Contexto histórico durante
o exílio de Carlos Alberto
Sobre a estadia do rei Carlos Alberto, convirá enquadrar os
acontecimentos, em tempos em que reinava, em Portugal, D. Maria II.
Recuando alguns anos, em Novembro de 1807, a família real,
com D. Maria I à frente, foge para o Brasil. Esta rainha era casada com Pedro
III, rei consorte e seu tio. No entanto, desde 1799, que o infante D. João de
Portugal era o regente em nome da mãe, que tinha enlouquecido.
Entre 1816 e 1826, este torna-se o Rei D. João VI, a que
sucederá D. Pedro IV, que abdicaria, nesse mesmo ano, em favor de sua filha
Maria, que sendo menor, obrigou a que o reino tivesse como regente até 1828, a
irmã de D. Pedro IV, Isabel Maria de Portugal e, depois, na mesma qualidade,
durante 5 meses, o irmão de D. Pedro IV, D. Miguel.
Este, quebrando o compromisso assumido de casar com a sua
sobrinha, tornou-se, por usurpação do trono, rei até 1834.
Vencido D. Miguel, assume D. Maria II, entre 1834 e 1853 e,
o rei consorte D. Fernando II, entre este ano e 1855, como regente, dada a
menoridade do seu filho, que reinaria apenas durante 6 anos, como D. Pedro V,
já que, morreu prematuramente.
Em 1849, no ano do exílio do rei Carlos Alberto, reinava,
portanto, D. Maria II
A D. Pedro V, entre 1861 e 1889, sucederia o seu irmão D.
Luís I, que viria a casar com D. Maria Pia, da casa de Saboia, neta do rei Carlos
Alberto e filha do rei Vítor Emanuel II.
Afinal quem foi o rei
Carlos Alberto?
Na época da dominação napoleônica no Piemonte, Carlos
Alberto estudou em Paris e em
Genebra. Em 1814, Napoleão nomeou-o tenente do regimento "Dragões".
Pouco depois da queda do Império Francês, voltou para Turim e foi aceite na
família real, embora visto com um pouco de suspeita por causa das suas
simpatias pela França e por ser uma pessoa de espírito liberal.
“Em 1821, Carlos
Alberto teve um papel não muito claro nas agitações constitucionais que
aconteceram no Reino da Sardenha e, certamente teve contato com os rebeldes,
mas, na última hora parece que voltou atrás, enquanto os conjurados, em boa ou
em má-fé, continuaram a contar com ele.
Após a abdicação do
rei Vítor Emanuel I em 1821, tornou-se regente e promulgou a constituição, a
valer com a aprovação do rei, ou seja de Carlos Félix, mas este, ao contrário,
desautorizou o feito, chamou os austríacos ao Piemonte-Sardenha, e ordenou a Carlos
Alberto de acompanhar as tropas fieis a Novara, coisa que ele fez sem hesitar.
Por causa das suas atitudes, ele se tornou suspeito não somente aos olhos dos
Carbonários, que o acusaram de traição, mas também aos olhos da corte. Primeiro
ficou exilado na casa do sogro, Ferdinando III de Toscana, depois participou da
repressão à revolução liberal espanhola lutando em Trocadero atraindo, assim, o
ódio dos seus antigos amigos políticos.
Depois da morte de
Carlos Félix em 1831, subiu ao trono sem dificuldade em 27 de abril de 1832 (é
lenda o fato de que Metternich tramou para excluí-lo da sucessão)”.
Fonte: “pt.wikipedia.org”
Carlos Alberto decidiu-se, a dado momento, pela intervenção
armada contra os austríacos, para a qual não estava preparado, a fim de
expulsá-los da Lombardia e de Veneza.
A guerra conduzida pessoalmente por ele teve como resultado
imediato a libertação da Lombardia, arrancada ao jugo austríaco; contudo, o
Império Austríaco rapidamente iria recuperar, acontecendo a grande derrota dos
piemonteses em Novara.
A breve campanha acabou, então, em três dias, com a
desastrosa batalha de Novara a 28 de Março de 1849.
Carlos Alberto abdicou no mesmo dia em favor do filho Vítor
Emanuel II, retirando-se para o exílio.
Viagem para o exílio
e hospedagem no Porto
O rei Carlos Alberto exilou-se, então, no Porto, após
abdicar em favor do seu filho Vitor Emanuel II e, viveria na casa da quinta da
Macieirinha, entre 14 de Maio e 28 de Julho de 1849.
A viagem para o exílio foi feita sempre por terra até
Pontevedra depois de fazer centenas de quilómetros em França e de atravessar
toda a Espanha.
Entre Pontevedra e Vigo, usou como transporte um barco e, a
partir daí, encetou a viagem novamente por terra até ao Porto, mas já com
numeroso acompanhamento.
Entra em Portugal por Valença, desce o rio Minho num barco
expressamente preparado para o efeito, até Caminha e alcança Viana do Castelo
pela estrada marginal, passando aí, a noite de 16 de Abril.
No dia 17 de Abril, retoma a viagem até Casal de Pedro (V.
do Conde), onde por se sentir doente ficaria instalado e pernoitaria numa
mísera estalagem.
Entretanto, no dia 17 de Abril, por desconhecimento geral da
realidade dos factos, corre na cidade o boato de que o rei teria embarcado em
Vigo, em direcção ao Porto, a bordo da galeota espanhola Martin Álvares e que
chegaria nessa mesma tarde.
Por isso, o cais da Foz enche-se de uma multidão de
curiosos. Foi uma decepção!
No dia seguinte, dirige-se para a cidade do Porto.
Carlos Alberto tinha decidido viajar incógnito, sob o título
de conde de Barge, acompanhado apenas de dois criados. Não conseguiu, no
entanto, manter o desejado anonimato, sendo por diversas vezes reconhecido ao
longo da viagem, incluindo na sua chegada ao Porto, a 19 de Abril de 1849,
tendo sido recebido pelas autoridades da cidade no Carvalhido.
Carlos Alberto, esgotado por uma longa viagem efectuada em
condições de grande desconforto, tinha viajado a cavalo. Encontrava-se desalentado
com a derrota militar sofrida cerca de um mês antes, e num precário estado de
saúde, não conseguindo, por isso, assistir a mais do que dois discursos. E,
quando o secretário da Câmara se preparava para proferir a terceira prelecção,
fez saber que se encontrava doente e que pretendia, o mais rapidamente
possível, retirar-se para uma estalagem, como um simples viajante.
Começou por se hospedar na Hospedaria do Peixe, a funcionar
no majestoso Palácio dos Viscondes de Balsemão, na então Praça dos Ferradores,
hoje Praça Carlos Alberto. Ali ficou, enquanto não lhe era disponibilizado um
local para residir.
A 27 de Abril, hospedou-se numa casa na Rua dos Quartéis,
vizinha do palácio dos Carrancas.
“O ex-rei ficou nove
dias no hotel; depois transferiu-se para uma pequena casa arrendada, que
pertencia a Maria Teresa de Sousa Vasconcelos, com um jardim, «na saída da
cidade em direcção à Torre da Marca, próximo da Real Fábrica dos galões de oiro
e de prata e defronte do quartel de infantaria, exposta plenamente a sul»; mas
naquele lugar da rua dos Quartéis, Carlos Alberto ficou pouco tempo: a
habitação – antes arrendada a um inglês, que decidiu subarrendá-la a Carlos
Alberto por seis meses, com a única condição de, para além da renda, o rei se
encarregasse de todos os móveis, utensílios, porcelanas, cristais e roupas –
era demasiado pequena e modesta, dotada de apenas três divisões e de um jardim.
Deste modo, a 14 de Maio, o ex-soberano da Sardenha mudava novamente de
domicílio, alojando-se na casa suburbana de António Ferreira Pinto Basto.
3.488,37 liras,
equivalentes a 600.000 réis, era quanto pagava por uma vivenda «mais limpa do
que bela, mas situada ao fundo de um jardim muito ameno e com bonitas e amplas
vistas sobre o rio e sobre o mar».”
Com o devido crédito a Pierangelo Gentile – Fonte: Imprensa
da Universidade de Coimbra
António Ferreira Pinto Basto, acima referido, era irmão de José
Ferreira Pinto Basto (Porto, Santo Ildefonso 30 de Novembro de 1801 - 15 de
Junho de 1875), ambos filhos de José Ferreira Pinto Basto (Porto, 16 de
Setembro de 1774 — Lisboa, 23 de Setembro de 1839) e de Bárbara Inocência
Felicidade Allen.
José Ferreira Pinto Basto (filho) foi casado com Ana
Joaquina Ferreira de Sampaio, dois anos mais velha que ele, tendo sido o
anterior proprietário dos terrenos onde se instalou o Hospital do Conde de
Ferreira.
José Ferreira Pinto Basto (pai) foi o fundador da famosa
fábrica da Vista Alegre.
Começou por adquirir, em 1812, a Quinta da Ermida, perto da
vila de Ílhavo, à Ria de Aveiro. Em 1816 comprou, em hasta pública, a Capela da
Vista Alegre e terrenos envolventes, tendo aí instalado a Fábrica da Vista
Alegre.
Em 1824, José Ferreira Pinto Basto apresentou uma petição ao
Rei D. João VI para “erigir para estabelecimento de todos os seus
filhos, com igual interesse, uma grande fábrica de louça, porcelana, vidraria e
processos chímicos na sua Quinta chamada da Vista-Alegre da Ermida”.
Em Alvará Régio de 1 de Julho de 1824 D. João VI autorizou o
estabelecimento da Fábrica de Porcelana da Vista Alegre. Apenas cinco anos
depois, a Vista Alegre recebeu o título de Real Fábrica, um reconhecimento pela
sua arte e sucesso industrial.
Finalmente, em meados do mês de Maio, Carlos Alberto acabou
por se mudar para a Quinta da Macieirinha.
Em 28 de Julho, Carlos Alberto morre na Quinta da
Macieirinha.
Casa da Quinta da Macieirinha
“O estado de saúde de
Carlos Alberto era, contudo, bastante delicado e agravava-se de dia para dia.
Em breve deixou de poder dar os curtos passeios a cavalo pela cidade, ficando
retido em casa, onde os médicos Francisco d'Assis e António Fortunato se viam
impotentes para contrariar a morte que se aproximava. Às três horas e meia da
tarde do dia 28 de Julho de 1849, na casa da Quinta da Macieirinha, pouco mais
de quatro meses após a sua chegada a Portugal, é anunciada a já esperada
notícia fatal: Carlos Alberto morrera. A notícia da sua morte provocou uma
profunda consternação na cidade. Toda a gente, independentemente das suas
opções políticas ou classe social, sentiram vivamente a morte tão cruel e
prematura do malogrado príncipe, e grande parte da população vestiu de luto. Os
divertimentos públicos foram suspensos e tanto nessa noite como na seguinte não
houve espectáculos no Teatro Lírico. Durante dois dias, continuamente, os sinos
de todas as igrejas dobraram a finados, as bandeiras nacionais foram colocadas
a meia haste, e o barulho de uma descarga de bateria, colocada no largo da
Torre da Marca, soava de quarto em quarto de hora”.
Com a devida vénia a José Manuel Lopes Cordeiro, In Jornal
Público, 1999
Em Setembro de 1849, os restos mortais de Carlos Alberto
rumariam a Génova, a bordo do vapor Monzambano.
In “O Porto do Romantismo” de Artur Magalhães Basto
Capela
Quatro anos após a morte de Carlos Alberto, chegou ao Porto,
sua irmã, Frederica Augusta de Montléart, que pretendeu erigir uma capela em
memória do rei Carlos Alberto. Para isso, obteve a autorização para concretizar
aquele desejo, numa parcela de terreno colocado à sua disposição, em 1854, em
terrenos da Torre da Marca, mais propriamente junto do local onde aquele sinal
de navegação tinha sido derrubado, anos antes, pela metralha, durante as lutas
do cerco do Porto.
Durante a construção do templo, aconteceram diversas
contrariedades, decorrentes da falta de planeamento dos trabalhos, que levaram,
por exemplo, a que as fachadas da rectaguarda e laterais tenham um risco que os
entendidos dizem ser muito pobre. Tal facto ter-se-ia ficado a dever aos
méritos atribuídos ao mestre-pedreiro de seu nome Lopes, escolhido para
responsável máximo da obra, méritos esses, que ele não possuía de todo.
Entretanto, já tinham sido feitos, anteriormente, outros
esquissos do templo, solicitados aos arquitectos Joaquim de Costa Lima Júnior e
Pedro d’Oliveira, tendo, este último, acabado por fiscalizar a obra no que,
apenas, a aspectos de segurança dizia respeito, pois não concordava com os
traços arquitectónicos postos em prática pelo mestre-pedreiro.
Quanto à fachada principal, parece que ela teve por base um
desenho, apresentado à Câmara, aquando do pedido de licenciamento da
construção, que alguns dizem ser obra da princesa Frederica, outros do
arquitecto Costa Lima e, ainda, outros, de que a princesa o teria obtido em
Lisboa e de autor desconhecido.
Desenho da fachada da Capela de Carlos Alberto – Fonte:
“gisaweb.cm-porto.pt”
No desenho anterior é apresentada a fachada principal,
traçada pela própria mão da princesa Frederica Augusta de Montléart e aprovada
pela Exma. Câmara Municipal do Porto, em sessão de 30 de Março de 1854, que
serviria para que a obra tivesse a necessária autorização.
Poder-se-á dizer que o templo foi construído com grande
improvisação, onde nenhum projecto parece ter sido verdadeiramente seguido.
Capela de Carlos Alberto c. 1900 - Ed. Photo Guedes; Fonte:
"igreja-luterana.blogspot.pt"
Capela de Carlos Alberto - Ed. Alberto Ferreira em 1907;
Impressor Papelaria e Tipografia Académica
Traseiras da Capela de Carlos Alberto
Em 25 de Dezembro de 1861, foi inaugurada a capela numa
missa aí realizada com a presença da princesa Frederica Augusta.
Muito mais tarde, aquando da implantação da República, em
Itália, um bisneto de Carlos Alberto, o rei Humberto II, haveria também de se
exilar em Portugal.
Na altura da estadia do rei Carlos Alberto, na quinta do
Sacramento, ela tinha sido comprada e pertencia a António Ferreira Pinto Basto,
(filho de Domingos Pinto Basto), ligado às fábricas de cerâmica da Vista
Alegre, fundada por seu irmão José Ferreira Pinto Basto em 1824.
Este José Ferreira era uma figura de destaque na sociedade
portuguesa do século XIX. Proprietário agrícola, comerciante audaz, incorporou
sabiamente o ideário liberal do século, tendo-se tornado “o primeiro exemplo de
livre iniciativa” em Portugal.
Por seu turno, António Ferreira Pinto Basto era um
Miguelista, que se oporia à primeira tentativa de implantação da capela dentro
da sua propriedade.
A 13 Março de 1863,
a princesa Frederica Augusta Montheart doou a Capela de Carlos Alberto ao rei
Luís I que, no ano anterior, casara com D. Maria Pia de Sabóia, neta de Carlos
Alberto.
Em 1865, foi a
capela dotada de um órgão com 4 teclados manuais de J. W. Walker e, em 1866, do
um retábulo executado em Paris, pelo escultor Alexandre Oliva, constituído por
quatro colunas e um nicho com a imagem de São Carlos Borromeu.
In jornal “O
Comércio do Porto” de 7 de Julho de 1872
Em 1907, os
delegados da Exposição Internacional de Milão, vieram expressamente ao Porto
para deporem, na capela Carlos Alberto, uma coroa de bronze.
A partir de 1934, a
Santa Casa da Misericórdia fica incumbida por D. Amélia e D. Augusta Vitória,
mãe e esposa de D. Manuel II, de lá promover sufrágios nos aniversários da
morte do último rei português.
O órgão seria
saqueado em 1947.
Em 1950, a Rainha D.
Amélia de Orleães e Bragança e a sua nora Vitória de Hozenzohlen doaram a
capela à Câmara Municipal do Porto, cujo acto formal ocorreu no dia 22 de Dezembro de 1950, durante uma cerimónia oficial levada a cabo naquele templo.
No ano seguinte, o órgão é desmantelado e são vendidos os tubos.
Devido à passagem do rei Carlos Alberto por Pontevedra, no
seu trânsito para o exílio, a Galiza haveria de homenageá-lo com a colocação de
um cruzeiro com placa evocativa junto da capela, na Avenida das Tílias.
Nessa placa, colocada na base, lê-se: "Pontevedra a
Oporto MCMLIX", tendo a sua implantação decorrido durante a realização da
Feira Popular do Palácio de Cristal, no ano de 1959, com a inauguração, a 23 de
Agosto, da Semana da Galiza e do respectivo Pavilhão da Galiza.
Capela de Carlos Alberto e Cruzeiro de
homenagem de Pontevedra – Fonte:
“dopedidoaoaltar.com”
Desde 2009, a capela que é parte integrante dos jardins do
Palácio, foi arrendada pela Câmara Municipal, e passou a ser a sede, no Porto,
da Paróquia Luterana da Santíssima Trindade da Igreja Luterana de Portugal,
onde realiza os seus cultos, todos
os Domingos.
Capela nos jardins do Palácio de Cristal