sexta-feira, 6 de outubro de 2017

(Continuação 19)


“Foi António Lobo de Barbosa Ferreira Teixeira Girão (1785-1863), 1º Visconde de Vilarinho de S. Romão, quem mandou edificar este magnífico edifício localizado na Travessa do Carregal.
Por sua morte, sem descendência, passou o título para seu sobrinho, Álvaro Ferreira Girão, casado com D. Júlia Clamowse Brown, filha da poetisa por­tuense Maria da Felicidade do Couto Brown (1797 -1861), que aqui viveram muito tempo e onde lhes nasceram os seus quatro filhos.
Faziam gala do uso da sua capela dedicada a Santo António do Carregal, que ficava (e fica) logo a seguir ao portão da entrada, mas perfeitamente autónoma, com porta para a rua, encimada por uma coroa condal e, no granito, sobrepujando a porta, a pedra de armas da família e a data "1487 - 1903".
No século XV (1492) um tal João Martins Ferreira, um homem muito rico, teria fundado nesse local o morgadio do Carregal, também conhecido como o morgadio dos Ferreiras.
A área ocupada, digamos assim, pelo mor­gadio era enorme. Abrangia, tomando como referência a zona urbana dos nossos dias, o espaço compreendido entre as ruas de Ce­dofeita, Miguel Bombarda, Rosário, Restau­ração e o Largo do Prof. Abel Salazar.
Qualquer bom dicionário dará de morga­dio a seguinte definição; "vínculo indivisível e inalienável que passa, numa família, de pri­mogénito em primogénito, mas sempre em linha reta varonil". E a estes vínculos, acres­centamos nós, andavam ligados muitos e rendosos proventos. Isto para dizer que João Martins Ferreira era um homem muito rico e pessoa assaz influente na sociedade do seu tempo. 
Os viscondes de Vilarinho de S. Romão são descendentes deste João Martins Ferreira, mercador muito rico que esteve ligado à Câmara como vereador.
No Palacete, em 1851, esteve alojado o Asilo da Infância, com a particularidade de ter na porta da rua uma caixa de esmolas, solicitando donativos aos transeuntes.
Em 1 de Junho de 1917, foi aqui fundado, sob a direcção de Valentim Moreira de Sá, o Conservatório Superior de Música, que aqui se conservou ate 13 de Março de 1976, quando, sob direcção de Fernanda Wandschneider, foi ocupar o antigo palacete da família Pinto Leite, na Rua da Maternidade, até o D.L. 310/83 o ter transformado em escola secundária”.
In Junta de Freguesia de Miragaia

O morgadio como instituição vincular tem origem na legislação castelhana e, embora seja adoptada pelo reino de Portugal antes, só entra na legislação portuguesa com as Ordenações Filipinas de 1603.
Os morgadios foram extintos em Portugal no reinado de D. Luís I por Carta de Lei de 19 de Maio de 1863, subsistindo no entanto o vínculo da Casa de Bragança, o qual se destinava ao herdeiro da Coroa. Este último morgadio viria a perdurar até 1910.
Sobre aquele João Martins Ferreira, que instituiu o morgadio do Carregal e é citado no anterior texto, sabe-se que:

“João Martins Ferreira viveu na cidade do Porto na viragem do século XV para o século XVI. Foi mercador e exerceu diversos cargos públicos. Serviu o Município como almotacé, procurador do concelho, vereador, juiz e, finalmente, chanceler. Acumulou um vasto património na área urbana e fora do Porto. Ligou-se, através do casamento, a prestigiadas famílias (a segunda mulher, Violante Correia, era filha bastarda de Frei Paio Correia de Lacerda, Bailio de Leça).
No último quartel do século XV, João Martins Ferreira instalou-se numa casa torre, situada na Rua dos Mercadores.
Em 1491, instituiu o morgadio dos Ferreiras. Pantaleão Ferreira, filho do seu casamento com Violante Correia, sucedeu-lhe no morgadio, o qual se transmitiu em linha direta nas três gerações seguintes.
João Martins Ferreira morreu em 1514, tendo sido sepultado na Capela de Jerusalém do Convento de São Domingos”.
Fonte: “gisaweb.cm-porto.pt”


Até há pouco tempo nas instalações do Palacete do Carregal, funcionou um estabelecimento do ensino secundário, o “Colégio Horizonte”.
Desde Maio de 2016, funciona lá um hotel.


Palacete dos Viscondes de Vilarinho de S. Romão já a funcionar como hotel – Ed. “booking.com”


Sobre António Lobo de Barbosa Ferreira Teixeira Girão (descendente de João Martins Ferreira), um liberal que já tinha participado na revolta de 1820, fala-nos o artigo seguinte publicado na "A Voz do Nordeste" em 28/09/2000.


“Em 1833 alistou se para combater ao lado de D. Pedro e teve papel preponderante durante o cerco de Lisboa, ao fazer os planos para reabastecer de água a cidade que se encontrava cercada pelas tropas miguelistas. Regressado à vida política foi nomeado Par do Reino e recebeu diversos cargos e honras dos quais se destaca o título de visconde de S. Romão, que lhe foi concedido por decreto de D. Maria II de 17.11.1835. Recebeu e desempenhou ainda outros importantes cargos: Inspector das Águas Livres e das Fábricas Anexas; Provedor do Papel Selado; Presidente Honorário de Instituto de África; Fidalgo e Cavaleiro da Casa Real; Comendador da Ordem de Nossa Senhora da Conceição; Administrador da Casa da Moeda: Prefeito de Trás-os-Montes e da Estremadura. Era também importante agricultor e reconhecido economista e nesta qualidade foi sócio da Sociedade Promotora da Indústria Nacional. As ideias económicas dum viticultor O primeiro visconde de S. Romão deixou uma extensa e interessante bibliografia. Nela sobressaem os estudos sobre a agricultura, especialmente das vinhas. sendo o mais conhecido a Memória histórica e analytica sobre a Companhia dos Vinhos denominada da Agricultura das Vinhas do Alto Douro (1833), que, de acordo com Inocêncio Silva, é o que de mais completo se escreveu sobre esta instituição. São também muito interessantes os seus estudos sobre economia, e nomeadamente sobre economia doméstica e até a culinária. Citemos aqui apenas dois títulos: Memória sobre a economia do combustível por meio de vários melhoramentos que se devem fazer nos lares ordinários, fornalhas, fornos e fogões (1834); e Arte do Cozinheiro e do Copeiro, compilada dos melhores que sobre isto escreveram modernamente (...) (1841). Alguns dos seus trabalhos foram publicados nas Memórias da Academia das Ciências e escreveu ainda diversos artigos para a Revista Universal Lisbonense, para os Annaes da Sociedade Promotora da Indústria Nacional e para outros periódicos. A sua obra constitui um bom exemplo do modo como a herança do movimento das luzes, e do reformismo que o caracterizou, se fez sentir entre nós, durante a primeira metade do século XIX. Além da grande variedade de temas abordados, nela perpassa a defesa da instrução e do saber como bases do progresso e do desenvolvimento económico do país. Dotado de espírito prático e inventiva, para ele a aquisição de conhecimentos tinha, acima de tudo, um sentido pragmático e operativo. Divisamos na obra e intervenção política de Teixeira Girão duas ideias bases: em primeiro lugar a defesa do desenvolvimento agrícola e sobretudo o aumento da produção vinícola. A quantidade e a qualidade eram para ele conciliáveis. Deveriam, assim, eliminar-se todos os entraves que bloqueavam a expansão da produção e do comércio livre e por isso insurge se contra os tributos e monopólios. Em segundo lugar, considerava que para conseguir este desenvolvimento económico do país, a instrução e inovação científica e tecnológica, que ela origina, eram as estratégias indispensáveis. Era preciso pôr em prática os ensinamentos dos economistas, modernizar e inventar novas máquinas, divulgar e introduzir novas culturas agrícolas, como a batata e, enfim, aprofundar os estudos agronómicos.
O romantismo e ardor que colocou na defesa das novas ideias conduzem a situações que podem parecer paradoxais, tais como, vermos um morgado a combater os morgadios e a reclamar a liberdade das terras, o fim dos vínculos dos dízimos e de todas as formas que entravem a produção. Valorizando a terra livre e o trabalho livre, base da inovação, as ideias económicas de Teixeira Girão continuam a ser uma referência obrigatória para todos os que consideram o sector vinícola e, em especial a vitivinicultura duriense, como uma das melhores apostas para o progresso moral e económico da nação. Muito teríamos a escrever sobre a vida e obra de Teixeira Girão, que aguardam, tal como a de muitos outros portugueses, por investigadores ou até por cineastas em busca de inspiração”.
In "A Voz do Nordeste" 28/09/2000; Fonte: “ruasdoporto.blogspot.pt”


Capela de Santo António do Carregal anexa ao palacete – Ed. JPortojo


Bem perto do Palacete situado na Travessa do Carregal, fica o Jardim do Carregal, cujo topónimo deriva de ser um local alagadiço infestado de uma planta, as carregas, que proliferam em terrenos húmidos.
Este jardim é considerado um dos últimos de concepção romântica (visível no traçado da ponte que atravessa o seu lago), da responsabilidade de Jerónimo Monteiro da Costa, que chegou a ter responsabilidades na Câmara Municipal no sector de parques e jardins, com intervenções, nomeadamente, no Jardim do Passeio Alegre, entre outros.



Jardim do Carregal


Os terrenos desse jardim, junto ao Hospital de Santo António pertenciam à Santa Casa da Misericórdia do Porto, quando foram cedidos em 1857 à Câmara para levantar o jardim que hoje se chama Jardim de Carrilho Videira e que, começou por se chamar, Praça do Duque de Beja.
Este Duque de Beja era o infante D. João, filho de D. Maria II.  
No subsolo do jardim e por baixo do Hospital de Santo António passa o chamado Rio Frio ou Rio do Carregal, com nascente na Rua da Torrinha.
O Jardim do Carregal já comunicou com a Rua do Rosário, no tempo da tracção eléctrica e até Outubro de 1925, por um túnel, que desembocava no prédio da actual Rua de Clemente Meneres, nº 16, quando os eléctricos traziam os passageiros  provenientes da Praça da Boavista e vice-versa.
Por aquele túnel já passavam, antes, vindos do Carmo, os “Americanos” que se dirigiam à Boavista.
Esta Rua do Rosário foi aberta em terrenos cedidos, em parte, pelo empresário chapeleiro, tio de Almeida Garrett, Domingos de Almeida, que fervoroso devoto de Nossa Senhora do Rosário alteraria o seu nome, para Domingos do Rosário de Almeida. Este sujeito era dono de uma quinta enorme denominada Quinta do Paço, que deu origem ao topónimo Rua do Paço de que existe hoje um troço que é o Beco do Paço ligando ao Jardim do Carregal.


Parada militar do Regimento nº 18, junto ao Jardim do Carregal, em 1900, podendo observar-se, à esquerda, a entrada do túnel que fazia a ligação à Rua do Rosário -Ed. Photo Guedes




Vista actual do local da foto anterior - Fonte Google maps


Pode observar-se por comparação das duas fotos anteriores, que os prédios mais próximos ainda existem.
Antes da construção do jardim existia no local uma Rua D. Pedro V cujo topónimo foi deslocado em 1883 para outro local, para as bandas de Massarelos. 

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