terça-feira, 18 de outubro de 2022

25.167 Um lisboeta com ligações à cidade do Porto

 
Em 1893, tinha sido inaugurado o Instituto para Surdos-Mudos Araújo Porto, criado com o legado de José Rodrigues de Araújo Porto.
Em 12 de Novembro de 1899, junto das instalações do Instituto Araújo Porto, iriam ser construídas as que se destinavam ao que veio a ser o Asilo de Cegos S. Manuel e, sobre o lançamento da 1ª pedra, narrava o jornal “O Primeiro de Janeiro”:
 
“A quinta Araujo Porto e o local destinado ao novo Asylo estavam adornados de bandeiras, e o edifício do Instituto dos Surdos-mudos ostentava riquíssimas colgaduras de damasco em todas as suas janellas.
E durante a cerimonia tocou a excellente banda do Asylo do Barão de Nova Cintra, instituição também dependente da Santa Casa da Misericordia do Porto, como se sabe.
O illustre prelado portuense, sr. D. António Barroso, que antes havia assistido á collocação da primeira pedra do bairro operario, de iniciativa do nosso presado collega do Commercio do Porto, chegou ao local pouco
depois da uma hora da tarde. Sua reverendíssima era acompanhado dos srs. dr. Ferreira Pinto, seu secretario, e dos reverendos conegos Filippe Coelho e Correia e Sá, e foi recebido á porta da quinta pelos sr . provedor e mesarios da Santa Casa, corpo docente do Instituto de surdos-mudos muitos convidados, etc, etc.
No local destinado ao edificio do novo ásylo e em que já assentam alguns alicerces e se erguem pequenos trechos de parede, o sr. D. Antonio benzeu o terreno e a pedra que ía ser imposta, lançando por ultimo a bênção a todas as pessoas presentes, entre as quaes havia um grande numero de senhoras.
Sob a pedra foi collocado um cofre com todas as moedas do actual reinado e uma legenda em latim, correspondente ao auto da cerimonia, lida pelo mesario da Santa Casa, reverendo Francisco Patricio.
Foi o sr. governador civil quem conduziu a colhér, o sr. general Cibrão a argamassa, o sr. presidente da camara as moedas, o sr. dr. Paulo Marcellino Dias de Freitas o camartelo e o sr. Branco Rodrigues, o incansavel protector dos cegos, o cofre.
Finda a cerimonia, houve sessão solemne na sala de estudo do Instituto dos surdos-mudos. Presidiu o sr. D. Antonio Barroso, tendo á sua direita os srs. governador civil e general Cibrão, e á esquerda os srs. presidente da camara e Branco Rodrigues”.




Cerimónia do lançamento da 1ª pedra do Asilo de Cegos – Fonte: “Jornal dos Cegos” (Fevereiro de 1900; Lisboa – Editor: Branco Rodrigues); gravuras obtidas a partir de fotografia de Aurélio da Paz dos Reis

 
 
A gravura anterior revela a cerimónia efectuada, em 12 de Novembro de 1899, de lançamento da 1ª pedra do Asilo de Cegos, sendo visível, no horizonte, a igreja da Lapa.
 
 
 

Fanfarra dos alunos do Estabelecimento do Barão de Nova Sintra durante a cerimónia de lançamento da 1ª pedra do Asilo de Cegos – Fonte: “Jornal dos Cegos” (Fevereiro de 1900; Lisboa – Editor: Branco Rodrigues); gravuras obtidas a partir de fotografia de Aurélio da Paz dos Reis
 
 
 
 
Entretanto, em 1904, abriria na Rua das Taipas a «Escola de Cegos do Porto» por iniciativa do jornalista José Cândido Branco Rodrigues (1861-1926), nascido no seio de uma família da alta burguesia lisboeta e editor do “Jornal dos Cegos”, com sede em Lisboa.




Texto extraído do “Jornal dos Cegos”, nº 52, de Fevereiro de 1900, da autoria de José Cândido Branco Rodrigues, do qual era também o editor e director e viria a ser, também, o fundador da “Escola de Cegos do Porto”
 
 
 

Palacete, em Lisboa, residência de José Cândido Branco Rodrigues, sito na Avenida da República, nº 36, esquina da Avenida Visconde de Valmor (1908) – Fonte: “Casa de Branco Rodrigues” (Alfredo d’Ascenção Machado), a Architectura Portuguesa, ano I, nº 10, 1908, pag. 37-38
 
 
 
“No dia 5 de Maio de 1903, o Governador Civil do Porto, Adolpho da Cunha Pimentel, bacharel em direito, aprovava o alvará que José Cândido Branco Rodrigues lhe apresentou com os respectivos estatutos, datados de 1 de Abril anterior, para administrar uma instituição de beneficência denominada «Escola de Cegos do Porto», destinada a instruir e educar crianças cegas de ambos os sexos. Como os estatutos não continham disposição alguma a que se opusessem as leis gerais, foram os mesmos aprovados pelo referido Governador Civil, usando da faculdade que lhe conferia o n.º 8 do art. 252 do Código Administrativo.
Cortesia de Teo Dias
 
 
 
A «Escola de Cegos do Porto» irá ser alojada, inicialmente, na Rua das Taipas, nº 76, no Palacete dos Vilar de Perdizes, a ser correcta a informação obtida a partir da colecção do espólio da “Foto Guedes” pertencente ao Arquivo Municipal do Porto. No entanto, a referida escola mudar-se-ia ainda, em 1904, para instalações na Rua Ferreira Cardoso (antiga Viela de Sacais).
 
 
 

Palacete dos Vilar de Perdizes

 
 
A «Escola de Cegos do Porto» passaria, então, a funcionar na Rua Ferreira Cardoso, nº 103, sob as orientações do seu fundador, Branco Rodrigues e administrada financeiramente pela Santa Casa da Misericórdia do Porto (artº 9º), em edifício que, em 1912, seria alvo de uma intervenção autorizada pela licença camarária, nº 455/1912.





Escola de Cegos do Porto, na Rua Ferreira Cardoso, c. 1905
 

 
O prédio que viria a situar-se adossado à escola, à direita da foto, teve licença de construção nº 16/1907.
A sociedade portuense recebe com muita aceitação a iniciativa de Branco Rodrigues e sucedem-se as iniciativas para a recolha de fundos para a Escola de Cegos.
A 18 de Novembro de 1907, era levado à cena um espectáculo de angariação de fundos.


 


 
 
A 18 de Dezembro de 1908, é posto à venda um número especial da revista “Arte”, de Marques Abreu, em benefício da Escola de Cegos do Porto.
Em 1 de Outubro de 1938, a «Escola de Cegos do Porto» passou a ser totalmente administrada pela Misericórdia, quando era seu Provedor o Dr. António Luís Gomes e Mesário o Dr. Mário de Vasconcelos e Sá. Existiam então, ali, 18 alunos, a quem eram ministradas aulas de Braille e actividades profissionais pelo seu Director, o Prof. Miguel Mota.

 
 

Miguel Mota, director da Escola de Cegos do Porto
 
 
 
No ano de 1945, a «Escola de Cegos do Porto» foi transferida da Rua Ferreira Cardoso para as instalações do Asilo de Cegos, na Rua da Paz, resultando desta fusão o “Instituto Asilo de Cegos de S. Manuel”, que passaria a ter uma média de 25 alunos e alguns asilados. Nesta data, era Director o Dr. Bertino Daciano da Rocha Guimarães e Professor de Música e Braille o Prof. Albuquerque e Castro. Foram estes dois homens os grandes impulsionadores da transformação do “Asilo de Cegos e Instituto de S. Manuel”.
O prédio na Rua Ferreira Cardoso, nº 103 passaria, então, para a posse da Igreja Adventista do Sétimo Dia que, aí, construiria o seu novo templo, que subsiste.

 
 

Igreja Adventista do Porto
 
 
 
Remodelação do Instituto de Cegos S. Manuel
 
“Em 1958, José Ferreira de Albuquerque e Castro foi nomeado Director dos Serviços Tiflológicos da Santa Casa da Misericórdia do Porto, sendo substituído nessas funções por sua mulher, Dr.ª Pilar Ribas de Albuquerque e Castro, quando faleceu em 15 de Abril de 1967.
A 12 de Maio de 1969, celebrou-se o primeiro acordo de cooperação entre o Instituto da Família e Acção Social (IFAS) e a Misericórdia, com vista ao melhor funcionamento do Instituto S. Manuel.
Com o decorrer dos tempos deixaram de ser admitidos asilados e, assim, quando em 1969 o Instituto encerrou para obras, os educandos em idade escolar foram transferidos para o Internato de S. José, que abriu nessa altura, indo os restantes para um Lar instalado num prédio da Misericórdia, na Rua do Rosário.
Em 1972, foram concluídas as obras e o Instituto foi remodelado, não só quanto a instalações, mas ainda nos seus variados aspectos de funcionamento, nomeadamente nas áreas administrativa, pedagógica, educativa e social.
Em 1976, foi revisto o acordo com o IFAS passando, por via dele, para os quadros do Centro de Educação Especial do Porto (CEEP) todo o pessoal técnico do Instituto.
Em Novembro de 1977, graças ao esforço conjunto da Santa Casa e do Centro de Educação Especial do Porto iniciou-se a construção de um ginásio, especialmente concebido para cegos”.
Fonte: Santa Casa da Misericórdia do Porto
 
 
Hoje, a toponímia da cidade passou a ter a pouco conhecida “Rua Instituto de Cegos S. Manuel”, que liga a Rua de Joaquim Vasconcelos à Rua da Torrinha.

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