sábado, 10 de dezembro de 2016

(Continuação 20) - Actualização em 03/04/2018, 24/01/2019 e 22/01/ e 07/12/2020




A freguesia de Cedofeita, administrativamente, faz parte da cidade do Porto desde 1834, juntamente com a do Bonfim, ambas anexadas à cidade do Porto por ordem de D. Pedro IV.
 
 
“A origem da freguesia de Cedofeita remonta a um pequeno mosteiro que teria aqui sido fundado por um voto do rei suevo Teodomiro, no ano de 559. No século XII, sendo rei de Portugal D. Afonso Henriques já estariam aqui instalados os Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, procedendo-se nesta época à reconstrução e ampliação da igreja, dando origem à Colegiada de S. Martinho de Cedofeita que, até meados do século XIX, irá deter os direitos senhoriais sobre estas terras. Nos inícios do século XII, quando a Condessa D. Teresa concede a D. Hugo o Couto do Bispo da Porto, já existia o “Couto da Colegiada de Cedofeita”, uma vez que o documento refere os limites em que ambos os coutos se confrontavam. Já no século XVI é anexado o lugar de Massarelos. O Couto da Colegiada de S. Martinho de Cedofeita que compreendia assim uma extensa área incluindo ainda o lugar anexo de Massarelos. Inciar-se-ia perto do lugar da Arrábida, junto ao Rio Douro, subindo pelo lugar do Bom Sucesso até ao Monte Pedral e ao Monte Cativo, descendo depois por Germalde (atualmente a zona da Lapa) e daqui até ao atual Largo da Trindade, onde infletia em direção a Monchique junto ao Rio Douro. Era um fértil arrabalde da cidade, mas escassamente povoado, sendo muitas vezes designado como o “Ermo de Cedofeita”. Até ao século XVIII Massarelos, que seria o lugar mais povoado, terá pertencido ao Couto. No entanto, a partir desta data aparece já referenciado como uma das freguesias autónomas da cidade do Porto no território fora das muralhas da cidade. Mas Cedofeita conhece, a partir desta data, uma rápida expansão demográfica tornando-se durante o século XIX uma das zonas mais importantes para a expansão urbana da cidade e para a edificação de alguns dos mais notáveis edifícios públicos, coincidindo com a extinção da Colegiada e com a anulação do Couto e dos direitos senhoriais sobre este território.”
Fonte: Partido Comunista Português
 
 
O sítio de Cedofeita remonta, portanto, à ocupação sueva, desenvolve-se em volta de uma pequena igreja que, embora apresente uma pedra com a data de 554, ela constituiu uma inscrição apócrifa, que nada tem que ver com a realidade. No entanto, a sua origem reporta a tempos muito anteriores à formação da nacionalidade.
Tendo o Couto de Cedofeita existência anterior à outorga, por D. Teresa, do Couto do Porto ao bispo D. Hugo, no entanto, a carta do Couto de Cedofeita só terá sido atribuída por D. Afonso Henriques, embora muitos historiadores afirmem que tudo resultou de uma falsificação do documento elaborado pela Colegiada de Cedofeita, uma organização dos cónegos, sob a supervisão de um Prior, que administrava as terras em volta da tal igreja.
Localizada num local ermo, a integração do Couto de Cedofeita no tecido urbano dá-se cerca da transição do século XVI para o século XVII.
Já na vigência do Estado Novo, a partir de 22 de Março de 1936, quando foi inaugurada, os portuenses habituaram-se a apreciar o novo edifício da Junta de freguesia de Cedofeita, no Largo Pedro Nunes.
 
 
 

Antiga Junta de Freguesia de Cedofeita no Largo Pedro Nunes
 
 
A partir de Janeiro de 2013, a Freguesia de Cedofeita passa a fazer parte da União de Freguesias do Centro Histórico do Porto.




9.10.1 Rua de Cedofeita e Praça de Carlos Alberto (Largo dos Ferradores)



A Rua de Cedofeita é uma rua cheia de história, situada no coração da freguesia de Cedofeita. O seu nome deriva, segundo a lenda, da rapidez (cito facta) com que foi construída a velha igreja dedicada a São Martinho, edificada, primitivamente, durante o domínio Suevo, no séc. VI.
A hipótese mais aceite pelos historiadores diz  que o Couto de Cedofeita foi doado ao bispo do Porto por D. Afonso Henriques, o nosso primeiro rei – séc. XII.
 
 
“A partir de 1777, o antigo caminho rústico, aberto ao longo de terrenos que faziam parte da Quinta da Corredoura, uns, e da leira do Carril, outros, denominou-se Rua de Cedofeita. Mas, quatro anos depois (1781), já era conhecido por Rua da Estrada e, logo a seguir, chamava-se Rua Direita de Cedofeita, mas não estava ainda totalmente urbanizada.
Ainda em 1795, uma carta régia dava autorização à Câmara para proceder ao aforamento de terrenos da referida Quinta da Corredoura, "junto à Torrinha", através "dos quais campos se tinha aberto de novo uma larga e frequentada rua das de maior concorrência da sobredita cidade, em a qual se achava o maior aumento da povoação".
Até aos finais do século XVIII, a Rua Direita de Cedofeita possuiu muito poucas edificações, sendo ladeada por campos de cultivo e altos muros que delimitavam várias propriedades, entre as quais estavam as quintas dos Carvalhos do Monte; da Boavista ou de Santo Ovídio (com entrada pela Praça da República); e da Fonte. A primeira pertencia aos irmãos José e António Ribeiro Braga; a segunda aos Figueirôas e Pamplonas; e a terceira aos herdeiros de Domingos José Nogueira. No começo, a tal rua da Estrada alongava-se até ao Carvalhido. Mais tarde, abriu-se a Rua da Ramada Alta, denominação de origem rústica que, segundo antiga tradição, teve origem numa alta e ampla ramada que, naquele sítio, atravessava o caminho então existente. Posteriormente, a Rua de Cedofeita acabava no Largo da Ramada Alta, "acima do lugar onde estava a Fonte dos Ablativos", um curioso chafariz que pode ser admirado nos jardins das Águas do Porto, à Rua do Barão de Nova Sintra. Mais tarde, o comprimento da artéria foi encurtado quando, já na segunda metade do século XIX, a Câmara, querendo homenagear o súbdito britânico Joseph James Forrester, feito Barão de Forrester, em 1855, e que morreu tragicamente em 1861, no naufrágio do barco em que navegava, no sítio do Cachão da Valeira, perto da Régua, deu o seu nome à parte da artéria que ia da Rua da Boavista até à Ramada Alta.
À parte da Rua da Estrada que ia da Ramada Alta até ao Carvalhido foi dado o nome de Rua de 9 de Julho, para assinalar a passagem por aquele local, no dia e mês indicado, do ano de 1832, das tropas do exército liberal à frente das quais vinha D. Pedro IV. Anteriormente, desde pelo menos 1238, ano das inquirições mandadas fazer por D. Afonso III, dava-se à estrada que por ali passava o nome de "Via Vetera", ou seja "estrada velha", que era o caminho que os soldados romanos percorriam quando se dirigiam a Braga ou Astorga.”
Com o devido crédito a Germano Silva
 
 
 

Praça de Carlos Alberto
 
 
 
Na foto acima, observa-se a Praça de Carlos Alberto, que tinha sido Largo dos Ferradores e, à direita, o palacete do Visconde de Balsemão, mais tarde, palacete do Conde da Trindade e do Barão do Valado, depois de ter sido Hospedaria do Peixe, na qual, durante alguns dias, esteve o Rei Carlos Alberto, que haveria de dar o nome à praça.
Ele foi e continua a ser o edifício mais imponente da praça e tem raízes no fim do século XVII.
 
 
 

Palacete Balsemão, em 1833 – Desenho de Joaquim Vilanova
 
 
 
 
De facto, a última alteração de topónimo da praça teve a sua origem quando, em 4 de Maio de 1850, António José Coelho Lousada, que foi vereador municipal (1850), deputado pelo Porto (1858) e conselheiro, em reunião de Câmara, propôs aos demais vereadores, que fosse solicitado ao Governo Civil a passagem do topónimo Praça dos Ferradores a Praça Carlos Alberto.
A actual Praça de Carlos Alberto chamava-se, então, até 1850, Praça dos Ferradores pois aí existiam vários trabalhadores desse ofício, dado ser a paragem e passagem de muitas carruagens, que pela Rua de Cedofeita seguiam para Viana, Póvoa, etc. e, pela Rua de Santo Ovídio, para Braga.
Em 12 de Agosto de 1874, inaugurou-se nesta praça a primeira linha de caminho-de-ferro americano até Cadouços, à Foz do Douro.
Em 1883, começaram a fazer concorrência aos “americanos” os carros Ripert da “Empresa Portuense de Carros Ripert”, que tinha sede na Rua de S. Dinis e faziam a ligação a S. Mamede de Infesta e serviam vários outros pontos da cidade.
Para S. Mamede de Infesta, os carros tinham o seu término na Praça Carlos Alberto, em frente à tabacaria Havaneza, depois, Mercearia Pacheco.
Um tombo do mosteiro de S. Domingos menciona em 1669, a "Rua Pública dos Ferradores, junto do chafariz da Porta do Olival" e de um outro largo perto, que se chamava o Outeiro dos Ferradores.
Naqueles terrenos, entre c. 1676 e 1833, se realizou a “Feira dos Bois”, transferida depois para o Poço das Patas (Campo 24 de Agosto) e, ao longo dos anos, a “Feira do Carvão, da Palha e da Erva”.
Uma importante feira que comercializava cadeiras, caixas, bancos, tamancos e outros artigos em madeira – a “Feira das Caixas” – que acabaria nos Lavadouros (próximo da Picaria), deu durante anos movimento ao local.
O dia 1 de Abril de 1856, foi dia de festa - a praça foi dotada de iluminação a gás.
 

 

Praça de Carlos Alberto, em 1907, com o Hospital do Carmo à esquerda
 
 
 
 

Fontanário e candeeiro a gás na Praça de Carlos Alberto
 
 
 

Praça de Carlos Alberto, actualmente – Ed. JPortojo
 
 
 
No centro da praça existe hoje e, desde 1928, um monumento dedicado aos mortos da Grande Guerra de Henrique Moreira, que veio substituir um outro que o povo não aprovou, da autoria de José de Oliveira Ferreira, aí colocado em 1924, mas, que tendo sido considerado “tão feio”, viria a ser abatido em 1925.
 
 
 

Monumento de Henrique Moreira


 

Monumento de José de Oliveira Ferreira
 
 
 
 
Um outro monumento, uma escultura de Humberto Delgado, em que o general é representado voltado para o café Luso, da autoria do escultor José Rodrigues e foi inaugurada a 14 de Maio de 2008, está implantada junto do palacete Balsemão.
 
 
 



Estátua do General Humberto Delgado – Ed. J Portojo
 
 
 
 
 

Praça de Carlos Alberto, início do século XX
 
 
 

Praça de Carlos Alberto em perspectiva obtida a partir da Praça Gomes Teixeira – Ed. J Portojo





Na foto acima, na esquina, o palacete dos Couto Moreira e, depois, residência da família Pena.
Para conhecer um pouco a Rua de Cedofeita, iremos fazer um périplo por ela, seguindo no sentido da Praça de Carlos Alberto para a Rua da Boavista.
A Rua de Cedofeita, que hoje começa na Praça de Carlos Alberto, era conhecida, em 1777, como a Rua da Estrada, e ligava o Porto à Póvoa.
Na realidade ela começava antes, na Cordoaria, junto às Muralhas Fernandinas junto da Porta do Olival. Era utilizada pelos viandantes que, tendo saído da medieval Porta do Oli­val, tinham como destino Barcelos, Vila do Conde ou outras terras do Norte. 
Começou a ser pensada a sua abertura em 1762, por iniciativa de João de Almada e Melo aquando no cargo, de Presidente da Junta das Obras Públicas do governo do Marquês de Pombal, a quem ligavam laços familiares. Foi um dos grandes obreiros da modernização de Lisboa depois do Terramoto de 1755. 
Veio para o Porto onde começou obras de grande vulto. Uma delas ligar a zona portuária do Douro com as partes altas da Cidade. A Rua de Cedofeita foi uma das vias que idealizou. 




Uma perspectiva de alguns edifícios – Ed. JPortojo



O certo é que a Rua foi aberta rapidamente - volta aqui a entrar e com razão o “cito-facta”, traduzido para “cedo-feita”- e passou a conhecer-se como Rua Direita de Cedofeita.
A chamada Planta Redonda de Balck publicada em Londres (1813) mostra já o troço de Cedofeita até à Rua da Boavista, quase todo ladeado de casario.
Em 1851, sabe-se que o seu piso era em “macadam”.



Início da Rua de Cedofeita – Ed. JPortojo


A uma dezena de metros do início do nosso percurso, olhamos em frente e apercebemo-nos que esta rua é quase toda recta.
À nossa direita encontramos a Travessa de Cedofeita que já se chamou Viela do Açougue.
No plano de urbanização do bairro dos La­ranjais, elaborado em 1760, por iniciativa de João de Almada e Melo, o grande reforma­dor da cidade, onde hoje vemos a Travessa de Cedofeita estava assinalado um simples carreiro sem qualquer denominação. 



Olhando para trás, ao fundo a Torre dos Clérigos – Ed. JPortojo



Edifícios com as suas varandas – Ed. JPortojo



“É uma artéria, de grande aglomerado residencial, tendo no rés-do-chão da maioria dos edifícios comércios das mais variadas espécies. Quase, todos os edifícios são do séc. XVIII e princípios do séc. XIX,  predominantemente estreitos e compridos onde sobressaem as varandas de sacada com a arte do ferro tão tradicional do Porto, cantarias nas pilastras e cimalhas de granito e azulejos na fachada, estes já do séc. XIX ou XX. Veremos de relance alguns desses edifícios, contaremos alguma da sua história bem como de alguns dos seus primitivos donos e/ou ocupantes. A maior parte deles são referenciados como imóvel de interesse púbico pelo IGESPAR
Comecemos pelo nºs 88-96 onde está um pronto- a- vestir e onde antes esteve o Bazar dos 3 Vinténs, bazar de brinquedos, conhecido de várias gerações de portuenses e que ostenta na fachada um painel alusivo ao Pai Natal.



Aqui esteve o Bazar dos 3 Vinténs e painel com Pai Natal



Os nºs 154 e 162 são os mais antigos da Rua – Ed. JPortojo


Frente dos nºs 154 e 162 – Ed. JPortojo



 No nº 159, prédio em recuperação, viveu Carolina Michaëlis e seu marido Joaquim Vasconcelos, casados em 1876. Ela é reconhecida como a mais importante das filólogas da língua portuguesa. Foi crítica literária, escritora, lexicógrafa, tendo sido a primeira mulher a leccionar numa universidade portuguesa, a de Coimbra. Teve igualmente grande importância como mediadora entre a cultura portuguesa e a cultura alemã. Nasceu em Berlim em 15 de Março de 1851 e morreu no Porto em 22 de Outubro de 1925.
Joaquim Vasconcelos natural do Porto, musicólogo e historiador de arte, vivia e estudava na Alemanha quando conheceu Carolina. 
Foi um dos grandes pioneiros da divulgação e desenvolvimento da arte popular. As exposições no Porto em 1881 de Industrias  Caseiras e um ano mais tarde da exposição de Cerâmica devem-se em grande parte a ele. Crítico entre os métodos de ensino inglês e o rigor alemão científico adaptados à arte portuguesa criou alguns anti-corpos. Deixou uma obra de grande valor cultural. José Augusto França disse que foi ele o real fundador da História da Arte em Portugal, entendida como ciência, com objecto e método próprios. Consta-se que na véspera da Revolução de 31 de Janeiro de 1891 (a primeira tentativa da implantação do regime republicano em Portugal), Antero de Quental, vindo de Vila do Conde, hospedou-se aqui e os estudantes da Academia Portuense organizaram na rua, em frente à casa, um grande comício patriótico. Antero falou aos estudantes da varanda da casa de Joaquim de Vasconcelos”.
Com a devida vénia a JPortojo



Aqui viveu Carolina Michaëlis – Ed. MAC

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