quinta-feira, 5 de outubro de 2017

(Continuação 18)

21.19 Palácio de S. João Novo ou Palacete do Costa Lima


Palácio de S. João Novo – Fonte: “gisaweb.cm-porto.pt”


Situado junto a um pano da antiga muralha da cidade, o palácio do Largo de S. João Novo foi mandado edificar, c.1727, por Pedro Costa Lima, casado em segundas núpcias com D. Maria Teresa de Melo e Alvim, fidalgo da Casa Real e administrador da Fábrica dos Galeões do Ouro do Porto, que para aqui veio residir para umas casas que comprou na então Rua de São João Novo, em 1676.
Mais tarde, mandaria construir neste mesmo local um edifício imponente, dentro do tradicional palacete de estilo barroco, com os seus jardins em socalcos e com tanques de água que viriam a ser alimentados pela mina de Arca d'Água.
No local onde se ergueu o palacete havia, em tempos remotos, pequenas casas pertencentes a António Bravo, contratador das enxarcias da cidade do Porto e feitor das ribeiras do Ouro.
Essas casas passaram para o domínio régio e o rei D. Afonso VI fez presente delas, em Julho de 1665, D. Gaspar Cy, natural de Sevilha como serviços prestados no norte de África, mais propriamente, em Marzagão, com a incumbência do pagamento ao Senado da Câmara do Porto, do foro anual de 40 réis.
Como não tinha interesse em fixar residência em Portugal, o sevilhano vendeu, em Outubro de 1665, as casas, a Domingos Antunes Portugal que, em 1676, as venderia a Pedro da Costa Lima.
O Palácio de S. João Novo é um típico exemplar de arquitectura urbana barroca, com os volumes desenvolvidos horizontalmente e fachada sumptuosa, evidenciando a entrada nobre do edifício.
O seu projecto foi durante muitos anos atribuído a Nicolau Nasoni, devido à exuberância dos elementos exteriores, nomeadamente os frontões interrompidos e as volutas. No entanto, actualmente, confirma-se que a traça do palácio foi elaborada pelo mestre António Pereira.



“Com planta em L, dividido interiormente em três pisos, o palácio apresenta uma fachada de dois registos, cujo ritmo é marcado pela repetição de janelas a espaços regulares em ambos os registos. No primeiro, abre-se ao centro o portal principal, de moldura rectangular encimada pela pedra de armas da família proprietária, ladeado por duas janelas com guarda de ferro e moldura em frontão invertido alternadas por porta rectilínea com óculo e frontão. O registo superior possui sete janelas de sacada, das quais seis são encimadas por frontões quebrados e a central, mais alta, é ladeada por volutas na parte inferior. Todas são precedidas por guarda de ferro forjado. À esquerda, foi edificado um corpo menor dividido em três registos, que possui no primeiro porta em arco pleno, no segundo janela semelhante às do primeiro registo do corpo principal e no último registo janela, também em arco de volta perfeita, com guarda de ferro.
Interiormente, o corpo principal possui escadaria central de dois lanços paralelos, que sobe até ao terceiro piso. As salas são cobertas por tecto de masseira”.
Catarina Oliveira, In “patrimoniocultural.pt”



O texto que se segue fala-nos sobre o primeiro responsável pela construção do palácio, Pedro Costa Lima, nascido em Viana do Castelo, na freguesia de Monserrate em 26 de Abril de 1648.


“Além de Administrador da Fábrica dos Galeões do Ouro do Porto, terá exercido igualmente: o cargo de Juíz de Fora e de Vereador da Câmara do Porto, Administrador da Casa da Moeda, Guarda-Mor dos Lastros e Tabacos, Governador da Cidade do Porto, Familiar do Santo Ofício, Cavaleiro na Ordem de Cristo e Fidalgo da Casa Real, por alvará de 13 de Novembro de 1710.
Apesar da escritura do casamento de Pedro da Costa Lima com D. Maria Teresa de Melo e Alvim registar que Pedro da Costa Lima já residia na rua de S. João Novo em 1693, desconhece-se porém, quando começou a residir nas casas sitas na rua de S. João Novo e como as adquiriu. O próprio contrato de obrigação da obra lavrado a 20 de março de 1725 indica que Pedro da Costa Lima pretendia inovar as casas em que residia, sem, contudo, especificar a que corresponderiam as pré-existências da Casa de S. João Novo. Inédita é, porém, uma provisão e petição de Pedro da Costa Lima à Câmara (...) do Porto e ao rei D. João V “sobre a serventia do muro que fica dentro do seu quintal” datada de 27 de setembro a 29 de outubro de 1710. Manuel Álvaro Bessa, um vizinho de Pedro da Costa Lima, pretendia construir umas casas e pretendia usar a muralha e uma das torres de que Pedro da Costa Lima detinha direito, possivelmente para a passagem de recursos materiais e de mão-de-obra. Pedro da Costa Lima, com o intuito de impedir que o seu quintal fosse devassado, pediu licença para tapar uma porta que detinha na muralha.
(…) Em 1725, Pedro da Costa Lima pretendia inovar as casas em que residia, na rua de S. João Novo. No contrato de obrigação da obra, redigido a 20 de março de 1725 – dois anos após a escritura para instituição de vínculo e de morgado – nas suas residências sitas na “rua de S. João Novo”, Pedro da Costa Lima encomenda a feitura da obra aos mestres pedreiros: António da Silva, mestre pedreiro de Perosinho em Gaia, Domingos Pinto e Pedro Pereira, ambos mestres pedreiros de Campanhã do Porto.
(…) Numa idade avançada, a 15 de outubro de 1723, Pedro da Costa Lima e sua mulher, D. Maria Teresa de Melo e Alvim mandaram lavrar uma escritura para instituição de vínculo e morgado de modo a que os seus bens inalienáveis e indivisíveis se conservassem na sua descendência. Devemos atentar no fato de esta escritura intitular-se “Instituição de vínculo, e morgado […]”. Juridicamente, vínculo será o “conjunto de bens constituídos em fundação para fazer face às despesas de uma capela e do respectivo culto.” Morgado corresponde ao “conjunto de bens inalienáveis e indivisíveis legados ao filho mais velho ou, na falta deste, a outras pessoas segundo uma ordem de sucessão estritamente estabelecida.” Contudo, facilmente se encontra a expressão morgadio associado a uma capela. Porém, este documento torna-se peculiar pelo fato de usar os dois termos vínculo e morgado, o que nos sugere que o casal instituidor pretendia distinguir os bens móveis e imóveis que transitariam como morgado pelos herdeiros da família e os bens que ficavam associados à administração de uma capela. Deste modo, aquela escritura, apesar de não descriminar os bens que estariam associados quer ao vínculo, quer ao morgado, impõe-nos uma questão relativa à provável existência de uma capela administrada por Pedro da Costa Lima e sua mulher D. Maria Teresa de Melo e Alvim.
(…) Segundo a escritura, a sucessão do vínculo e do morgado só ocorreria para o sexo feminino, quando não existissem descendentes do sexo masculino”.
Com a devida vénia a Catarina Sousa Couto Soares; In Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em História da Arte Portuguesa, 2016


Falecidos que foram os dois filhos de Pedro Costa Lima, Pedro da Costa Lima e Melo, e depois o irmão deste, Miguel da Costa Lima e Melo, Reverendo e Tesoureiro-Mor da Sé do Porto, que terá estabelecido a sua residência na Casa de S. João Novo, uma vez que, ao registo da sua morte a 23 de Março de 1758, é dado como morador na Rua de S. João Novo, os bens existentes por herança, passaram para a sua irmã mais nova e quinta filha do casal instituidor do vínculo e morgado, D. Ana Casimira de Lima e Melo (1702-1792).
Esta havia casado a 8 de Novembro de 1726 com Diogo Francisco Leite Pereira (1698-1768), tendo o casal estabelecido residência no Palácio de S. João Novo.
Como curiosidade o facto de, a partir de 1792, ano do falecimento de D. Ana Casimira de lima e Melo, a Rua de S. João Novo já ser designada por “Largo de S. João Novo”.


Palácio de Álvaro Leite - Desenho de Joaquim Cardoso Vitória Vilanova em 1833



À data do desenho acima, Álvaro Leite Pereira de Melo e Alvim, quarto filho de seus pais, segundo filho varão do casal, sucedeu no vínculo e morgado de S. João Novo. É assim que estes Leite Pereira (que não são os ligados à Casa de Ramalde) entram na história desta casa.
Álvaro Leite Pereira casou com Maria Cristina Faria de quem teve uma filha, que morreu nova e solteira.
Na qualidade de vereador da Câmara, foi quem procedeu à quebra do “Terceiro escudo” no Largo da Feira, em frente da Rua do Loureiro, por ocasião da cerimónia da “Quebra dos Escudos”, realizada após o falecimento do rei D. João VI, ocorrido em 10 de Março de 1826.
O Regimento do Senado, feito na época de D. Manuel I, regulamentou esta cerimónia, que consistia em quebrar os escudos do rei falecido para os substituir pelos do novo monarca. Acabou com a morte de D. Pedro V, em 1861.
O palacete de S. João Novo acabaria por ir ter às mãos de uma sua sobrinha, Maria Helena Leite do Outeiro Pereira de Melo e Alvim, casada com o industrial, Vasco Ferreira Pinto Basto.
Deste casamento houve Joaquim Augusto Leite Ferreira Pinto Basto, casado com Maria das Dores Ribeiro de Faria.
O palacete passou, então, para a posse do filho deste casal, o engenheiro Álvaro Ferreira Pinto, que tendo fixado residência em Lisboa o alugou à Junta de Província do Douro Litoral.




Escadaria do Palácio de S. João Novo – Fonte: “gisaweb.cm-porto.pt”


Vestíbulo do Palácio de S. João Novo – Fonte: “gisaweb.cm-porto.pt”



Durante o Cerco do Porto, Pinho Leal refere que a propriedade tinha sido abandonada pelos seus proprietários e serviu como hospital militar, mas que teria sido devolvida e novamente ocupada pelos proprietários, findo que tinha sido o conflito.
No palacete, em meados da década de 1830, já estava instalada a Typographia Commercial Portuense, que por aqui se manteria por tempo impossível de precisar.
Muito depois, já em pleno século XX, o proprietário da Casa de S. João Novo em 12 de Dezembro de 1942, Álvaro Leite Pereira de Melo Ferreira Pinto, celebrou um contrato de arrendamento com a Junta de Província do Douro-Litoral, para sede e funcionamento, na Casa de S. João Novo, do “Museu Etnográfico do Douro-Litoral” que abriu portas em 1945.



“Sofreu ampliações no século XIX, um incêndio em 1984 e obras de conservação em 2000. Arrendado à Junta distrital do Porto em 1941, em 1945 é inaugurado o Museu de Etnografia e História com peças regionais, originalmente organizado por Pedro Vitorino, permanecendo aberto ao público até 1992. É Imóvel de Interesse Público.”
In balcaovirtual.cm-porto



Sala de Medicina e Farmácia Popular do Museu de Etnografia e História da Província do Douro-Litoral – Fonte: “O Tripeiro”, VI série, ano IX, n.º 12 (Dez. 1969)



O acervo do Museu de Etnografia e História foi depositado em diversos museus com vista à sua protecção.
Diz-se que outra parte daquele espólio teria sido guardada no também desactivado quartel de S. Brás, à Rua da Constituição, ignorando-se o que lhe teria acontecido depois.
Este quartel à data das lutas liberais e do Cerco do Porto era uma fortaleza.
Seria, depois, em complemento ao quartel do Carmo, quartel da Guarda Municipal (por aqui estaria na década de 1870) e sede dos telegrafistas, tornando-se, mais tarde, em Casa da Reclusão da 1ª Região Militar, no ano de 1963.
Em 1993, o quartel foi desactivado pelo Estado-Maior do Exército. A partir desse ano, nunca mais foi dada função alguma ao quartel, quase tão esquecido quanto abandonado. 



Quartel de S. Brás, na esquina da Rua de S. Brás e Rua João Pedro Ribeiro

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