domingo, 12 de junho de 2022

25.160 O Mundo Elegante

 
Ultrapassado o ponto médio do século XIX, dando resposta ao desenvolvimento e à modernização que a sociedade portuense vinha experimentando surge, em 1858, para satisfação das jovens, a revista “O Mundo Elegante”.
Aquele novo período começara, de facto, em 1851, com o ciclo político chamado de Regeneração que terá como motor principal a figura de Fontes Pereira de Melo, primeiro, com a pasta de ministro das Obras Públicas e, depois, em 1861, na Chefia do Governo.
 
 


Fontes Pereira de Melo, em 1883
 
 
O progresso atravessou, então, transversalmente, toda a actividade económica e, sobretudo, com um desenvolvimento enorme nas vias de comunicação.
No que ao Porto concerne, a cidade começa a ligar-se por uma rede viária que permitirá uma circulação mais eficaz.
Assim, em 5 de Maio de 1852, já se ia na carreira de diligência até Famalicão, com a viagem inaugural de ligação até Braga, a acontecer em 4 de Maio de 1853, num traçado cujo perfil corresponderá à conhecida EN 14.
Naquele percurso inicial, os passageiros apeavam-se para a travessia do rio Ave. Só, mais tarde, em 1858, foi possível fazer a travessia através da ponte pênsil da Trofa.
Antes, a travessia do rio Ave, entre Ribeirão (Vila Nova de Famalicão) e São Martinho do Bougado (Trofa), era feita com recurso à utilização de barcas. 

 
 

Ponte Pênsil da Trofa – Pintura a óleo de Alcino Costa
 
 
 
Enquanto a ligação a Braga não ficou concluída, os passageiros tinham que se apear na freguesia de Arnoso, para que, aí, fosse construído um viaduto.
Esse local, na fronteira dos concelhos de Famalicão e Braga, ficou para sempre identificado por um obelisco, que ainda hoje pode ser observado.
 
 
 
 

Obelisco de Arnoso, na EN 14, alusivo à construção pela Companhia de Viação Portuense, da ligação entre Porto e Braga
 
 
 
Então, a diligência partia às 6 horas do Porto e chegava a Braga ao meio dia. Na volta, saía da cidade dos arcebispos às 15 horas e chegava à Invicta às 21 horas.
Em 1859, já era possível ir de diligência à Vila da Feira, com partidas às 2ªs, 4ªs e 6ªs feiras e regresso, às 3ªs, 5ªs feiras e Sábados.
Em meados da década de 1860, já se viajava diariamente para Braga, Famalicão, Guimarães, Barcelos, Viana do Castelo e Amarante.
E, a rede de itinerários não deixou de crescer, inclusive a referente às ligações ferroviárias.
Mas voltando ao lançamento da revista “O Mundo Elegante”, o seu aparecimento vinha dar resposta a um sector da sociedade, mais jovem, e que começava a virar as suas atenções para o que se passava na Europa, principalmente nas grandes capitais europeias.
“O Mundo Elegante”, que se publicaria no Porto de 1858 até 1860, dizia ser um periódico semanal de modas, litteratura, teatros, bellas artes, &c,.
Seria fundador da publicação o veronês Jacopo Carli que seria, também, o seu Compositor Musical, sendo Camilo Castelo Branco o seu Redactor literário.
Para além de muitas outras figuras de vulto, Francisco Marques Sousa Vitervo colaboraria assiduamente com a sua poesia.
 
 
“Jacopo Carli era natural de Verona tendo permanecido no Porto entre 1840 e 1861. Inspirado pelo ambiente musical que se vivia na cidade decidiu prestar também o seu contributo propondo à Câmara Municipal a criação de uma escola de canto que proporcionasse um ensino completo, de qualidade e gratuito. Desta forma, estudar canto estaria acessível a todos, aproveitando os talentos que, de outro modo, ficariam por desenvolver.
Carli ofereceu os seus serviços de forma gratuita. A proposta do cantor foi rapidamente acolhida pela Câmara Municipal do Porto, que desde 1846, durante o mandato do então presidente José Passos, tinha em mente a criação de uma aula de canto na cidade. Consequentemente, em 13 de junho de 1855, o jornal Eco Popular publicou um documento no qual se anunciava a inauguração de uma Escola Popular de Música Vocal da Câmara Municipal do Porto, gratuita e destinada a rapazes maiores de onze anos de idade, sendo seu professor e diretor Jacopo Carli.
O método aplicado seria o mesmo que se utilizava no Conservatório de Música de Milão por considerá-lo o mais adequado. A Escola Popular de Música Vocal estava instalada na Câmara Municipal e no primeiro dia de aulas contava com 53 alunos matriculados. O sucesso desta instituição durante os primeiros anos de funcionamento viria a ser recolhido, de forma pormenorizada, pelo jornal O Comércio do Porto. No primeiro ano o número de alunos era de 342, no ano seguinte 132 e, em 1857, 113 alunos. Um ano depois aumentara para 132 ficando com 96 alunos em 1859. Quando Jacopo Carli abandonou Portugal, por circunstâncias familiares que o obrigaram a regressar a Itália, a Escola de Canto não sobreviveu ao seu afastamento”.
Cortesia de Rosa Maria Sánchez Sánchez – In “Dissertação de Mestrado em Estudos Literários, Culturais e Interartes”
 
 
Durante a sua permanência na cidade, Jacopo Carli para além de dar aulas a alunos (as) em privado, também teve a seu cargo as aulas de piano e canto do Liceu da Ordem Terceira da Santíssima Trindade, que abriu portas em 1857, tendo sido substituído nessa tarefa, quando regressou a Itália, por Estanislau Delgado Canedo.
 
 
“Para além da sua atividade como professor, Carli foi editor da revista O Mundo Elegante, que publicava em cada número uma peça inédita de um compositor portuense. O próprio Carli chegou a publicar uma basta obra de peças para piano e para canto e piano; no entanto, as suas capacidades como compositor estavam muito longe de igualar o seu talento como professor. Na opinião de Ernesto Vieira eram «tudo cantilenas banais e outras composições publicadas, a maior parte delas para piano, também nada valem.» [VIEIRA, 1900: vol. I, p. 220]”
Cortesia de Rosa Maria Sánchez Sánchez – In “Dissertação de Mestrado em Estudos Literários, Culturais e Interartes”
 
 
 

Jacopo Carli (1820-1890)

 
 
O primeiro número de “O Mundo Elegante” foi para as bancas, em 24 de Novembro de 1858, terminando a sua publicação em Fevereiro de 1860.
“O Mundo Elegante” será pioneiro, no que à moda dizia respeito, por permitir a escrita da sua crónica de modas a modistas, embora elas fossem todas francesas. Tratava-se de duas irmãs, Mesdames Ferins, modistas com atelier na cidade e com elevados créditos.
“O Mundo Elegante” oferecia, inicialmente, estampas de moda coloridas, assinadas por Emygdio, do qual se sabe que trabalhava na Oficina Litográfica de Villa Nova f.º & C.ª, na Rua de Santa Teresa, n.º 26, no Porto.
A oficina litográfica, atrás referida, pertencia a herdeiros do conhecido litógrafo Joaquim Cardoso Victória Vilanova, falecido em 1850 e com estabelecimento primitivo na Rua do Campo Pequeno (ao Largo da Maternidade).
Teria nascido, no Porto, em 1792 ou 1793. Assinava as suas litografias da seguinte forma: "J.C. Vilanova".
Em 1850, após a morte de Joaquim Cardoso Victoria Vilanova, a oficina primitiva encerrou, aparecendo, anos mais tarde, sob a firma “Vilanova, Filhos & C.a”, na Rua de Santa Tereza, n.° 26 e, depois, na Rua Formosa, n.° 331, com a designação “Vilanova & Filhos”.
Quanto a Emygdio será, por certo, o célebre Emídio Amatucci, o proprietário de uma conceituada litografia da Rua de Santa Catarina, n.°s 19 e 20.
Em 1859, as gravuras de moda de “O Mundo Elegante” passam a ser monocromáticas, talvez com o intuito de embaratecer a publicação.
 
 
“O número de modistas na cidade do Porto era muito mais reduzido que na capital, e estas só começariam a aumentar após o Cerco, no fim das Guerras Liberais. Aproveitaram a oportunidade de negócio modistas como Madame Villaret, que se estabeleceu nesta cidade. Mas muitas destas modistas optavam por aí se estabelecer em períodos sazonais, provavelmente na época de bailes no inverno, e no início da primavera, quando as damas se ocupavam pela encomenda de novas toilettes para a estação. Era o caso da modista Eliza Gautir que sem estabelecimento nesta cidade, aí comercializava, voltando para Lisboa após o escoamento do stock”.
Cortesia de Ricardo Braga, In “A Moda no Periodismo Português Oitocentista”
 
 
 

Cabeçalho do frontispício da revista “O Mundo Elegante”, Nº 1 (24 de Novembro de 1858) - Fonte: Biblioteca Pública Municipal do Porto
 
 
 
A gravura, acima, representa uma reunião ou uma soirée, onde figuram vinte e duas personagens, evidenciando-se uma senhora que toca piano, outra que canta, as demais assistindo, todas elas rodeadas por cavalheiros.
Aquelas soirées realizavam-se frequentemente nas casas dos burgueses do Porto. Para além dessas reuniões, a Sociedade Filarmónica Portuense e a Assembleia Portuense promoviam-nas da forma mais apetecível para os mais jovens – os bailes – que decorriam durante o Inverno e Primavera.
As jovens, filhas dos burgueses portuenses, para além daquelas reuniões musicais/dançantes experimentavam a sedução do mundo exterior, fora da cerca da residência familiar, com idas regulares à igreja e, por vezes, nos fins-de-semana, acompanhadas de perto pela presença atenta dos pais, ao Jardim de S. Lázaro, normalmente para um passeio sem destino ou para ouvir uma qualquer banda actuando no seu coreto.
Assim, era, em 1858, já que os Jardins do Palácio de Cristal só apareceriam em 1865, e o Jardim da Cordoaria só abriu ao público em 1867.
Quanto aos jovens burgueses era a estúrdia completa.
Pois, é neste caldo de cultura, que a revista “O Mundo Elegante” é lançada.
Em 1858, no ano de lançamento de “O Mundo Elegante”, vários outros acontecimentos foram notícia.
Em Outubro, falece José Plácido e Maria José, ambos irmãos de Ana Plácido.
Aliás, o desenlace de Maria José acontece quando as duas irmãs passavam mais uma temporada no Bom-Jesus de Braga, a ares, para que a jovem tentasse debelar a tísica. Por essa altura, também Camilo Castelo Branco dava o saltinho ao santuário para se encontrar com Ana Plácido e, na volta, já após a morte de Maria José, escrevia ao seu amigo, protector e confidente, José Barbosa da Silva:
 
 
“Meu caro Barbosa
(...)
A Ana está cada vez pior. Da morte da M. J., já tu sabes. Eu não posso, sem lágrimas, deter-me na triste previsão do que vai ser a minha vida. Creio que se não for um cadáver, serei um ‘cadáver moral’, um padre”.
 
 
A 7 de Novembro desse ano, o Porto assistiria à inauguração do novo Teatro-Circo (actual Sá da Bandeira).
No balanço do ano de 1858, no que diz respeito à actividade económica, ele seria marcante, pois, em virtude de uma crise, acabariam por falir cerca de 100 empresas.
Entretanto, continuavam a chegar ao Porto e ao norte do país, os brasileiros de torna-viagem procurando, muitos deles, as jovens casadoiras da burguesia portuense.
À frente da Câmara do Porto, começaria neste ano o seu mandato, que se estenderia até 1865, o conde de Lagoaça.
 
 
 

Ilustração In revista “O Mundo Elegante”, Nº 1 (24 de Novembro de 1858) – Fonte: Biblioteca Pública Municipal do Porto
 
 
 
Naquele primeiro número de “O Mundo Elegante”, como artigo de fundo, podia ler-se:
 
 
“O Mundo Elegante será o mundo-patarata? Suspeita damninha que entra a inguiçar-me logo no principio! O mundo elegante é a sociedade polida, lustrosa, invernizada no corpo e no pensamento, na acção e na palavra, na intenção e na obra. Patarata quer dizer ostentação van. Elegamcia quer dizer escôlha. Poderão imparceirara-se as duas coisas n’um mesmo individuo, n’uma mesma classe? (…) O Mundo-Elegante faz-se para todas as caras possiveis, desde a botocuda até á georgiana; Para todas as intelligencias imaginaveis: Para todas as progenies admissiveis na ordem da propagação; Para todos as virtudes ainda as mais hypotheticas. (…) Um mundo assim elegante póde e deve ter um jornal, um como archivo dos seus fastos, uma especie de acta em que se vão escrevendo as phases da civilisação portuense. De hoje a cem annos, quando o Porto attingir o seu destino de maxima perfectibilidade, os nossos netos mostrarão este jornal como testemunho de uma civilisação remota. (…) Falta saber que este jornal abomina a sciencia. Aqui só se escrevem coisas que o leitor póde esquecer uma hora depois, com tranquilla consciencia de que não perdeu coisa alguma. Abjura-se tambem a satyra, e a critica. Cada qual póde fazer o que quizer, e viver como quizer. Respeita-se a ignorancia e o vicio: respeita-se tudo.”
Camilo Castelo Branco
 
 
Sobre o lançamento do 1º número de “O Mundo Elegante” dava nota o jornal “O Comércio do Porto”, em 25 de Novembro de 1858, e no dia seguinte, curiosamente, sempre pela pena do omnipresente Camilo Castelo Branco e que, seguidamente, se destaca.




In jornal “O Comércio do Porto” de 25 de Novembro de 1858


 
Na notícia, anterior, é possível também observar que a Sociedade Filarmónica Portuense anunciava a abertura das suas reuniões dançantes e musicais da nova época.
 
 
 

In jornal “O Comércio do Porto” de 26 de Novembro de 1858
 
 
A Lisboa, a notícia chega, no dia 26 de Novembro, através do jornal “A Revolução de Setembro”, de António Rodrigues Sampaio.
Assim:
 
“No Porto vai publicar-se um novo jornal de modas, teatros e literatura, de que será principal redator o distinto escritor Camilo Castelo Branco, e que se denominará o “Mundo Elegante”. Parece que o sr. Evaristo Basto também colaborará no mesmo jornal.”
“A Revolução de Setembro” de 26 de Novembro de 1858
 
Mais tarde, “A Revolução de Setembro” sobre o primeiro número de “O Mundo Elegante” diria:
 
“Já se publicou no Porto o 1º número do ‘Mundo Elegante’, semanário de modas, literatura, teatros, belas–artes e romances, e que é redigido pelo sr. Camilo Castelo Branco. Neste número, além da introdução, obra da pena do sr. Camilo Castelo Branco, aparece um esboço da vida de Adriana Lecouvreur, da Laura de Petrarca, e de Margarida de Valois. Todos os jornais são concordes em declarar que esta publicação será muito importante, se o sr. Camilo continuar à sua frente.”
 
 
Em 1 de Janeiro de 1859, no nº6 da revista “O Mundo Elegante”, Camilo Castelo Branco informava os seus leitores da homenagem prestada pela Câmara do Porto ao compositor Jacopo Carli, com a atribuição de uma medalha de ouro alusiva ao seu trabalho à frente da Escola Popular de Música Vocal da Câmara Municipal do Porto.
 
 

“O Mundo Elegante”, Nº 6, de 1 de Janeiro de 1859, dando conta de homenagem a Jacopo Carli com atribuição de uma medalha de ouro




Ilustração In revista “O Mundo Elegante”, Nº 10 (Fevereiro de 1859) – Fonte: Biblioteca Pública Municipal do Porto

segunda-feira, 6 de junho de 2022

25.159 Palácio de Cristal (outros factos)

 
Circo Olímpico e o Museu Industrial e Comercial do Porto
 
 
Museu Industrial e Comercial do Porto ao Palácio de Cristal, no denominado Circo Olímpico
 
 
O Circo Olímpico, situado entre o Quartel e a Rua da Restauração, foi utilizado como um complemento ao Palácio de Cristal durante a Exposição Internacional de 1865.
Durante muitos anos, a ligação entre esses terrenos e o Palácio de Cristal era feita por uma ponte, visível na foto acima.
 
 
“Este esbelto edifício, construido inteiramente de ferro em Inglaterra, levanta-se do lado de leste e a pouca distancia do palacio de cristal. Tem doze faces, e n'ellas quatro corpos como vestibulos, que resaltam um pouco para fóra, correspondendo aos quatro pontos cardeaes, tendo cada um d'esses vestibulos tres portas de entrada. Recebe a luz e ventilação pela cúpula.
Como ao tempo da exposição ainda não se tivessem começado os camarotes, palanques e mais obra de madeira, o circo apresentava a vista de um grande e bello salão, lindamente pintado de côres alegres, e alumiado por abundante luz.
A gravura que acompanha este artigo, a qual foi copiada de uma photographia, mostra a perspectiva que se desfructava da porta de entrada principal do mesmo circo, que era a que communicava com a galeria, por onde se passava a coberto do rigor do tempo para os dois grandes armazéns annexos ao palácio de cristal”.
Ignácio de Vilhena BarbozaArchivo Pittoresco n.º 40 Tomo IX 1866 (pág 313) 
 
 

Circo Olímpico – Ed. Archivo Pittoresco, 1866, nº 40 Tomo IX

 
 
Por sua vez, o Museu Industrial e Comercial foi criado oficialmente em 31 de Dezembro de 1883, como complemento das escolas industriais criadas alguns dias depois, em 3 de Janeiro de 1884, mas a sua inauguração no Circo Olímpico só ocorreria em 1886.
 
"Abre domingo próximo, no circo Olímpico do Palácio de Cristal, O Museu Industrial e Comercial do Porto"
In jornal "O Primeiro de Janeiro", de 19 de Março de 1886 - 6ª Feira
 
 
A partir desta data, nas instalações do Circo Olímpico coexistiram o museu e a escola com o nome de Escola de Desenho Industrial de Vilar, que tinha sido criada em 1884 e que, a 5 de Dezembro desse ano, recebeu o nome do Infante D. Henrique, e que o manteve até hoje. 
O museu Industrial e Comercial ficou desde a sua fundação, sob a direcção de Joaquim Vasconcelos, que a partir de Setembro de 1888 é nomeado conservador do museu.
 
“Em 1889 o museu contribui para a representação portuguesa na Exposição Universal de Paris e em 1890 organiza a Exposição Pedagógica no Palácio de Cristal.
Tendo em conta os últimos factos relatados, não foi surpresa a decisão de Etelvino Brito em extinguir os museus industriais e Comerciais de Lisboa e Porto por decreto-lei de 23 de Dezembro de 1899.
(…) Para substituir estes museus foi criada a Comissão Superior de Exposições a quem competia organizar alternadamente exposições anuais agrícolas e industriais no Porto e em Lisboa, ou excepcionalmente em qualquer outra parte do país.
Joaquim de Vasconcelos não se conformou com tal decisão. Durante muitos anos conseguiu manter as colecções do extinto museu juntas no mesmo edifício abandonado que serviu de museu na esperança de que este pudesse ser restabelecido.”
Com a devida vénia ao Dr. Carlos Loureiro – Curso de Pós-graduação em Museologia (Homenagem a Fernando Bragança Gil, Universidade do Porto, Faculdade de Letras, Porto 2005)
 
 
Com a implantação da República há uma réstia de esperança para que seja possível a reabertura do museu, mas tal não acontece, apesar de, em 1908, ter servido o seu espólio para dotar, em parte, a representação de Portugal na Exposição do Rio de Janeiro.
Em 18 de Junho de 1918, os objectos que faziam parte do antigo museu, são transferidos para uma das naves laterais do Palácio de Cristal que se encontrava desocupada, vindos do Circo Olímpico. 
Em 1927, as instalações do Circo Olímpico estavam em completo estado de degradação e Joaquim Vasconcelos ainda tinha as chaves das mesmas.
Entretanto, em 1932, o espólio do museu estava amontoado no edifício Braguinha em S. Lázaro e no prédio ocupado na Rua de Entreparedes pelo Instituto Comercial, pois, em 20 de Agosto de 1920, tinha sido decidido proceder à instalação do Museu Industrial e Comercial, junto do Instituto Superior do Comércio do Porto.
Algumas peças de cerâmica foram para o Museu Soares dos Reis, e entre a Escola Prática de S. Bento, em Santo Tirso, Escola Industrial de Faria Guimarães e Conservatório de Música de Lisboa, se distribuíram outras peças. Outro material teria recolhido ao Museu de Etnografia.
Hoje, aquela área, outrora ocupada pelo Circo Olímpico, está ocupada pelo Hospital Veterinário da Universidade do Porto, e a Rua Jorge de Viterbo Ferreira separa-a do Palácio de Cristal.
 
 
 
 
Dr. António Ferreira Braga e a Exposição Internacional de 1865
 
 
O Dr. António Ferreira Braga (1802-1870), morador na Rua dos Lavadouros, foi um capitalista, nesta qualidade com o seu nome ligado à Fábrica de Fiação de Crestuma, e que regeu ainda algumas cadeiras na Escola Médico-Cirúrgica, como lente, e terá para sempre o seu nome também ligado ao Palácio de Cristal, pois, para além de principal accionista da Sociedade do Palácio de Cristal foi ele, durante uma reunião ocorrida a 7 de Julho de 1864, na sede da Associação Comercial do Porto, quem avalizou com os seus capitais, para que fosse possível a inauguração daquele empreendimento e ele decorresse com uma mostra de cariz internacional.
Tendo o Palácio de Cristal apresentado sucessivos prejuízos durante a exploração da sua actividade, o Dr. António Ferreira Braga haveria de falecer, em 1870, com a sua fortuna muito depauperada e sobrando, para a posteridade, na toponímia recente, uma rua com o seu nome, na zona da Prelada.
Antes da reunião atrás referida, já tinha ocorrido, no Palácio da Bolsa, uma outra reunião, em 30 de Agosto de 1861, com a presença dos fundadores do Palácio de Cristal, sob a presidência de Guilherme Augusto Machado Pereira, onde seriam eleitos os membros para a direcção e conselho fiscal da denominada Sociedade do Palácio de Cristal.
A sua direcção seria composta por Alfredo Allen (1828-1907) – também membro da Sociedade Agrícola do Porto, tendo participado como expositor na primeira Exposição Agrícola de 1857 –, Francisco de Oliveira Chamiço (1819-1888) e Francisco Pinto Bessa (1821-1878), tendo como substitutos António Bernardo Ferreira (1835-1907) – na altura Presidente da A.I.P. (1859 e 1867) –, Eduardo Chamiço (-) e António José do Nascimento Leão (m. 1889); do conselho fiscal faziam parte José António de Sousa Basto (1805- 1890) – Visconde da Trindade –, José Joaquim Pereira Lima (m. 1884) e José Fructuoso Aires de Gouveia Osório.
A estes, juntavam-se ainda, António Ribeiro Forbes (1791- 1862), Joaquim Ribeiro de Faria Guimarães (1807-1879), José Joaquim Leite Guimarães (1808-1870) – 1º Barão de Nova Sintra –, António José de Castro Silva (1825-1886) – 1º Visconde de Castro e Silva.
Foi, então, criada a Sociedade do Palácio de Cristal, tendo sido emitidas acções de 100$000 num total de 100 contos de reis, podendo o capital subir a 200 contos de reis. 
Constituir-se-ia, assim, uma longa lista de accionistas da Sociedade do Palácio de Cristal. No total, 265 accionistas, todos fundadores daquela importantíssima instituição.
Os maiores accionistas foram, inicialmente, o Conde de Terena e D. Anna Margarida de Noronha Braga (casada com António Ferreira Braga, falecida em 21 de Julho de 1886), cada um com quatro contos; seguem-se José Joaquim Leite Guimarães e Visconde de Pereira Machado, com três contos; António Ferreira Braga, Young & C.ª, Luiz Alves Pinto Basto, D. Maria Christina de Faria, D. Maria Emília Ribeiro Coelho Cabral, Viscondessa de Pereira Machado e Viscondessa da Trindade, com 2 contos; D. Maria Júlia Cardoso Pereira Ferraz Carvalho de Lucena (2:300$000); El-Rei D. Pedro V, com 1:500$000; El-Rei D. Fernando, com 800$000; Imperatriz e o senhor Infante D. Luiz (depois Rei) com 500$000 reis cada um; contavam-se mais trinta accionistas de conto de reis ou para cima, mas abaixo de 1:500$000.
A partir do mês de Setembro de 1861, começaria a campanha de realização do capital da sociedade do Palácio de Cristal.
 
 
 

Anúncio publicado no jornal “O Comércio do Porto”, em 30 de Setembro de 1861


Em 2 de Fevereiro de 1866, pelas 8h30, o rei Luís I esteve no Palácio de Cristal a assistir ao último concerto, que ali se realizou, antes do encerramento da I Exposição Internacional do Porto, estando presentes quase 2000 pessoas. O concerto terminou pelas 11h, tendo depois el-rei recebido uma comissão que pretendia colocar um padrão qualquer, nos jardins do Palácio de Cristal, para recordar os promotores da exposição: o visconde de Vilar de Allen e António Ferreira Braga.
Para este efeito, foi feita uma subscrição, que encerraria no dia 6 de Fevereiro de 1866, tendo rendido a soma de 1.500$000 rs.
 
 
 
Escolha da Torre da Marca
 

A escolha da instalação, em 1865, do Palácio de Cristal nos terrenos da Torre da Marca, teve como ensaio as exposições agrícolas aí realizadas.
Por determinação de Fontes Pereira de Melo, reconhecendo a importância da agricultura na riqueza do país, seriam organizadas sociedades agrícolas em todas as capitais de distrito.
No Porto, por acção do Barão do Valado, constituir-se-ia a Sociedade Agrícola do Distrito do Porto, em Dezembro de 1854.
A primeira Exposição Agrícola ocorreria nos terrenos da Torre da Marca em 12, 13 e 14 de Julho de 1857.
 
 

Torre da Marca e Massarelos
 
 
 
Na gravura acima é visível a capela de Carlos Alberto, inaugurada em 1861, mas começada a construir alguns anos antes.


 
Jornal “O Comércio do Porto” de 15 de Julho de 1857
 
 
 
A segunda edição da Exposição Agrícola teria lugar, no ano seguinte, no mês de Outubro, como dá conta o jornal “O Comércio do Porto” de 25 de Outubro de 1858 (2ª Feira)