segunda-feira, 16 de julho de 2018

(Continuação 11)


Revolta dos marceneiros

“Em 1836 o convento de S. Domingos, segundo Artur Magalhães Basto, servia para armazém de diversos produtos da Alfândega. Estas instalações seriam invadidas quando naquele ano ocorreu a revolta dos marceneiros, que visou a destruição de mercadoria estrangeira importada. Durante aquela revolta vários estabelecimentos que comercializavam foram assaltados e a mercadoria destruída, tendo-se salvado os armazéns principais da Alfândega porque alguns funcionários da mesma as defenderam até à chegada de reforços policiais.
Vamos primeiro contextualizar: estamos em meados de 1836. O país vai ainda no início da sua caminhada pela monarquia liberal, que só estabilizara realmente cerca de quinze anos depois. A cidade passa por um período de grande aperto alimentar com a falta do cereal, matéria-prima do pão, ao mesmo tempo que o comércio nesta secular cidade comercial se vai abrindo aos bens comprados no estrangeiro. Ora, se eu tenho fome mas não consigo vender os bens que produzo por não conseguir competir com a concorrência... (isto sou eu a colocar-me na pele de um artesão português da época); Entram agora os tumultuários (que não se lhes pode chamar revoltosos)…
Com o devido crédito A Nuno Cruz Adm. do Blogue “A Porta Nobre”



 “Houveram ontem sérios tumultos nesta cidade, mas nenhuma cor política os acompanhava – era a miséria e a fome a guerrear a indolência do Governo. É este o caso.
Souberam os sambladores que estavam desembarcando de um brigue hamburgês muitos trastes, como mesas, cómodas, relojos (sic), pianos, e outras cousas de mão-de-obra estrangeira. Foram ter-se com o Exmo. Governador Civil, representando-lhe que desse as providências necessárias para cessar o desembarque de similhantes móveis que vinham fazer a sua miséria, por virem empatar a venda dos nacionais, e sujeitar por conseguinte milhares de pessoas há morte. Sossegou-os o Exmo. Governador Civil dizendo-lhes que não podia violar a Lei suspendendo o desembarque, mas que estivessem certos que iria representar a S. M., e que havia de obter o remédio para os seus males. Partiu o povo, mas este que não atende à lei quando a necessidade urge, foi fazer ao Ilmo. Administrador da Alfândega a mesma petição que ao Exmo. Governador Civil tinha feito, no que também não foi atendido.
Exasperaram-se então os pretendentes, e determinaram fazer-se justiça por suas próprias mãos. Foram às barcas que conduziam os móveis, e quebraram toda aquela quinquilharia, não deixando um cavaco direito. - Não contentes com isto foram ao armazém da igreja velha de S. Domingos, e fizeram outro tanto aos que aí se tinham já recolhido. - Quiseram ir também a casa de Mr. Guichard, mas o Exmo. Governador Civil que aí se achava presente, pode conseguir que se retirassem sem barulho algum. - Dizem que alguns pequenos grupos quiseram fazer o mesmo por diversas partes. Na Alfândega quiseram também entrar por fim, mas aparecendo o Exmo. Governador Civil, e uma patrulha da Guarda Municipal lançando fora o grupo e fechando as portas, pôs fim àquela pertenção.
Tanto na igreja velha de S. Domingos, como na Alfândega, apareceu o Exmo. Governador das Armas, sossegando o povo, e dando com ele vivas à rainha e à Carta.
Na calçada dos Clérigos foi aonde os tumultos duraram até à noite, defronte das lojas de Guichard e Tallone.
Chegada que foi a noite tudo se retirou a suas casas sossegadamente, isto é – sem força alguma que a isso os obrigasse.
Diga-se uma vez em abono do povo – não consta que alguém fosse ofendido em sua pessoa, nem que se cometesse roubo nem ainda do mais pequeno valor – era uma multidão inerme que não usou de outras armas além das que lhe deu o furor desatinado.
E diga-se também em justo louvor do Exmo. Governador das Armas, que só a sua prudência salvou o Porto ontem dos horrores da anarquia. Nenhuma violência usou para com o povo – e a sua presença – a persuasão e o bom modo, foram as únicas armas que empregou para com a multidão que lhe pedia pão, ou meios honestos de o ganhar. Uma autoridade que carregasse o povo, ou que ousasse contra ele arrancar a espada, faria correr rios de sangue, e não conseguiria talvez o desejado fim.
(...) “
In “A Vedeta da Liberdade”; Fonte: “aportanobre.blogs.sapo.pt”


Revolta dos marceneiros – Ed. In O Tripeiro, Série V, Ano II; Fonte: “portoarc.blogspot.pt”

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