quinta-feira, 20 de abril de 2023

25.186 O Barão de Forrester

 
Para o lado sul da Ramada Alta apresenta-se a Rua Barão de Forrester.
Esta rua deve o seu topónimo ao Barão de Forrester que, por lá, teve a sua residência, na primeira metade do século XIX.
Dizem que, à época, a casa do Barão de Forrester, era uma residência magnífica.
Em 1854, segundo o testemunho do próprio barão, já era habitada pelo visconde da Trindade.
 
 
 
Quando habitei a casa na Ramada Alta actualmente ocupada pelo patriótico e filantropo (termo de que me sirvo-em lugar de ill.mo e exc.mo) visconde da Trindade, tinha um relógio de mesa muito lindo, de três e meio palmos de altura, sendo o assunto um preto segurando um cavalo bravo e fogoso. Quando saía da minha casa pela manhã, e voltava à noite, costumava sempre conferir o meu relógio de algibeira com aquele; mas aconteceu-me um dia, que, voltando a casa, dei pela falta do relógio, manga de vidro, preto, e cavalo branco, e até a própria chave. Em vão, pergunto a minha mulher, filhos e criados, pela falta; mas ninguem me podia esclarecer o negócio; porém tendo motivos de suspeitar de algumas pessoas, relacionadas com os criados, paguei, a cada um deles, um mês adiantado, e mostrei-lhes a porta. Foi justamente, Sr. Redactor, nesta ocasião que alguem me falou na bela organização do corpo dos ladrões na cidade do Porto, debaixo da autoridade do ladrão-mór a que acima me referi”.
Excerto da carta dirigida ao redactor do jornal Commercio pelo Barão de Forrester em 1854
 
 
O visconde da Trindade, que à data do texto anterior, exercia o cargo de Presidente da Câmara do Porto, era um brasileiro de torna-viagem, de seu nome José António de Sousa Basto, nascido em Cabeceiras de Basto em 1805, que andou por terras da América do Sul, durante cerca de três décadas, onde fez fortuna, tendo regressado a Portugal em 1850.
 
 
“Em 23 de Agosto retirou-se para o Porto, que avaliando os seus altos merecimentos cívicos, morais e trabalhadores, o elegeu vereador, sendo eleito presidente para o primeiro biénio de 1852 a 1853, reeleito para o biénio de 1854 a 1855, não aceitando a reeleição para o biénio seguinte, depois de ter demonstrado à cidade invicta quanto valia o seu nobre carácter e a força do seu ânimo, em proveito daqueles que o tinham elevado, e que jamais podem esquecer quanto lhe devem. Em Julho de 1859 voltou ao Rio de Janeiro a fim de liquidar os seus negócios, o que conseguiu com rara actividade, no curto espaço de dois meses, promovendo ali entre os seus amigos uma subscrição que atingiu a avultada soma de vinte contos de réis, destinada a constituir o fundo do Liceu da SS. Trindade, regressando de novo à pátria em 13 de Novembro de 1859”.
Fonte: epl.di.uminho.pt/
 
 
 
 

Casa na Ramada Alta que seria mandada demolir em pleno século XX
 
 
A casa que se observa na foto acima, dizem, teria sido a que foi habitada pelo barão de Forrester.
Em 1830, pertencia a António José Gonçalves Braga que diligenciou, naquele ano, à Câmara do Porto, uma reformulação da sua fachada.
Na sua casa da Ramada Alta, Forrester promovia alguns jantares, aos quais se apresentavam os seus melhores amigos.
Na sua obra (1884) “Vinho do Porto”, Camilo Castelo Branco dá conta de alguns daqueles convivas.
 
 
 
Jantares do Barão de Forrester – Fonte: “O Porto do Romantismo” (1932) de Artur Magalhães Basto

 
 
Na foto, abaixo, vemos a entrada da Quinta da Boa Vista que pertenceu ao Barão de Forrester, onde também viveu, a alguns quilómetros da Galafura.
O seu contributo para o desenvolvimento do Douro vinhateiro foi preponderante, nomeadamente na cartografia (autor do primeiro mapa sobre a Região Demarcada do Douro) e no desenvolvimento da própria actividade vitivinícola. Em grande parte, como resultado das inovações que introduziu, o Douro assumiu, durante o séc. XIX, uma grande importância no comércio internacional de vinhos.

 
 

Entrada da Quinta da Boa Vista


 
Há quem afirme que o Barão de Forrester teria vivido, também, no edifício do antigo Restaurante Comercial, situado na Rua do Infante D. Henrique., que utilizava como escritório e local de trabalho.
 
 
 

Edifício Forrester/Restaurante Comercial

 
 

Interior do edifício Forrester com vista para o Palácio da Bolsa
 
 
 
O Barão de Forrester (1809-1861) foi José James Forrester, de seu nome, nascido em Hull, escritor, artista e viticultor, que tanto se notabilizou na expansão e propaganda do Douro e dos seus vinhos e que, com quase 52 anos, morreu afogado no rio Douro, em Maio de 1861, no lugar do Cachão da Valeira.
 
 
“Nascido em 1809 em Inglaterra e falecido em 1861 num acidente de barco no fatídico Cachão da Valeira, em pleno Alto Douro, foi uma figura de destaque em todos os assuntos do vinho. Enquanto comerciante consagrou a reputação internacional dos vinhos da firma Offley Forrester, que ele próprio se encarregava de seleccionar criteriosamente na região demarcada. Como enófilo lutou pela preservação do carácter genuíno dos vinhos do Douro contra as adulterações tidas, à época, como inevitáveis e até desejáveis – combateu ferozmente as práticas de adicionar baga de Sabugueiro, como artifício para intensificar a cor, e (espante-se!) a aguardentação dos mostos, por considerar uma deturpação das naturais qualidades do vinho. À cartografia nacional legou o primeiro mapa da Região Demarcada do Douro. Como pintor, fotógrafo e aguarelista, deixou-nos imagens vibrantes da intensa vida burguesa do Porto de oitocentos”.
In blogue: webook

 
 

James Forrester


 
“Em 1831 Joseph juntou-se à empresa vinícola de um tio seu no Porto, e iniciou uma reforma no comércio de vinhos. Na sua obra de 1844, Uma palavra ou duas sobre o vinho do Porto, declarou guerra aos que adulteravam o vinho. Também estudou o oídio da vinha causado pelo Oidium tuckeri, desenhou notáveis mapas do vale do Douro (Mapa do Rio Douro). Por este trabalho, foi-lhe concedido o título de Barão, por D. Fernando II, em 1855, regente durante a menoridade de D. Pedro V.
Pintou várias aguarelas, e foi autor de O Douro Português e País Adjacente (1848) e de Prize Essay on Portugal and its Capabilities (1859), pela qual recebeu uma medalha de ouro”.
Fonte: pt.wikipedia.org/

 
 
Muito jovem, com vinte e dois anos, James Forrester desembarcara no Porto em 1831, para trabalhar numa empresa exportadora de vinho do Porto que pertencia a um tio: a Offley, Forrester & Webber.
Entre 1843 e 1860, James Forrester publicou vários trabalhos, escrevendo-os e ilustrando-os com excelentes desenhos, sobre o cultivo e a produção dos vinhos durienses. Os seus trabalhos “A crise comercial explica-se” e “A verdadeira causa da crise comercial do Porto” contribuíram grandemente para debelar o pânico e estimular as energias das gentes do Douro seriamente abaladas com o flagelo que devastou grande parte dos vinhedos, em 1859.
Ficaram famosos os seus mapas e notas, em “O país vinhateiro do Alto-Douro”, publicado em Português e Inglês e, mais tarde, reeditado pela Câmara dos Comuns, em Londres.
 
 
 
“Rua Nova dos Ingleses – Porto, 1834”- Pintura do Barão de Forrester
 
 
 

“Feira do Porto”, 1835 – Barão de Forrester
 
 
 
"Vista do rio Douro com a cidade do Porto", 1840 – Desenho do Barão de Forrester





 
A gravura acima, uma vista do rio a partir das Fontainhas, resulta de uma impressão de uma ilustração do Barão de Forrester, executada antes de 1843, pois parece que se vislumbra, ainda, a Ponte das Barcas.

 
 
 

Gravura estampada, em 1860, de desenho da ponte Pênsil da autoria do Barão de Forrester

 
 

Foto do Barão de Forrester, em 1859, da Rua Nova dos Ingleses (actual Infante D. Henrique)

 
 
Estava chegado o fatídico dia.
Depois de dois dias de intensa chuva, o Domingo amanhecera agradável e, com o passar das horas, ganhara força a proposta que surgira no grupo de um jantar na Régua. E, por isso, ali se encontravam todos, dezassete, a bordo do barco rabelo que ia descendo o rio. A uma velocidade crescentemente ameaçadora… a julgar pela apreensiva expressão que se vai desenhando no rosto de Joseph James Forrester.
Há já uma semana que o britânico se encontrava, a convite de Dona Antónia Adelaide Ferreira, a “Ferreirinha”, e do seu marido, o milionário Silva Torres, no Vesúvio – a fabulosa quinta que estes possuíam no Douro.
A tragédia aproximava-se e seria descrita assim, magistralmente, por Camilo Castelo Branco:
 
 
 
 
'' A morte desastrosa do barão de Forrester, em 12 de Maio de 1861, é uma das mais notáveis vinganças que o rio Douro tem exercido sobre os detractores dos seus vinhos. A família Ferreirinha da Régua, composta de dona Antónia Adelaide, de seu marido Silva Torres, o milionário, digno de o ser pela bizarria das suas generosidades, de sua filha e genro, condes da Azambuja, tinham ido, rio acima, à sua celebrada quinta do Vesúvio, e convidaram o barão de Forrester a passar uma semana em sua companhia. No dia 12, um alegre domingo, saíram todos do Vesúvio, na intenção de jantarem na Régua. O Douro tinha engrossado com a chuva de dois dias, e a rapidez da corrente era caudalosa. Aproando ao ponto do Cachão, formidável sorvedouro em que a onda referve e redemoinha vertiginosamente, o barco fez um corcovo, estalou, abriu de golpe e mergulhou no declive da catadupa.
O barão sofrera a pancada do mastro quando se lançava à corrente, nadando. Ainda fez algum esforço por apegar à margem; mas, fatigado de bracejar no teso da corrente ou aturdido pelo golpe, estrebuchou alguns segundos de agonia e desapareceu. Salvaram-se os outros, não todos, com a protecção de uns barcos que aí estavam para recolher o despojo de outro naufrágio de um transporte de cereais. Livrou-se Torres, o futuro par do reino, agarrado a um barril de azeite, até que o recolheram a um dos barcos. Dona Antónia e o conde de Azambuja aferraram-se às dragas do barco. A condessa foi salva por um marinheiro. Um juiz de direito, Aragão Mascarenhas, agarrou-se à vara do barco rijamente, qual o temos sempre visto filado à vara da Justiça, em naufrágio de trapaças. Mas nem todos saíram com vida. Um criado de Torres foi logo tragado pela cachoeira; e, abraçada com a vela, já quando se lhe estendia um braço redentor, afogou-se uma criatura a quem os noticiaristas não deram a mínima importância. Pois foi uma perda insubstituível. Era a Gertrudes, um tesouro de jóias culinárias que a voragem engoliu...''.

 
 
Este desastre, pelas circunstâncias em que se deu (Dona Antónia Ferreirinha, que viajava com ele, e mais outras senhoras, salvaram-se graças ao fole das suas saias) e ainda, pelo facto de ter vitimado o Barão de Forrester, foi durante muito tempo motivo de estranhas e singulares versões, tanto mais que o seu cadáver nunca apareceu (dizia-se, na altura, que era usual o Barão carregar muitas moedas de ouro no forro de cabedal do seu largo cinto). Admitiram-se ou criaram-se lendas e fantasias à volta do sinistro Cachão do Douro e, no caso, chegou-se a conjecturar um crime. De tudo, porém, nada se averiguou e nada se provou...
 
 
 

Quinta do Vesúvio, em foto de Emílio Biel, no fim do século XIX
 
 
 

Quinta do Vesúvio
 
 
 

Cachão da Valeira
 
 
 

Barão de Forrester
 
 
 
James Forrester exercia, também, uma actividade comercial associado a familiares, com sede em V. N. de Gaia, na Quinta da Boavista.
 

 
In jornal “O Comércio do Porto” de 21 de Abril de 1858

 
 
In "O Comércio do Porto" de 5 de Maio de 1858




In “Jornal do Porto” de 24 de Dezembro de 1859


 

In jornal “O Comércio do Porto” de 7 de Fevereiro de 1859



Após a morte de James Forrester a sociedade teria sido dissolvida.


 
 

In “Jornal do Porto” de 16 de Janeiro de 1862

2 comentários:

  1. Excelente Américo, ouço histórias do Barão desde miúdo. Naquele género, minha Avó contava que o Avô dela.... Fantástica vida dele em apenas 52 anos...

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    1. É um gosto saber que continuas a apreciar as estórias de Porto de Antanho. Cumprimentos.

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