sexta-feira, 28 de março de 2025

25.271 O Sidonismo e a cidade do Porto

 
Sidónio Bernardino Cardoso de Silva Pais (Caminha, 1 de Maio de 1872 – Lisboa, 14 de Dezembro de 1918), casou com 23 anos com uma mulher mais velha que ele, em 1895, com a qual teve cinco filhos e, naquele ano, matriculou-se para retomar o curso de Matemática na Universidade de Coimbra, que interrompera, anos antes, para frequentar a Escola do Exército.
Em 1898, sai doutor em Matemática e, em Outubro de 1910, chega a vice-reitor da Universidade de Coimbra.
Vai militar no Partido Unionista. Em 1910, ainda é Presidente da Câmara de Coimbra e no 1.º governo da República, em 1911, vai ser ministro do Fomento, no governo de João Chagas e, depois, abraça a pasta das Finanças, no governo de Augusto de Vasconcelos Correia.
Foi, depois, representante diplomático de Portugal em Berlim, desde 17 de Agosto de 1912, retornando a Portugal após termos sido envolvidos na 1.ª Guerra Mundial.
O mês de Dezembro de 1917 vai ser recheado de notícias relacionadas com uma insurreição armada acontecida na capital.
Entre os dias 5 e 8 de Dezembro de 1917, Sidónio Pais veste a farda de militar e ocupa a Praça do Marquês do Pombal em Lisboa. O papel do povo é determinante no desfecho da contenda.
Na madrugada do dia 8 de Dezembro fora exonerado o governo liderado por Afonso Costa, transferindo-se o poder para a Junta Revolucionária presidida por Sidónio Pais.
Bernardino Machado é destituído do cargo de Presidente da República e vai acabar exilado.
No dia seguinte à tomada de poder por Sidónio Pais e do derrube do governo de Afonso Costa, os portuenses começam a ter uma ideia mais concreta do que teria acontecido pela capital.
Eram tempos difíceis, em que os portugueses sentiam os efeitos do conflito mundial 1914-1918 e os portuenses sofriam, ainda, os de um tifo exantemático, que se estenderia pelo ano seguinte de 1918.
Acresce que, após a implantação da República, eram muitas as desavenças entre os republicanos entrincheirados em diversas facções.
No Porto, em 9 de Dezembro, na sequência do golpe de Estado, começam a sentir-se os ventos dos novos tempos. Assim, são detidos e levados para bordo de um barco ancorado em Leixões, Afonso Costa, que se encontrava de visita pelo Porto e hospedado no Grande Hotel do Porto, Augusto Soares, Rómulo de Oliveira, Caldeira Scévola, António Martins, Cristiano Carvalho e Domingos Tomé.
O Café Chaves, ao Laranjal, é encerrado.
 
 
 
Na esquina (nos dias hoje será o local, sensivelmente, da implantação da estátua da “Menina da Avenida”) do prédio esteve, desde 1900 até 1918, o Café Chaves, no Laranjal, poucos meses antes de ser transferido para a Cordoaria

 
 
O Café Chaves, em 15 de Maio de 1918, iria abrir portas no "chalet" da Cordoaria.
 
 
 

À esquerda, o Chalet da Cordoaria para onde se transferiu o Café Chaves

 
 
Alberto Midões, António Barbosa e Pedro Mourão serão detidos no Clube Português, à Rua Formosa, no dia 10 de Dezembro.
D. António Barroso, que se encontrava no exílio, é autorizado a regressar à sua Diocese e, no dia 20 de Dezembro, fá-lo viajando incógnito, recolhendo ao Paço de Sacais, no Bonfim, por estar ocupado com os serviços camarários o Paço Episcopal, à Sé.
As primeiras medidas de Sidónio Pais foram alterar “Lei de Separação das Igrejas e do Estado”, suscitando de imediato a reacção dos republicanos históricos e da Maçonaria, mas colhendo o apoio generalizado dos católicos, dos republicanos moderados e da população rural, então a vasta maioria dos portugueses.


 
 

Início da demolição da Câmara do Porto, em 1916, para abertura da Avenida dos Aliados
 
 
 
 

Paço de Sacais, na Rua António Granjo, onde em 1918 iria falecer D. António Barroso


 
É suspenso o decreto sobre o Ensino Secundário, que vinha provocando grande agitação nos meios estudantis e, em sequência, termina a greve dos estudantes liceais do Porto.
No Porto, Belchior de Figueiredo vai desempenhar a função de chefe do Comité Revolucionário; o Governador Civil, Dr. Nunes da Ponte dá posse, no dia 16 de Dezembro, ao novo Comissário Geral da Polícia, capitão José de Melo Carvalho e ao novo Inspector da Polícia, Alfredo Carlos Dias da Costa.
No dia 30 de Dezembro, são encarcerados os políticos Hamilton Carramão, Carlos Lopes do Vale, Francisco António da Gama e, ainda, António Ferreira Seixas Júnior, que era o director dos jornais “A Montanha” e a “Lanterna”.
Chegado o novo ano de 1918, a 12 de Janeiro, Sidónio Pais visita o Porto, hospeda-se no Grande Hotel do Porto e, na tarde do dia seguinte (chovia a cântaros), vai à Bolsa, presidir à cerimónia de devolução do edifício à Associação Comercial, na pessoa do seu presidente António Alves Cálem Júnior.
 
 
 

Fachada do Grande Hotel do Porto, à data, da hospedagem de Sidónio Pais e onde, no mês anterior, tinha sido preso Afonso Costa. Em 1918, o hotel receberia obras e a fachada foi um pouco alterada

 
 
 
No dia 15 de Janeiro, Sidónio Pais assiste a um baile em sua honra no hotel em que estava hospedado e, no dia seguinte, visita a Universidade, o Hospital Militar e outras instituições e assiste, ainda, na gare da estação de S. Bento, à partida de um contingente de Artilharia 6, que partia para Moçambique.
Em 11 de Março, de 1918, ressurge nas bancas “A Voz Pública”, que se tinha publicado, no Porto, entre 1891 e 1909.
Nesta ocasião, diz ser um Diário Republicano Conservador. Na verdade é um defensor do novo regime.
 
 
 

Cabeçalho do jornal “A Voz Pública” de 30 de Abril de 1918
 
 
 
Em 12 Março de 1918, na sequência de ideia que vinha germinando desde o golpe de Estado de abrir no Porto a filial do Colégio Militar, é anunciado que foi escolhido para o efeito o Convento do Sardão, em Vila Nova de Gaia.




Convento do Sardão
 
 
 
 
Em 18 de Abril de 1918, a capela da Rua de Gondarém, que tinha sido transladada pedra por pedra desde o seu primitivo local de instalação, junto à igreja de S. Francisco, em S. Nicolau, pertencente à confraria dos ourives da prata e que tinha sido encerrada, é devolvida ao culto, por decisão do governo de então, em decreto assinado por Sidónio Pais.
 
 
 

Capela da Rua de Gondarém, em 1907
 
 
 
Em 28 de Abril de 1918, Sidónio Pais foi eleito por sufrágio directo dos cidadãos eleitores, obtendo 470 831. Foi proclamado Presidente da República, a 9 de Maio, do mesmo ano, sem sequer fazer consulta ao Congresso e passando a gozar de uma legitimidade democrática directa.
Estava legitimada pelo voto a República Nova.
Para a expressiva votação, Sidónio Pais contou muito com a sua popularidade junto dos católicos, ainda que fosse ateu, mas também assistia, frequentemente, à celebração de missas.
O contexto religioso na data da ida às urnas, para além da religiosidade crónica dos portugueses, experimentava outras vivências.
Um ano antes, numa charneca da aldeia de Aljustrel, na serra de Aire, três crianças analfabetas (Lúcia Santos, de 10 anos, Francisco Marto, de 9 anos e Jacinta Marto, de 7 anos) disseram ter vivido uma experiência mística, quando uma “senhora de luz” lhes falou de cima de uma azinheira e, cerca de seis meses antes, uma multidão presente no local da visão narrada, assistiram à “dança do sol”, o que foi entendido como um milagre.
Em Maio de 1918, Sidónio Pais está de volta ao Porto.
No dia 17, chega ao Porto e visita a Ilha dos Galegos, ao Monte Pedral, dando ordens para arrasar com aquelas autênticas pocilgas que não eram para alojar seres humanos.
Na realidade, passada uma semana, no dia 24, o Dr. Almeida Garrett que tinha tomado posse, quatro dias antes, do cargo de representante do Governo para o combate à epidemia de tifo exantemático, consegue que os 100 habitantes da Ilha dos Galegos sejam alojados no Bairro Municipal da Prelada.
Até partir para Lisboa, no dia 19 de Maio, Sidónio Pais visita os doentes de tifo internados no Hospital Joaquim Urbano, demorando-se no quarto do Dr. Freitas Veloso, sub-director do mesmo hospital, contagiado em serviço e ainda visitou a Exposição de Rosas que estava pela nave do Palácio de Cristal.
No dia 19, Sidónio Pais inaugura uma Sopa dos Pobres e de visita ao Aljube decide que fossem imediatamente libertados todos os presos políticos que aí se encontravam, o que caiu muito bem nos portuenses.
Na realidade, o tempo de prisão sem culpa formada, já tinha passado dos oito dias previstos no tempo de Afonso Costa para os sessenta dias.
Por outro lado, as forças mais conservadoras da sociedade começavam a sentir-se mais libertas e, no Porto, vão manifestar o seu contentamento junto do Dr. Alfredo Magalhães, nomeado Ministro da Instrução que, embora não fosse um portuense, era uma figura de relevo na vida citadina.
Em 1890, o Dr. Alfredo de Magalhães tinha-se matriculado no curso de Medicina da Escola Médico-Cirúrgica do Porto, curso que terminou em 1896.
No ano de 1899, parte para França, onde permanece até 1901, período durante o qual frequenta na Universidade de Paris um curso de especialização em Dermatologia e Sifiligrafia.
Foi contratado como professor substituto da Escola Médico-Cirúrgica do Porto, onde leccionava as disciplinas de Histologia, Matéria Médica e Terapêutica Geral, cargo que acumulava com o exercício da medicina provada e com aulas no Instituto Superior do Comércio Portuense. Em 1911, é nomeado professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto em resultado da integração da Escola Médico-Cirúrgica na recém-fundada Universidade do Porto.
 
 
“José Alfredo Mendes de Magalhães (Valença do Minho, São Salvador de Gandra, 20 de Abril de 1870 — Porto, 17 de Outubro de 1957), mais conhecido por Alfredo de Magalhães, foi médico, professor de Medicina, publicista e político republicano com actividade no período da Primeira República Portuguesa e do Estado Novo. Entre outras funções foi reitor da Universidade do Porto, procurador à Câmara Corporativa, Ministro da Instrução Pública,  governador-geral de Moçambique e presidente da Câmara Municipal do Porto. Foi membro da Maçonaria, com iniciação feita na loja Fernandes Tomás, da Figueira da Foz”.
Cortesia de Carlos Gomes (Blogue do Minho)
 
 
 
Narrativa das manifestações envolvendo o Dr. Alfredo Magalhães, em 19 e 21 de Julho de 1918, respectivamente
 


Os sidonistas, sentindo chegada a hora da vingança, começam a retaliar contra todos que representavam a velha ordem.
Em Julho, foram alvos preferidos os jornais anti-clericais.
 
 
 


 
 
O jornal “A Voz Pública”, afecto ao governo, não escapa à saga vingativa dos ultra-sidonistas e, no dia 9 de Novembro de 1918, a sua sede é assaltada e destruídas a redacção e as oficinas.
As instalações do Aljube não têm descanso.
No dia 16 de Novembro, são detidos por motivos políticos Mário Mesquita de Barros, Alberto Ferreira das Neves Álvaro Nascimento, Joaquim de Sousa Loureiro, José Francisco Pereira, João José Duarte e muitos mais.
No dia seguinte, a 17 de Novembro, o General Macedo e Silva, comandante da Região Militar Norte, determina a proibição de circulação de veículos, excepto oficiais e serviços de socorros.
No dia 20, numa fábrica de calçado da Rua dos Caldeireiros, é descoberto um arsenal de bombas, armas e munições.
O chefe da polícia, o capitão Solari Alegro, faz horas extra na perseguição aos opositores do regime, entretanto, denominado de República Nova e, em contra-partida, não cessam as manifestações de carinho e as homenagens de que é alvo, durante almoços e jantares dos quais é o centro das atenções e, normalmente, têm lugar no restaurante do Palácio de Cristal.


 
 

Restaurante do Palácio de Cristal

 
 
Entretanto, era já perceptível que as divisões dentro da República Nova eram imensas.
Belchior de Figueiredo, o líder do movimento no Porto, já se tinha afastado.
Entre muitas visões distintas de encarar a governação, a decisão de acabar com os Ministros transformando-os todos em Secretários de Estado, foi a machadada final. Por isto, Feliciano Costa, o braço direito de Sidónio, abandona o barco e é recambiado do Ministério do Trabalho para Roma como embaixador.
No dia 2 de Junho de 1918, no Porto, forças de Cavalaria 9 e de Infantaria 6 tomam conta da Estação de Campanhã, enquanto contingentes da GNR e da Polícia se concentram na Estação de S. Bento e Estação das Devesas, (V.N. de Gaia), para neutralizarem uma greve de pessoal da CP a que, por solidariedade, já tinham aderido, também, pessoal da Linha do Minho e Douro.
Em 14 de Junho, na sequência desta greve nos caminhos-de-ferro, afasta-se, também, Machado Santos.
No dia 6 de Dezembro de 1918, chega a notícia de Lisboa que Sidónio Pais tinha sido alvo de um atentado, mas que sobreviveu. Acalmaram-se as hostes.
No dia anterior, tinha acontecido uma espectacular parada militar na Avenida da Boavista para comemorar o primeiro aniversário da revolta chefiada por Sidónio Pais.
O general Macedo e Brito passaria revista às tropas em parada. Então, foi apresentada pela primeira vez uma Charanga de Cavalaria 9 e um contingente armado da Polícia com um grupo de corneteiros e tambores.
Naquela 6.ª Feira, 6 de Dezembro, a Câmara Municipal do Porto seguia no ritmo habitual, decidindo pedir ao conde de Vizela a cedência, para o museu municipal, da pedra de armas de um velho prédio que estava a ser demolido na Rua do Correio, o que foi aceite pelo destinatário.
 
 
 

Pedra de Armas que decorou um prédio na Rua do Correio
 
 
 
No dia 14 de Dezembro, causaria grande emoção e comoção a notícia de mais um atentado sofrido por Sidónio Pais.
Desta vez, na Estação do Rossio quando se preparava para embarcar em direcção à cidade do Porto para mais uma visita. Sidónio Pais, sobrevivendo, momentaneamente, viria, no entanto, a morrer no hospital.
Foi seu algoz, Júlio Costa que, em 1918, aquando de uma greve dos trabalhadores rurais de Vale de Santiago, assumiu a posição de negociador entre as autoridades e os revoltosos, conseguindo um acordo.
A actuação daqueles trabalhadores, liderados pela ala anarquista da Comuna da Luz de António Gonçalves Correia, foi considerada como perigosa para a ordem pública, e o Governo não aceitou os termos do acordo, sendo os grevistas severamente punidos, sendo alguns deportados para África.
Sentindo-se traído pela falta de palavra das autoridades, o já inconformado José Júlio da Costa radicalizou-se e jurou vingar os seus conterrâneos do Vale de Santiago, decidindo assim assassinar Sidónio Pais
José Júlio da Costa faleceu em 1946, com 52 anos de idade, internado no Hospital Miguel Bombarda, depois de 28 anos de prisão sem direito a julgamento.



 
 

Assassinato de Sidónio Pais
 
 
Começam as prisões dos políticos oposicionistas e diversas guarnições militares começam a chegar à cidade do Porto para reforçar as que já cá estavam sediadas.
Rejubilam os oposicionistas, lamenta o povo.
Apesar de a República Nova encarnar uma ditadura, o povo admirava o ditador.
Sidónio deixava-se fotografar com anciãos, pegava ao colo as criancinhas, visitava enfermos, visitava os casebres e ilhas onde o povo vivia, instituía locais de distribuição de alimentos denominados “Sopa dos Pobres” e andava entre os mais necessitados.
A vida das populações, regra geral, pouco se alterou, assim: continuavam as necessidades inerentes a uma guerra que atingia Portugal; o regimento em La Lys foi massacrado e, mesmo após o Armistício, não houve engenho para repatriar os sobreviventes; a fome grassava e sucediam-se os assaltos aos armazéns de comida e os assaltantes repelidos a tiro pelas forças policiais.
No dia 23 de Dezembro, chegam à cidade os Regimentos de Infantaria 32, de Penafiel e de Artilharia 4, de Amarante, unidades aboletadas no Matadouro Municipal e na Serra do Pilar, respectivamente.
No dia 26, chegam os regimentos de Artilharia 7, de Viseu que vai ser aquartelado no Monte Aventino, Regimento de Infantaria 8, de Braga e Regimento de Infantaria 20, de Guimarães, ambos aquartelados no Matadouro Municipal.
Dia 27, chega ao Porto o Regimento de Infantaria 9, de Lamego.
Para assegurar a ordem é criada, no dia 18, a Junta Militar do Norte pelos coronéis Gaspar Cunha Prelada e António Maria da Silva Ramos, tenente-coronel Jaime Carvalho da Silva e capitães Aires de Abreu e Solari Alegro.
No dia 24, o comando das tropas da Junta Militar do Norte é assumido pelo general Tamagnini de Abreu.
A última noite de 1918, seria passada com o rebentamento de petardos, um deles junto da residência, à Rua Antero de Quental, de Alberto Meneses, Governador Civil do Porto.
Não tinha passado um mês, a 19 de Janeiro de 1919, a Guarnição Militar do Porto, reunida no Monte Pedral, sob o comando de Paiva Couceiro, declara a restauração da Monarquia.
O Porto, mais uma vez, no olho do furacão.
A proclamada “Monarquia do Norte” durou 25 dias. Ficou como a Revolta do Quarteirão.
O sidonismo tinha trazido algo de premonitório e o 28 de Maio de 1926 perfilava-se no horizonte.

 
 

Postal, 1918 – Ed. Monteiro
 
 
 
O corpo de Sidónio Pais foi embalsamado e sepultado nos Jerónimos, uma semana depois de ter sido morto, mas os seus restos mortais foram, posteriormente, transladados para o Panteão Nacional pelo Estado Novo.
Passados dois anos sobre o atentado que vitimou Sidónio Pais, em 1920, Fernando Pessoa homenageou-o num longo poema intitulado “Presidente-Rei”. Começa assim:

 
 


 
 

 

terça-feira, 25 de março de 2025

25.270 Casa Mello Abreu e Salão Mello Abreu

 
A “Casa Mello Abreu – Armazém de Música, Pianos e Outros Instrumentos” começou por exercer a sua actividade na Rua do Cimo do Muro, n.º 22, à Ribeira, tendo sido fundada em 1853 por José de Mello Abreu.
Anexo à actividade de aluguer e de venda de Orgãos, Concertinas, Harmoniflutes e Pianos das marcas Pieyel, Erard, Steinway e Bord, tinha oficina de reparação desses instrumentos.
Anexo a esta loja existia, como era habitual nas firmas desse ramo, uma sala de exibição de músicos. Neste caso era o denominado “Salão Mello Abreu” por onde passaram muitos alunos que viriam a singrar na actividade musical.
 
 
 

Publicidade a José de Mello Abreu, em 1860


 
 
Em 1861, já a firma José de Mello Abreu tinha um novo n.º de polícia (240), em virtude da remodelação introduzida, nesse âmbito, no ano anterior, pelo Governador Civil José de Serpa Pimentel, 2.º visconde de Gouveia.

 
 
 

Publicidade a José de Mello Abreu, em 1861
 
 
 
No fim da década de 1880, já a “Casa Mello Abreu” estava pela Rua da Cancela Velha. Subindo esta rua, as suas instalações estavam, à nossa direita, perto da Rua do Bonjardim.



 

A “Casa Mello Abreu” na Rua da Cancela Velha
 
 
 
 
 
A “Casa Mello Abreu”, na Rua da Cancela Velha, em 1888
 
 
 

A “Casa Mello Abreu”, na Rua da Cancela Velha, em 1889





Comerciantes de Música “Annuaire des artistes et de l’enseignement dramatique et musical”, 1903
 
 
 
 
Como se observa no extrato do anuário acima representado, à data, José Mello Abreu já teria falecido e a firma passou a “José de Mello Abreu (Viúva)”.
 
 
 

Comerciantes de Música “Annuaire des artistes et de l’enseignement dramatique et musical”, 1909
 
 



A “Casa Mello Abreu”, na Rua da Cancela Velha, em 1911
 
 
 

A “Casa Mello Abreu”, na Rua da Cancela Velha, em 1913
 



Para além do Salão da Casa Melo Abreu, existiam no Porto outros espaços ligados a conhecidas casas de música para apresentação dos novos executantes musicais. Devem ser realçados o Salão Casa Moreira de Sá (1900–1908), o Salão Bechstein (1910 – c.1927) e o Salão Beethoven (1914 – c. 1943).
Em todos estes espaços se apresentavam os discípulos e os seus professores em audições muito aguardadas.
Para além daqueles locais, outros não ligados ao comércio da música se destacavam, em audições muito participadas como, por exemplo, o Salão do Centro Comercial do Porto (1900–1940), o Ateneu Comercial e os Fenianos Portuenses.

 
 
 

Programa do concerto inaugural das sessões de Música de Câmara no Salão da Casa Mello Abreu, em 6 de Janeiro de 1913
 
 
 
 
 

Programa dum ensaio de discípulos realizado no “Salão Mello Abreu”, em 27 de Maio de 1918




Em 1916, Moreira de Sá era sócio-gerente da “Casa Mello Abreu” como se destaca e observa na carta abaixo.

 
 
 

Papel de carta da “Casa Moreira de Sá” – Cortesia de José Leite, administrador do blogue “Restos de Colecção”
 
 
 
A “Casa Mello Abreu” encerraria na década de 1920.

 
 

Os prédios, em frente, com as fachadas voltadas a norte, são o que ainda restava, em 1939, da Rua da Cancela Velha. Em frente, à direita a Rua Rodrigues Sampaio - Ed. Guilherme Bonfim Barreiros
 
 
 

Imagem editada da foto anterior, na qual se observa, à esquerda, em 1939, o Restaurante Madrileno que tinha ocupado as instalações da “Casa Mello Abreu” e tinha fama de servir o melhor chispe com feijão branco

quinta-feira, 6 de março de 2025

25.269 Relojoarias com história

 
Fábrica de Relógios “A Boa Reguladora”
 

Registada a firma, em 1892, com a denominação “São Paulo & Carvalho” e, inicialmente, instalada na cidade do Porto, datam de 1894 os primeiros relógios que produziu. No ano seguinte, obteve a medalha de ouro na Exposição Agrícola e Industrial de Vila Nova de Gaia e, em 1896, transfere-se para a freguesia de São Julião de Calendário, em Vila Nova de Famalicão.
A empresa “São Paulo & Carvalho” foi fundada em 14 de Fevereiro de 1892, por João José de São Paulo e José Gomes da Costa Carvalho.
A oficina destinada ao fabrico de relógios foi aberta, em 1893, no Porto, na Rua Gomes Freire, às Fontainhas.
Em 1894, a fábrica “A Boa Reguladora” colocava no mercado os primeiros relógios.
 
 
“O primeiro modelo fabricado na fábrica do Porto foi o “Batalha”, relógio de mesa batendo horas e meias horas. Sendo o primeiro, foi também um modelo que nunca deixou de se fabricar”.
Cortesia de Fernando Correia de Oliveira (estacaochronographica.blogspot.com)

 
 

Relógio de mesa modelo “Batalha” de “A Boa reguladora”
 
 
 
João José de São Paulo era, na realidade, quem conhecia a actividade, mas viria, pouco depois, a falecer.
Pouco antes deste desenlace, a sociedade foi reconstituída com a entrada de José Carvalho que se associou a seu irmão, Lino de Carvalho, também relojoeiro, exercendo em Famalicão e ainda, a Joaquim Martins de Oliveira Rocha, principal credor de João José de São Paulo. A firma passou a ter a denominação “Carvalho Irmão & Cia” e, em 1896, a fábrica já estava em Famalicão, junto à linha férrea, em Calendário.
Neste momento, cessa a ligação desta empresa à cidade do Porto.
A firma “Carvalho, Irmão & Cª”, Fábrica de Relógios “A Boa Reguladora” (Vila Nova de Famalicão) apresentou durante a Exposição Industrial Portuguesa de 1897, realizada no Palácio de Cristal, no Porto, uma colecção de relógios de mesa e de parede, além de diversos acessórios de relojoaria.
A produção de “A Boa Reguladora” pretendia concorrer, sobretudo, com o artigo similar importado da Alemanha e Estados Unidos.
Em 1901, é paga a dívida a Joaquim Martins de Oliveira Rocha, que sai da sociedade, ficando esta nas mãos dos irmãos Carvalho.
 
 
 “Registada a firma com a denominação São Paulo & Carvalho e inicialmente instalada na cidade do Porto, datam de 1894 os primeiros relógios que produziu. No ano seguinte obteve a medalha de ouro na Exposição Agrícola e Industrial de Vila Nova de Gaia e, em 1896, transfere-se para a freguesia de São Julião de Calendário, em Vila Nova de Famalicão”.
Fonte: reguladora.pt
 
 
 
 

Fábrica de Relógios de “A Boa Reguladora”, em Famalicão
 
 
 
 
 
“A Boa Reguladora”, a partir de 1953, passou a“Reguladora”.
Ficou muito conhecida pelos relógios exibidos nas estações de caminho-de-ferro.
 
 
 
 

Estação Ferroviária da Fontela
 




No seu apogeu, as instalações de “A Boa Reguladora”, em Famalicão
 
 
 
 
Relojoarias portuenses
 
 
São muitas dezenas as relojoarias que nas últimas décadas estiveram de portas abertas a servir os portuenses e que já desapareceram.
Na Rua de Santa Catarina a “Zurich”, na Rua Formosa, a “Relojoaria Baptista” e, na Praça dos Poveiros, n.º 80, a “Relojoaria Aguiar”.
Esta última com um destaque especial por só ter encerrado há poucos anos.
 
 
 
1. Relojoaria Aguiar




Praça dos Poveiros, à direita, em primeiro plano, a “Relojoaria Aguiar”, década de 1950



 

Publicidade à Relojoaria Aguiar, em 1940 – Cortesia do jornalista Fernando Ferreira de Oliveira



 

Relógio icónico na fachada do prédio da “Relojoaria Aguiar”, em Abril de 2011, quando já tinha encerrado há algum tempo - Cortesia de Paulo Ferreira
 
 
 
 
Entre muitas outras relojoarias, portanto, duas se destacaram e continuam de portas abertas: “Marcolino”, na Rua de Passos Manuel e “Mendonça”, na Rua de Sá da Bandeira.
 

 
 
2. Relojoaria Marcolino
 
 
Sendo, desde há décadas, uma relojoaria de referência, mais recentemente, mesmo para as gerações mais novas passou a ser conhecida por ser, em determinado momento, a única a comercializar e a disponibilizar os modelos mais raros dos relógios Swatch.
 
 
 
“Em 1926, António Marcolino abre a primeira relojoaria, na Rua de Santo Ildefonso, dando-lhe a designação que persiste até hoje. Em 1937 a relojoaria Marcolino passa para o número 130 da Rua de Passos Manuel, no coração do Porto, onde se mantém. Tal como ainda hoje acontece, começa por exibir na sua fachada um relógio que passou a ser o guia da hora exata para todos quantos passam naquela movimentada artéria. Em 1962, a relojoaria Marcolino conhece um novo proprietário, Adriano Magalhães, que, no entanto, mantém a marca e a especialização em relojoaria de qualidade. Em 1970, o ourives José Moura adquire a empresa e realiza a primeira grande renovação estética e funcional da loja. Nova mudança de proprietários em 1980, com a aquisição pela família Neves. Nesta ocasião, a empresa alarga a sua gama de produtos, vocacionando-se para um segmento de topo, através da representação de marcas de alta relojoaria de prestígio como Vacheron Constantin, IWC, Omega, Piaget, Cartier, Breitling, entre outras. O serviço de assistência técnica é também reforçado nesta época por um experiente mestre relojoeiro, de forma a responder a todas as exigências de um mercado em crescimento. Em julho de 2014, Paulo Neves regressa à gestão da empresa, através da sua aquisição ao irmão, Rui Neves. Inicia um processo de renovação e renascimento para a marca Marcolino que não esquece, no entanto, a tradição e know-how de quase 90 anos em relojoaria e joalharia”.
Fonte: comerciocomhistoria.gov.pt
 


 

Relojoaria Marcolino antes da ampliação das instalações, c. 1960
 
 
 
Já neste século, a Relojoaria Marcolino acabaria por se estender e aumentar significativamente as suas instalações ocupando a área em que, outrora, esteve a emblemática “Casa Inglesa” de pronto-a-vestir.

 
 

A “Casa Inglesa”, de Manuel Donas, na esquina das ruas de Passos Manuel e de Santa Catarina
 
 
 

Capa da partitura da peça musical “Espera-me na Casa Inglesa”, uma marcha one step de Júlio Pontes, c. 1940


 
 

Publicidade à “Casa Inglesa”
 
 
 
 
 
“Marcolino”, actualmente – Fonte: viva-porto.pt/
 
 


Relojoaria Marcolino – Cortesia de Gina Cunha
 
 
 
 
3. Relojoaria Mendonça
 
 
Com morada na Rua de Sá da Bandeira, n.º 428, ocupando, presentemente, as lojas, 23-24, do renovado Mercado do Bolhão, esta relojoaria já por aqui estava, no mesmo local, antes da última intervenção que ocorreu no citado mercado.
Enquanto decorreram as obras esteve numa loja mesmo defronte, no outro lado da mesma rua.
Esta relojoaria portuense é obra de Alberto Mendonça.

 
 

Publicidade à Relojoaria Mendonça
 
 
 
 
 
 
 

Na primeira loja, à esquerda, esteve a Relojoaria Mendonça durante as obras de remodelação do Mercado do Bolhão
 
 
 
 
 
“A paixão de Alberto Mendonça por relógios revelou-se logo aos 10 anos de idade, altura em que começou a aprender o ofício. A arte foi-lhe transmitida pelo tio Domingos Mendonça, uma referência no exclusivo mundo dos relojoeiros do Norte no início do século XX (fundou a Relojoaria Azevedo Mendonça, estabelecimento centenário que ainda hoje existe na sua terra natal, em Malta, Vila do Conde). Mais tarde, Alberto Mendonça passou a exercer e estabeleceu-se por conta própria em 1945, na altura com a Relojoaria Ramos e Mendonça, à qual esteve ligado durante 12 anos.
Hoje em dia, mantém-se a tradição familiar na gestão desta casa meio-centenária, com Jacinto Mendonça e a irmã Maria José a garantir a singela forma de comércio com o futuro já assegurado pela paixão de Miguel e Filipe, da geração seguinte”.
Fonte: mercadobolhao.pt
 
 

 

Relojoaria Mendonça no seu local actual e primitivo, nas lojas, 23 e 24, do Mercado do Bolhão