que a concessão
tinha terminado em 1917 -, dando origem aos Serviços Municipais de Gás e Electricidade. No entanto, e apesar de
ter existido um plano para a sua recuperação e ampliação, a Central do Ouro só
continuou a produzir até 1923, em virtude da autarquia ter entrado em
negociações com a União Eléctrica Portuguesa para o abastecimento de energia
eléctrica à cidade, com base na produção da central do Lindoso, o que veio a
suceder a partir de Novembro daquele ano”.
Cortesia de José Manuel Lopes Cordeiro; Jornal “Público” de
29 de Abril de 2001
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