sábado, 14 de setembro de 2024

25.251 Passagens do Imperador D. Pedro II do Brasil pela cidade

 
Em 1 de Março de 1872, D. Pedro II (1825-1891), imperador do Brasil, começa uma visita à cidade do Porto, acompanhado pela imperatriz, D. Teresa Cristina Maria de Bourbon.
O imperador D. Pedro II do Brasil era filho do Imperador D. Pedro I do Brasil (Rei D. Pedro IV de Portugal) e de Maria Leopoldina.
Sobe ao trono, em 1841, tendo o Brasil, durante 1831 e 1840, vivido o chamado “Período Regencial”, já que D. Pedro I, seu pai, tinha abdicado e ele ainda era menor de idade.
No Porto, a comitiva irá ficar alojada, no Hotel do Louvre, à Rua do Triunfo (Rua D. Manuel II) que, para o efeito, foi alvo de diversas remodelações por parte da sua proprietária, D. Henriqueta Alvellos.
O primeiro andar do Hotel foi destinado aos Imperadores, e o segundo para a sua comitiva.
 
 
 

D. Pedro II, em 1870, com 45 anos de idade
 
 
 
Aquela estadia ficaria para a história, entre outros factos, pela situação de embaraço criada, quando o imperador, influenciado pelo cônsul do Brasil, no Porto, achando especulativa a conta apresentada, se recusou a liquidá-la. Um escândalo!



 

Fachada do prédio, voltada para a Rua do Rosário, onde esteve o Hotel do Louvre

 
 
A dona do hotel, após decisão de um tribunal lhe ter dado razão, ao fim de 5 anos, na acção judicial que, entretanto, correu, haveria de embarcar num navio para o Brasil, tentando resgatar a conta  de mil libras em dívida.
Para obstar ao escândalo, quatro ricos portugueses, residentes no Brasil, pagariam do seu bolso a dita maquia.
A visita acontecida em 1872, à cidade do Porto, começaria a ser preparada alguns meses antes.
Assim, em 25 de Maio de 1871, D. Pedro II e a sua mulher D. Teresa Cristina de Bourbon (1822-1889) partem do Rio de Janeiro no paquete Douro.
Chegados a Lisboa a 12 de Junho, permanecem de quarentena obrigatória no Lazareto, tendo recusado a oferta de D. Luís para o fazerem na corveta portuguesa Estephanea.
Finda a quarentena, instalaram-se no Hotel Bragança até à partida no caminho-de-ferro para uma digressão pela Europa, em Junho de 1871. Visitaram Espanha, França, Inglaterra, Alemanha, Áustria, Itália e o Egipto.
No fim do dia 29 de Fevereiro de 1872, estão na fronteira espanhola e no comboio do correio dirigem-se para o Porto, tendo desembarcado na estação das Devesas, em V. N. de Gaia, pelas 7,30 horas da manhã, do dia 1 de Março, 6ª Feira, onde são recebidos pelas autoridades, seguindo-se o atravessamento do rio Douro e, finalmente, a cidade do Porto.

 
 

Ponte Pênsil sobre o rio Douro. Na chegada do Imperador, duas linhas de bandeiras tremulavam nas guardas da ponte - Foto: Calótipo de Frederick William Flower
 
 
 

Arco Triunfal, ao cimo da Rua de S. João, no percurso do Imperador D. Pedro II, após atravessar o rio Douro, vindo das Devesas e da Ribeira onde esteve montado um elegante pavilhão

 
 
 

Largo da Feira de S. Bento (com a Igreja dos Congregados, em fundo), e o pavilhão montado e devidamente preparado para receber o Imperador em 1872



 
Arco Triunfal, na Rua dos Clérigos, com o palacete das Cardosas, à esquerda

 
 
Os Imperadores do Brasil, entraram na cidade em carro descoberto, tendo as tropas apresentando armas.
Uma breve homenagem, ainda nas Devesas, foi feita ao filho do Imperador-Soldado, numa alocução redigida por João Luís de Melo e entregue a S.M., e assinada por antigos soldados que combateram com seu Pai.
Alojada a comitiva no Hotel do Louvre, depois de desfilar pelas ruas da cidade, ornamentadas com seus arcos triunfais, e terminado o almoço, seguir-se-ia a visita à cidade.
A jornada começaria pela presença numa missa na Lapa às 11h.
Depois, visitaram a Bolsa, a Igreja dos Franciscanos, a Misericórdia e, aí, apreciaram o quadro (Fons Vitae) dessa instituição, o Ateneu Portuense e a Academia Portuense de Belas-Artes, onde foram recebidos pelo subinspetor Conde de Samodães.
Durante a visita à Academia Portuense de Belas Artes, sedeada no extinto convento de S. Lázaro, D. Pedro II procurou conhecer os pintores Francisco Rezende e João Correia e as suas obras, pelo prestígio que tinham, entretanto, adquirido.
Disso, nos dá conta o texto seguinte:
 
 
“Depois de reparar no mau estado em que se acha o edifício, cuja reparação compete à camara municipal da cidade, subiu às aulas da Academia, e ahi notou os quadros dos srs. Francisco José Resende e João António Corrêa, que elogiou, perguntando pelo primeiro, o qual se não achava presente. Mais tarde foi o sr. Resende recebido no hotel do Louvre, aonde foi offerecer-lhe dois quadros, um de costumes, outro com o retrato del-rei o sr. D. Luiz.”…
In Viagem dos Imperadores do Brasil em Portugal. Imprensa da Universidade. Coimbra 1872. (pág.103)
 
 
Entretanto, no Jornal “O Primeiro de Janeiro” de 3 de Março de 1872 dizia-se a propósito daquela visita:
 
 
Hontem, pelas 7 horas da manhã foi o snr. Resende collocalos na sala de espera do hotel do Louvre, e quando procedia áquella operação, entraram na sala o snr. D. Pedro II com os snrs. Marquez de Ficalho, Andrade Corvo e seu secretario António Sampaio, os quais não só muito elogiaram os quadros como também dirigiram affectuosissimas palavras ao notável artista. Suas magestades querem que aquellas pinturas vão já na sua companhia para o Rio de Janeiro.
 
 
 

“Pescadores numa Praia” (1887), com perspectiva sobre a praia de Matosinhos - Óleo sobre tela 95 x 145 cm, de Francisco José Rezende, exposto no Palácio Nacional de Queluz
 
 
 
Os Paços do Concelho e a Igreja dos Clérigos foram os alvos seguintes da imperial comitiva.
Às 7h, houve recepção de diversas autoridades no Hotel do Louvre.
Na oportunidade, uma delegação de Estudantes Brasileiros no Porto, foram entregar e ler uma mensagem a S.M.I., D. Pedro II.
Às 9h, aconteceu um espectáculo no Teatro Bacquet. S.M. manifestou, então, desejos de falar a Camilo Castelo Branco.
Durante a noite a cidade esteve iluminada, nomeadamente, a Praça D. Pedro, o edifício da Câmara, a Rua de Santo António e as escadas da igreja de Santo Ildefonso, arco dos Lóios e o pavilhão da Feira de S. Bento.
O dia seguinte, 2 de Março, um Sábado começou cedo, tendo o imperador visitado, na companhia do marquês de Ficalho, a Foz, Leça e Matosinhos.
Antes, pelas 7 horas da manhã, já o pintor Francisco Rezende tinha deixado no Hotel Louvre as pinturas que se destinavam ao Imperador.
Na Foz, D. Pedro II visitou o Salva-Vidas e o Castelo da Foz, a que se seguiu a fortaleza da Serra do Pilar.
A Escola Politécnica, o mercado do Anjo, o Instituto Industrial, o mercado do Bolhão e a fábrica da Companhia de Fiação Portuense, ao Campo 24 de Agosto, foram também alvo da atenção de D. Pedro II.
E, era chegado o momento da visita a Camilo Castelo Branco.
Antes, D. Pedro II tinha feito, um convite ao escritor Camilo Castelo Branco para que o visitasse, no Hotel do Louvre, para o agraciar com a Ordem da Rosa.
O escritor declinou o convite, dizendo-se doente, mas o imperador toma, então, a decisão de ser ele a dirigir-se a casa do enfermo, a S. Lázaro.
 
 
 

Na primeira casa, à esquerda, a S. Lázaro, morava Camilo, quando foi visitado pelo Imperador D. Pedro II, em 1872

 
 
Só após treze anos decorridos sobre esta visita, o decreto que fez Camilo, Visconde de Correia Botelho, acabaria por ser assinado, por D. Luís, a 18 de Junho de 1885.
Antes do jantar, ainda foi visitado o Hospital de Santo António, a Escola Médico-Cirúrgica e o Museu Municipal da Rua da Restauração.
Após aquele repasto, houve recepção ao corpo consular e pelas 9 horas no Teatro S. João subiu ao palco a ópera “Poliuto”, uma tragédia lírica de Gaetano Donizetti.
Após passar dois dias completos, no Porto, a comitiva imperial, logo no dealbar da madrugada de 3 de Março, um Domingo, parte para Braga, pernoita em Barcelos e, no dia seguinte, estavam outra vez na estação das Devesas, onde foram apresentados os cumprimentos das autoridades. Seguir-se-ia a visita a Coimbra e a chegada a Lisboa com hospedagem no Hotel Bragança, depois de passagem por Leiria, Alcobaça, Caldas e Batalha.
 
 
 
O regresso à cidade do Porto
 
 
O imperador D. Pedro II e a imperatriz D. Teresa Cristina Maria de Bourbon haveriam de retornar à cidade do Porto, alguns anos mais tarde, embora em situação nada festiva.
Em 1889, aqui chegavam para se exilarem, em consequência da implantação da República no Brasil.
Seria no Grande Hotel do Porto, na Rua de Santa Catarina, que se hospedaram e, num dos seus quartos, que a imperatriz morreu, no começo da tarde do dia 28 de Dezembro de 1889, quando D. Pedro II realizava uma visita de cortesia à Escola Portuense de Belas Artes, a S. Lázaro.
Nos tempos que se seguiram, o imperador exilado irá ser alvo de diversos actos de grande amizade, cujo protagonista foi o conde de Alves Machado, nomeadamente, custeando as despesas de funeral da imperatriz e auxiliando, pontualmente, o imperador na sua estadia em Paris.
O conde Alves Machado foi a personagem que se destacou, para sempre, por ter vivido cerca de quarenta anos no Hotel Francfort, sendo dono de um magnífico palacete na Praça da República, que ainda hoje existe, mas em completa ruína.
 
 
 
Antecâmara da visita de D. Pedro II a Camilo Castelo Branco
 
 
Alguns dias antes da visita de D. Pedro II à sua casa em S. Lázaro, por uma questão de deferência para com o imperador, tinha Camilo Castelo Branco dado ordens à sua editora para parar com a impressão do seu romance “A Infanta Capelista” que tinha por tema central o tráfico negreiro efectuado pelos portugueses, no Brasil.
A Casa de Bragança era também criticada.


 
 

Um dos 50 exemplares (Edição fac-similada) mandado reproduzir, em 1952, no Porto, pela Livraria Moreira da Costa, filha – Cortesia do Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro

 
 
Em meados do século XX, tendo conseguido reconstituir um exemplar completo, a Livraria Moreira da Silva-Filha vai publicar uma edição fac-similada de 50 exemplares da “Infanta Capellista” sendo, por isso, processada por Flora Augusta Castelo Branco Vilaça, neta de Camilo Castelo Branco, que vem a ganhar o processo e é indemnizada em 18.500 escudos, em sentença proferida em 12 de Janeiro de 1959.
No processo judicial se narrava o modo como a Livraria Moreira da Costa tinha feito a reconstituição da obra literária:
 
 
“raríssimos exemplares escaparam à destruição ordenada, nomeadamente, as folhas impressas, dadas por Camilo, como papel velho, a um barbeiro, tendo-se conseguido pelo menos reconstituir um exemplar completo e depois, com a reconstituição imprimiu alguns exemplares.”
 
 
Ainda no ano de 1872, a Livraria Ernesto Chardron vai publicar, poucos meses após a destruição de “A Infanta Capelista”, a obra “O Carrasco de Vítor Hugo José Alves”, romance cujos personagens e história seguiam o rumo de “A Infanta Capelista”, com as poucas alterações que o escritor decidiu introduzir.
Eram, entre outros, seus alvos, os brasileiros de torna-viagem e antigos negreiros, Manoel Pinto da Fonseca e Joaquim Pinto da Fonseca.
Em 1916, a Livraria Lello publica, em reedição, “O Carrasco de Vítor Hugo José Alves”.

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