“Papelaria Araújo
& Sobrinho”
Ao longo dos anos, diversas papelarias implantadas na cidade
passaram, por uma ou outra razão, a fazer parte do imaginário dos portuenses.
Entre muitas, aquela que se destaca por ser, dizem, a mais
antiga ainda em actividade, é a “Papelaria Araújo & Sobrinho”, no Largo de
S. Domingos.
A conhecida “Papelaria Araújo & Sobrinho” tem as suas
origens quando, em 1829, António Ribeiro de Faria, sócio fundador da Associação
Comercial do Porto, funda a firma “Armazém
de Papel do Murinho de S. Domingos”, no Largo de S. Domingos.
A gerência da firma ficou a cargo de Manuel Francisco de
Araújo, um primo do fundador.
Entretanto, para Manuel Francisco de Araújo, começou a
trabalhar um seu sobrinho, Domingos Gonçalves Araújo que, caindo nas graças do
seu tio, em 1866, foi convidado a juntar-se-lhe numa nova sociedade, com a
firma “Manuel Francisco de Araújo & Sobrinho”.
Manuel Francisco de Araújo acabaria por comprar o prédio
onde se instalava a papelaria, no Largo de S. Domingos, num terreno, antes um
quintal de uma casa, expropriado pela Câmara ao Conselheiro Domingos Ribeiro de
Faria, onde foi construído um prédio e, na sua fachada fronteira ao convento,
uma fonte nela incrustada.
Na planta seguinte, aquele terreno está identificado com a
letra D.
Planta, em 1845, de parte do Largo de S. Domingos, na qual o
círculo, à direita, é o local do chafariz de S. Domingos, depois deslocado para
a Cancela Velha e substituído, por estas bandas, pela fonte apresentada na
imagem seguinte, à esquerda
À esquerda, a Fonte do Largo de S. Domingos (que substituiu
um chafariz) e que, a partir de 1845 até aos primeiros anos do século XX,
serviu os portuenses
Ainda, em 1866, por doença de Manuel Francisco de Araújo,
este faz-se substituir por seu filho, Manuel Francisco de Araújo Júnior que com
Domingos Gonçalves de Araújo constituem a firma “Araújo & Sobrinho”.
Será por acção de Manuel Francisco de Araújo Júnior, uma
personagem ligada à vida cultural da cidade, que os artistas plásticos da
cidade passam a frequentar a papelaria para adquirir os materiais que
necessitavam.
Na sua habitação, nos andares superiores do prédio,
sucediam-se as sessões de tertúlia e saraus musicais.
Em 1902, retira-se Domingos Gonçalves de Araújo, que falece
em 1918, e a firma passa a “Araújo & Sobrinho, Sucessor”.
Em 1932, morre Manuel Francisco de Araújo Júnior.
Desde então, a firma, hoje, “Araújo & Sobrinho, Sucessores”,
após atravessar parte do século XIX, todo o século XX e um quarto do século
XXI, vem sendo gerida, como o seu nome indica, por sucessores dos fundadores.
Interior da Papelaria Araújo & Sobrinho, Sucessores
Papelaria Araújo & Sobrinho, Sucessores, em 1948
No local apresentado na foto abaixo, esteve uma sucursal da
Papelaria Araújo & Sobrinho, na Rua dos Clérigos.
Uma outra esteve, durante grande parte do século XX, na Rua
de Santa Catarina, nº 103, em frente ao Café Majestic, nos baixos do prédio
onde, na segunda metade do século XIX, funcionava a “Padaria Faria” fundada por Ribeiro de Faria, em 1865, que habitava
os andares superiores. Os seus herdeiros apenas abandonaram a habitação em
1939.
Nesta casa nasceria Alfredo Ferreira Faria (1867-1930), o
fundador da revista “O Tripeiro”.
A família Araújo, nos nossos dias, explora no local da
antiga papelaria e residência da família, uma moderna unidade de hotelaria.
A Papelaria Araújo & Sobrinho encontra-se no Largo de
São Domingos dividindo espaço com o “A. S. 1829 Porto Hotel”
Assim, após remodelação do edifício em 2015, é Miguel
Araújo, da 5ª geração da família Araújo, que continua o legado da papelaria
“Araújo & Sobrinho, Sucessores”, administrando juntamente com a cunhada
Maria José Fontes e uma prima, Joana Araújo Jorge, já da 6ª geração, um pequeno
espaço com artigos de papelaria, característicos, que divide com “Porto A.S.
1829 Hotel” e o “Restaurante Galeria do Largo”.
«Manuel Francisco de
Araújo, trisavô de Miguel, foi um dos primeiros portuenses a meter-se num barco
a vapor e ir a Inglaterra fazer compras para a colónia de ingleses, que era
quem tinha dinheiro aqui na altura.
“O centro do Porto era
aqui. Ele começou com uma loja de bricabraque, vendia sabonetes,
água-de-colónia, chocolates e instrumentos musicais porque a papelaria
resumia-se a papel, tinta e pena. A papelaria pura e dura eram esses três
artigos. A papelaria cresceu imenso depois, mas praticamente desapareceu com a
informática. Deixou de fazer sentido.”
Miguel nasceu no
edifício de seis pisos. “Vem do meu trisavô. O meu bisavô ergueu o edifício
porque a loja era pequena. Quando o meu pai se casou, o meu avô fez uma
remodelação e construiu um apartamento maravilhoso. Era a nossa casa, uma casa
fantástica”, conta o bisneto, neto, filho e protector da marca Araújo &
Sobrinho que vive nas paredes, nos corredores, nas escadarias e nas gavetas do
Porto A.S. 1829 Hotel, há sensivelmente um ano no Largo São Domingos, no Porto.
Nos três últimos pisos viveram vários ramos da família. A “casa fantástica”,
recorda Miguel, olhos vidrados, tinha “quartos gigantes”... “Depois descíamos e
tínhamos a casa dos nossos avós que era maior ainda. E descíamos mais ainda e
tínhamos a sala de armas, a biblioteca, o salão de jogos... E depois a loja. Eu
era miúdo, havia a porta do cavalo, que era uma passagem directa para a loja,
onde chegaram a trabalhar cerca de 150 funcionários. Ainda existiam as
oficinas, a gráfica, a serralharia, a carpintaria... Era um mundo, fazia-se
tudo aqui”».
Testemunho de Miguel Araújo; Fonte Site: “fugas.publico.pt”
No Largo de S. Domingos, existiu uma imagem de Santa
Catarina colocada num nicho aberto na fachada de um prédio já desaparecido e
que ornando uma pequena fonte, estava na frontaria de um prédio existente num
recanto voltado para a Rua das Flores. Aliás, em 1728, a imagem já lá estaria.
A imagem de Santa Catarina recolheu depois ao interior da
Papelaria Araújo & Sobrinho adornando a denominada Fonte de Santa Catarina.
Ocupando o hall de entrada do “Porto A.S. 1829 Hotel”, com
um pequeno espaço de venda ao público de artigos de papelaria, pode observar-se
que a memória da Fonte de Santa Catarina e a imagem de Santa Catarina a ela
associada foram preservadas.
Papelaria Reis
A Papelaria Reis nasceu na Rua do Almada, em 1865, tendo
sido seu fundador Manuel Alves dos Reis. Por morte deste, sucedeu-lhe na
administração do negócio seu filho José Alves dos Reis, que Carlos Bastos
biografou no "Livro de Ouro do Comércio e Indústria do Porto".
A transferência da Papelaria Reis para a Rua das Flores
ocorreu em 1907. Mas não foi logo para o sítio onde esteve a casa que foi de
João de Barros, o autor da Geographia
de Entre Douro e Minho, genro do reverendo Martinho do Couto, que a
construiu na primeira metade do século XVI.
Instalou-se, primeiro, no prédio com os números de 21 a 25,
onde já funcionava um estabelecimento do mesmo ramo - a Papelaria Rebelo, que
havia sido fundada em 1877 por João Vieira Rebelo.
Foi só, muito mais tarde (Dezembro de 1931), que a Papelaria
Reis se mudaria para o prédio com a numeração de 150 a 160, em local anteriormente
ocupado pela residência do reverendo Couto, uma casa tipicamente de estilo
manuelino que, na sua fachada, exibia uma imagem de São Miguel significando,
assim, que era foreira do Cabido.
Casa do reverendo Couto demolida no dealbar da segunda
metade do século XIX. Desenho (1908) de Karl Albrecht Haupt
Na foto anterior, entre o nº 150 e 160 da Rua das Flores, o
local onde esteve a casa do reverendo Couto e, mais tarde, num novo prédio,
sucessivamente, a família Fortuna, a União Commercial e a Papelaria Reis.
Aquele prédio haveria de ser, então, a morada da família
Fortuna, estando os baixos do mesmo ocupado por uma papelaria e livraria,
explorada pelo comerciante João de Freitas Fortuna Júnior, ao qual sucedeu no
negócio seu filho João António de Freitas Fortuna.
Esta personagem era irmão do Dr. Vicente Urbino de Freitas e
amigo do escritor Camilo Castelo Branco recebendo, assiduamente, a sua visita.
Antiga morada da família Fortuna e da sua livraria ocupada
por estabelecimento da União Comercial, c. 1890. A partir de 1931, aqui se
instalou a Papelaria Reis – Fonte: CPF
Papelaria Peninsular
Foi pela mão de Valentim Ribeiro Gonçalves Basto,
natural de Padronelo – Amarante, que nasceu a denominada “Typographia
Peninsular”, hoje, Peninsular – Papelaria e Artes Gráficas. Com instalações, à
data da fundação, na extinta Rua de São Crispim, números 18 e 22.
Depois, até hoje, na Rua Mouzinho da Silveira.
Papelaria Peninsular, na Rua Mouzinho da Silveira
“A fundação data de
1905, mas Valentim Ribeiro Gonçalves Basto abriu a Typographia Peninsular em
finais do século XIX. Aliás, a brochura “A minha defesa” de António
Vasconcellos foi inteiramente composta na tipografia e faz parte do espólio
mais antigo deste estabelecimento. É também na capa da revista Algazarra, de
agosto de 1902, que surge, pela primeira vez, uma referência à tipografia. No
entanto, é na data da fundação que se adiciona a papelaria à tipografia, que
permitiu a expansão do negócio. Em 1928, por falecimento do fundador, a
Peninsular passa para as mãos da sua esposa, filha e genro, que imprimem um
dinamismo e tornam este estabelecimento num espeço de referência. É desta
altura que advém o seu slogan “Não perca tempo a pensar… compre na Peninsular”.
Atualmente, a empresa vai na quinta geração da família e continua atual, sendo
uma referência no setor”.
Fonte: comerciocomhistoria.gov.pt
Sucessivamente, na mão da mesma família, actualmente, é José
Eduardo Barbedo (4° geração) e Diogo Barbedo (5° geração) que estão no comando
da empresa, que continua a ser uma referência no sector.
Outras papelarias
portuenses
Papelaria Académica
A Papelaria
Académica atravessou, na Praça da Batalha todo o século XX. Era conhecida pela
qualidade das canetas de tinta permanente que vendia aos seus balcões.
Em 1 de Dezembro de 1901, anunciava no jornal “A Voz
Pública” os seus serviços, como se pode observar a seguir.
Papelaria Académica, localizada entre os cinemas Águia d’Ouro e
Batalha, exibindo o seu icónico reclame às canetas Pelikan
Papelaria Papélia
Na Rua de Santa Catarina, desde da década de 1930, fronteiro
ao Café Majestic e, durante muitos anos, vizinha da sucursal da Papelaria
Araújo & Sobrinho esteve a Papelaria Papélia.
Papelaria Progresso
Na esquina das ruas de Santa Catarina e António Pedro
esteve, durante várias décadas, a Papelaria Progresso.
Presentemente, encontra-se numa loja na Rua Antónia Pedro, a
poucos metros da loja primitiva.
Papelaria Modelo
A Papelaria Modelo situou-se, desde 1921, no Largo do Lóios,
nº 76. Possivelmente, vinda da Praça de Carlos Alberto, conforme se pode
observar no anúncio inserido no jornal “A Voz Pública” de 1 de Dezembro de
1901.
Teria ocupado, então, as instalações da Papelaria dos Loyos
- Costa & Carvalho, na mesma morada.
Papelaria Azevedo
À direita, a Papelaria Azevedo, no Largo dos Lóios, em duas
épocas distintas
A papelaria Azevedo haveria de dar lugar ao Café dos Lóios.
Papelaria Sousa
Ribeiro
“A M. Sousa Ribeiro…Nasceu
em 1956, exactamente na Rua Sá de Bandeira, pela mão de Manuel Sousa Ribeiro,
pai dos actuais sócios. Na altura, era uma papelaria e chamava-se, apenas,
Sousa Ribeiro. Mais tarde, o dono decidiu especializar-se num ramo do negócio
para escapar às dificuldades económicas. Surge, assim, a M. Sousa Ribeiro,
especializada em artigos artísticos, na Rua Sampaio Bruno”.
Fonte: jpn.up.pt
Nas antigas instalações do Excelsior Café abriu, em 2008, a
M. Sousa Ribeiro, empresa que deriva da primitiva Papelaria Sousa Ribeiro e
que, até então, ocupava instalações na vizinha Rua Sampaio Bruno.
Interior da Papelaria M. Sousa Ribeiro, nas instalações do antigo café Excelsior, no qual o espaço era
composto por duas partes separadas por degraus
A partir de Dezembro de 2016, as instalações da Papelaria M.
Sousa Ribeiro, na Rua de Sá da Bandeira, seriam ocupadas pela empresa internacional
do ramo óptico, Leica.
A Papelaria M. Sousa Ribeiro acabaria por ocupar uma loja na
Praça Guilherme Gomes Fernandes.
Papelarias diversas
Papelaria Guimarães
Papelaria Pirata
Ao Bonfim, a Papelaria Pirata, ainda de portas abertas,
serviu os estudantes dos Liceus Alexandre Herculano e Rainha Santa Isabel,
desde sempre.
Papelaria Nelita
A Papelaria Nelita não resistiu à pressão turística e
encerrou já na segunda década do século XXI.
Papelaria Fidélia
Ainda, na Rua de Santa Catarina, nº 293, a Papelaria Fidélia,
desde 1968 serviu os portuenses pela mão da família Fontes. Antes, o serviço
foi prestado pela família Machado.
Em 2017, não resistiu à pressão urbanística e Fátima Fontes
encerrou o estabelecimento.
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