sábado, 30 de setembro de 2017

(Continuação 13)


Cronologia do aparecimento do edifício

Em 1813, numa planta de George Balck, é visível uma porção de área edificada onde viria a surgir o palacete, acreditando-se que os alicerces respectivos, tenham sido aproveitados para o levantamento do edifício actual.
Tal ficou a dever-se a José António de Castro Pereira, nascido em Bragança em 1789, Cavaleiro da Casa Real, Comendador da Ordem de Nossa Senhora da Conceição, vereador da Câmara do Porto em 1848, capitalista e negociante, que procura consolidar a sua posição social e económica, com a construção do edifício para sua habitação e da família.


Edificado (amarelo) na esquina das ruas Formosa e Santa Catarina na Planta de Balck de 1813


“Em 1842 José António Castro Pereira, solicita à Câmara Municipal do Porto (CMP), autorização para lajear uma série de casas sitas na Rua de Santa Catarina na esquina com a Rua Formosa.
Em 1843 o mesmo requerente solicitou autorização para o levantamento de uma casa com três pisos.
Em 1845 o requerente muda de ideias e diz pretender o levantamento de um prédio com quatro pisos.
Em 1849 morre José António Castro Pereira e o edifício passa para a viúva, Antónia Margarida Antunes Navarro.
Em 1866 o edifício é alugado ao Liceu Portuense por 850.000 reis, devido a problemas financeiros da família.
Em 1876 Margarida Navarro faleceu e o prédio passa para o seu filho, Júlio César de Castro Pereira, 2º visconde de Lagoaça, comendador da Ordem de Cristo e da Ordem de Nossa Senhora de Vila Viçosa, títulos que recebe do seu tio, irmão de sua mãe, António José Antunes Navarro, que tinha sido 1º visconde e conde de Lagoaça e Presidente da Câmara do Porto entre, 1860 e 1867, ano em que falece a 17 de Julho.
Entre 1876 e 1894 a propriedade é penhorada e o seu novo proprietário, Inácio Pinto da Fonseca é o responsável pela picagem da pedra de armas da família Castro Pereira que se encontra na fachada.
Em 1879 o liceu desocupa o edifício e em 22 de Fevereiro de 1894 o Estado adquire-o por permuta com Inácio da Fonseca e esposa, recebendo estes em compensação um prédio que pertencia ao Estado e, desde então, passou a albergar serviços relacionados com o Ministério das Obras Públicas.
Em 1894 o edifício é descrito como «um palacete de quatro andares, água-furtada, quintal, poço, água de bica e mais pertenças».
(…) Após o falecimento do proprietário inicial, por razões de funcionalidade e em data posterior a 1845 (mas que não é possível precisar), verificou-se o acrescento de um quinto piso e as portas do piso térreo da habitação, voltadas a Sul, para a Rua de Santa Catarina, foram parcialmente entaipadas dando lugar a janelas, sendo eliminado o acesso directo à parte posterior do edifício. Foi ainda desmontado o lanço de escadas existente na antiga habitação do lado Sul para dar lugar ao elevador e casa de banho e criadas várias divisórias e tectos falsos”.
Fontes: Ana Filipe e Patrícia Costa, 2004; Alexandrino Brochado - In, Santa Catarina “História de Uma Rua”; “O Tripeiro”, Série V, nº 3, Ano 9, 1953



Júlio César de Castro Pereira, atrás referenciado, foi segundo Visconde de Lagoaça, em verificação da segunda vida concedida a seu tio António José Antunes Navarro, irmão de sua mãe.
 A renovação do título foi por decreto de 6 de Julho de 1867.
Nasceu a 27 de Março de 1836 e casou a 20 de Junho de 1876 com D. Adelaide Henriqueta de Sousa Basto, nascida a 5 de Março de 1849, filha dos primeiros Viscondes da Trindade.






Características

O edifício tem planta rectangular, com dois pequenos corpos quadrangulares adossados nas extremidades da fachada posterior.
Cobertura em telhado de duas águas, com chaminé e claraboia a Norte.
O edifício é flanqueado a Norte por um outro de 5 pisos e a Sul pelo situado na Rua de Santa Catarina nº 250, com o qual comunica ao nível do 2º piso e através do pátio que se desenvolve ao nível do 1º piso, ou piso térreo, em cota mais baixa, com acesso através de lanços de escadas.

“O edifício é constituído pela justaposição de dois lotes estreitos, inicialmente idênticos a nível da planta, fachadas e motivos decorativos, mandados construir para habitação da mesma família.
Os vãos mais amplos do registo da fachada principal, permitem adivinhar a sua primitiva utilização para o acesso de carruagens, ao pátio interior, acesso depois cortado para remodelação interior do edifício.
Interiormente, apesar das alterações tem-se ainda a percepção de que os pisos apresentariam duas salas viradas para a fachada principal e outras duas para a fachada posterior.
As salas apresentam estuques decorativos, sendo principalmente de destacar aquele da chamada “Sala do Tesouro”, alusiva talvez, à actividade financeira de José António Castro Pereira.
Fontes: Ana Filipe e Patrícia Costa, 2004

Palacete dos Castro Pereira (em 2º plano) contíguo ao prédio da esquina em 1º plano

No prédio da esquina da foto acima, chegou em tempos (1891), a funcionar no seu rés-do-chão o Café Lusitano e, no 1º andar, uma agremiação de cariz republicano.
Seria nestes dois locais muito frequentados por Alves da Veiga, que foi idealizada a malograda revolta de 31 de Janeiro de 1891.



Palacete dos Castro Pereira - Ed. JPortojo

Pedra de Armas - Ed. Guilherme Bomfim Barreiros; Fonte: "gisaweb.cm-porto.com"


Acima observa-se a Pedra de Armas do século XIX existente no jazigo do cemitério da Lapa, idêntica à que foi picada no edifício na Rua de Santa Catarina.



Vista aérea actual do Palacete dos Castro Pereira – Fonte: Google maps

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

(Continuação 12)


O antigo Clube Inglês (Oporto British Club) fundado em 1903 localizou-se, em tempos, na freguesia de Miragaia, num palacete da Rua das Virtudes nº 11.
Sendo um exemplar típico de moradia nobre e setecentista, teve como hóspedes a Congregação de São Bernardo, uma família de comerciantes da cidade e mais tarde, o Oporto British Club.
No seu jardim, assente sobre um troço das Muralhas Fernandinas, esteve montada, durante o Cerco do Porto, uma bateria das tropas liberais, dada a sua localização privilegiada, e donde se tem um excelente panorama do rio Douro e de Vila Nova de Gaia.
A casa foi construída para recolhimento dos monges da Congregação da Ordem de São Bernardo, que por lá terão estado cerca de 80 anos.
Com a extinção das ordens religiosas, em 1834, a casa passou para a Fazenda Pública, acabando vendida a José Alexandre Ferreira Brandão, um negociante exportador de vinho do Porto para o Brasil, e que a tornou na sua residência familiar.
Entre outras intervenções, o referido comerciante mandou também fazer uma porta na muralha, tentando replicar a que teria sido a Porta das Virtudes, uma das entradas da Muralha Fernandina e que, entretanto, tinha sido destruída no séc. XVIII. Porém, a verdadeira porta denominada Porta das Virtudes, não se localizava naquele local preciso.

“Trata-se de um edifício de dois pisos, sendo o superior rasgado por janelas de sacada com gradeamento em ferro e encimadas por frontões curvos e triangulares, alternadamente. A fachada principal, que abre para o antigo jardim, possui três portas de vergas curvas. No interior, salientam-se o vestíbulo com seis arcos abatidos, apoiados em pilastras, a decoração em estuque e as pinturas dos tectos.
Está situado na Rua das Virtudes, numa típica moradia burguesa de cunho solarengo que voltada a oeste tem uma ampla vista sobre o rio Douro.
Ao lado, um terraço da casa assenta sobre uma das torres da velha muralha fernandina. Esta torre é visível das traseiras do Museu de Etnografia e das Escadas do Caminho Novo. Trata-se de uma torre com 15 metros de altura, preciosa relíquia da muralha do século XIV. O seu acesso não é livre. Para se poder ir até ao eirado da torre é necessário ter autorização.
No interior o destaque vai para a decoração dos tectos, alguns dos quais são pintados a fresco em tons suaves. Chamam a atenção, pela decoração cuidada, um tecto circular e um outro em painéis, cujos principais motivos são aves e flores estilizadas e policromadas. Actualmente, encontra-se instalada neste edifício a sede da Ordem de Malta”. 
Fonte: “patrimoniocultural.gov.pt”



Em 1923 a casa foi vendida pela proprietária nessa data, D. Adelaide Olívia de Sousa Brandão Castro Neves (após duas gerações volvidas e com os negócios em queda) e passado a ser, a partir de 1925, a sede do Oporto British Club, que até aí tinha as suas actividades no vizinho Palacete dos Leite Pereira na Rua das Taipas, e era um dos dois clubes ingleses que existiam no Porto (o outro era o Oporto Cricket and Lawn Tennis Club). Por aquela sua nova morada se manteve o Oporto British Club, até que, em 1967 se associou a ao Oporto Cricket and Lawn Tennis Club, em instalações na Rua do Campo Alegre.
A casa ficou então abandonada uns anos e, na altura do 25 de Abril, foi alvo de ocupações típicas desse período histórico, durante o qual, entre outros, a Companhia de Teatro Pé de Vento usufruiu do espaço.
Mais tarde, foi possível por intermediação da Segurança Social estabelecer um protocolo com o Dr. João Rebello de Carvalho, fundador em 1976 de uma organização de carácter social e de beneficência, os “Serviços de Assistência Organizações de Maria (SAOM)”, passando as instalações, a partir daí, a albergar aquela organização.
Entre 2011 e 2012, o edifício sofreu importantes obras de requalificação.


Antigo Clube Inglês – Ed. “commons.wikimedia.org”



Detalhe da claraboia – Ed. SAOM


Detalhe de tecto – Ed. SAOM



Porta de entrada – Ed. SAOM


Troço da Muralha Fernandina e porta no muro do antigo Clube Inglês


Como complemento diga-se que o Oporto Cricket and Lawn Tennis Club foi originalmente formado em 1855, no Candal, em Vila Nova de Gaia.
Entre os membros fundadores estão as famílias Sandeman, Reid, Tait, Cassels, Sellars, Dow, Warre e Fladgate, ainda hoje com representantes entre os membros do clube.
Hoje a sua sede é na Rua do Campo Alegre, em terrenos adquiridos em 1923, e o clube actual resultou da fusão em 1967 daquele clube, com origens no Candal, com o Oporto British Club fundado em 1903 e que andou pelas Virtudes.
Algumas parcelas do terreno inicialmente adquirido (principalmente as que apresentam frente para a Rua do Campo Alegre) acabaram por ser vendidas em 1987 para financiar a ampliação do clube e a construção de algumas instalações.


quinta-feira, 28 de setembro de 2017

(Continuação 11)

21.12 Casa do Campo Pequeno ou Palacete Pinto Leite


A propriedade sita na Rua da Maternidade, onde a Casa do Campo Pequeno foi edificada, foi adquirida por Joaquim Pinto Leite em 1854.
A construção do edifício teria durado alguns anos, pois, em 1862 há notícia de que a obra de pedreiro ainda decorreria e, por essa razão, não estaria totalmente acabada.
Joaquim Pinto Leite (Cucujães 1805; Porto, 27 Fev.1880) foi muito novo para o Brasil juntamente com os irmãos, onde esteve cerca de uma dezena de anos, entre 1820 e 1829, regressando com uma considerável fortuna. Em 1830 tinha fundado uma casa comercial no Porto e crê-se que levou a sua vida, nessa época, entre o Brasil e Portugal.
Em 1838 já estava a residir regularmente no Porto, na Rua dos Lavadouros. De facto, em 9 de Março desse ano entrou para a Irmandade da Lapa, instituição da qual chegou a ser Vice-presidente (1853).
Contudo, só em 1840, tendo 36 anos, fez o competente bilhete de residência. Nessa altura, era súbdito brasileiro e tinha, por isso, de dar conta da sua morada ao administrador do respectivo bairro, necessitando também de passaporte para circular no continente português. No referido bilhete de residência, declarou ir morar para o Largo dos Lóios nº 30.

“Não sabemos se esse ano de 1840 marcará a mudança de residência para o prédio dos Lóios que, ainda hoje, faz esquina com a Calçada dos Clérigos e onde, em 1854, Joaquim Pinto Leite morava (no número 56), possuindo no rés-do-chão o seu estabelecimento de tecidos. De facto, na época do Cerco do Porto (1833), Joaquim Pinto Leite residiu já no Largo dos Lóios, num prédio que foi isento de aboletamento precisamente pelo facto de Joaquim Pinto Leite se ter então declarado cidadão brasileiro. Joaquim Pinto Leite adquiria fazendas por grosso e vendia a retalho. Este importante negócio de tecidos na cidade do Porto era detido por Joaquim Pinto Leite, mas foi iniciado em sociedade com os irmãos António Pinto Leite, Caetano Pinto Leite e, mais tarde, também com Sebastião Pinto Leite. Desde cedo, Joaquim Pinto Leite dedicou-se também simultaneamente ao empréstimo de capital, acabando por formar uma importante casa bancária, em conjunto com o irmão José Pinto Leite, que fora residir para Londres. Assim, a casa bancária Pinto Leite & Brother (mais tarde Pinto Leite & Brothers, com a entrada de Sebastião Pinto Leite, que também se estabeleceu em Inglaterra), possuía escritório em Londres e no Porto, na esquina entre o Largo dos Lóios e a Rua dos Clérigos (n.º 91).
(…) Os irmãos Pinto Leite andaram associados, tendo sido feitas várias sociedades, conforme uns voltavam do Brasil ou se estabeleciam fora do Porto. Em 1840, a partir de 1 de Janeiro, a firma Joaquim Pinto Leite & Ca. passava a designar uma sociedade comercial entre Joaquim Pinto Leite e seu irmão Sebastião, tendo cessado a que Joaquim Pinto Leite possuía desde 8 de Agosto de 1837 com os irmãos Caetano e João. Joaquim Pinto Leite e seus irmãos investiam em quase tudo o que fosse lucrativo, como era comum na época por parte de capitalistas com espírito arejado e conhecedores dos negócios mais rentáveis no Brasil e em outros países. É o caso do negócio da fundição: a firma Pinto Leite & Irmão, que possuía filiais em Manchester e Liverpool na década de 1860, importava dali materiais para as fundições do Porto”.
Fonte: J. Francisco Ferreira Queiroz, In Revista da Faculdade de Letras Porto, 2004

Voltando a centrar o interesse no Palacete Pinto Leite, ele é já referenciado como uma das casas importantes da cidade e, por isso, assinalado no folheto distribuído aos visitantes da Exposição Internacional do Palácio de Cristal em 1865, sendo referido que era de construção bem recente.
Porém, segundo J. Francisco Ferreira Queiroz e a propósito da representação naquele folheto da casa do Campo Pequeno diz:

“A julgar pela planta do Porto de Joaquim da Costa Lima Júnior, de 1839, ao lado da casa que Joaquim Pinto Leite mandou erigir, existia já uma casa recuada e murada, com jardim pela frente (no terreno onde está hoje a Maternidade Júlio Dinis). Numa planta de 1865, assinala-se claramente o palacete de Joaquim Pinto Leite, mas no referido terreno, o que deve ser um erro de quem elaborou a planta. De qualquer modo, o ter confundido o local da nova casa apalaçada com o de uma outra anterior (da família Gubian) demonstrará talvez como a de Joaquim Pinto Leite era bem mais marcante”.


 “…há porém diversos palacetes de construção moderna, que muito aformozeam a cidade, tornando-se mais notáveis os de Antonio Bernardo Ferreira, no Largo da Trindade; do conde do Bulhão, na rua Formosa; do visconde de Pereira Machado, na rua da Alegria; e de Joaquim Pinto Leite, no Campo pequeno.”
João Antonio Peres Abreu, Roteiro do Viajante no Continente e nos Caminhos de Ferro de Portugal em 1865, Imprensa da Universidade Coimbra 1865. (pág.119); Fonte: Ricardo Figueiredo, administrador “doportoenaoso.blogspot.pt”


“Desconhece-se o autor do projecto, mas pelo estilo neopalladiano presume-se que tenha tido influências inglesas, contrário ao gosto da arquitectura portuense do século XIX, mais na influência das belas-artes francesas. Os azulejos que recobrem o edifício são originários de uma fábrica inglesa, a Minton, Hollings & Company, de Stoke-on-Trent(…).
(…) Há notícia de que, em 1866, celebrou-se no palacete o casamento entre Orísia Pinto Leite e Arsénio Pinto Leite, primos e ambos moradores no dito palacete. Não é demais sublinhar que, nesta família, o casamento entre primos foi comum. A impressa da época elogia a casa, sóbria mas elegantíssima, comparando-a a uma rica moradia no melhor bairro de Londres.
O edifício possuía quartos de banhos principescamente luxuosos e tecnicamente inovadores, contando com torneiras banhadas a ouro e sanitários em porcelana de Sèvres. No exterior, ainda existe um pavilhão ou casa de fresco, espaço de lazer, também conhecido como casa das bonecas e uma estufa de floricultura.
Actualmente, a decoração da Casa do Campo Pequeno está marcada por modificações do início do século passado, que a tornaram menos sóbria aproximando-a das casas ricas da cidade. O seu carácter singular foi-se diluindo”.
Fonte: “pt.wikipedia.org”


Palacete Pinto Leite – Ed. JPortojo, 2011


O palacete seria adquirido aos herdeiros pela Câmara Municipal do Porto (CMP) em 1966 para lá instalar o Conservatório de Música, o que veio a acontecer só em 1975 e onde funcionou até 2008.
Nas antigas cocheiras recuperadas começou a CMP, desde 1986, a instalar as reservas dos Museus Municipais que, actualmente, se encontram em processo de requalificação.

“No ano de 1951 o arquiteto Prof. Emanuel Paulo Vitorino Ribeiro e sua mulher Alice Celestina da Fonseca Azevedo Ribeiro doaram à Câmara Municipal do Porto as coleções de arte que vinham sendo recolhidas pela família Vitorino Ribeiro, ao longo de duas gerações.
As Reservas Municipais concentram num mesmo espaço a coleção Vitorino Ribeiro, que se encontrava na Casa Vitorino Ribeiro em Contumil, as coleções de mobiliário da Casa Museu Marta Ortigão Sampaio e do Museu Romântico, de pintura da Câmara Municipal do Porto e de mobiliário e pintura da Casa Oficina António Carneiro”. 
Fonte: “cm-porto.pt”

Àquele espólio citado no texto anterior, acresce o avulso proveniente de locais vários, pertencentes ao Município do Porto (Paços de Concelho, Quinta de São Roque da Lameira, Palacete dos Viscondes de Balsemão, etc.).
Por sua vez, o Conservatório de Música tinha sido fundado em 1917. Passou pelo Carregal, depois pela Casa do Campo Pequeno e seguiu depois para um espaço no antigo Liceu D. Manuel II, hoje Rodrigues de Freitas.
Devido a pressões de ordem económica a Câmara do Porto em Fevereiro de 2016, acabaria por vender o Palacete Pinto Leite por 1,643 milhões de euros a uma empresa do ex-futebolista, António Oliveira e de António Moutinho Cardoso, coleccionador de arte que prometem ali criar um "ex-líbris cultural” aberto à cidade.


Hall de entrada – Ed. JPortojo, 2011


Jardim e traseiras do palacete – Ed. JPortojo, 2011

Como outros palacetes do século XIX tinha no seu último andar uma capela.


Capela do palacete – Ed. JPortojo, 2011


Edifício que foi das antigas cavalariças – Ed. JPortojo, 2011

Vista da cidade a partir do palacete – Ed. JPortojo, 2011


Na foto acima é possível observar, sobre a esquerda, com mais destaque, a Torre dos Clérigos e à sua esquerda a torre sineira da igreja dos Carmelitas. À direita, na linha do horizonte, é possível descortinar o Monte da Virgem e a antena da RTP.


Nota de rodapé

O lançamento vertente sobre o Palacete Pinto Leite, é uma singela homenagem à memória de Jorge Portojo como administrador de “portojofotos.blogspot.pt” e, cujo perfil em auto-retrato, era:

“Reformado há meia dúzia de anos, tento agora descobrir especialmente a minha Cidade Natal, o Porto. Gosto de a fotografar, ler a sua história e dos seus monumentos, ruas e jardins.
Na net divulgo o que vou aprendendo”.

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

(Continuação 10)


«A Quinta e Casa Burmester, sitas no nº 1055 da Rua do Campo Alegre, foram baptizadas com o apelido dos seus donos mais recentes, antes de a propriedade passar a fazer parte integrante do património imobiliário da U. Porto, em 1957. Chamava-se "Quinta do Campo Alegre" quando, em 1896, foi comprada por 2 contos de réis a Eduardo Alves da Cunha e mulher, Anna Luiza Marques d’Oliveira Cunha, pelo negociante Gustavo Adolfo Burmester. A aquisição da quinta e dos respectivos rendimentos, outrora pertencentes à sociedade comercial António Alves da Cunha & Companhia, teve lugar a 11 de Maio de 1896. A escritura de venda descreve-os da seguinte maneira:
"Campo de terra lavradia denominado "Campo Allegre" com uma casa para caseiro, poço d’agua com engenho e mais pertenças, sito na rua do Campo Alegre com uma porta d’entrada que tem o número seiscentos e vinte e um, freguezia de Massarellos, d’esta cidade, confrontando do norte com a dita rua do Campo Alegre, do poente com viella publica, denominada do Monteiro, do sul com o campo de Egydio Teixeira Duarte e do nascente com Pedro Maria da Fonseca Araújo e António Gonçalves da Silva; é de natureza de prazo, foreiro no domínio directo ao Priorado de Cedofeita, hoje massa commum da Collegiada, com o foro annual de sessenta e nove litros e quarenta centilitros de trigo, igual porção de centeio, sessenta e cinco litros, seiscentos e vinte e cinco decimililitros de milho, dezesete litros e trinta e cinco centilitros de cevada, meio carro de palha triga, quatro gallinhas e o laudemio de quarenta-um".
No ano seguinte ao daquela transacção, a Câmara Municipal do Porto autorizou o novo proprietário, Gustavo Adolfo Burmester, a construir uma casa de habitação dentro do perímetro da quinta, conforme o projecto aprovado a 22 de Fevereiro e "com tanto que o fundo da fossa seja arredondado em arco de circulo com a flecha de 1/10 do seu comprimento e todos os ângulos interiores da mesma forma na ligação das paredes com o fundo tambem arredondadas em arco de circulo de 0,25 m de raio, e ficando sujeito ao disposto nas respectivas posturas e mais deliberações municipaes. Porto, Paços do Concelho, 5 de Março de 1897. (…)".
Nessa mesma data, Gustavo Burmester assumiu, ainda, o seguinte compromisso com a edilidade portuense: a casa a construir seria em granito duro e cal hidráulica, as paredes exteriores do rés-do-chão teriam a espessura de 0,70 m, isto é, mais 10 cm do que as do primeiro pavimento e mais 15 cm do que as a edificar por cima destas. As paredes interiores teriam 0,30 m de espessura. Assim como se comprometeu a observar os restantes requisitos apresentados pela Câmara e que eram os seguintes:
"A armação bem como o travejamento será de pinho de riga, tendo a armação as dimensões de 0,10 x 0,15 para as peças principaes;  0,08 x 0,12 para as secundarias e 0,06 x 0,08 para barrotes. Nos travejamentos a secção será de 0,10 x 0,25 e a distância de eixo a eixo de 0,55. As condicções d’esgoto dentro do edifício serão de chumbo de 0,10m de diâmetro, e as exteriores até a fossa de tubos de grez de 0,20m de diâmetro. A fossa será construída de pedra, e revestida de argamassa de cimento e areia.".
Pouco tempo depois chegou à Câmara Municipal do Porto novo requerimento de Gustavo Burmester, que pretendia obter autorização para vedar a sua propriedade da Rua do Campo Alegre "tanto pelo lado d’esta rua como pelo lado Poente, por onde confronta com o caminho tortuoso que da dita rua segue para o Alto d’Arrabida". Para fazer face às despesas que a Câmara teria de suportar, Gustavo Burmester doou ao município, como contrapartida, a porção de terreno necessária para alinhar o arruamento, cuja largura seria de cinco metros, tal como constava da planta que o requerente apresentou ao mesmo tempo. A escritura de cedência do terreno foi lavrada em 14 de Agosto de 1897. Este alinhamento implicou a anuência de João Henrique Andresen, proprietário da casa vizinha do lado poente, a qual também acabaria na posse da U. Porto, na segunda metade do século XX.
Entretanto, prosseguiram as melhorias introduzidas na habitação. Na viragem do século, com a montagem de um motor a gás (sistema "OTTO, de 1,5 cavalos"). Mais tarde, com a construção de um portão na Travessa de Entre-Campos (lado poente) e com a exploração de uma instalação eléctrica destinada a iluminar a residência. Em 1922, com a assinatura de um contrato com a Companhia das Águas do Porto para fornecimento diário de 73 litros de água.
Do lado nascente, a Quinta Burmester confrontava com um prédio pertencente a Primo Monteiro Madeira, sito no número 877 da Rua do Campo Alegre. Necessitando de reparar umas construções exteriores a esse prédio, Primo Madeira enviou uma carta a Maria Henriqueta Leite Guedes Burmester, viúva de Gustavo Adolfo Burmester, em Dezembro de 1943, pedindo-lhe autorização para encostar os telhados daqueles imóveis ao muro que separava os terrenos de que ambos eram proprietários.
Em 1957, a Quinta e Casa Burmester foram entregues pelo Estado à Faculdade de Ciências, em compensação dos cortes infligidos na área pertencente ao Jardim Botânico, na sequência da construção dos acessos à Ponte da Arrábida. Alguns anos mais tarde, quando se revelaram insuficientes as instalações da Faculdade de Letras, o Jardim Botânico prescindiu de parte da propriedade em favor desta Faculdade. Luís de Pina, director da Faculdade de Letras criada em 1961, supervisionou e acompanhou de muito perto as obras de beneficiação que foi necessário levar a cabo para que o Palacete Burmester acolhesse professores e alunos».
Fonte: “sigarra.up.pt”

A Viela do Monteiro referida no documento anterior é, hoje, a Travessa de Entrecampos.

 

Casa Burmester, fachada Norte

Fachada Norte, outra perspectiva – Ed. “sigarra.up.pt”



Fachada Sul – Ed. “sigarra.up.pt”

2ª habitação – Ed. “sigarra.up.pt”

Portão de entrada para o jardim, pela Rua do Campo Alegre - Ed. “sigarra.up.pt”



Em 1 de Abril de 2022, foi inaugurada no Palacete Burmester, à Rua do Campo Alegre, a “Casa dos Livros”, da responsabilidade da Faculdade de Letras.
Para aí, irá o acervo de Eugénio de Andrade, que se juntará a outros, nomeadamente, de Vasco Graça Moura, do poeta Albano Martins ou acervos digitais como os de Heriberto Helder e Manuel António Pina.

terça-feira, 26 de setembro de 2017

(Continuação 9)


“Casa Primo Madeira é a designação por que continua a ser conhecido o Círculo Universitário do Porto, espaço nobre de que a Universidade dispõe no Pólo 3 e utiliza para eventos de natureza variada. Este palacete dos finais do século XIX localiza-se no n.º 877 da Rua do Campo Alegre, freguesia de Massarelos, paredes meias com a Casa Burmester, pertença, também, da Universidade do Porto. No jardim que rodeia a Casa Primo Madeira predomina a vegetação romântica, de natureza idêntica à de outras propriedades nas imediações, como a Casa Andresen, também património da U. Porto.
O palacete, cujo primeiro proprietário foi o Conselheiro Pedro Maria da Fonseca Araújo (1862-1922), sofreu intervenções da autoria do arquitecto José Marques da Silva quando foi adquirido por Primo Monteiro Madeira, que lhe conferiu o nome pelo qual passou a ser conhecido. Na casa principal, de planta rectangular e quatro pisos, os aposentos distribuíam-se da seguinte forma: na cave, a cozinha, a lavandaria, a dispensa e arrecadações; no rés-do-chão, salas de entrada, salas de estar, de bilhar, de jantar e copa; no primeiro piso, quartos e respectivos sanitários; no segundo piso, quartos e sanitários para o pessoal.
Em 1899, a casa foi ampliada através da construção de um anexo com cavalariça e cocheira no rés-do-chão e duas residências para empregados no primeiro pavimento. No jardim, distribuíam-se uma casa de serviço e uma estufa.
Já na posse da U. Porto, a casa principal e outras edificações foram reconstruídas entre 1986 e 1988, observando um projecto do arquitecto Fernando Távora. Em 1990, este projecto foi galardoado com o Prémio João de Almada, de recuperação do património arquitectónico da cidade do Porto. O jardim romântico, de inspiração inglesa, também foi remodelado e adaptado pelo arquitecto paisagista Francisco Caldeira Cabral (1908-1992)”.
Fonte: “sigarra.up.pt”

“As obras levadas a cabo pela equipa liderada por Fernando Távora procuraram respeitar a traça original do edifício, assim como a dos equipamentos de interior. Na cave mantiveram-se a cozinha, a dispensa, a lavandaria, as arrecadações e as instalações para o pessoal. O rés-do-chão continuou a ser o piso de recepção, bem como o das refeições e do lazer. No primeiro pavimento, os quartos deram lugar a salas de reunião ou de serviços (de secretaria e direcção) e a área do segundo pavimento foi repartida entre o pessoal de serviço, o ginásio e gabinetes.
No edifício anexo de dois pisos, o andar térreo ficou reservado para salas de reunião e recepção e o superior para quartos de hóspedes da U. Porto. A maior parte das mobílias e dos candeeiros constituem peças únicas, desenhadas para o efeito. Alguns móveis foram adquiridos para equipar certas divisões e tirou-se partido da existência de desenhos e de pinturas da Escola Superior de Belas Artes do Porto e da Faculdade de Arquitectura para decorar os interiores.
A vegetação do jardim foi inventariada, seleccionaram-se as espécies a conservar - como o Cedrus atlântica (cedro do Atlas), o Liriodendron tulipifera (tulípio) e o Platanus occidentalis (plátano) - e a área de produção foi substituída por uma zona de lazer composta por relvados e por um jardim formal”.
Com a devida vénia ao Professor Artur Filipe dos Santos

Encerrado em 2013 devido a um incêndio que atingiu o telhado do edifício, o Círculo Universitário do Porto regressou à actividade em Fevereiro de 2016, agora com a designação de Clube Universitário do Porto.


Casa Primo Madeira



Casa Primo Madeira em planta de Teles Ferreira de 1892 (quadrícula 162)



O Conselheiro Pedro Maria da Fonseca Araújo a quem Primo Madeira adquiriu a propriedade, foi industrial e presidente entre 1895-1896 e 1901-1905 da Associação Comercial do Porto, proprietário em 1901 da Quinta da Brejoeira, em Monção, primitivamente chamada Quinta do Vale da Rosa, tendo sido, ainda, Presidente da Câmara Municipal do Porto, Governador Civil do distrito e também deputado às Cortes e Par do reino.
De acordo com as informações disponíveis, e a crer nas referências de Dora Wordsworth, aquando da sua passagem por Portugal em 1845, a construção deste imóvel ter-se-ia iniciado em data próxima de 1806, devendo-se a iniciativa da sua edificação a Luís Pereira Velho de Moscoso. 
Em estilo neo-clássico e planta em L, já que, Luís Pereira Velho de Moscoso não sendo um nobre não lhe era possível construir o palácio com quatro torres e planta quadrangular.

 
 
“Fizemos uma agradável e verdejante viagem a cavalo, apesar do calor, até à magnífica mansão da Berjoeira (sic), sede da família de P____de M___. Foi começada há cerca de 40 anos; e, de acordo com o projecto, deveria ser um edifício quadrangular com 180 pés de extensão para cada um dos quatro lados; mas somente metade do foi terminado. A casa contém grandes conjuntos de alojamentos, com tectos e painéis mal pintados. Num dos salões há retratos de família, em toda a fealdade de caricaturas de uma rigidez esborratada.
Os quadros da casa, de todos os géneros, são espécimes deploráveis de arte.
Os jardins são muito bonitos e bem arranjados; alamedas frescas, canteiros de flores cobertos de parreiras, fontes, sacadas com arbustos, passeios de gravilha, caramanchões cobertos de telhas azuis com vários padrões estão entre os ornamentos destes jardins.
A casa ergue-se, talvez, no centro dos terrenos; pois dela não se desfrutam panoramas de monta, e nem um vislumbre de água corrente.
O território envolvente é, contudo, rico e florestado; e as montanhas remotas fazem um bonito cenário em todas as partes desta zona”.
Dorothy Wordsworth – “Diário de uma viagem a Portugal e ao Sul de Espanha”

 
 
A construção do palácio, que demorou 28 anos a ser erguido, foi autorizada por D. João VI que, porém, nunca o chegou a visitar, e terá sido entregue ao Mestre Domingos Pereira, natural da freguesia de Sopo, Vila Nova de Cerveira, e as pinturas dos salões entregues ao Mestre Clemente, de Valença, e ao seu colaborador Julian Martinez.
Foi Simão Pereira Velho de Moscoso, personagem dada a serões festivos, quem terminou a obra de seu pai.
O grande poder económico da família Velho de Moscoso decorria da sua ligação à família Caldas que tinha adquirido a sua imensa riqueza no Brasil.
Simão Moscoso faleceu em 1881, sem descendência. O Palácio foi herdado pelas famílias Caldas e Palmeirim de Lisboa, tendo sido colocado á venda, em hasta pública, 20 anos depois, sendo então, adquirido pelo Conselheiro Pedro Maria da Fonseca Araújo, que realizou algumas benfeitorias como sejam a construção de um teatro e um jardim de Inverno, e mandado colocar painéis de azulejo, da autoria de Jorge Pinto, no átrio e escadaria, entre algumas outras.
Foi também nesta época que a quinta foi toda murada e que o portão principal construído.
Em 23 de Junho de 1910, foi o palácio classificado como Monumento Nacional.
Em 1937, o palácio foi vendido ao comendador Francisco de Oliveira Paes, que o ofereceu à sua filha Maria Hermínia Silva d’Oliveira Paes como prenda do 18º aniversário.
Decorrente de dificuldades económicas, a família Paes vende a propriedade a Feliciano do Anjos Pereira, companheiro de Hermínia Paes, que construiu uma moderna adega e, em 1977, lançou no mercado, com grande sucesso, uma marca própria, o vinho Alvarinho "Palácio da Brejoeira".
Após o falecimento de Feliciano dos Anjos Pereira, a propriedade passou para Maria Hermínia Silva d'Oliveira Paes, em partes iguais, com os herdeiros de seu companheiro Feliciano.
Maria Hermínia d’Oliveira Paes, falecida em 2015, com 97 anos, sempre esteve, até aí, à frente dos destinos da quinta.
Em 2021, a propriedade é posta à venda por 25 milhões de euros, sendo Emílio Sousa Magalhães o accionista principal da sociedade, agora proprietária, e que inclui apenas mais um segundo sócio. 

 
 

Palácio da Brejoeira

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

(Continuação 8)




O Palácio do Conde do Bolhão, imóvel classificado pelo IPPAR, é considerado um dos edifícios mais notáveis da arquitectura civil do Porto oitocentista e fica na Rua Formosa, próximo do mercado do Bolhão.
Mandado construir em 1844 por António de Sousa Guimarães, casado em 1835 com Francisca Fausta do Vale Pereira Cabral (1808-1888), um dos comerciantes mais ricos do país, em 1876, já estava nas mãos de José Pereira Loureiro, visconde de Fragosela, credor daquele.
O palácio expressava o vigor político e financeiro da orgulhosa burguesia portuense do séc. XIX, sendo a sua decoração de estuques, pintura e talha, assinada pelos artistas mais relevantes da época. No entanto, o palácio deve ainda a sua reputação à faustosa vida social que o Conde do Bolhão promovia e que Camilo Castelo Branco, seu protegido, descreveu detalhadamente.
No Palácio do Conde do Bolhão realizaram-se algumas das festas mais animadas da cidade, no século XIX, com Camilo Castelo Branco como assíduo partici­pante.
No seu último piso, era dotado de uma capela.
Durante toda a tarde do dia 3 de Maio de 1852, uma 2ª Feira, o barão (14 de Agosto de 1851) e baronesa do Bolhão iriam ser os anfitriões, no seu palacete, da rainha D. Maria II e da restante comitiva real, que se encontravam de visita à cidade do Porto.
Este ano seria de desavenças conjugais.
A baronesa Francisca Fausta sai de casa acusando o barão de maus tratos.
O caso apaixona a opinião pública, originado um exército de partidários.
Camilo Castelo Branco que, dois anos antes tinha feito o elogio público de António Alves de Sousa Guimarães, dado como apoiante de Saldanha, numa série de artigos publicados em “O Nacional” faz a defesa do barão, tentando provar serem as acusações, falsas e motivadas pela rivalidade política do igualmente rico e poderoso cunhado, Constantino António do Vale Pereira Cabral, firme apoiante de Costa Cabral.


«A edificação do seu palácio - considerado uma das mais luxuosas residências da cidade, com um grande quintal e jardim, que alcançava a Rua de Fernandes Tomás, onde o seu proprietário também possuía algumas casas - custou mais de 70 contos de reis, uma quantia apreciável para a época. O título de Barão do Bolhão foi-lhe concedido em 1851 por D. Maria II, a qual, no ano seguinte, juntamente com a respectiva comitiva, se hospedou no palácio, por ocasião de uma visita ao Norte do país. A hospitalidade então prestada à real figura terá constituído o motivo pelo qual veio a ser recompensado com o título de conde do Bolhão, por decreto de 1855, assinado já por D. Fernando - em virtude de a rainha ter morrido em 1853, apenas com 34 anos, durante o parto do seu décimo primeiro filho, regente na menoridade do futuro D. Pedro V. Ao mesmo tempo que conquistava a sua nobilitação, Sousa Guimarães perdia no terreno familiar. Tendo casado em 1835 com Francisca Fausta do Vale Pereira Cabral, irmã de um grande capitalista e negociante do Porto, vê o seu casamento desfeito em 1852, quando aquela abandona o lar, acusando o marido de tirania conjugal e maus tratos físicos. A "questão conjugal do barão do Bolhão", denominação pela qual ficou conhecido este escândalo, dividiu a sociedade portuense da época tendo o barão, no entanto, conhecido a solidariedade de algumas figuras célebres, como Camilo Castelo Branco, seu amigo pessoal. O conhecido "gazetilheiro" saiu em defesa de Sousa Guimarães, com a publicação no "Nacional" de um extenso artigo, intitulado  "Revelações", o qual lhe acarretou a fúria dos sobrinhos da baronesa, os irmãos Sousa Guedes, traduzida numa agressão ao romancista, à porta da sua residência na rua de Santo António.  
(...) Após a separação da mulher, as festas desapareceram do palácio do magnata, o que levou Camilo, em 1857, a lamentar-se nas páginas do "Nacional", declarando que, "depois que se fecharam os faustosos salões do Sr. conde do Bolhão, esmoreceu aquele ânimo largo dos anfitriões que engrandeciam a terra. Quem conheceu, há dez anos, o Porto, pasma dos sintomas de decadência em que hoje está". É, aliás, Camilo Castelo Branco quem, num artigo publicado em 1851 no "Jornal do Povo", nos descreve, do seguinte modo, a faustosidade oriental do palácio do conde do Bolhão: "Para os que a observam de longe, a fachada do edifício é pelas proporções grandiosas e formas de capricho uma dessas criações de Sufflot, no reinado de Luís XV, em que a arquitectura, depurada da insipidez italiana, ostenta um carácter entre o severo e o risonho - entre a face de um templo grego e o frontispício gracioso de um castelo na França de Francisco I". E, prossegue o romancista, numa elogiosa referência ao co-proprietário da vizinha fundição do Bolhão, que nessa época se encontrava envolvido na luta pela legalização da Associação Industrial Portuense: "Sobre os cinco arcos que constituem as cinco entradas, ergue-se o primeiro andar de cinco janelas rasgadas, terminando em ogivas com os seus parapeitos de gradaria dourada, é de si tão perfeita obra, que faz gosto admirar ali até que progresso as nossas fábricas podem ser alteadas, quando as administrações forem presididas por homens de talento artístico como o Sr. José Vitorino Damásio". Passando à discrição dos interiores do palácio, Camilo detém-se na sala de visitas - "Um belo sonho com palácios de fadas; um dourado quiosque para sultanas na hora da sesta" -, salientando que "o Sr. Resende, distinto pintor deste país malfadado para o mérito, concebeu e executou na tela que fecha o fogão desta sala, um grupo de aldeões, que em torno da fogueira, parecem conversar em santa paz nos trabalhos rústicos do dia seguinte. [...] A sala de baile é adornada por móveis que reúnem riqueza, simplicidade e delicadeza no gosto. Antes dos emblemas de dança e música, que portentosamente decoram os excelentes estuques, é muito para captar o belo fantástico que o Sr. João Baptista Ribeiro personalizou em alegorias adaptadas ao uso daquele recinto". Referindo-se à capela do palácio, Camilo destaca "os quatro velhos quadros de muito valor", embora considere que, contrariamente à opinião do seu amigo Sousa Guimarães, que atribui um deles a Grão Vasco, "ser talvez muito duvidoso julgá-lo tal, mas por isso, não é menos incontestável o seu grande valor". Quanto ao quintal, Camilo estima que a "estufa de ferro é a primeira deste país", salientando que o "asseio nas menores coisas do serviço doméstico, como cisternas e capoeiras, é mais parte a quinhoar da ideia luminosa que transluz no todo". No que respeita à história do conde do Bolhão, desgraçadamente - para além do abandono da mulher e de ter de encerrar o salão de festas do seu palácio - ver-se-á também a contas com a justiça. Em 1860 foi acusado de traficar moeda falsa para o Brasil, processo do qual veio a ser despronunciado, não obstante o escândalo permanecer bem vivo na opinião pública da cidade durante anos. Apesar de ilibado, o conde do Bolhão nunca mais conheceu os tempos faustosos que o rodearam no passado. Algum tempo depois a falência bateu-lhe à porta, obrigando-o a ceder o palácio - então avaliado em 27 contos de reis -, incluindo o jardim, quintal e os prédios da rua Fernandes Tomás, ao seu principal credor, José Pereira Loureiro, visconde de Fragosela, que em 1876 já era o seu proprietário.»
Com a devida vénia a José Manuel Lopes Cordeiro, In Jornal Público, 04/04/1999




Júlia, filha de António Alves de Sousa Guimarães; Pintura no tecto do Palácio do Bolhão - Fotografia de Luís Ferreira Alves

 
 
O Palácio que, à época, seria conhecido como Palacete de Mercúrio, por ter na sua platibanda uma estátua daquele deus Romano, teria sido inaugurado com um grandioso baile oferecido a 800 convidados, dos quais 250 eram senhoras, no dia 12 de Fevereiro de 1851, celebrando também um aniversário do futuro barão.


 

A estátua do Deus Mercúrio na platibanda do Palácio do Bolhão

 
 
Deste dia, nos deu conta o cronista José de Sousa Bandeira (1789-1861), no jornal “Periódico dos Pobres” de 18 de Fevereiro.
Camilo Castelo Branco também escreveria sobre o tema numa crónica do periódico político “O Portugal” que tinha vindo para substitui um outro do mesmo cariz – “A Pátria”.
“O Portugal” dizia ser um periódico miguelista, católico e anticabralista.

 
“Notícias Diversas – ‘Um baile famoso’ – O baile dado pelo sr. António Alves de Sousa Guimarães, em a noite de quarta feira, continua ainda, e continuará por muito tempo a ser o assunto geral de todas as conversações: é que a impressão que deixou aquela noite de encantos não é das que morre e desfalece à luz do dia seguinte.
Ninguém houve talvez ainda, que se esmerasse com tão diligente e infatigável cuidado em regalar todos os seus convidados, e que lograsse a boa fortuna de o conseguir tão completamente.
De toda a parte brotavam prazeres tão variados a embriagar os sentidos, que pensamento que ali entrasse, não tornava a sair.
O sr. António Alves até conseguiu que o delicado gosto da elegância chegasse onde não podiam chegar os seus cuidados: foi tão mimoso o ramalhete, que reuniu, de ‘formosas’ e ‘elegantes’, que nos seus olhos e primores deixaram muitos, por gosto, perder a liberdade.
O que ali passou e se sentiu não o podemos nem sabemos contar:
“Melhor é experimentá-lo que julgá-lo,
Mas julgue-o quem não pôde experimentá-lo.””
In “O Portugal”



Uma festa que, disseram, teve início pelas 8 e 30 da noite, quando a banda de música anunciou a entrada no portal das primeiras senhoras e terminou às oito horas da manhã, quando os músicos declararam não poderem mais.
Em 1890, Emílio Biel (1838-1915), fotógrafo da Casa Real e um dos grandes pioneiros da fotografia portuguesa, comprou o edifício e instalou ali o seu estúdio.
Foi nesta casa que Biel morreu, em 1915, amargurado por ter sido atacado no início da I Guerra por ser alemão.
O palácio foi depois arrendado por Raul de Caldevilla, pioneiro da publicidade e fundador da Invicta Filmes, que ali instalou a sua empresa publicitária, antes de ser adquirido pelos proprietários da Litografia do Bolhão, que ali funcionou durante largas décadas até ao início dos anos 90 do século passado, tendo sido, para o efeito, construído um anexo de dimensões consideráveis cobrindo o antigo jardim.
A Câmara do Porto acabaria por comprar o edifício em 2001, cedendo-o, por 50 anos, à ACE (Academia Contemporânea do Espectáculo) /Teatro do Bolhão, visando a sua recuperação e reconversão em Teatro do Bolhão, edifício sede da escola e companhia.
As obras da 1ª fase de adaptação do palácio, sob o comando do arquitecto José Gigante, decorreram entre 2005 e 2009 com o apoio da DREN, CMP, CCDR-Norte e com o apoio do Ministério da Cultura, concluindo-se a 2ª fase em 2014 e tendo a inauguração ocorrido em Março de 2015.




Interior do Palácio do Bolhão – Ed. Jornal Público

Quarto do Palácio do Bolhão – Fonte: “ovoodocorvo.blogspot.pt”


Palácio do Conde do Bolhão encimado na platibanda por estátua representando Mercúrio