quinta-feira, 28 de novembro de 2019

(Conclusão) - Actualização em 22/04/2021


Comemorações do Centenário da Fundação da Nacionalidade (1140) e do Centenário da Restauração da Independência (1640)


No Porto, em 1940, as festividades alusivas àquelas duas comemorações, centrar-se-iam em volta da Sé Catedral, com uma remodelação geral do espaço existente.
Em frente à Sé, viria a nascer um largo, que é o que hoje existe, e pode ser apreciado. Para isso, foi necessário eliminar algumas ruas e ruelas de um aglomerado habitacional de cariz medieval, e demolir as habitações que impediam essa tarefa. Foi, assim, intervencionada uma área dentro do perímetro do chamado Castelo.
Desapareceram, em sequência, para sempre, a Rua da Senhora de Agosto, a Rua do Paço, a Rua das Tendas e o Largo do Paço Episcopal.
A própria Rua de S. Sebastião viu-se um pouco amputada no seu tamanho.
Pretendeu-se, com a intervenção levada a cabo, a monumentalização do conjunto dos edifícios episcopais, tornando-os mais visíveis.
O facto saliente é que, se aquele objectivo foi atingido, por outro lado, a raiz histórica do lugar perdeu-se, em parte.
Salvou-se a Capela dos Alfaiates, mas num cenário completamente diferente.



Na foto, a placa toponímica que indica o Largo do Paço Episcopal. Ao fundo a Sé – Fonte: AHMP



Largo fronteiro à Sé do Porto (à esquerda) antes de 1940. Ao fundo, o Paço Episcopal e, à direita, a Capela de Nossa Senhora de Agosto (conhecida por Capela dos Alfaiates) que foi transferida, pedra a pedra, para o gaveto entra a Rua do Sol e a Rua de São Luís



Aspeto das demolições no Largo do Paço Episcopal (actual Largo Dr. Pedro Vitorino), para o alargamento do Terreiro da Sé – Fonte: AHMP



Capela dos Alfaiates, na Sé, em 1935



Capela dos Alfaiates no seu lugar actual – Ed. “visitporto.travel”


Alguns anos antes, nas imediações daquele local, e dentro ainda dos limites da muralha sueva, se tinha procedido a uma outra demolição, com a qual, alguns portuenses não concordaram.
Tratou-se do derrube do “Arco de Sant’Ana” e, quem mais se fez, então, ouvir, foi Almeida Garrett.
Assim, em 2 de Junho de 1821, começa a ser demolido, por ordem da Câmara, o velho “Arco de Sant’Ana”, junto à Sé, resultante de um pedido de Manuel Luiz da Silva Leça e António Joaquim de Carvalho.
Tal facto, deixaria indignado Almeida Garrett que se manifesta nos seguintes termos:


“Cahiste pois tu, ó arco de Sant’Anna, como em nossos tristes e minguados dias, vae cahindo quanto ha nobre e antigo ás mãos de innovadores plebeus, para quem nobiliarchias são chimeras, e os veneráveis caracteres heráldicos de rei d’armas Portugal lingua morta, e esquecida que nossa ignorância despreza, hieroglyphicos da terra dos Pharaós antes de descoberta a inscripção de Damieta!
Assentaram os miseráveis reformadores que uma pouca de luz mais e uma pouca de immundicie menos, em rua já de si tam escura e mal enchuta, era preferível á conservação d'aquelle monumento em todos os sentidos respeitável!
Com que desapontamento deste meu coração, depois de tantos annos de ausência, não andei procurando, em vão!... Na rua de Sant’Anna, uma das primeiras que a minha infancia conheceu, as gothicas feições d’aquellé arco? e a alampada que lhe ardia continua, e os milagres de cera que lhe pendiam á roda, e toda aquella associação de cousas, que me trazia á memória os felizes dias de minha descuidada meninice!”
Almeida Garrett



O Arco de Sant’Anna estava localizado na rua que teve o mesmo nome, a partir do século XVIII e, antes, durante a idade média, tinha sido Rua das Aldas e, depois da construção do colégio de S. Lourenço (Grilos), Rua do Colégio, embora amputada de uma porção, na sua extensão.
O Arco de Sant'Ana das Aldas era o que restava de uma das quatro portas da velha cidade do Porto, talvez mesmo um postigo aberto no extremo da muralha do lado norte, que nesse ponto quebrava em direcção ao sul, correndo em seguida pelas traseiras da antiga Rua dos Mercadores, paralela à de Sant'Ana.
 
 
 

Arco de Sant’Ana, In revista” O Tripeiro”
 
 

Arco de Sant'Ana e oratório - Reconstituição de Gouvêa Portuense
 
 
Sant’Ana, a avó de Jesus Cristo, foi adorada todos os dias num oratório, implantado num arco da Rua das Aldas.


 

Imagem de Sant’Ana, da Virgem e do Menino, que era adorada no Arco de Sant’Ana
 
 
Aí, correndo em busca de auxílio, as parturientes, em dificuldades, tinham a devida assistência, numa casa contígua ao oratório que lhes disponibilizavam, quer durante o dia ou à noite, as Cadeiras de Sant’Ana, nas quais se recostavam e adquiriam a fé que necessitavam, em troca da oferta de um pouco de azeite (a lâmpada do Arco mantinha-se permanentemente acesa) ou de uma pequena dádiva em dinheiro.
A 26 de Julho, dia da festa anual da padroeira, o Arco onde assentava o oratório com a imagem da Santa era ricamente decorado com panos (alguns deles bordados a ouro e prata) e flores, dando ao Arco o aspecto de uma capela-mor.
Quando o Arco de Sant’Ana foi demolido, em 1821, a imagem da Santa e as Cadeiras de Sant’Ana passaram para a capela de S. Crispim, junto da Rua da Biquinha, continuando a servir do mesmo modo que anteriormente.
Assim, na tarde de 29 de Junho de 1821, a imagem alvo de veneração foi, sob o estandarte da irmandade dos sapateiros, curtidores, surradores e correeiros, conduzida, em procissão e em magnífico andor, pelos mestres que nesse ano eram juízes ou tinham assento na Casa dos Vinte e Quatro (em que estes ofícios gozavam do direito de banco), para a capela de S. Crispim e, aí, colocada em altar especial.
 
 
Cadeira de Sant’Ana, para parturientes
 
 
 
 
Do velho arco de Sant'Ana, actualmente, apenas sobrevive a porta que permitia o acesso ao nicho onde estava a imagem de Sant’Ana com a Virgem e o Menino, apesar de, em 13 de Maio de 1943, a Câmara Municipal ter aprovado um projecto para o reconstituir e reimplantar, no seu local primitivo, o que não se concretizaria.
Hoje, a imagem de Sant’Ana está esquecida na Capela de S. Crispim, entretanto, deslocada, nos finais do século XIX, para a actual Rua de Santos Pousada. 









Local actual do Arco de Sant'Ana - Ed. Graça Correia




Interior da Sé, em 1910, antes do restauro dos anos 30 do século XX – Ed. Foto Guedes



Sé em 1934 – Ed. Alvão


Entrada da Sé em 1934 – Ed. Alvão



Castelo da Sé e Sé catedral


Durante a nossa 1ª dinastia até ao reinado do D. João I, o Bispo e a Sé, como centros de poder, pontificaram no governo da cidade. A partir daí, com a ajuda do rei, os burgueses puderam, aos poucos, determinar o seu destino.


«Fomos à procura e, no "Corpus Códice", importante documento de leitura obrigatória para quem quiser conhecer a história do Porto, do tempo em que ela era feudo dos senhores bispos, num trecho datado de 1339, em que a Igreja determinava as coimas, ou seja, as multas, a aplicar a quem não cumprisse determinadas regras, nomeadamente as que diziam respeito aos privilégios dos portuenses, lá aparece o seguinte:
"nenhum rico homem, nem rica-dona, nem cavaleiro, não pousará dentro na cerca do castelo e se aí for pousar o dito Senhoria da Igreja lhe fechará "as portas do dito castelo e terá dele as chaves o bispo ou seu mandado".
Também no "Catálogo dos bispos do Porto", escrito em 1623 pelo prelado D. Rodrigo da Cunha (bispo da diocese portucalense entre 1619 e 1627), se abordam as questões que aconteceram entre o austero bispo D. Vasco Martins e os homens do Senado (leia-se Câmara) que tanto agitaram a cidade aí por 1341. Escreveu D. Rodrigo:
"chegou o negócio (os acontecimentos) a termos tais, que em certo alvoroço se juntaram alguns do povo e com mão armada se foram ao paço do bispo apostados em o afrontarem e maltratarem, mas ele, que soube do motim primeiro que os conjurados chegassem à Sé em que assistia a um ofício fúnebre de certa pessoa nobre, se recolheu ao castelo que era a fortaleza da Igreja do Porto".
“Numa das pedras da torre virada a norte, existem dois curiosos elementos escultóricos: um "signum salomonis" (sino saimão) que fica junto ao primeiro gigante; e a figura de uma barca, que os especialistas dizem ser a mais antiga representação iconográfica de uma embarcação que é por vezes identificada como sendo uma coca (esta, de origem nórdica, era utilizada no tráfego costeiro).
Mas há também quem considere aquela figura esculpida no granito como sendo o navio de S. Vicente e ligue a sua existência na referida torre da catedral à lenda de S. Vicente mártir, que é o padroeiro de Lisboa e foi o primeiro padroeiro da cidade do Porto.
A lendária história é conhecida: o diácono Vicente foi martirizado por Daciano, governador de Saragoça e Valência, por ordem expressa do imperador Maximiano. O corpo de S. Vicente, continua a lenda, foi recolhido num barco que, sob a proteção de dois corvos, aportou ao rio Tejo. D. Afonso Henriques trouxe um braço do mártir para o Porto, e S. Vicente foi padroeiro desta cidade de 1173 a 1453.
Foi grande, no Porto, o culto de S. Vicente cuja imagem esteve na capela de Nossa Senhora da Encarnação, também conhecida por capela de S. Tiago, que ficava nos claustros da Sé. A festa a S. Vicente era no dia 22 de Janeiro e tinha como promotores os correeiros, peleiros, caldeireiros e douradores que tomaram o mártir como patrono.
(…) A imagem de S. Vicente está na Sé, no altar de Sant' Ana, no transepto, perto da porta que dá acesso à sacristia, onde antigamente esteve a capela da família dos Alões.
Durante muitos anos, em frente à imagem de S. Vicente, na catedral, esteve sempre acesa, de dia e de noite, a chama de uma lamparina de azeite. Em 1600, foi criado um prazo, segundo o qual um tal Francisco de Carvalho, morador no lugar de Melres, então do extinto concelho de Aguiar de Sousa, que ali tinha um olival, era obrigado a oferecer, anualmente, dois almudes de azeite, que à sua custa tinha a obrigação de trazer a esta cidade do Porto, para que nunca se apagasse a chama votiva no altar de S. Vicente.”»
Cortesia de Germano Silva


A área à volta da Sé, desde sempre, foi a residência das personagens importantes do clero e da burguesia do Porto.
Na rua, que pode dizer-se ficava por trás da Sé e, por isso mesmo, se chamava Rua de Trás da Sé e que a partir de 11 de Outubro de 1919, a Câmara determinou que seria a Rua da Catedral e hoje é a Rua D. Hugo, as casas daqueles burgueses e clérigos de elevado estatuto eram porta com porta, como se vê pela identificação respectiva nas plantas seguintes.



Ocupação dos prédios da Rua de Trás da Sé, para Norte da Capela de Nossa Senhora das Verdades (1) – Planta de Telles Ferreira de 1892



Ocupação dos prédios do troço da Rua de Trás da Sé mais a Norte – Planta de Telles Ferreira de 1892



No fim da década de 30 do século passado, a área fronteira à Sé, onde vivia sobretudo o povo, foi arrasada para dar outro enquadramento à catedral.



Vista aérea do casario fronteiro à Sé, antes das demolições – Crédito a “Estrela Vermelha”



Sé e Paço Episcopal com demolições já a decorrer para abertura do largo em frente à Sé




A meio, a calçada de Vandoma de acesso à Sé. À direita, o Solar dos Correia Montenegro (demolido poucos anos depois)



Uma outra perspectiva da Calçada de Vandoma e da Sé



Rua de Nossa senhora de Agosto (1933), desaparecida com as demolições – Ed. Bomfim Barreiros (AHMP)



Demolições à entrada da Calçada de Vandoma



As demolições efectuadas na Sé com o objectivo de ganhar um largo


Após o arranjo urbanístico acontecido em volta da catedral, a inauguração oficial do Terreiro da Sé seria levada a cabo, a 7 de Junho de 1940, pelo Ministro das Obras Públicas Duarte Pacheco, Presidente Comissão Administrativa da C.M.P., Mendes Correia e outras individualidades.



Cerimónia de inauguração da nova zona envolvente à Sé Catedral, que seria baptizada como Terreiro D. Afonso Henriques e que, hoje, é o Terreiro da Sé



Na foto acima observa-se a chegada das individualidades, subindo a Calçada de Vandoma, para procederem à inauguração, que ficaria conhecida como o “Acto Medieval”, do novo Largo da Sé, em 1940.
As casas que se veem atrás da comitiva seriam, mais tarde, também demolidas, para abertura da Avenida Afonso Henriques, de acesso ao tabuleiro superior da ponte Luíz I, entre 1947 e 1949.



Inauguração do Terreiro D. Afonso Henriques, hoje, Terreiro da Sé



Perspectiva obtida a partir do Terreiro da Sé, em que se vêm a Torre dos Clérigos, a antiga Torre dos Alões (a meio), a Câmara Municipal do Porto e o falso Pelourinho





 
 
Na foto anterior, a meio, no Largo da Sé, observa-se uma placa em pedra invocando a reunião havida, em 1147, pelo bispo do Porto Pedro Pitões quando foi encarregado pelo rei D. Afonso Henriques de receber uma frota de cruzados do norte da Europa que tomavam parte da Segunda Cruzada. Aí, D. Pedro fez um discurso aos cruzados para convencê-los a ajudar os portuenses a conquistar Lisboa.
E, assim, na cidade do Porto, se comemoraram, de uma vez só, dois centenários.


quarta-feira, 27 de novembro de 2019

(Continuação 2)


Comemorações no Porto do Centenário da morte do Infante D. Henrique


Em 1960, o Porto assistiu às comemorações do 5º centenário da morte do Infante D. Henrique (4 de Março de 1394, Porto - 13 de Novembro de 1460, Sagres), que se realizaram por todo o País.
O ponto alto das comemorações, na cidade invicta, prendeu-se com a inauguração da remodelada Casa do Infante e de outros edifícios a ela anexos e de uma outra inauguração, ocorrida no Largo António Calém, de um monumento dedicado ao esforço que os portuenses desenvolveram na expansão marítima, no tempo do Infante D. Henrique.
Aquele Largo António Calém, que outrora já se chamou Largo do Ouro, deve a actual toponímia em memória de António Alves Calém, nascido em 1829, que por ali teve uma fábrica de Curtumes, apesar de a família da qual foi patriarca ficar a ser mais conhecida, na cidade, pelo negócio que desenvolveu ligada ao vinho do Porto.
Em 1859, deu sociedade ao seu filho António Alves Calem Júnior e criou a “A.A. Calem & Filho, Lda”. 
 
 

Cortesia de Jorge Fernandes Alves
 

 
Assim, por outro lado, aquele topónimo homenagearia também o filho de António Alves Calém,  António Alves Calém Júnior, (Porto n. 7/11/1860 - f. 16/08/1932), que viria a ser Presidente da Associação Industrial Portuense entre 1901 e 1903, tendo um dos seus filhos, António de Oliveira Calém, em 1953, exercido o cargo Presidente interino da Câmara Municipal do Porto



Monumento ao “Tripeiro”, de Lagoa Henriques, inaugurado em 1960, no Largo António Calém – Ed. AHM do Porto



Placa colocada no pedestal do grupo escultórico do Monumento ao “Tripeiro”


Aquele monumento, até à sua implantação, teve uma história um pouco atribulada.
Ele teria sido o resultado de um concurso ganho, em parceria, por Lagoa Henriques, Siza Vieira, Augusto Amaral e Alcino Soutinho.
Diz-se que, devido a ser o betão o material proposto para ser utilizado na escultura, a obra teria sido vetada por Oliveira Salazar.
Mais tarde, seria contactado apenas Lagoa Henriques, que foi incumbido para que projectasse e executasse uma obra, mas individualmente.
O escultor começaria de início por recusar a missão, mas por pressão dos seus parceiros, em reunião ocorrida no café Majestic, acabaria por aceitar a tarefa, fazendo uso de um material mais tradicional.
Assim, nasceria a obra “Memória em Louvor da Grei”.
O acto inaugural da «Memória em Louvor da Grei», no Largo de António Calém, com benção do monumento pelo Administrador Apostólico da Diocese do Porto, D. Florentino de Andrade e Silva, ocorre em 27 de Agosto de 1960.
Quanto à denominada Casa do Infante (actual), ela irá surgir da doação pelo Estado, em 1958, de uns armazéns e anexos, à chamada Casa do Infante D. Henrique, sitos na Rua da Alfândega Velha, à Câmara Municipal do Porto, com o objectivo de aí se instalar um museu, e duma outra doação, dos antigos armazéns da Fazenda Nacional, propriedade do Banco Nacional Ultramarino.
É, por essa ocasião que, nomeada uma Comissão, ela se associa à Comissão das Comemorações Henriquinas, e depois de analisarem a situação, é decidido avançar com uma intervenção para as construções anexas e incorporá-las na Casa do Infante.
O arquitecto Rogério de Azevedo, já com o cargo de delegado da “Comissão das Comemorações do V Centenário da Morte do Infante”, é o escolhido para intervencionar em todo o conjunto arquitectónico.
Até ao início de 1960, estão concluídas as coberturas e feita a consolidação de paredes.
Até ao fim desse ano, a obra vai ganhar contornos definitivos.
Em 20 de Dezembro, são adquiridos os candeeiros.



Casa do Infante, actualmente


Construção da Nau no Cais do Ouro para as comemorações dos 500 anos da morte do Infante D. Henrique – Ed. Teófilo Rego (1960)



A Nau que foi construída para as “Comemorações do V Centenário da Morte do Infante” (1960), em 2º plano, durante as cheias de 1962



Lançamento à água, no estaleiro do Ouro, em 1960, de uma nau similar às usadas na expedição a Ceuta (1415)



Cortejo Fluvial. Chegada à Ribeira das réplicas de naus construídas no estaleiro do Ouro para as “Comemorações do V Centenário da Morte do Infante” (1960) – Fonte: “portoarc.blogspot.com”



Cortejo presidencial (Portugal e Brasil) nas comemorações “V Centenário da Morte do Infante D. Henrique”, em 1960, de passagem pela Praça de Almeida Garrett, em frente à estação de São Bento



Subindo a Avenida dos Aliados, o cortejo dos presidentes Américo Tomás, de Portugal, e Juscelino Kubitschek de Oliveira, do Brasil, aquando das comemorações do “V Centenário da Morte do Infante D. Henrique”, em 1960




Vista obtida sobre a Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade, a partir da Praça do Município (hoje, Praça do General Humberto Delgado), durante uma cerimónia, com a presença dos presidentes de Portugal e Brasil, integrada nas Comemorações do “V Centenário da Morte do Infante D. Henrique”, em 1960




Envelope e selo (comemorativo do 1.º dia de circulação - 26 de Junho de 1960) do Centenário da Morte do Infante D. Henrique



Moeda comemorativa do V centenário da Morte do Infante (1960)



(Continua)





terça-feira, 26 de novembro de 2019

(Continuação 1)


Exposição Colonial do Porto de 1934


“As exposições coloniais eram realizadas mundialmente durante o século XIX e na primeira metade do século XX nos países europeus. Destinavam-se a mostrar aos habitantes da metrópole, as diferentes facetas das colónias. As exposições coloniais resultavam das reconstruções espetaculares dos ambientes naturais e monumentos de África, Ásia e Oceânia. A encenação dos habitantes das colónias, muitas vezes deslocados à força do seu local de origem, deu-lhes posteriormente a classificação de zoológicos humanos.”
Fonte: “pt.wikipedia.org”


Esta exposição seria inaugurada em sessão solene no Palácio da Bolsa, a 15 de Junho de 1934, abrindo as suas portas no dia seguinte, nos jardins do Palácio de Cristal e prolongou-se até 30 de Setembro, do mesmo ano, tendo durado, por isso, 3 meses e meio e, para o efeito, sido erguidos cerca de quatrocentos pavilhões, montados em cinco meses.
A que a antecedeu tinha-se realizado em 1931, em Paris.
Anos antes, também no Porto, tinha o Rei D. Carlos inaugurado, a 2 de Março de 1894, uma “Exposição Insular e Colonial”, que tentou unir a nação, após o Ultimato Inglês.
Agora, pretendia-se uni-la em torno de um regime político, que nos iria governar por algumas décadas.
O presidente da Câmara do Porto era, na altura da exposição, o portuense António Augusto Esteves Mendes Correia, principal fundador da Sociedade de Antropologia e, também, o fundador do Museu da Universidade do Porto.
Com o seu stand na Avenida da Índia (Avenida das Tílias), Domingos Alvão fez as imagens diárias para o jornal privativo da Exposição. Além dessas, realizou largas centenas de fotografias, que hoje se encontram no Centro Português de Fotografia. Foi, ele, o único fotógrafo da exposição.


Mapa mostrando a extensão do Portugal colonial (Todas as salas de aula, da escola primária, tinham um, nas suas paredes)



Cartaz publicitando a Exposição Colonial do Porto (1934)



“Em 1934 o Regime já consolidado e inspirado pela Exposição Colonial de Paris de 1931, promove no Porto a primeira das suas grandes exposições - a Exposição Colonial do Porto – destinada a propagandear o Estado Novo como um regime moderno, activo num Portugal Imperial. Para Comissário da Exposição, é escolhido o capitão Henrique Galvão (1885-1970), então ainda um dos militares ligados ao Regime e um dos homens mais conhecedores dos nossos territórios coloniais, já que tinha sido Governador da província de Huíla em Angola (1929), participado na Exposição Colonial de Paris em 1931 e organizado as feiras coloniais de Luanda e Lourenço Marques (1932).
(…) Mas, se os objectivos da Exposição são claros, mostrar interna e externamente a unidade e a grandeza do Império Colonial Português, a ideia da sua realização no Porto, deve-se provavelmente ao volume e importância da emigração e das importações de mercadorias com o Brasil e as Colónias, que se efectua através do porto do Douro.”
Ercílio de Azevedo, “Porto 1934 - A Grande Exposição”. Fonte: Blogue “doportoenaoso”



Com um novo regime político instituído desde 1932, e com Salazar no seu comando, não foi deixada de lado, a possibilidade de glorificar o Chefe do Governo.


Apologia de Salazar durante a “Exposição Colonial do Porto” (1934)



Capa do catálogo da “Exposição Colonial do Porto” (1934)


Tenente Henrique Galvão – Director Técnico da Exposição Colonial do Porto (1934)



Vista aérea da entrada do Palácio de Cristal, com o Pavilhão das Colónias, à entrada, à direita – Ed. Foto Beleza (1934)


Palácio das Colónias e Monumento ao Esforço Colonizador Português



Monumento ao Esforço Colonizador Português – Ed. Alvão



O conjunto escultórico da foto acima é da autoria do Alferes Alberto Ponce da Castro e de José Sousa Caldas. À volta do obelisco, estão as 6 figuras simbólicas, com 3 metros de altura, a quem se deve o esforço colonizador: o Missionário, o Soldado, a Mulher, o Médico, o Agricultor e o Comerciante. Na base, uma inscrição:
“Em comemoração da Exposição Colonial Portuguesa no Porto de 16 de Junho a 30 de Setembro de 1934”.
Este monumento encontra-se, actualmente, na Praça do Império, na Foz do Douro.




“Os preparativos da Exposição foram acompanhados pela própria cidade, que deveria estar preparada para dar resposta ao elevado número de visitantes que se esperava aí acorrer. Nos periódicos o número de anúncios aumentava de forma proporcional à aproximação da data de inauguração, dando informações àcerca de hotéis, pensões e transportes, não só na cidade como também nos seus arredores. Neste contexto, a imprensa tomaria um importante papel, cobrindo os principais momentos do evento e dedicando muitas das suas páginas à análise e discussão de assuntos coloniais.
O Comércio do Porto publicou entre Junho de 1934 e Setembro do mesmo ano um total de cinquenta e nove números de um periódico distribuído gratuitamente, “O Comércio do Porto — Colonial”, ao mesmo tempo que Henrique Galvão dirigia a revista Ultramar: Órgão Oficial da I Exposição Colonial , publicada entre Fevereiro e Outubro”.
Cortesia de Vera Lúcia Penetra Gonçalves (Faculdade de Letras da Universidade do Porto) O Palácio de Cristal Portuense na Primeira Exposição Colonial Portuguesa (1934)



Nave Central do Palácio de Cristal durante a Exposição Colonial Portuguesa (1934)


Pavilhão da Companhia União Fabril Portuense das Fábricas de Cerveja e Bebidas Refrigerantes (CUFP), na Exposição Colonial Portuguesa (1934)



Capa d’ “O Comércio do Porto – Colonial” de 22 de Junho de 1934




Comboio percorrendo os jardins do Palácio de Cristal, durante a Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão


Teleférico construído para servir os visitantes, durante a Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão



“No jardim do Palácio de Cristal procurava-se apresentar o Império Colonial com a floresta tropical, o deserto, uma picada angolana, aldeias típicas de todas as colónias e muitas outras simulações que tinham por intenção dar ao visitante, após o passeio, a sensação de ter viajado por todo o Império Português. Cada Colónia enviou os seus nativos, que foram alojados em aldeias ou habitações típicas, continuando na Exposição a sua vida, usos e costumes coloniais.
(…) Na Avenida da Índia (Avenida das Tílias), eixo estruturante dos jardins do Palácio, estavam, à entrada, o Arco dos Vice- Reis da Índia, e ao fundo, uma réplica do Farol da Guia de Macau.”
Fonte: “portoarc.blogspot.com”



Arco dos Vice–Reis da Índia na Exposição Colonial de 1934, que se erguia no topo Norte da Avenida das Tílias



Réplica do Farol da Guia de Macau na Exposição Colonial de 1934



Pavilhão do Chá, de Macau, na Exposição Colonial de 1934


Pavilhão de S. Tomé e Príncipe na Exposição Colonial de 1934


Pavilhão de Timor na Exposição Colonial de 1934



Aldeia de Moçambique na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão



Feiticeiros de Moçambique na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão



Aldeia Balanta da Guiné, na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Domingos Alvão


Lago e aldeia do arquipélago dos “Bijagós” (Guiné- Bissau), na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Domingos Alvão



Aldeia de Angola na Exposição Colonial de 1934



A Exposição Colonial de 1934 propiciaria o encontro de realidades etnográficas diversas, como nos narra o jornal “O Comércio do Porto” de 17 de Julho de 1934.


“(…) o famoso rancho típico dos Zés P’reiras do Marco de Canavezes (…) visitou o pavilhão de O Comércio do Porto Colonial oferecendo, por momentos, um espectáculo de cor e de ruído.
Um preto da aldeia lacustre da Guiné, assistindo casualmente, ao espectáculo desta visita regional, improvisou um bailado violento e agitado, entre o grupo dos Zés P’ reiras.
Estabeleceu-se por instantes uma confraternização entre o Douro e a Guiné… o bailado estranho do negro que se saracoteava e regougava modas bárbaras do seu sertão africano, no meio dos trajes escarlates, verdes, negros, pletóricos de cor das raparigas e homens do Douro que o som dos bombos ensandecia de entusiasmo.”


«Uma parte dos visitantes foi simultaneamente objecto de exposição. Isto aconteceu no âmbito de dois cortejos que balizaram o calendário da mesma: a Parada Regional de Entre Douro e Minho, que ocorreu a 15 de Julho, e o Cortejo Colonial, que marcou o encerramento da exposição, a 30 de Setembro de 1934. Parece ser esclarecedora, se lermos os seus subentendidos, uma nota surgida a 7 de Julho, no noticiário local de “O Primeiro de Janeiro”, a propósito da organização do certame referido para 15 de Julho:
Continua o entusiasmo por esta grandiosa festa no concelho de Vila Nova de Gaia. A classe rural sabe que não se trata apenas de uma Parada de costumes, danças e folklore regionais, mas também de um cortejo cívico do povo das aldeias que patrioticamente vem manifestar o seu contentamento e admiração pelos feitos gloriosos dos seus maiores».
Cortesia de António Medeiros (Doutor em antropologia, professor no ISCTE), “Primeira exposição colonial portuguesa (1934)”; In Etnográfica Press, 2003



Desfile de representantes na “Parada Regional do Entre Douro e Minho”, na Rua de Santa Catarina, em 16 de Julho de 1934 – Fonte: jornal “O Século”, Arquivo de Fotografia de Lisboa



As manifestações presentes durante Exposição Colonial de 1934, de exaltação de costumes de raiz popular, estender-se-iam e contagiariam a própria burguesia.
Assim, mais uma vez o jornal “O Comércio do Porto” dava conta de uma festa ocorrida num hotel de Vizela.


“Como era de esperar foi de uma grandiosidade nunca vista a festa puramente nacional que os proprietários do Hotel Cruzeiro do Sul ontem proporcionaram aos seus hóspedes (…) surgiu inesperadamente um numeroso grupo de senhoras e cavalheiros que vestidos com trajes do Minho e de Marias de Portugal despertaram a alegria e a boa disposição (…). Pelas duas horas da madrugada teve princípio a ceia à portuguesa que principiou pelo tradicional caldo verde, que foi seguido.
As mesas arranjadas com louça grossa, candeeiros de três bicos, velas, pequenos pires de tremoços, garfos de ferro e pão de milho davam bem a impressão das mesas dos lavradores.”
In jornal “O Comércio do Porto” de 14 de Agosto de 1934



A 30 de Setembro de 1934, acontece o encerramento da exposição com um grandioso cortejo cívico que percorreu algumas ruas da cidade.


“Um dos acontecimentos mais simbólicos que marcou o seu encerramento foi a realização do cortejo alegórico. Esse cortejo, que integrou dezenas de carros alusivos, centenas de figurantes históricos e as populações trazidas das regiões metropolitanas e coloniais, bem como espécimes animais, percorreu as ruas da cidade desde da Foz do Rio Douro até aos Jardins do Palácio de Cristal, teatralizando episódios e figuras da história dos Descobrimentos.
Foram ainda organizados concursos, saraus, paradas, congressos, romagens, provas desportivas e excursões. Promoveu-se a deslocação de grupos e de pequenas comunidades de todos os pontos do país como escolas, orfanatos, quartéis, institutos e sindicatos corporativos. A CP (Caminhos-de-Ferro Portugueses) organizou mesmo uma “Grande Excursão Nacional” à cidade do Porto, transportando cerca de cinco mil passageiros em 21 comboios e a Igreja católica também se mobilizou (Martins, 2012:171). De Vigo, na Galiza (Espanha) vieram jornalistas; houve visitantes estrangeiros ilustres, como o príncipe de Gales e o ministro das Colónias da Bélgica, Paul Tschoffen; ou ainda o director do jornal Le Temps, bem como outros jornalistas. No final, as estatísticas oficiosas vieram a contabilizar o movimento de entradas, entre meados de Junho e finais de Setembro, em cerca de um milhão e trezentos mil visitantes, número que serviu a propaganda da exposição no estrangeiro”.
Cortesia de Filomena Serra (Drª em História da Arte Contemporânea e investigadora integrada do Instituto de História da Arte da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa)



Carro alegórico de Macau, durante desfile do Cortejo Colonial, na Exposição Colonial de 1934



Desfile do Cortejo Colonial, na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Domingos Alvão; Fonte Maria do Carmo Serén, In “A Porta do meio a Exposição Colonial de 1934, Fotografias da casa Alvão. Porto Centro Português de Fotografia, 2001”



Cortejo histórico durante a Exposição Colonial Portuguesa, em 1934 – Fonte: CMP, Arquivo Histórico Municipal




Medalha e selos comemorativos da Exposição Colonial de 1934



Heinrich Gleiser, o homem das andas, a distribuir sabonetes da Ach. Brito na Exposição Colonial Portuguesa, em 1934



“Apesar da relativa modéstia dos meios usados, a Exposição Colonial foi um evento visitado em massa. Passaram pelo recinto centrado no Palácio das Colónias — nome do Palácio de Cristal no verão de 1934, quando foi transformado pela implantação de fachada temporária de linhas modernistas — cerca de um milhão e meio de pessoas, segundo os cálculos mais optimistas do seu director técnico, Henrique Galvão. Aquele dado quantitativo sugere a importância e o impacte social da iniciativa nos distritos do norte do país.
(…) A maioria das pessoas que foram meus informantes no Porto, não sabia nada da Exposição Colonial. As suas lembranças de infância, de idas nos fins-de-semana aos jardins do Palácio de Cristal, davam conta de confrontos com algumas marcas e objectos que tinham sobrado daquela iniciativa: uma “Aldeia dos Macacos” — no pequeno lago que acolhera a “Aldeia Lacustre Bijagoz” —, um leão que sobreviveu miseravelmente, um aviário malcheiroso com pássaros exóticos. Em Junho de 1934, um jornalista anotou sem má-consciência nenhuma: “O exotismo na Exposição Colonial é dado sobretudo pelos indígenas e pelos exemplares zoológicos, que têm constituído para o público um motivo de excepcional curiosidade.” (O Comércio do Porto Colonial 16/6/1934). Hoje já desapareceram dos jardins do palácio os rastos da iniciativa pedagógica que o estado pagou em 1934.”
Cortesia de António Medeiros (Doutor em antropologia, professor no ISCTE), “Primeira exposição colonial portuguesa (1934)”; In Etnográfica Press, 2003


Da exposição sobreviveria, após o seu final, um leão com “residência”, durante dezenas de anos, numa jaula dos jardins do Palácio – era o “Sofala”.
Numa outra jaula e também com uma boa longevidade, esteve um chimpanzé – o Chico.
Ambas as jaulas eram visita da miudagem que antes da década de 1980 demandavam o Palácio de Cristal.
Hoje, tal não seria possível. Neste caso, chama-se progresso.



O “Chico” atrás das grades em 1975 – Editado de filme de Henrique Tavares



O “Sofala” atrás das grades em 1975 – Editado de filme de Henrique Tavares


(Continua)