No dia 7 de Maio de 1943, o “Jornal de Notícias” informava
os seus leitores de que o lançamento da “mulher do padeiro”, efectuado no dia
anterior, tinha sido um grande êxito e se tinha instalado, em sequência, o “fim
do mundo” na baixa portuense.
A “mulher do padeiro”, uma boneca, depois de lançada de uma
avioneta, tinha caído no telhado da casa da Rua de Santo António, nº 190.
Um idoso, correndo risco de vida, vai apanhá-la e oferece-a
à sua neta Maria Odete, de 4 anos.
Pouco depois, uma delegação composta pela menina, o seu pai,
Artur O. de Vasconcelos, proprietário do Mercado Filatélico do Norte, e o seu
“priminho” Aníbal, dirigiram-se à sede do “Jornal de Notícias” onde receberiam
das mãos do sub-director do periódico, a quantia de 1000 escudos contra a
entrega da boneca.
Maria Odete pouco se interessou pelo que se passava à sua
volta, apenas pretendia que não lhe tirassem a boneca.
Na ocasião, uma multidão aguardava à porta da sede do
jornal, na Avenida dos Aliados, pelo desfecho da cerimónia e aplaudia os
sortudos.
Tudo tinha começado uns meses antes, quando o “Jornal de
Notícias” começava a divulgar um concurso, mais precisamente, no dia 11 de
Fevereiro de 1943, anunciando o concurso “Bonecos
Animados”, com início daí a dias.
Consistia o concurso na recolha pelos leitores de uns
quadradinhos de uma estória, que seriam impressos diariamente e que teriam que
ser recortados conjuntamente com a legenda respeitante à cena do quadradinho, impressa
na penúltima página do periódico, sendo esse conjunto colado numa caderneta
vendida na sede do “Jornal de Notícias”. Quando completada, a caderneta seria
trocada por senhas numeradas que dariam acesso a um sorteio de prémios que,
nessa primeira série, subiam aos 1000 contos.
O primeiro quadradinho seria impresso a 21 de Março, num
Domingo, traduzindo-se por um enorme êxito.
Passaram, então, a fazer parte do quotidiano dos portuenses
as personagens “Mulher do Padeiro”, “Padeiro”, “Alcinda”, “Mete o Nariz em
Tudo”, “Pipocas”, “Aninhas da Ribeira”, “31”, “Amola a Faca” e três regateiras
do Mercado do Bolhão (“Micas”, “Maria Rita e “Maria Augusta), entre outras.
Foram milhares os participantes, de tal modo que começou a
ser perspectivada uma segunda série e sucedendo-se a procura desenfreada por
jornais publicados em dias anteriores.
Dado o êxito do concurso, a lista de prémios aumentava todos
os dias pela adesão de inúmeras casas comerciais da cidade, que
disponibilizavam toda uma diversidade de artigos.
Em grande número, os prémios referiam-se a artigos de
mercearia ou para o lar, mas não só.
Assim, constava da lista mobílias, galináceos, porcos,
cabazes de alimentos e até “um almoço de
Domingo, durante seis meses, no Restaurante do Palácio de Cristal”.
De acordo com a mecânica do concurso, a busca da legenda do
quadradinho, feita na penúltima página, a da publicidade classificada do
jornal, permitia o contacto dos participantes com as firmas aderentes.
Nas semanas seguintes, os leitores estavam identificados com
as personagens; os responsáveis pelo jornal encenavam entrevistas às
personagens da série “Bonecos Animados”
que, era, na prática, uma história de banda desenhada.
Assim, o “Jornal de Notícias”, em 4 de Maio, escrevia, como
introdução a uma entrevista totalmente encenada à “Mulher do Padeiro” que, no
argumento da história, andava pela capital:
“É grande o entusiasmo
na cidade do Porto pela descida na Avenida dos Aliados ou Praça da Liberdade,
em paraquedas da “Mulher do Padeiro”, que, conforme vimos anunciando se
realiza, depois de amanhã das 18 para as 19 horas.
A “Mulher do Padeiro”
que descerá, depois de amanhã das 18 às 19 horas, em paraquedas na Avenida dos
Aliados falou ao “Jornal de Noticias”.
A gentil e encantadora
protagonista dos “Bonecos Animados” que se encontra hospedada num dos melhores
hotéis de Lisboa, recebeu, ontem, um dos nossos redactores que,
propositadamente, a foi ouvir sobre a sua próxima viagem à capital do Norte, em
avião gentilmente cedido pelo Aero Club do Porto e pilotado por distinto
aviador (…)”.
À introdução, acima expressa, seguia-se uma série de
perguntas e respostas.
Preparava-se, então, o dia do lançamento em paraquedas da
“Mulher do Padeiro”, que desceria na Avenida dos Aliados, a partir de uma
avioneta, supostamente vinda da capital.
Em 5 de Maio, o “Jornal Notícias” publicava em anúncio de
1/4 de página:
O êxito do concurso obtido e os proventos inerentes foram
tais, que o “Jornal de Notícias” haveria de promover uma segunda série dos “Bonecos Animados”, pelo que, no dia 25
de Maio de 1943, encenava a chegada à Estação Ferroviária de S. Bento, apeados
do rápido oriundo da capital, as personagens (actores) que desfilaram em carro
aberto sob os aplausos de uma multidão de portuenses.
Após a comitiva se ter dirigido para a sede do “Jornal de
Notícias”, na Avenida dos Aliados, proceder-se-ia ao sorteio, entre aqueles que
se tinham apresentado a concurso, de três Libras em ouro.
Também se disse que, nessa ocasião, o “Padeiro” e a Mulher
do Padeiro caíram nos braços um do outro, para gáudio do povo.
A opereta “A Mulher
do Padeiro”
O Porto não iria ver-se livre da “Mulher do Padeiro”.
No início de 1944 vai estrear, no Teatro Sá da Bandeira, a opereta
popular em 2 actos e 7 quadros, a “Mulher do Padeiro”.
Um original de Arnaldo Leite e Campos Monteiro e a
ilustração associada de Cruz Caldas.
Os autores aproveitavam a onda.
As interpretações estiveram a cargo de Mirita Casimiro
(Fininha), Vasco Santana (Tibério), Costinha (Firmino), Luíza Durão
(Miquelina), João Perry, Domingos Marques, Zita Trindade, Maria Mesquita,
Carlos Viana, João Pio e Peggy & Humberto.
Costinha, Luísa Durão, Vasco Santana e Mirita Casimiro,
caracterizados para os seus personagens: Firmino, Miquelina, Tibério e Fininha
– Col. Museu Nacional do Teatro
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