quinta-feira, 30 de março de 2023

25.183 O Caminho da Aguada

A estrada marginal que corria pela margem direita do rio Douro, entre o esteiro de Campanhã e a Ribeira, começaria a ser delineada na década de 1940. Foi durante muitos anos o Caminho da Aguada.
Este topónimo referenciava a foz da ribeira de Mijavelhas, situada entre a ponte do Infante D. Henrique e a ponte Maria Pia, que despencava, lá do alto, para o rio Douro, em cascata, com a sua nascente nas imediações do Campo 24 de Agosto.



Local da foz da ribeira de Mijavelhas, também, chamada ribeira do Poço das Patas



Em anos de muita chuva, apesar do encanamento da ribeira, é possível observar o fenómeno, pois ela acaba por transbordar. Foi o caso da invernia acontecida na primeira semana do ano de 2023.
Dessa cascata de água se diz que, em épocas muito remotas, os barcos se vinham abastecer de água potável.
Actualmente, essa estrada marginal compõe-se de dois troços a que correspondem dois topónimos. Entre o Freixo e o entroncamento com a Rua de Sabrosa é chamada de Avenida Paiva Couceiro. Daí até à ponte Luiz I é a Avenida Gustavo Eiffel.
Seria o engenheiro militar Reinaldo Oudinot, que durante catorze anos dirigiu as obras da barra, a conceber uma intervenção na frente unitária ribeirinha.
Nesta óptica, seriam cinco as intervenções a desenvolver: São João da Foz, com o projecto para a barra e para a reestruturação urbana e defensiva deste lugar; Massarelos, com o projecto de um cais para abrigo das embarcações e de uma alameda pública; Ribeira do Porto, com o projecto de ampliação e elevação do cais e de reestruturação do tecido urbano existente; Guindais, com o projecto de um cais para o porto fluvial; e Freixo, com o projecto de regularização da foz dos rios Tinto e Torto, no esteiro de Campanhã.
No âmbito deste último, acrescia um outro objectivo: o de estabelecer a ligação da cidade baixa com as povoações de Valbom e Gondomar.
A partir de 1794, passou a ser possível vencer o percurso escarpado da margem direita do rio Douro, entre o esteiro de Campanhã e a ponte Pênsil, na Ribeira, a pé ou a cavalo.



 
“Uma das dificuldades na construção da estrada entre a Ribeira e o Freixo era a abertura do leito da via pois neste tramo do rio Douro as encostas são escarpadas e rochosas.
A dificuldade maior, porém, era a travessia do esteiro de Campanhã, zona alagadiça onde desaguavam os rios Tinto e Torto1851. Oudinot estudou em particular este local onde o rio Douro faz uma curva pronunciada. O projecto envolveu o encanamento da foz dos dois ribeiros e a construção de estradas e pontes no leito do rio; envolveu, ainda, a conciliação do traçado da nova estrada para a Régua com o palácio do Freixo e seus jardins assim como a resolução das ligações às povoações próximas.
(…) No final do ano de 1794 já estava aberta a ligação entre a Ribeira e o vale de Campanhã, uma passagem “a pé ou a cavalo”, estabelecendo-se a comunicação à cota baixa entre a cidade e as povoações vizinhas situadas na parte oriental. Nos anos seguintes, Oudinot continuou com este trabalho, “alargando e melhorando o caminho, de forma que se possa cada vez aproveitar melhor”. Com estes trabalhos, Oudinot garantia o início da construção de uma via marginal ao Douro, uma tarefa que se prolongaria pelos séculos XIX e XX”.
Cortesia de Carlos Henrique de Moura Rodrigues Martins - Tese de Doutoramento em Arquitectura (2014)

 
 



O Caminho da Aguada seria caminhado na íntegra, entre a Ribeira e o Freixo, pela personagem Manuel Quintino, na obra “ Uma Família Inglesa” de Júlio Dinis. Quando tinha um problema para resolver que necessitasse de reflexão, a solução buscava-a naquele percurso, em contemplação da paisagem e em meditação.
Acabaria por ser encontrado extenuado, sentado num banco junto do cemitério do Prado do Repouso, já na Rua do Heroísmo, pelo seu futuro genro.
Júlio Dinis vai descrevendo os lugares de passagem: fonte do Carvalhinho, Quinta da China, Rego do Lameiro e Esteiro de Campanhã. Para trás tinha ficado a fábrica de Curtumes. Começava a subida para o sítio do Padrão.

 
 

Sítio do Padrão de Campanhã, na Rua do Heroísmo, c. 1950
 
 
 
Teríamos que chegar à década de 1940 para que todo o percurso, entre o Freixo e a Ribeira, fosse realizado em plenitude.


 
 

Abertura da estrada marginal de ligação do Freixo à ponte Luís I, na zona da Central Termo Eléctrica do Freixo – Ed. Guilherme Bomfim Barreiros; Fonte: Arquivo Municipal do Porto

 
 

Aspecto das obras para a abertura da Avenida Marginal, na zona do Freixo, que possibilitaria a ligação da estrada nacional n.º 19-2.ª, com o tabuleiro inferior da ponte Luís I - Ed. Guilherme Bomfim Barreiros; Fonte: Arquivo Municipal do Porto



 

Aspecto das obras de abertura da Avenida Marginal, em Quebrantões Norte - Ed. Guilherme Bomfim Barreiros; Fonte: Arquivo Municipal do Porto
 
 
 

Marginal do rio Douro (Caminho da Aguada), observada a partir de V. N. de Gaia, entre o Freixo e a Ribeira antes da grande intervenção na década de 1940 – Ed. Alvão


 

O Caminho da Aguada, próximo da Quinta de Roriz

 
 

Perspectiva actual da foto anterior – Fonte: Google maps

 
 
Entre o prédio das fotos anteriores e a ponte ferroviária Maria Pia esteve sedeada a fábrica de cerâmica “Chambers & Wall” que começou por ser, a partir de 1912, um polo de produção da Fábrica de Louça de Massarelos e que, mercê de um incêndio, acabaria por encerrar, neste local, em 1936.
O referido prédio teria sido a habitação do proprietário da cerâmica.



 

O antigo Seminário, à direita, lá no alto, em litografia de Cesário Augusto Pinto, em 1849, e mesma perspectiva, actualmente – Cortesia de “Gaia à la Carte”

 

Na Quinta de Roriz, c. 1920, em Quebrantões do Norte, na margem direita do rio Douro, a Fábrica “Chambers & Wall”, com o antigo Seminário, parcialmente, visível

 
 

A meio da foto, a Calçada das Carquejeiras (antiga Calçada da Corticeira), em 1945, com a marginal ainda por construir
 
 
 
 

Caminho da Aguada, ainda em terra batida, observável desde da Calçada da Corticeira (Calçada das Carquejeiras) até à ponte Maria Pia

 
 

Mesma perspectiva da foto anterior, obtida em 1900
 
 
 

Ponte Luís I, ainda sem o acesso marginal aberto
 
 
 
 

À direita, na década de 1950, já estava construída a marginal

 
 

Avenida Gustavo Eiffel, actualmente, junto da antiga ponte ferroviária Maria Pia – Fonte: Google maps

Sem comentários:

Enviar um comentário