sexta-feira, 17 de maio de 2024

25.239 Santa Mafalda e a cidade do Porto

Em tempos em que o senhorio da cidade era pertença dos bispos, D. Mafalda haveria de ficar ligada à cidade em virtude de um acordo feito com o bispo D. Pedro Salvadores, que possibilitou a construção do convento de S. Domingos, o que originaria, para sempre, o topónimo dado ao largo fronteiro.

 
 

Por aqui, esteve o convento de S. Domingos, alvo de um incêndio, em 1832, e do qual apenas restou a fachada voltada para o Largo de S. Domingos

 
 

Largo de S. Domingos, em 1880

 
 
Este prelado tinha convidado os frades dominicanos a estabelecerem-se na cidade para fazerem o contra-ponto aos frades franciscanos que na cidade se tinham fixado com a ajuda dos portuenses, ignorando-o.
Sentindo-se despeitado, o bispo ofereceu um terreno aos dominicanos, em Belomonte, bem perto da morada dos franciscanos, para aí se estabelecerem.
Não demorou muito, no entanto, que as partes de desentendessem.
Seria, então, por interferência de D. Mafalda, que pela região possuía uma imensidão de terras, que a contenda seria dirimida.
D. Mafalda, nascida em Penafiel, em 1195 ou 1196, teria, então, por possível interferência papal, conseguido que o bispo libertasse a autorização para que os dominicanos continuassem a construção do seu convento, doando ao prelado a igreja de Santa Cruz de Riba Leça e área anexa, situado em Bouças.
D. Mafalda, também conhecida como a Rainha Santa, era a filha preferida de D. Sancho I e uma das irmãs de D. Afonso II e neta de D. Afonso Henriques.
Assim, ainda recém-nascida, recebeu como uma prenda de seu pai o Mosteiro de Bouças (hoje Matosinhos).
Por falecimento precoce de sua mãe D. Dulce de Aragão, seria educada por D. Urraca Viegas, filha de Egas Moniz e Teresa Afonso.
Por morte de Sancho I, D. Mafalda herdaria um imenso património que se encontrava disperso por todo o reino, incluindo-se Marco de Canavezes, Lamego, Arouca, Seia e, ainda, a região do Vale do Sousa.
Do seu pai tinha já recebido, ainda recém-nascida, o Mosteiro de Bouças (hoje Matosinhos).



Localização actual do antigo Mosteiro de Bouças a partir do qual nasceu Matosinhos – Fonte: Google maps


 
 

Entrada do Mosteiro de Bouças (em ruínas), c. 1900, na Quinta do Passal
 
 
 
 
Após a morte do seu progenitor, em Março de 1211, D. Mafalda recebeu o mosteiro de Arouca e, dado que, aquando do falecimento de sua mãe, ela não tinha feito qualquer testamento, as propriedades da rainha defunta, por determinação de D. Sancho I, passariam, por sua final e última vontade, para três das suas seis filhas: Teresa, Sancha e Mafalda.
Tal decisão viria a provocar um litígio entre o rei D. Afonso II e as irmãs atrás referidas.
Teresa e Sancha veriam a situação resolvida, apenas, quando D. Sancho II se tornou rei. No caso de Teresa estava em causa Montemor-o-Velho e no de Sancha, Alenquer.
No que dizia respeito a Mafalda, a questão que subiria a decisão do Vaticano, centrava-se, principalmente, com a vila de Seia e mais remotamente com Bouças.
Desconhece-se até que ponto a mediação encetada por D. Mafalda, entre o bispo do Porto e os dominicanos, não tenha uma possível relação com uma tentativa de aproximação ao Vaticano, no seio do conflito que a opôs ao seu irmão.
Em 1230, D. Mafalda a exemplo do que tinha feito com o mosteiro de Arouca, com a autorização do bispo de Lamego, voltou-se para o mosteiro beneditino de Bouças e transformou-o, também, numa comunidade Cisterciense.
Diga-se que, relativamente a Bouças, mais tarde e após litígio (mediado pelo Papa) com o seu irmão D. Afonso II, viria a perder a favor do reino a posse de Bouças que, entretanto, tinha sido dada anteriormente em doação, à Ordem do Hospital.
Tendo vivido D. Mafalda no convento de Arouca, veio a morrer no convento de Rio Tinto aos 90 anos por doença, aquando de uma sua visita em peregrinação ao Porto, diz-se em veneração à Nossa Senhora da Silva, com culto na Sé do Porto, onde deixava enormes oferendas.
D. Mafalda, senhora de uma fortuna imensa, teria um funeral, entre Rio Tinto e Arouca, onde ficou sepultada, que continua a estar assinalado nos dias de hoje.
Não havendo uma unanimidade entre os historiadores, os memoriais ou marmoirais da Ermida (Penafiel), Sobrado (Castelo de Paiva), Alpendorada (Marco de Canaveses), Lordelo (já desaparecido, em Baião) e Santo António (Arouca), estarão, segundo a lenda, relacionados com D. Mafalda.
São tradiccionalmente referidos como pontos de paragem no traslado do seu corpo de Rio Tinto para o Mosteiro de Arouca, ou como locais de homenagem à sua vida e obra.
A configuração dos marmoirais comporta, normalmente, um arco, verificando-se uma excepção para o caso de Sobrado (Castelo de Paiva).
 
 
 
 
Memorial da Ermida – Fonte: CM Penafiel


Memorial de Sobrado – Fonte: CM Castelo de Paiva




Quinta dos Bispos
 
 
O território entregue por D. Mafalda ao bispado do Porto haveria de ser convertido por D. Rodrigo Pinheiro, entre 1552 e 1572, num local de repouso e divertimento para ele e seus sucessores.
 
 
“O bosque, o rio Leça, as ramadas, as múltiplas fontes, cascatas, ermidas, capelinhas e elementos escultóricos mandados erigir por ele, assim como a magnífica casa contribuíram significativamente para o sucesso do projeto.
Durante os séculos seguintes os bispos do Porto aí encontraram um refúgio acolhedor. E, com eles, entraram na quinta alguns dos mais destacados homens de letras e artes dos seus tempos. Eis alguns exemplos: D. Rodrigo da Cunha, Manuel Faria e Sousa, frei Bartolomeu dos Mártires ou frei Luís de Sousa.
Entre 1741 e 1752 o famoso arquiteto italiano Nicolau Nasoni é responsável por uma série de intervenções na Quinta por encomenda do bispo D. José Fonseca e Évora. É assim que surge, entre outros elementos arquitetónicos, a belíssima entrada barroca voltada para o Largo da Igreja.
Infelizmente este é um dos poucos elementos que se pode contemplar uma vez que desde 1939, após várias décadas de abandono, pilhagem e destruição, este foi transformado em colónia penal, encontrando-se inacessível ao público.”
Fonte: CM Matosinhos
 
 

Largo da Igreja, fronteiro à entrada para a Quinta dos Bispos
 
 
 
 

Obras, em 1933, de adaptação da Quinta de Santa Cruz do Bispo a Cadeia Civil do Porto



 



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