No prédio n.º 716 da Rua de Costa Cabral, no Porto, viveu e
morreu Fernando de Castro (1888-1946) e, aí, continuou a viver a sua irmã Maria
da Luz de Araújo Castro.
Em 15 de Dezembro de 1951, através do Decreto-lei 38.560,
nº261-I Série, a Casa-Museu Fernando de Castro passa a ficar anexa ao Museu
Soares dos Reis; em 24 de Janeiro de 1952, é feita uma escritura de doação onde
Maria da Luz de Araújo Castro (irmã de Fernando de Castro) doou ao Estado dois
prédios urbanos, o 704 e o 716, na Rua de Costa Cabral, bem como todo o seu
artístico e valioso recheio.
Na revista “O Tripeiro”, V.ª Série, VII Ano, Abril 1952, pág.
268, Hugo Rocha, alguém que conheceu pessoalmente Fernando Castro, faz a sua
fotografia.
“Com os seus altos
colarinhos engomados, os seus negros cabelos encaracolados, a sua impecável
calça de fantasia, a sua vistosa flor ao peito, os seus polainitos de Verão e
de Inverno, o se chapéu de coco, a sua bengala de dandy, Fernando Castro era
uma das figuras mais características e distintas da cidade e uma das
sensibilidades e inteligências mais apuradas e fascinantes que tenho
conhecido”.
Fernando de Castro
Dois prédios com o seu recheio foram doados, então, ao
Estado, bem como as obras de arte reunidas ao longo dos anos por Fernando
Castro.
Com aquela doação, seria montada a Casa–Museu Fernando
Castro, que ficaria sob administração do Museu Soares dos Reis.
Casa-museu Fernando Castro – Cortesia de Pedro Figueiredo
Possivelmente, a ligação e a paixão pela arte teria raízes
no pai de Fernando Castro, igualmente com o seu nome completo.
Tendo vivido na freguesia da Sé, Fernando António Castro
(pai), um empreendedor, decidiu mudar-se para a zona das Antas em 1893.
Esta é a data de aprovação da casa que mandou construir com
dois pisos, na Rua de Costa Cabral, a que se sucedeu uma ampliação em 1908,
incluindo uma cozinha junto à sala de jantar no primeiro piso e a construção de
um terceiro piso para quatro quartos e duas salas.
Os caixotões dos tectos, os lambris e demais elementos
arquitectónicos da casa correspondem à época da sua construção, pelo que
Fernando António Castro (pai) teria já um gosto pela arte, que teria
transmitido ao seu filho.
Faleceria em 1918 e, após a sua morte, questões familiares
conduziram à ocultação de todos os documentos referentes à herança transmitida,
em 1918, aos seus dois filhos, Maria da Luz e Fernando de Castro, o herdeiro da
casa.
Sobre Fernando António Castro (pai) é o texto seguinte.
“A decoração interior
da Casa-Museu é dominada por uma atmosfera revivalista, onde sobressai o
trabalho da talha e domina a arte sacra, transmitindo ao espaço um certo
espírito de antiquário, em consonância com o culto dos estilos nacionais e das
antiguidades em finais do século XIX. Constitui por isso um dos raros ambientes
do romantismo tardio na cidade do Porto.
Estudos recentes
indicam que a decoração fixa da casa corresponde à época da sua construção,
entre 1893 e 1908, incluindo lambris de madeira entalhada, de fabrico moderno
ou restaurada, tetos de caixotão, espelhos, mobiliário, papéis de parede,
lustres e lanternas. Este revestimento original parece resultar de um
verdadeiro projeto de interiores, concebido com ostentação e dentro de um gosto
atualizado seguido pelo fundador da casa, Fernando António de Castro. É de
notar que este negociante da Rua das Flores provinha de um ambiente instruído,
sendo filho de um tabelião e membro da família Campos Melo, próspera nos
lanifícios da Covilhã.
Fonte: museusemonumentos.pt
Fernando de Castro (filho) um poeta e desenhador,
reconhecido caricaturista irá, ao longo da sua vida, reunir um riquíssimo
espólio de arte dos mais variados estilos e que, hoje, podemos apreciar.
Para alguns foi um coleccionador compulsivo.
A Casa Museu, propriamente dita, é um edifício oitocentista
de planta em L, de três frentes, com quatro pisos, sendo dois deles uma cave
semi-enterrada e um piso acrescentado.
Em Abril de 1952, a Casa-Museu era descrita, na revista “O
Tripeiro”, V.ª Série, VII Ano, Abril 1952, pág. 268, por Hugo Rocha, como
segue.
“À entrada, na sala
minhota, observam-se os tectos e lambris que vieram de Braga do extinto
mosteiro dos Remédios, peças de talha oriundas do convento franciscano
bracarense de Monteriol”.
Interior da Casa-Museu Fernando Castro
E continuava Hugo Rocha.
“A sala de jantar com
o tecto e os seus caixotões em talha policrómica e dourada espanhola do século
XVIII; os quadros de pintores holandeses, franceses, italianos e portugueses; a
mobília em talha de estilo Renascença bem como os seus vidros e porcelanas,
surpreendem pela riqueza.
A escada de
comunicação com o 1.º andar e a galeria D. João V, ostentam quadros de Grão
Vasco, Gaspar Dias, candeeiros faianças em estilo D. João V, tábuas das escolas
flamengas e portuguesas.
A sala de leitura
apresenta as suas estantes em estilo Renascença, quadros de Sousa Pinto e
esculturas de Soares dos Reis e presépios de Teixeira Lopes e obras de Camilo
em edições raras.
No 2.º andar
destaca-se no quarto de dormir a cama em estilo Rocaille”.
Por fim, Hugo Rocha descrevia as galerias onde eram exibidas
obras dos grandes mestres.
“Anexo ao edifício,
podem observar-se duas galerias.
A maior, com pintura e,
a mais pequena, com peças de estatuária sacra, românica e gótica em pedra de
Ançã e em madeira.
Na pinacoteca podem
observar-se obras de Josefa de Óbidos, Roquemont, Rosa Bonhheur, Daubigny,
Bastien, Lefage, Casanova, Silva Porto, Malhoa, Columbano, Carlos Reis, Sousa
Pinto, Henrique Pousão, António Carneiro, António José da Costa, Roque Gameiro,
Alves de Sá, João Vaz, Acácio Lino, José de Brito, Alberto de Sousa e outros.”
Paisagem do Porto; Tela de Artur Loureiro (1853-1932) - In Casa-Museu Fernando
Castro, Porto
Cena de peça de Molière; Tela de Giuseppe Signorini, na Sala de Baile
António Soller (Retrato, 1882) – In Casa- Museu Fernando
Castro, Porto; Pintor: Francisco José Resende
Na gravura anterior, observa-se um retrato de António
Soller, um pianista e compositor, nascido em Lisboa, em 1840, exposto na Casa
Museu Fernando Castro.
Na segunda metade do século XIX, o pianista viveu no Porto
e, em 1862, já por lá se encontrava.
Nesse ano, no Teatro Baquet, foi executado um hino, durante
uma récita de gala em honra do príncipe Humberto, irmão de D. Maria Pia,
escrito por António Soller.
Sobre aquele músico, conta-se que estando ele de visita à Exposição
de Paris de 1878 viu o fonógrafo de Edison e não acreditou.
Pediu licença para ir cantar ao bocal do fonógrafo e,
segundo as suas próprias palavras:
“cantei o Hino de
Maria da Fonte! Só depois do fonógrafo repetir o que acabava de cantar, é que
me dei por convencido da sublime e esplêndida invenção de Edison”.
António Soller - In revista “O Tripeiro”, V.ª Série, Ano VIII, Abril de 1953,
pág. 355