domingo, 22 de novembro de 2020

25.104 Centro Comercial do Porto e a Rotunda da Boavista (Actualização em 06/02/ e 20/04/2021)

O Centro Comercial do Porto partilhou com a Associação Comercial do Porto, durante algumas décadas, a representação dos comerciantes da região.
Fundado em 1887, o Centro Comercial do Porto começa por se instalar no Largo dos Lóios, mas, poucos anos depois, passará a ocupar o palacete do visconde da Trindade (Palacete Balsemão), na Praça Carlos Alberto.

 
 

Convocatória do Centro Comercial do Porto, in “Jornal do Porto” em 20 de Janeiro de 1889




Palacete Balsemão


In jornal "A Voz Pública" de 11 de Abril de 1907




Na primeira década do século XX, em 1906, muda-se para a sua nova morada, na Praça Santa Teresa (onde, décadas depois, esteve a sede da Companhia de Seguros "A Mundial"), na sequência da ocupação das suas instalações que foram arrendadas à Companhia do Gás, vinda da Cancela Velha.
O universo dos seus associados contemplava, principalmente, os pequenos comerciantes que não se sentiam bem representados pela Associação Comercial do Porto.

 
 
 

Foto obtida a partir dos "Leões" c. 1910, de prédio que albergava os Grandes Armazéns do Chiado (ostenta as bandeiras).
No edifício que se segue (mais a Norte) esteve instalado o Centro Comercial que dividia instalações com a Associação de Jornalistas e com a delegação da Cruz Vermelha e onde, mais tarde, surgiria um outro prédio onde esteve a Companhia de Seguros “A Mundial” - Ed. Photo Guedes

 
 
 
 
 
“Em 1887, tinha-se fundado o Centro Comercial do Porto que, à data da sua instalação, já contava duzentos associados e no ano seguinte mais de seiscentos. Esta nova associação de classe, se não parece ter nascido de uma confrontação directa com a velha Associação, também se nos afigura dever-se à necessidade sentida pelo pequeno comércio, da defesa dos interesses próprios, porventura,  mal  zelados  pela  associação  da  grande  burguesia. 
O Centro nasceu  de  uma «Comissão de Vigilância», integrada de vinte elementos que se organizou «nesses momentos de desespero, provocados pela anarquia dos serviços  aduaneiros».  Se  a  direcção  do  Centro  afirmava  ter  tido  muita  adesão, por outro lado, também, denunciava obstáculos e barreiras que se levantaram a impedir a aprovação da sua lei estatutária.
No entretanto, as dificuldades parecem ter sido de ordem administrativa. 
Em 1893,  trocava-se  correspondência  com  a  Associação  Comercial  do  Porto,  em  que se afirmavam os interesses comuns. De qualquer maneira, o tipo de ligações  mantidas  e  as  preocupações  imediatas  que  vieram  a  ocupar  o  Centro  Comercial,  denunciam  claramente  ser  esta  associação  de  classe  de outro estrato da burguesia mercantil.
Curioso de assinalar é o facto de ter sido no Centro Comercial que o explorador africano, Álvaro de Castelões, proferiu, a 12 de Dezembro de 1891, uma conferência em que defendeu a «alienação de todas as colónias provadamente inúteis, ideia cuja oportunidade pode ser contestada, mas que, cada vez mais, se recomenda à atenção do governo e do país, cujo patriotismo deve ser orientado numa direcção útil e honrosa, contrariamente àquela a que nos tem sujeitado um domínio colonial, absorvente e inglório». Assumir esta opinião quando ainda estavam vivos os ecos do ultimato, representa, de facto, uma abertura de espírito e, talvez, uma coragem que nem todas as classes estariam em condições de exibir.”
Cortesia de José Capela “A Burguesia Mercantil do Porto e as Colónias (1834-1900) - Edições Afrontamento, 1975”
 
 
 
Em Lisboa, o interlocutor privilegiado do Centro Comercial do Porto era a Associação de Logistas.
Em 1890, o Centro Comercial do Porto dirige-se à Câmara de Deputados, contra o convénio Luso-Britânico de 20 de Agosto de 1890, na sequência do ultimatum de Janeiro.
Com os problemas coloniais sempre muito presentes, o Centro Comercial do Porto, em reunião de direcção de 27 de Agosto de 1900, presidida por Álvaro Gomes de Sá, decide montar no Porto um “Museu Colonial e Comercial”.
Desde sempre, o Centro Comercial do Porto teve a sua atenção voltada para a problemática colonial.
Em 1891, na sua sede, Álvaro Castelões disserta sobre aquele tema.

 
 
In “A Voz Pública”, em 13 de Dezembro de 1891 (Domingo)
 
 
Após a sua fundação, o Centro Comercial do Porto sempre teve, na sua actividade, preocupações na vertente de apoio social, de que é exemplo, a sua posição na primeira linha no socorro às vítimas da grande tragédia marítima de 27 de Fevereiro de 1892 - os pescadores.
Exemplo da linha seguida, naquele âmbito, é o texto abaixo.

 
«Considerando que o estado social da classe marítima em Portugal é de tal forma atrasado que não lhe permite formar uma noção dos seus próprios direitos e interesses, dando-se assim o facto isolado e indigno da civilização de haver uma população trabalhadora e heróica que vive em absoluto abandono e alheia às garantias da lei e aos benefícios da  cooperação  e  da  previdência  associativa…»
 
 
Intervenções públicas do género da anterior conduziriam ao aparecimento do “Instituto de Protecção às Classes Trabalhadoras” que, em 27 de Fevereiro de 1893, reunido na sede do Centro Comercial do Porto, realizava a sessão inaugural da sua fundação, apresentando-se como um novo organismo assistencial fundado com objectivos filantrópicos e de defesa das leis de previdência e pretendendo pugnar pelos interesses das classes trabalhadoras, prover à assistência aos inválidos do trabalho, facilitar a aquisição de instrumentos de trabalho e velar pelo futuro das famílias, especialmente aos órfãos, viúvas e mães.
Todos os sócios eram obrigados ao pagamento duma quota mínima de 5.000rs, de uma só vez ou durante um ano, em cinco prestações.
Foi presidente do Centro Comercial do Porto no fim do século XIX, Ezequiel Vieira de Castro que teve uma intervenção pública de relevo aquando da chegada do primeiro comboio à Estação de S. Bento.
No dia 8 de Julho de 1887, a Câmara do Porto aprovou o projecto de construção de uma estação de caminho-de-ferro no coração da cidade, que deveria ser edificada no lugar onde então se erguia o convento beneditino de S. Bento da Avé-Maria.
Para se levar o comboio de Campanhã até ao centro do Porto - uma extensão de pouco mais de dois quilómetros e meio -, rasgou-se, das Fontainhas a S. Bento, um extenso túnel através do granito.
Durante a execução das obras ocorreram desastres, muitos deles mortais e também, por isso, os trabalhos estiveram interrompidos alguns anos.


Viaduto próximo do Rego do Lameiro, em 1905, da linha entre Campanhã e S. Bento


O plano, assinado pelo engenheiro Hipólito Baére, previa ainda a construção de um segundo ramal, que garantiria a ligação à Alfândega e que se destinava exclusivamente ao transporte de mercadorias. Também esta linha obrigou à abertura de vários túneis na escarpa do Douro.


Linha entre S. Bento e Campanhã e, à cota mais baixa, o Ramal da Alfândega


 
 
«Aprovado definitivamente o projecto por despacho do Governo, datado de 18 de Janeiro de 1888, as obras, a cargo da Empresa dos Caminhos-de-Ferro do Minho e Douro, arrancaram a bom ritmo. No final desse ano já estava operacional o ramal da Alfândega e, com o início da abertura de um túnel entre as Fontainhas e S. Bento, parecia que o comboio não tardaria a chegar ao centro da cidade.
No dia 7 de Novembro de 1896, a locomotiva "Miragaia", puxando várias carruagens de primeira classe e uma carruagem-salão, desembocou do recém-concluído túnel do convento de S. Bento da Avé-Maria (depois chamado de D. Carlos I), para ir terminar a sua marcha num improvisado abarracamento de madeira, que faria as vezes de estação até à construção do edifício actual, projectado por Marques da Silva.
Como as fotografias da época documentam, esta chegada do primeiro comboio a S. Bento foi saudada por uma verdadeira multidão e teve direito a bandas militares. À entrada do túnel, nas Fontainhas, lançaram-se foguetes, e ao longo da Rua da Madeira, segundo descreve a imprensa da época, as senhoras vinham às janelas agitar lenços brancos. Não era para menos. A conclusão do túnel tornara-se um verdadeiro ponto de honra para a cidade, cujas personalidades e instituições - designadamente as associações comercial e industrial, o Ateneu Comercial e o Centro Comercial do Porto, entre outras - não cessaram de fazer chegar a Lisboa requerimentos e petições nesse sentido. Intervindo na cerimónia oficial que se seguiu à chegada do comboio, o presidente do Centro Comercial do Porto, Ezequiel Vieira de Castro, elogiou justamente o papel da "opinião pública da cidade", que pressionou o Governo a terminar uma obra que esteve parada durante anos. "Os trabalhos iniciaram-se, chegou-se a um grande adiantamento, mas estacionaram por força das circunstâncias ou fatalidade das coisas", recordou Vieira de Castro, num resumo que seria aplicável a muitos outros empreendimentos da cidade, quer anteriores, quer posteriores.
Hoje pode parecer menos evidente a importância que tinha para a cidade a construção deste breve troço ferroviário. Mas, na época, Campanhã era um arrabalde do Porto, e os viajantes que ali se apeavam viam-se obrigados a recorrer às diligências para fazer o percurso até ao centro da cidade. Só tinham dois caminhos à escolha, e eram ambos maus: a estrada marginal do Douro ou a íngreme Rua do Freixo. Era também por estas vias que os comerciantes e industriais se viam obrigados a fazer transportar as suas mercadorias. Não admira, portanto, que a chegada deste primeiro comboio se tenha transformado numa espécie de arraial popular».

Cortesia de Luís Miguel Queirós, In “Jornal Público”, 8 de Julho de 2001
 
 
Linha entre S. Bento e Campanhã


 
Para além de Ezequiel Vieira de Castro, muitos outros comerciantes se destacaram trabalhando em prol do Centro Comercial do Porto.
Luís Augusto Marques de Sousa, um prestigiado comerciante do Porto, nas últimas décadas do século XIX e nas primeiras do século XX, seria um dos fundadores mais ilustres do Centro Comercial do Porto,  cujas direcções serviu, quando foram presididas por outros comerciantes afamados, como foram, Ezequiel Vieira de Castro e Bernardino Carlos de Azevedo Vareta.
Em 1913, seria mesmo eleito, por unanimidade, para Presidente da Direcção do “Centro Comercial do Porto”. A sua gestão foi tão bem sucedida, que acabou por ser reeleito sucessivamente.
O Centro Comercial do Porto estaria também, intimamente, ligado à visita, que ficou memorável, de Mouzinho de Albuquerque ao Porto, no dia 13 de Dezembro de 1897.
Tudo começou quando uma comissão delegada do Centro Comercial do Porto, constituída por António Ramos Pinto, António José Macedo e Simão José Gomes Ferreira Júnior, parte para Lisboa a fim de assistir à recepção a Mouzinho de Albuquerque.
Assim, a 16 do mesmo mês, Mouzinho aceita o convite para realizar no Centro Comercial do Porto uma conferência sobre assuntos coloniais e anuncia que ela poderá ocorrer em meados de Janeiro.
Em sequência, a 16 de Janeiro de 1898, o Porto rejubila com a chegada de Mouzinho de Albuquerque, herói de Chaimite, vencedor do império Vátua e de Gungunhana, garantindo, assim, o nosso império colonial, dizia a imprensa afecta ao regime daquela época.
A chegada aconteceu em Campanhã, momento em que subiram ao ar vários morteiros e os aplausos da multidão se fizeram escutar.

 
 
Landeau à porta da Estação de Campanhã no qual Mouzinho de Albuquerque se fez transportar
 
 
 
No percurso pela cidade, desde a estação ferroviária, a multidão apinhava-se nas bermas das ruas e Mouzinho fazia-se transportar integrado num longo cortejo de individualidades, em vistoso landeau.
Após o cortejo cruzar as ruas do Heroísmo, de S. Lázaro e Entreparedes, ao passar pela Rua de Santo António, observavam-se as varandas e janelas dos Armazéns Hermínios devidamente embandeiradas.
Após a sessão de boas-vindas ocorrida na Câmara Municipal, um outro cortejo se formou, Rua do Almada, acima, dirigindo-se para a igreja da Lapa, onde foi celebrada uma missa.

 
 
À porta da Câmara Municipal durante a homenagem a Mouzinho de Albuquerque

 
 
Recolhido após a cerimónia religiosa ao Grande Hotel do Porto, Mouzinho, nessa noite, foi homenageado na Associação Comercial do Porto, ao Palácio da Bolsa e ovacionado no Teatro Carlos Alberto, no terminus do 2º acto da revista “Tim Tim por Tim Tim”.
As iluminações na Praça D. Pedro e Praça da Batalha, nas ruas de Santo António, Clérigos, Santa Catarina e das Flores, estavam dignas da festa que se vivia.
No dia seguinte, Mouzinho presidiu na Câmara à distribuição dos prémios Camões instituídos pelo jornal “O Comércio do Porto” aos alunos do liceu que mais se destacaram, sendo, ainda, alvo de homenagens da Academia Portuense, cujas capas dos estudantes foi obrigado a pisar.
Depois, fez-se fotografar por Biel, nos estúdios do famoso fotógrafo.
Na matinée, Mouzinho assistiu a uma récita no Teatro Gil Vicente e no Teatro Carlos Alberto, assistiu à sessão solene promovida pelo Centro Comercial do Porto, o grande impulsionador da vinda da personalidade do momento, em Portugal, à cidade do Porto.

 
 
Sessão ocorrida no Teatro Carlos Alberto, em homenagem a Mouzinho de Albuquerque
 
 
 
Dirigindo-se a comitiva, então, para o Real Teatro S. João, a elite portuense presente teria a oportunidade de ouvir interpretar a Aïda, cantada soberbamente.
No terceiro dia, de volta ao Teatro Carlos Alberto, promovida pelo Centro Comercial, do qual Mouzinho era patrono, realiza-se mais uma sessão solene na qual intervêm vários oradores.
Após uma visita à Companhia Vinícola, segue-se um banquete oferecido pelo Centro Comercial, em que para lá da baixela de prata usada no mesmo, da casa de D. Sofia Rooke Lima, os discursos das individualidades foram inflamados de patriotismo.
Nova récita no Teatro Carlos Alberto, o baile da praxe no Club Portuense e, a 19 de Janeiro, chegava o último dia da visita, com a realização de uma missa campal no Campo da Regeneração (Praça da República).
Acabada a missa, o cortejo que se formou, integrando várias colectividades e personalidades da cidade, dirige-se descendo a Rua da Boavista para a Rotunda que, desde esse dia, teve descerrada uma lápide, passando a chamar-se Praça Mouzinho de Albuquerque.
À tarde, no salão do Centro Comercial do Porto, aconteceu a esperada conferência e Mouzinho passou a ser sócio honorário daquela associação.
Durante a cerimónia, Mouzinho discursou sobre temas ligados à política africana, realçando o abandono a que vinham sendo votados aqueles territórios e as respectivas populações indígenas.
À tarde, já no Grande Hotel, o Ateneu Comercial entregou-lhe o diploma de sócio de honra da colectividade.
À noite, teve lugar pelas ruas da baixa portuense uma marcha luminosa (aux flambeaux), organizada pelos bombeiros e, na qual, participaram as corporações dos Bombeiros Voluntários, quarenta cadetes da corveta Sagres, esquadrões de cavalaria 6, destacamento de Artilharia e Guarda Municipal. 
À passagem pelo hotel, a partir do qual, o homenageado assistia ao cortejo, o comandante Rodolfo de Araújo saudou Mouzinho.
Como curiosidade, diga-se que, a corveta Sagres, a 11 de Maio, iria ser rendida pela corveta Estefânia, e este seria um dos últimos actos públicos do navio escola, que costumava decorar o Cais do Bicalho.
A noite caiu com o esplendoroso banquete oferecido no Palácio da Bolsa, pela Associação Comercial do Porto.
Finda a visita, poder-se-ia concluir que ela teve o completo desdém da oposição política, e seria glorificada pela governação então vigente.
A opinião pública, à data, estava muito dividida perante a governação, mas, também, sobre a personalidade do antigo administrador colonial, que foi Mouzinho de Albuquerque. Assim, em 8 de Janeiro de 1902, Mouzinho de Albuquerque, fruto de uma depressão, em consequência de não conseguir resistir ao clima de intriga acerca do seu comportamento em África, preparou minuciosamente a sua morte, suicidando-se, a tiro de revólver, no interior de um coupé, na Estrada das Laranjeiras.
No dia 22 de 1898, o Centro Comercial protesta junto do rei, sobre a intenção do Parlamento, que se preparava para aprovar legislação para concessão de exclusivos nas colónias, no que é secundado pela Associação Comercial do Porto.
O Centro Comercial do Porto participaria no Conselho Económico Nacional, criado no governo da União Sagrada (Março de 1916 a Abril de 1917), presidido por António José de Almeida, o décimo terceiro governo da República Portuguesa que, de modo inédito, juntou os dois partidos rivais, à data: o Partido Evolucionista e o Partido Democrático.
Em 26 de Junho de 1921, sob o patrocínio da Associação Comercial, Associação Industrial, Centro Comercial e Associação dos Comerciantes, realizava-se no Palácio de Cristal a feira de artigos industriais.
O Centro comercial continuaria, ao longo dos anos, a ter um papel de relevo na vida da cidade.



Delegação do Porto da Cruz Vermelha


Em 24 de Novembro de 1909, instala-se no edifício do Centro Comercial, à Praça de Santa Teresa, a delegação do Porto da Cruz Vermelha.  
Antes, a delegação da Cruz Vermelha tinha sido fundada em 8 de Abril de 1897, trinta e dois anos depois de a instituição ter surgido, pela primeira vez, em Portugal, mais concretamente, em Lisboa.
A primeira comissão directora era constituída pelo General Adriano Cibrão e por António Baptista Alves de Lemos, Ezequiel Vieira de Castro, Augusto de Araújo e major José Augusto Maria da Silva e Sousa.
Apesar de dificuldades financeiras e logísticas, a delegação do Porto montaria um hospital para militares, em pisos alugados no Hospital de Crianças Maria Pia, na Rua da Boavista.
Assim, em pleno conflito mundial, em 6 de Julho de 1917, o Hospital de Crianças Maria Pia cede à Cruz Vermelha, por escritura lavrada no notário Domingos Curado, algumas dependências para instalação de um Posto Hospitalar para atendimento de militares feridos da 1ª Grande Guerra.
Até aqui chegar, a Cruz Vermelha para além de dividir instalações com o Centro Comercial, peregrinou por outras, pelas ruas da Fábrica e dos Mártires da Liberdade e, ainda, por duas moradas na Rua da Boavista.
No dia 10 de Julho de 1917, era nomeado como médico-chefe dos Serviços Cirúrgicos do Posto Hospitalar da Cruz Vermelha, já devidamente instalada, desde 1916, em instalações do Hospital Maria Pia, o cirurgião Professor Júlio Esteves Franchini.
Em Dezembro de 1917, chegaram os primeiros militares, mas face à epidemia de tifo que assolou a cidade, o hospital foi adaptado ao serviço antitifoso em Fevereiro de 1918.
Assim, no dia 22 de Fevereiro de 1918, O Hospital da Cruz Vermelha, à Rua da Boavista, face a uma epidemia de tifo que grassava no País, é transformado num hospital para tifosos. Na época, seria nomeado um Inspector de Saúde com poderes extraordinários para enfrentar o flagelo na cidade e o Governador Civil e o Dr. Almeida Garrett, decidem mandar adaptar o convento do Sardão, em V. N. de Gaia, para a convalescença daqueles doentes.
Como no mês seguinte, em Março, a epidemia não desse sinais de abrandamento, seria o Palácio das Carrancas, também, adaptado a hospital, pois o número de doentes já ultrapassava as doze centenas.
Por isso, o Hospital da Cruz Vermelha recebe para reforço do corpo médico, o conceituado, Dr. José Maria Braga.
Entretanto, aconteceria a primeira vaga de gripe pneumónica entre Maio e Julho de 1918, o que obrigaria à diversificação das intervenções.

 

In jornal “Diário Popular” de 5 de Abril de 1955

 
Em 4 de Abril de 1955, foi adquirido um palacete, na Rua Nossa Senhora de Fátima, para alojar a Cruz Vermelha em instalações que, ainda hoje, estão a cumprir a sua função.
A inauguração das novas instalações ocorreria em 8 de Abril de 1956.
Tratava-se de um palacete do início do século XX e que, em 1906, tinha sido vendido pela primeira vez, após a sua construção.
Em 21 de Junho de 1900, o pedido de licenciamento do prédio em causa foi solicitado à Câmara do Porto por George Phillip Shweder, obtendo o nº 155.
George Schweder foi o fundador, juntamente com Ferdinand Claus, da fábrica de sabonetes “Claus & Schweder” que, em 1906, já estava pela Rua de Serpa Pinto e, mais tarde, viria a ser a “Ach Brito”.
Em 1906, o palacete mandado construir por George Schweder é então vendido quando, em 1903, a saúde dele já dava sinais de debilidade, obrigando-o a abandonar a “Claus & Schweder”.
Até chegar à posse da Cruz Vermelha, a propriedade passaria pelas mãos de alguns outros proprietários.
Durante as décadas de 1960 e 1970, nos terrenos anexos ao referido palacete seria construído um edifício no qual passariam a funcionar os serviços de formação e outros ao nível da assistência às populações.
Uma figura ligada à delegação da Cruz Vermelha no Porto, entre várias outras que se destacaram, foi Ana Guedes Costa, a primeira enfermeira diplomada, fundadora da Liga das Mulheres Portuguesas, com relevância no apoio aos combatentes na 1ª Guerra Mundial e que, seria em 1943, durante a 2ª Guerra Mundial, vereadora na Câmara Municipal do Porto, com o pelouro da Saúde.
Foi benemérita do Hospital de crianças Maria Pia, a quem salvou da decadência com a receita da venda de alguns bens patrimoniais; esteve também na origem da criação do Instituto de Oncologia do Porto.
Por toda a sua actividade em favor da comunidade, podemos ver uma singela homenagem à sua pessoa, num busto, da autoria de Henrique Moreira, exibido no átrio da delegação da Cruz Vermelha.
Em virtude de laços familiares aos Guedes, da Casa da Costa, Ana Guedes tem uma ligação a Mancelos, Vila Meã.


 

Sede da Cruz Vermelha, na Rua Nossa Senhora de Fátima

sábado, 14 de novembro de 2020

25.103 A Cozinha Francesa na cidade do Porto

 
Com a idade de 8 anos, o francês Léon Prudhomme abandona Paris, na companhia dos seus pais, e aporta a Lisboa.
O chefe de família, Louis Eugène Prudhomme, que era concessionário da mala-posta, escolheu este meio de transporte para fazer a longa viagem, instalando-se na casa de um cunhado, em Lisboa, onde este tinha um armazém de víveres e salsicharia.
Cedo, Léon Prudhomme ficaria órfão de pai, que sucumbiria a uma febre tifóide, o que levou sua mãe, Marie Geneviève Badon, a mudar-se para a cidade do Porto, onde abriu, na Rua de Santo António, nº 186, uma pastelaria, estabelecimento como à época se apelidavam os que vendiam artigos de mercearia fina, actualmente chamados, de estabelecimentos “gourmet”.
Naquela morada, funcionaria a confeitaria da “Viúva Prudhomme” onde, mais tarde, esteve um outro estabelecimento famoso, de perfumaria e flores artificiais – “Au Printemps”- de Artur de Vasconcelos & Filhos.
Em 1877, o estabelecimento da “Viúva Prudhomme”, chamava-se “Salsicharia Francesa”, como se pode observar na publicidade inserida no “Guia do Viajante na cidade do Porto e dos seus arrabaldes” de Alberto Pimentel.


 


 
 
 
 
Projecto de alteração de fachada do prédio da chapelaria Costa Braga & Filhos e da casa “Au Printemps”, em 1919, na Rua de Santo António, 186 - 196



Na área ocupada, actualmente, pela loja com a sua montra envidraçada, esteve a primitiva “Salsicharia Franceza” – Fonte Google maps

 
 
 
Curioso e elucidativo é o comentário de Alberto Guimarães, abaixo expresso, sobre a afamada casa “Au Printemps”, da Rua de Santo António, inserto no blogue “portoarc.blogspot.com/”, do qual é administrador, Rui Cunha:
 
 
 
“Boa tarde!
Nasci nesta freguesia, mais precisamente na casa nº 12 do Passeio de S. Lázaro.
Meu pai nasceu na casa ao lado (nº 9).
Minha mãe nasceu na Rua de Santo António.
Todos os três fomos baptizados na igreja de Santo Ildefonso.
Meu avô materno era proprietário da casa "Au Printemps", fundada por sua mãe e minha bisavó, que era francesa, na Rua de Santo António, em cujos pisos superiores residia e onde nasceu minha mãe.
Seu irmão, o Tio Camilo Conseil de Vasconcelos foi, durante muitos anos, proprietário da "Tabacaria Africana".
O irmão de minha mãe foi fundador do "Mercado Filatélico", instalado no 1º andar da casa "Au Printemps".
Grande abraço tripeiro!”
Alberto Guimarães
 
 
Com Léon Prudhomme, já ao comando dos destinos do negócio, atendendo ao aumento de clientela e ao manancial de conhecimentos que foi adquirindo no âmbito da confecção do boudin (enchido típico da culinária francesa), da mortadela, do salame, do fiambre e da salsicharia em geral, aliado ao manuseamento sem problemas da cozinha francesa, foi decidido abrir, em 1877, um novo estabelecimento do género, na mesma rua, no nº 163, em frente ao prédio onde esteve, durante décadas, o "Depósito da Fábrica de Papéis Pintados" de António Cardoso da Rocha, e com o nome que “Léon Prudhomme” lhe emprestava.
A actividade comercial do empreendimento subiria a pique.
O local tornar-se-ia, na cidade, um ponto de reunião e de tertúlia, a exemplo da livraria Moré e da Farmácia Amorim, mais conhecida por “Club Rigollot”.
Entre as personalidades ligadas à “Casa Prudhomme”, contavam-se Alexandre Herculano, como fornecedor de produtos originários da sua quinta de Vale de Lobos e Camilo Castelo Branco, como consumidor, situações explicitadas no texto seguinte:

 
 
Amadeu Sales, In “O Tripeiro” nº 3, V série, Ano X
 
 

Em 26 de Junho de 1901, o jornal “A Voz Pública” (pág.3) anunciava que a “Casa Prudhomme”, na Rua de Santo António, 120-124, era o depósito da Farinha Nestlé, com uma lata a ter o preço de 460 réis.
Com o passar dos anos e com a idade a avançar, Léon Eugène Prudhomme que todos os dias acompanhado por um criado fazia o percurso, a pé, desde da sua residência na Rua Duque de Loulé, até à loja, para trocar dois dedos de conversa com os clientes, acabaria por ir entregando o negócio a um seu empregado, de seu nome, Vieira de Carvalho, com quem fez sociedade, a “L. Prudhomme & Cia”.
Vieira de Carvalho, oriundo de Braga, começaria por exercer na “Confeitaria Conceição”, na Rua de Santa Catarina, ingressando como caixeiro na “Casa Prudhomme”, em 1890.
Vieira Carvalho alcançaria a plena propriedade do estabelecimento em Novembro de 1921, após o falecimento do fundador, em Maio desse ano, quando a sociedade “L. Prudhomme & Cia” caducou.
Desde essa data e sob a designação de “Casa Prudhomme”, sucessor de “L. Prudhomme & Cia”, manter-se-ia de portas abertas até 15 de Abril de 1945.
No texto que se segue, publicado na revista “O Tripeiro”, na rubrica “Que deseja saber acerca do Porto” um leitor que conheceu a “Casa Prudhomme”, faz uma exaustiva descrição da mesma.


 
 


 
 
Como curiosidade e atinente à Rua de Santo António, em 1864, por lá existiam sete luveiros, Bernard & Romain, Fresquet, Loubière, Martel, Bérard, Vicente & Sanchez e D. Maria Martins.
A afamada Madame Bonifácia, luveira de muitos créditos ocupava, cerca de 15 anos, mais tarde, uma loja de sucesso, quase na esquina com a Rua de Santa Catarina.
Na mesma rua, exerciam a actividade as modistas, Madame Bouhard e Suère, os alfaiates, Baquet e Bouard, os chapeleiros, G. Casalini e Madame Galiano e o cabeleireiro, H. Beauvais.
Guichard Printemps ocupava-se da sua sapataria e V. Buisson da perfumaria e comercializava outros objectos de luxo.
Os dentistas Rouffe e Piriac, atendiam os clientes nos seus consultórios da rua da moda.

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

25.102 Uma farmácia da Foz do Douro que ficou célebre

 
Era comum, na 2ª metade do século XIX, os portuenses juntarem-se em cavaqueira principalmente nos botequins e cafés. Muitos deles ficaram célebres.
Algumas livrarias, como a “Moré” ou farmácias, as antigas boticas, como a do Largo do Padrão ou a “Lemos”, do Largo do Carmo (ainda existentes) foram também locais de eleição para a troca de ideias. Mas, entre estas últimas, uma outra se destacava das restantes. Foi a Farmácia Amorim, de Francisco José de Amorim, natural de Braga.
Esta personagem viveu algum tempo em França e na Ilha da Madeira e, depois, radicou-se na Foz do Douro. Abriu a farmácia em finais do século XIX, nos n.os 34-35 da Esplanada do Castelo, na Foz do Douro, tendo encerrado nas primeiras décadas do século XX.
Tinha um ajudante de apelido Pereira.
 
 
 
Entre o Hotel da Boa Vista (visível à direita) e a Rua da Cerca no nºs 34 e 35 (assinalada por um ponto preto) ficava a Farmácia Amorim – Planta de Telles Ferreira de 1892


 
Esplanada do Castelo, c. 1930. O Club Rigollot, situava-se um pouco para a direita, fora do enquadramento da foto
 
 
 
 
Ficou a farmácia, para a posteridade, mais conhecida como o Club Rigollot, tão expressiva era a sua tertúlia.
O nome, segundo alguns, ter-lhe-ia sido atribuído em homenagem à memória de um benemérito, João Paulo Rigollot, aperfeiçoador dos sinapismos outrora usados.
Porém, desde de sempre a origem da denominação era, para muitos, a de “Rigolo”, significando alegria.
De um modo ou de outro, aqui, desde o fim da tarde até por vezes noite adentro, se reunia vasto número de personalidades em amena cavaqueira de assuntos muito diversos, porém tentando evitar a conversa sobre política partidária.
Por esta sociedade intelectual, que se tornou famosa por toda a cidade, passaram vários vultos da política, das letras, das ciências, antigos ministros, governadores civis, professores, juízes, banqueiros, etc., no mais ameno convívio, em conversa tolerante e variada.
De entre as várias personalidades que compunham o grupo, destacou-se o barão de Paçô Vieira, muito referenciado em várias iniciativas da Foz desse tempo e que vivia na Rua do Passeio Alegre, numa casa que ainda hoje existe, na esquina com a rua de acesso à Igreja da Foz (lado esquerdo) e que exerceu o cargo de presidente do clube.
Em Dezembro de 1952, o brigadeiro Nunes da Ponte escreveu na revista O Tripeiro, V série, que nenhum dos sócios do Clube Rigollot pertencia "ao número dos vivos".
Rui Manuel da Costa Perdigão da Silva Fiadeiro Duarte (de Cifantes e Leão) descreve-nos, no texto seguinte, algumas das personalidades que passaram pelo clube.
 
 
 
“Por aqui se encontravam:
-Barão de Paçô Vieira, José Joaquim de Sousa Barreiros Coelho Vieira Júnior (Guimarães, 16/8/1825 - Guimarães, Casa de Paçô Vieira, 2/3/1906), formado em Direito (1851), delegado do Procurador Régio, auditor do Exército (1864), governador civil de Braga (15/2/1865), vice-presidente e posteriormente presidente do Tribunal da Relação do Porto (1894 e 1896 respectivamente), juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça (1901), deputado em várias legislaturas, pai do conde de Paçô-Vieira (1.º) e do visconde de Guilhomil. Título de 11/7/1868, por D. Luís I;
-Francisco Ramalho Ortigão (sobrinho de Ramalho Ortigão), comerciante que dirigiu a casa comercial Ramalho Ortigão & Filho, chegou a montar nos jardins da sua residência, à Rua Alto da Vila, uma fábrica de tapetes, excelente cavaleiro e amador de equipagens, foi um dos organizadores do antigo Centro Hípico do Porto, Cônsul do Panamá, a quem chamavam Rof porque, na sua mocidade, fez jornalismo assinando-se R.O.F., pai de Francisco Veiga Ramalho Ortigão, passava temporadas na Foz;
-Engenheiro Barros Araújo;
-José Diogo Arroio (Porto, Rua Formosa, 23/7/1854 - Porto, Foz, 16/11/1925), doutor em filosofia pela Universidade de Coimbra, lente da cadeira de Zoologia e de Química Inorgânica (durante 44 anos) e director interino da Academia Politécnica do Porto, professor de Química Geral e Análise Química do Instituto Comercial e Industrial do Porto, director da Faculdade de Ciências do Porto durante 7 anos, jornalista e um dos fundadores do Jornal de Notícias, político, deputado, Conselheiro de Estado e notável pianista, primeiro director do Teatro Nacional de S. João;
-Adriano Bandeira;
-João José Vaz da Gama Barata (oficial superior do Exército);
-Dr. António Brandão Pereira (nasceu em Braga);
José Alves Bonifácio (Viana do Castelo, freguesia de Castelo de Neiva, 22/1/1860 - 1943), professor do Liceu Central do Porto e da Academia Politécnica, vereador da Câmara Municipal do Porto, viveu na Rua do Gama, na Foz do Douro;
-José Maria Rodrigues de Carvalho (Braga, 2/4/1829 - Paris, 31/7/1908), juiz conselheiro, deputado em várias legislaturas, nomeado par do Reino e que presidiu à Câmara Alta;
-António Marinho Falcão de Castro;
-Domingos Correia (coronel);
-Pedro Maria Pinto Leite da Fonseca (1868-1930), caricaturista e autor do álbum de caricaturas Glórias da Foz e do Clube Rigollot, cantor amador;
Manuel Ribeiro Rodrigues Forbes;
-António Granjo (Chaves, 27/12/1881 - Lisboa, 19/10/1921), assassinado na Noite Sangrenta, advogado, político, presidente da Câmara Municipal de Chaves (de Fevereiro a Julho de 1919), fundador do Partido Republicano Liberal, ministro da justiça no governo de coligação de Domingos Pereira (entre 30 de Março a 30 de Junho de 1919 e de novo entre 15 e 21 de Janeiro de 1920), presidente do conselho de ministros (entre 19 de Julho e 20 de Novembro de 1920, num governo liberal, e de novo entre 30 de Agosto e 19 de Outubro de 1921), maçom;
-Manuel Granjo (professor do Liceu);
-Henrique Carlos de Meireles Kendall (Porto, Santo Ildefonso 11/5/1839 - Porto, Foz do Douro 15/9/1917), morador na Rua do Rosário, n.º 112 em Miragaia, comerciante da praça do Porto, jornalista, banqueiro, accionista do Banco Mercantil de Viana do Castelo (com 100 acções), presidente do conselho administrativo da Companhia das Docas e Caminhos de Ferro Peninsulares, fundador e gerente da companhia de navegação Progresso Marítimo Portuense, deputado eleito pelo Porto na legislatura de 1906, membro da comissão organizadora das festas que se realizaram no Porto em Abril de 1904, comemorando o centenário do infante D. Henrique, vogal efectivo no Tribunal do Contencioso Fiscal (junto à alfândega do Porto), membro da comissão de exame de contas da Associação Comercial do Porto em 1870, director em 1882 e presidente da Associação Comercial do Porto em 1894 e 1895 (no último ano, não exerceu o cargo até ao fim), vice-presidente da Real Companhia Hortícola, membro do conselho fiscal do Banco Comercial do Porto e da Companhia de Fiação de Sal­gueiros, tesoureiro e membro da direcção da Associação das Creches de S. Vicente de Paulo, cultor das belas-artes e amador de música muito considerado, tendo tomado parte em alguns concertos de caridade, a que nunca recusou o seu valioso auxilio, escritor e memorialista, pai de onze filhos, em cuja casa se lançaram as bases do Orpheon Portuense, tendo sido a Rua D. Carlos I - depois Rua José Falcão - por ele aberta em finais da década de 1880, um dos maiores e mais assíduos animadores deste clube Rigollot;
-Artur César Veiga de Lacerda, Director da Companhia Aliança, director do Clube da Foz;
-Vitorino Tei­xeira Laranjeira (Amarante, S. Gonçalo, 21/3/1855 - 1934), bacharel pela Faculdade de Matemática da Uni­versidade de Coimbra, engenheiro militar que supervisionou o estudo e a construção da linha férrea do Douro, na etapa do Pocinho a Barca d’Alva, fez parte do Conselho Superior da Instrução Pública, admi­nistrador da Companhia das Docas e da Companhia dos Caminhos de Ferro Peninsulares e presidente da Comissão da Cultura do Tabaco do Douro, professor da Academia Politécnica (cadeira de Construções Civis - Vias de Comunicação), do Instituto Industrial e Comercial, e da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, vice-reitor e reitor da Universidade do Porto, general graduado, escritor e poeta humorístico;
-Ernesto Teixeira de Lencastre, coronel-médico, durante muitos anos director do Hospital Militar D. Pedro V, à Boavista;
José da Cunha Lima, Capitão de Mar e Guerra, falecido Almirante, impul­sionador da construção dos courts de ténis da Foz, ainda hoje existentes;
António Pinto de Queirós Montenegro (nascido no Marco de Canaveses, Casa do Casal, 28/11/1846), morador na Foz, empreiteiro do caminho de ferro;
-Alberto Pais, coronel, conspirador no 13 de Dezembro, adido militar em Madrid e irmão de Sidónio Pais, aluno de Manuel Granjo, que o chumbou em Alemão impedindo-o assim de in­gressar no curso de Estado-Maior (em pleno Clube Rigollot, Pais foi desagravar-se, mas, como Granjo lhe respondesse desabridamente, Pais desferiu-lhe uma chapada e envolveram-se em contenda, que os de­mais sócios, e em particular Montenegro, tudo fizeram para acalmar; Granjo quis intentar uma acção ju­dicial contra Pais, mas como não conseguisse alguém que tivesse visto algo, acabou por desistir e tudo foi esquecido mais tarde);
Cândido Augusto Correia de Pinho, médico, professor da Escola Médico-Cirúrgica do Porto (1890), durante algum tempo presidente da Câmara Municipal do Porto, 2.º reitor da Universidade do Porto (1918-1919); José Nunes da Ponte (Açores, Ribeira Grande, 20/5/1848 - Porto, 5/9/1924), poeta que publicou, ainda nos tempos de estudante em Coimbra, a obra Ondulações, que Camilo refere no Cancioneiro Alegre, amigo de António de Macedo Papança (conde de Monsaraz), médico pela Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra em 1879, segundo governador civil republicano do Porto (entre 31/5/1911 e 20/9/1911), vereador e presidente da Câmara Municipal do Porto; membro do Partido Republicano Portu­guês e depois do Partido Unionista, deputado e ministro do Fomento durante o governo de Pimenta de Castro (1915), da Associação de Jornalistas e Homens de Letras do Porto, vice-provedor da Misericórdia, provedor da Ordem de S. Francisco;
-Francisco Eduardo Leite da Silva, médico conhecido como o Leite das Moças;
-Jorge Pinto da Silva (cônsul da Bélgica);
-Joaquim Ferreira da Silva, ferrenho anglófilo; Sousa Vieira (médico analista)”
 
 
Na revista “O Tripeiro”, nº 103, da 1ª Série, ano 3, de 1 de Fevereiro de 1913, alguém que assinava com o pseudónimo de “Fígaro”, em resposta a anterior artigo inserto no número antecedente, assinado por alguém que assinava como “Velho Tripeiro”, explicava que o farmacêutico Amorim não era bem de Braga, mas mais importante, explicava que o clube se chamava na realidade “Rigolo”, que reportava a divertimento.
Estávamos, assim, perante duas palavras homófonas.
A seguir se dá conta de um pequeno trecho do artigo de alguém que se identificava como “Fígaro”, e já atrás mencionado:




 
 

No mesmo número da revista “O Tripeiro”, alguém que assinava como “Um Tripeiro de Meia Edade” (sic), informava que o Club Rigollot tinha tido origem num chamado “Club Theológico”.

 
 

 
 
 
 
Aliás, no que à Foz do Douro diz respeito, nesses tempos, há conhecimento da existência de mais alguns clubes ou tertúlias, antes do final do século XIX, embora de naturezas muito diferentes.
O mais proeminente e, provavelmente, o mais lendário, chamava-se “Club Rigollot” e tinha nascido de uma tertúlia de intelectuais que se reuniam na “Farmácia Amorim”.
Teria sucedido, ao que alguns identificam, ao “Clube Theológico”.


 
A meio da foto, para a esquerda do Hotel da Boa Vista, ficava o Clube Rigollot
 
 
 
Um outro clube situava-se na Rua dos Banhos Quentes, actual Rua Coronel Raul Peres que, pelo local, é provavelmente o mesmo que Ramalho identifica como “Assembleia do Allen”, onde nasceu a primeira roleta da Foz, em 1870.
De cariz mais familiar, existiu o “Club de Cadouços”, a funcionar a partir da década de oitenta e onde se realizaram concertos famosos e, ainda, o “Club da Foz”, que apareceu na última década do Século XIX, instalado num prédio com frente para a Rua do Passeio Alegre, fazendo esquina com a Rua das Motas.
Artur Magalhães Basto, na sua obra "A Foz há 70 anos", publicada em 1939, faz também referência ao "Clube das Ondas", que reunia pela Foz.


Texto de Artur Magalhães Basto sobre o "Clube das Ondas"


Uma tertúlia que ficou célebre, local de reunião de muitos intelectuais daquele tempo, foi levada à cena no “Chalet do Carneiro”, inicialmente construído em madeira, em 1873, cujo primeiro proprietário foi António Carneiro dos Santos, daí a designação pela qual era identificado. Situava-se em pleno jardim do Passeio Alegre,
Camilo Castelo Branco, Arnaldo Gama, Ramalho Ortigão, Alberto Pimentel e outros, eram presenças assíduas no chalet. 
Quanto à importância e relevo social das personalidades que o demandavam, rivalizava com o “Club Rigollot”.
O “Chalet do Carneiro”, posteriormente rebocado, passou, já nos nossos dias, a ser conhecido por “Chalet Suisso” e ainda continua, no mesmo local, a ser fruído pelos portuenses.

 
 
Chalet Suisso, c. 1910



Clube dos Bisqueiros
 
 
Era, então, a Farmácia do Padrão um dos outros lugares também conhecidos da cidade como local de tertúlia, em cujas instalações, em 1899, foi fundado por “ferrenhos amadores de bisca lambida ou não”, o Clube dos Bisqueiros.
Tinha o seu regulamento, de que abaixo transcrevemos alguns artigos:
 
“1º. Dentro do Templo da Bisca é proibido a má-língua. Só se permite falar de vidas alheias, berrar contra o governo – seja ele qual for – e descompor os parceiros que jogarem mal. 
2º. Cada sócio é obrigado a contribuir com 200rs por mês para as despesas do expediente.
3º. Os mirones são considerados sócios honorários. Como só gozam metade, a sua entrada na sala de jogo,… obriga-os ao pagamento mensal de 100rs.
8º. Nenhum sócio é obrigado a jogar além das 10 horas da noite.
10º. Não é permitido molestar o físico das cartas. Quem o fizer dobrando-as, torcendo-as ou batendo-as violentamente na mesa pagará a multa de 20rs.
11º. Os sócios a quem for dado o gozo de desflorar um baralho de cartas, esportularão em homenagem à virgindade a quantia de 10rs por caveira. 
12º. Não são permitidas as escamações. Quem perturbar a paz e a santa harmonia do Clube, zangando-se por causa de assuntos bisqueiros, terá de beneficiar a caixa social com a quantia de 100rs, como sinal de profundo arrependimento por ter tido a ousadia de levar a desordem ao Sagrado Templo da Bisca.
13º. Como o Templo da Bisca é lugar de entretimento e não de batota, os jogos são a feijões ou Padre-Nossos.” 
 

 

Farmácia do Padrão, no Largo do Padrão