19.20 Rua do Conde
de Vizela e a distribuição do correio
A actual denominação de Rua Conde de Vizela fica a dever-se ao industrial Diogo José Cabral, proprietário de todo o quarteirão entre a Rua Conde de Vizela e a Rua Cândido dos Reis. Por decreto do rei D. Carlos do ano de 1900, aquele industrial foi agraciado com o título de primeiro Conde de Vizela e, daí, o nome actual, da antiga Viela do Correio.
Durante um período
de 279 anos, a partir de 1520, foi o correio da cidade do Porto administrado
pelos chamados Correios-Mores, ou mais, precisamente, Assistentes do Correio-Mor
do Reino. Não se sabe exactamente quando foi nomeado o 1° correio assistente no
Porto, embora haja quem refira que, no ano de 1552, já havia na cidade correio
organizado.
Na maioria dos
documentos dos séculos XV e XVI, é feita referência aos “almocreves” ou “recoveiros”
e, ainda, aos “caminheiros” para o transporte de correspondência Real,
Municipal ou de simples particulares. Com a nomeação dos Assistentes do
Correio-Mor, estas velhas práticas do recurso aos almocreves e caminheiros
foram sendo progressivamente abandonadas.
Recoveira com baús à cabeça, na confluência da Rua dos Clérigos com a Rua do Correio (visível na placa), em data anterior a 1927, a partir da qual, aquela rua passou a ser a Rua do Conde de Vizela
A nomeação daquelas personagens era uma atribuição do Correio-Mor que, para o efeito, negociava um
contrato com o proponente, que se obrigava ao pagamento de uma renda anual, mas
auferindo inteiramente dos rendimentos do correio que administrava.
Miguel Chamorro foi
o 1º assistente que se conhece. A primeira residência que se conhece do Correio
foi na Praça das Hortas na
esquina com a Calçada dos Clérigos,
onde existiam umas grossas árvores nas quais, c. 1608, se afixava uma lista
dando conta aos interessados da correspondência em trânsito.
Daí, passou para o
que é hoje a Rua do Dr. Magalhães Basto, contígua à delegação do Banco de
Portugal.
Na segunda metade do
século XVII, toda a área que compreendia a Rua do Almada e a Praça Guilherme
Gomes Fernandes e na qual se incluíam as ruas Conde de Vizela, da Fábrica, de
Santa Teresa, de Cândido dos Reis e Galeria de Paris, não passava de terreno
ainda despido de construções, constituindo a quinta da Cancela da Velha.
No ano 1681, o padre
Baltasar Guedes, que tinha fundado o Colégio de Nossa Senhora da Graça, trinta
anos antes, no campo do Olival, fez uma exposição à Câmara para que lhe fosse
facultada uma parcela de terreno abaixo do Calvário, para aí levantar algumas
casas, que se destinariam, quando arrendadas, a um complemento do orçamento da
instituição de caridade. O Calvário ou Calvário Velho é a actual Praça
Guilherme Gomes Fernandes, já que o Calvário Novo ficava na actual Rua Dr.
Barbosa de Castro. A Câmara cedeu, de facto, o terreno e os proveitos que daí
advieram para a instituição, foram de monta. Certo dia, o padre foi procurado
por João Soares Carvalho que pretendia um terreno para contruir uma habitação
própria no lugar que seria hoje a esquina da Rua Conde de Vizela e a Rua das
Carmelitas. Por volta de 1690, ficou a casa pronta. Seis anos depois, em 1696,
Soares de Carvalho (1665-1712), nomeado correio-mor do Porto instalou o serviço
dos correios na sua própria moradia, na confluência da actual Rua Conde de
Vizela com o chamado Alto da Calçada que só pode ser a dos Clérigos, passando a
via a ser conhecida desde aí por Viela
do Correio-Mor e Rua do
Correio-Mor e mais tarde por
Rua do Correio, quando antes tinha sido Travessa das Indulgências
e para alguns teria sido, também, Rua
de Santo António.
No fim da Travessa
das Indulgências, para quem nela entrava pela actual Rua dos Clérigos, ficava
a Rua da Picaria.
Em 1797, o cargo de
Correio-Mor do Reino é extinto e o Estado passa a ter o monopólio da exploração
postal.
As funções inerentes àquele cargo passam, então, a ser exercidas pelo Administrador do Correio nomeado pelo Estado.
A distribuição ao
domicílio começa em 12 de Fevereiro de 1800.
Em 1801, passaram os
serviços para a residência onde habitava o administrador-geral
do correio do Porto, José de Sousa Melo no Largo da Fábrica do Tabaco, na embocadura das actuais ruas da
Fábrica e do Conde de Vizela, mais propriamente aquele espaço que fica onde se
bifurcam as ruas da Fábrica, Aviz, Conde de Vizela e Santa Teresa. Escusado
será dizer que, desde logo, o largo passou a ser Largo do Correio.
Aqui, os correios
estiveram mais de trinta anos.
“José de Sousa Mello, cavaleiro-fidalgo da
casa Real, foi tesoureiro Geral do consulado da Alfândega do Porto, assim como
vice-provedor e deputado da Companhia Geral d’Administração d’Agricultura dos
vinhos do Alto Douro, e tinha a sua morada na Rua Nova do Almada: era
seguramente homem abastado, pois logo que foi nomeado para Administrador do
Correio fez construir para estes serviços uma casa à sua custa, com todas as
proporções e arranjos próprios, e em sítio acomodado ao comércio, com que o
público ficou satisfeito, e onde, a partir de 1803, ficou instalado o correio
do Porto. Situava-se aos Clérigos, com frente para a rua denominada do Correio,
actual Rua do Conde de Vizela”.
Cortesia de Luís Frazão; História Postal da Cidade do Porto na Era Pré-adesiva
José de Sousa Melo é
conhecido, também, por ter sido o primeiro proprietário da Quinta das Águas
Férreas, que seria ocupada, em 1810, pelo general Trant, encarregado do partido
das armas do governo do Porto, tendo ele passado a habitar a casa do Pátio do
Correio.
Antes, em 1809, durante a invasão do exército francês, José de Mello, conotado como colaboracionista, veria a sua casa das Aguas Férreas assaltada, roubada e estragado o seu recheio, e só escapou com vida por ter fugido a tempo, para uma quinta que tinha na Régua.
Acabaria por voltar por ordem do Governo, de 20 de Maio de 1809, que funcionou como uma amnistia.
Cortesia de Luís Frazão; História Postal da Cidade do Porto na Era Pré-adesiva
Antes, em 1809, durante a invasão do exército francês, José de Mello, conotado como colaboracionista, veria a sua casa das Aguas Férreas assaltada, roubada e estragado o seu recheio, e só escapou com vida por ter fugido a tempo, para uma quinta que tinha na Régua.
Acabaria por voltar por ordem do Governo, de 20 de Maio de 1809, que funcionou como uma amnistia.
Antes de ocupar as
instalações do Largo do Correio, durante parte do século XVIII, os serviços de
correio terão ocupado um edifício no Largo de Moinho de Vento (pertença na segunda metade do século XIX, a Armando Artur Ferreira de Seabra da Mota
Silva e, na primeira metade, desse século, a António Barbosa de Albuquerque, sogro do primeiro, mas que não se chegaram a conhecer).
Passando, depois, a Casa do Moinho de Vento pela posse de uma neta de António Albuquerque, que a resgatou duma penhora contraída por sua mãe, acaba nas mãos de uns sobrinhos do seu marido, por não terem descendência.
Já no século XX, em 1922, era José Ribeiro da Silva Pena o proprietário.
Na planta desenhada pelo arquitecto, Joaquim da Costa Lima, em 1839, abaixo representada, pode observar-se, em destaque, a identificação de um largo correspondente, hoje, ao Largo do Moinho de Vento, como sendo o “Correio Velho”.
Na planta desenhada pelo arquitecto, Joaquim da Costa Lima, em 1839, abaixo representada, pode observar-se, em destaque, a identificação de um largo correspondente, hoje, ao Largo do Moinho de Vento, como sendo o “Correio Velho”.
Palacete do Largo
Moinho de Vento (parcialmente demolido em 2017) para instalação de um hotel
Em 1836, os serviços
dos correios já ocupavam parte do ex-convento das Carmelitas.
Em 1857, passa a
ocupar o palacete da Baronesa da Regaleira na Rua S. Bento da Vitória.
É durante o século
XIX que se vai assistir a grandes transformações no tratamento do correio.
Por volta da década
de 1820, seriam regulamentados e implantados uns receptáculos de forma
rectangular, em ferro ou em madeira, para recolha, na via pública, de
correspondência.
Em 1882, na
sequência da necessidade de criar melhores condições de segurança às
correspondências depositadas naqueles receptáculos postais, surgem os marcos de
correio, mais robustos, cilíndricos, que subsistiram até aos dias de hoje.
Com uma frincha para
introdução das cartas e um cartaz que avisava do horário da recolha, Inicialmente,
os tradicionais marcos de correio foram mal recebidos pela imprensa da época,
que os criticaram por razões de ordem estética. Mas, cedo, se revelaram muito
úteis, pela sua eficácia, demonstrada no dia-a-dia, tanto ao nível da segurança
como da comodidade.
Em 1852, já se tinha
assistido ao lançamento do primeiro selo postal e, entretanto, a distribuição
do correio evoluía da mala-posta para o comboio.
“A Junta Provisória Encarregada de
Manter a Legítima Autoridade de El Rei o Sr. D. Pedro IV mandou em junho
de 1828 que o administrador do correio do Porto fizesse estabelecer «dous ou tres pontos nesta cidade, onde
julgar mais proveitosos, caixas para receção de cartas, encarregando a sua
guarda e vigilância a pessoas de probidade; isto para facilitar ao público comodidades para a
remessa das correspondências particulares. Com a ressalva de que: para não retardar a regular partida dos
correios para as diferentes partes do reino, tomará Vm. as medidas necessárias,
em relação às distâncias em que estiverem colocadas as caixas, para mandar
recolher a essa administração as que se acharem dentro delas».
Era uma modernidade!: três caixas de correio
espalhadas pela cidade, dando descanso aos pés dos interessados, obstando-os de
um longo caminho até à casa da administração! Se de facto a situação prevaleceu
no tempo ou não é algo que desconheço, pois poucos meses depois o país
"absolutismou" com D. Miguel usurpando o poder e os partidários de D.
Pedro fugindo para Inglaterra].
Notícia mais interessante foi a que encontrei
remontando a 1834, quase um ano depois do fim do cerco à cidade (1832-1833),
nos derradeiros meses da guerra civil (1828-1834):
«Somos authorizados a annunciar, que para
utilidade pública dos Habitantes desta Cidade se achão deffinitivamente
collocadas em differentes paragens, - Caixas para recepção das Cartas – a
fim de se evitar a demora em remessas á Administração do Correio, aonde até agora
havia unicamente a Caixa geral.
Os sitios onde se achão as Caixas, são os
seguintes:
- Na Porta Nobre, da parte de fóra.
- Na Esquina, entre a rua dos Inglezes, e a
rua de S. João.
- Na Feira de S. Bento das Freiras.
- No Largo da Batalha, junto á Capella.
- Na Rua direita, defronte da travessa dos
Capuchos.
- Na Esquina, entre a rua do Bomjardim, e a
rua do Estevão.
- Na Rua d’Almada, ao cimo.
- Na Esquina entre a rua de Cedofeita, e a
rua dos Bragas.
- Em Villa Nova, no Cabeçudo.
- E nas Costeiras.
Os moradores proximos destes sitios podem
informar-se das horas a que da Administração do Correio se mandão tirar as
Cartas, conforme está escripto em cada huma, para ficarem certos de que todas
as Cartas deitadas antes das horas fixadas são expedidas na competente partida
regular, - e que deitadas depois sómente são enviadas no turno seguinte.
A utilidade deste estabelecimento, que na
Capital se acha em via há muitos annos, mas que a estupida crença dos Sectarios
de D. Miguel julgou innovação perigosa para o Porto, quando em 1828 o
Absolutismo reassumiu o sceptro de ferro, depois de alguns dias de uso, - he
evidentemente proveitosa porque assim vimos a ter ramificada em diversos 11
pontos a recepção de todas as Cartas para o Correio, com a mesma regularidade,
com que até agora se usava na que se acha á porta da Administração, no extincto
Convento das Carmelitas.
Da mesma fórma, se tem tomado medidas para
pouco e pouco se ir estabelecendo a Posta pequena, que he encarregada de entregar as Cartas em
casa de que para isso der ordem, logo que cheguem os Correios, pagando sómente
5 reis em cada carta, a maior, do preço da Lei para o Correio Geral. As Pessoas
que desejarem receber assim as suas Cartas, queirão avisar a Administração do
Correio nesta Cidade; ou por Carta lançada em qualquer das Caixas, ou no mesmo
local da Distribuição.
He preciso desarreigar varios prejuizos, e de
certo he hum dos que temos mais inveterados, o uso de julgarmos por melhor o
escreverem-se os nomes de quem tem Cartas a receber, em Listas públicas á porta
do Correio, habilitando assim quem quizer a hir tirar as Cartas que lhe
parecer, sem responsabilidade de quem as entrega, porque não he obrigado a
conhecer todo o mundo nem a saber se esta ou aquella pessoa vai mandado pelo
dono da Carta &c. Presentemente, não he possivel pôr em pratica com regular
distribuição a entrega geral pelas diferentes casas, porque não tendo ainda
voltado a suas habituaes residencias os moradores dos diversos Bairros, pela
mudança forçada em rasão dos projecteis do inimigo, composição d’antigas
habitações &c, em vez de se acreditar o novo arranjo, acharia nos tropêços
desta confusão de moradias, hum estorvo terrivel. Mas pouco e pouco he
necessario hir acostumando, até por que pouco e pouco se vai habitualmente regulando
o exercicio dos Entregadores etc. Porque ao principio se acham embaraçados em
qualquer forma, querer logo que se diga que a innovação he má, parece desairoso
na bocca de quem confessa a todos os respeitos, que he preciso sahir da velha
rotina de abusos. Queixe-se quem julgar irregularidades, e se depois as não vir
remediadas, embora grite, que a opinião geral fará justiça, porque ás vezes he
o frenezi do genio que falla, e não a justêza do raciocinio do Cidadão
impaciente, e desarrazoado. Em as cousas tomando o habito antigo das moradas
certas e regulares, há de fazer-se no Porto, o que se faz já em Lisboa, e nos
Paizes civilisados, que a experiencia d’abusos teve a felicidade de corrigir
por fortuna delles, primeiro que nos tocasse a nossa vez.
Vamos portanto pouco e pouco, que vamos
melhor, e as Pessoas interessadas em que nos mostremos dignos de reformas, e
não bisonhos e faltos de instrucção para as receber, principiem a dar o
exemplo: estabeleça-se a Posta
pequena para se nos entregar a correspondencia, mandando nossos
nomes para isso ao Correio, pois que as Pessoas de menos raciocinio, vendo o
exemplo desenvolvido pela prática, convencem-se e seguem a marcha dos outros.»”
Com a devida vénia ao blogue “aportanobre.blogspot.pt/”
A posta-pequena, acima citada, dizia
respeito à entrega ao domicílio da correspondência, para quem o solicitasse
mediante o pagamento de 5 réis.
No mesmo texto: “Na Rua direita, defronte da travessa dos Capuchos”, a Rua Direita não é mais que a actual Rua de Santo Ildefonso, e a Travessa dos Capuchos era, à data, a via junto do convento.
Por sua vez, o sítio
do Cabeçudo ficava nas
imediações da área hoje ocupada pela Rua Cândido dos Reis, em Vila nova de Gaia,
situando-se o sítio de Costeiras em
Avintes.
Na Rua de Cândido
dos Reis, em V. N. de Gaia, na parede lateral de um prédio situado na esquina
daquela rua com a travessa do mesmo nome, existiu uma fonte importante
denominada Fonte do Cabeçudo, e sobre a qual se diz:
"Foram construtores o Mestre
pedreiro Domingos Gonçalves e Agostinho Rebelo. O ano de 1797 marca o momento
em que a fonte foi reformada ou restaurada, pela Câmara no reinado de D. Maria
I. Que ali construiu o frontespício de pedra com duas bicas tendo no topo a
coroa real e o escudo também em pedra. Fonte implantada na parede lateral do
prédio nº 117 da Rua Cândido dos Reis, onde ainda existe o frontispício de
pedra que exibe os restos da fonte. Foi-lhe retirado o tanque e desviada a
água. As duas bicas que serviam para abastecimento foram tapadas e a figura que
dava nome à fonte desapareceu, bem como outros acessórios. No topo está gravada
uma inscrição de onze linhas, onde se indica o ano de construção (1637)”.
In “arquivo.cm-gaia.pt”
Biblioteca Pública
em S. Lázaro – Fonte: “aportanobre.blogspot.pt/”
Na foto acima, de
finais do século XIX, vê-se à esquerda um marco do correio, com abertura para o
lado da via.
Sobre a recolha de correio, anunciava o “Jornal do Porto”, em 1872.
In “Jornal do Porto” de 21 de Junho de 1872, pág. 2
Os serviços do
correio transferiram-se, depois, em 1880, para a Praça da Batalha para o
palacete dos Guedes da Quinta da Aveleda, também conhecido por Palácio da
Batalha ou Palácio da condessa de Pangim, mandado construir por José Anastácio
Guedes da Silva. Seria um seu neto, Manuel Pedro Guedes da Silva da Fonseca,
que mandou colocar na fachada do edifício um escudo esquartelado, que ainda
hoje ostenta, dos Silvas, Guedes, Melos e Pereiras, assente numa tarja
acompanhada de troféus e encimada por um coronel.
Palácio da Batalha,
no início do século XX, quando já funcionava como sede dos Correios
No terreno livre (c. 1955), em primeiro plano, foi construído o Palácio dos Correios
À direita, o Palácio
dos Correios, hoje, um edifício de escritórios
Em termos nacionais,
em 1911, a empresa encarregue do tratamento do correio passa a ser dotada de
autonomia administrativa e financeira e chamava-se Administração-Geral dos
Correios, telégrafos e Telefones adoptando a sigla CTT.
Em 1969, os CTT são transformados em empresa pública com a denominação CTT – Correios e Telecomunicações de Portugal, E. P.
Em 1992, os CTT são
transformados em sociedade anónima, com a denominação CTT - Correios de
Portugal, S. A.. Ao mesmo tempo a área das telecomunicações é separada,
formando uma empresa autónoma, a Telecom Portugal.
Em 1969, os CTT são transformados em empresa pública com a denominação CTT – Correios e Telecomunicações de Portugal, E. P.
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