terça-feira, 16 de dezembro de 2025

25.294 “Autópsia” de uma fotografia

 
Prólogo
 
No Verão de 2025, Miguel Carneiro, que compartilha com Susana Fernandes a gestão de “Moreira da Costa, alfarrabistas”, na Rua de Avis, n.º 36, deu-nos a conhecer uma foto antiga, inédita, que lhe tinha sido apresentada por um cliente, possivelmente, da rua onde a sua loja está instalada, desde há muitos anos.
Inicialmente, uma livraria foi fundada no local antes ocupado pelo antigo alfarrabista conhecido como “Casa do Lopes”, situada na Rua da Fábrica, n.º 48, passando, em 1909, para a Travessa da Fábrica, n.º 50.
Hoje, ocupa um espaço no edifício do Hotel Infante Sagres, construído em meados do século XX. É a “Moreira da Costa, alfarrabistas”.
A citada foto carecia de ser estudada e, por isso, quando decidimos fazê-lo, cerca de seis meses após ter tomado conhecimento dela, apercebemo-nos, que o tal cliente da "Moreira da Costa, alfarrabistas", era Nuno Cruz, um estudioso da história da cidade do Porto, que a dá a conhecer em diversas publicações.
Diz, Nuno Cruz, numa delas, a propósito do tema:
 
 
“Pouco antes da Biblioteca Pública Municipal do Porto fechar portas para a sua total remodelação, que a obrigará a estar por mais de cinco anos encerrada, era o meu passatempo preferido ali me deslocar, aos sábados de manhã, na procura de velharias, antiguidades, "ineditidades" nos jornais antigos do Porto. Numa dessas rusgas acabei por encontrar, num pouco conhecido - e de curta vida -- periódico do início do século XX chamado O Porto, uma ou outra imagem surpreendente. A imagem que aqui apresento, levou-me pouco tempo a identificar com acuidade, embora já a tivesse desde 2022. A verdade é que só na última semana "me virei" para ela, com mais atenção”.
Cortesia de Nuno Cruz (9 de Junho de 2025)
 
“…jornal O Porto e tem como título A Carestia da Vida. Triste título... mas falar sobre esses tempos de desespero deixarei para outrem, que o fará de certeza bem melhor do que eu! A legenda da imagem é Venda do azeite na CASA FAVORITA (Castanheira e Fonseca)”.
Cortesia de Nuno Cruz (9 de Junho de 2025)
 
 
 
 

In jornal “O Porto” de 22 de Setembro de 1911 – Cortesia de Nuno Cruz
 
 
 
Estudo
 
 
Sobre a foto publicada no jornal "O Porto", que se auto denominava de monárquico e extra-partidário,  e a propósito da identificação do lugar em que aconteceu a sua recolha, Nuno Cruz apresenta factos irrefutáveis para identificação do local.
Assim, não parece haver dúvidas de que, à direita, está a chamada “Casa da Fábrica”, durante muitos anos, o edifício mais emblemático da Rua da Fábrica, fazendo esquina com a Travessa da Fábrica, que fazia a ligação à Rua da Picaria e que, em meados do século XX, deu o seu espaço ao Hotel Infante de Sagres.
 
 
 

Casa da Fábrica – Cortesia de Nuno Cruz

 
 
Tendo a Travessa da Fábrica a orientação Sul/Norte, do lado nascente do arruamento, como se pode observar, os elementos arquitectónicos da Casa da Fábrica, assinalados (com a oval), na foto acima, têm a sua correspondência, quando comparados com a foto original.


 
 

Travessa da Fábrica, em 1892 – Planta de Telles Ferreira
 
 
 
Na planta anterior, com X está marcada a morada (Travessa da Fábrica, n.º 50), a partir de 1909, da Livraria Moreira da Costa.
Como se pode observar, aquela morada já se encontrava em prédio muito próximo da Travessa da Picaria, pelo que podemos concluir, que ele foi demolido para abertura da Praça D. Filipa de Lencastre.

 
 

Perspectiva da Travessa da Fábrica obtida a partir do fundo da Rua da Picaria. Todos os prédios, à esquerda, onde também se encontrava a Moreira da Costa, foram demolidos para abertura da Praça D. Filipa de Lencastre

 
 
 
Desconhece-se o percurso da Livraria Moreira da Costa até encontrar a sua morada final.
Na mesma planta, observa-se ainda a Casa da Fábrica e, na esquina (norte/poente) oposta da travessa, a casa de Manuel José Gomes do Vale, por si remodelada, em 1823, para sua habitação, cujo chão e grande parte da área adjacente era pertença da Real Fábrica de Tabaco.
Para lá da casa de Manuel José Gomes do Vale, apresentava-se um logradouro interior (Travessa da Fábrica, n.º 17), onde tinha a sua residência e, aí, vivia com seu filho David Castro e a sua nora, a baronesa de Nevogilde, após ter vendido, em 1861, o Palácio das Carrancas à Coroa portuguesa, na pessoa de D. Pedro V.
Junto da residência da baronesa, o seu filho, um reconhecido ilusionista, administrava o Teatro Minerva.
Na foto original, parece que o acesso ao logradouro já foi ocupado por um prédio.
Em 1911, o edifício da esquina (norte/poente), formada pela Rua da Fábrica e da Travessa da Fábrica, já estava ocupado pela firma de comércio de cereais, com razão social, “Castanheira & Fonseca”.
Nesse lado poente do arruamento, o estudo da planta de Telles Ferreira de 1892 e os pedidos de licença de obras para um prédio, que se provará que é o representado na foto original, leva-nos a conclusões definitivas.
Assim, em 18 de Janeiro de 1911, Castanheira e Fonseca solicitava à Câmara do Porto execução de obras para montar uma devanture numa montra e abrir um portal, que obteve a licença n,º 67/1911.
O processo era constituído por um projecto, do qual fazia parte um desenho, com as fachadas voltadas para a Rua da Fábrica e para a Travessa da Fábrica.
 
 
 

À esquerda desenho da fachada voltada para a Rua da Fábrica e, à direita, a fachada voltada para a Travessa da Fábrica do prédio ocupado por Castanheira e Fonseca
 
 
 
 
O desenho da fachada voltada para a Travessa da Fábrica pode ser comparado com a foto original…parece não deixar dúvidas.
Entretanto, quanto à fachada voltada para a Rua da Fábrica, a foto seguinte confirma tudo.
 
 
 

Rua da Fábrica
 
 
 
Na foto acima, as três casas, à direita, apresentam as suas fachadas fora do alinhamento restante, como se pode comparar com a planta de Telles Ferreira e uma foto mais abaixo. Faziam as três moradas parte da antiga casa de Manuel José Gomes do Vale.
Na foto acima, a casa, mais à direita, apresenta, já, de acordo com o projecto atrás mencionado, a devanture solicitada em 18 de Janeiro de 1911.
Na segunda casa, a partir da esquerda, esteve, a Tipografia Ocidental, na Rua da Fábrica, n.º 80, desde 1891 e, depois da morte de Costa Carregal, o seu proprietário, uma outra tipografia, que lhe sucederia até 1913, quando as suas instalações foram então ocupadas pelo jornal diário republicano “O Norte”.
Antes, aquando da ocupação inicial daquela morada pela Tipografia Ocidental, a fachada do prédio já estava recuada do alinhamento da rua, como se pode observar na foto abaixo.
Aliás, aquele desalinhamento das fachadas, como já se referiu, era comum às três moradas, fazendo todas elas, parte da casa de Manuel José Gomes do Vale, como se pode apreciar na planta de Telles Ferreira atrás exibida. 
 

 

Entrada, em 1891, para a Tipografia Ocidental, na Rua da Fábrica, n.º 80, com a sua fachada recuada
 
 

Conclusão
 
 
Parece não haver dúvidas que, a foto original é de 1911, da Travessa da Fábrica que, hoje, é a Rua de Avis.
Importa ainda referir, que sobre aquele local, na Rua da Fábrica, a paisagem urbanística se alterou, como é óbvio ao longo dos anos.

 
 

Rua da Fábrica, próximo da esquina (norte/poente) com a Rua de Avis – Fonte: Google maps

 
 
Na foto acima, observa-se a Livraria Bertrand, que já foi Porto Editora e que aí começou por se instalar em 1944.

 
 

Porto Editora, na Rua da Fábrica, em 1944
 
 
 
 
Na esquina (norte/poente), entre as ruas da Fábrica e de Avis esteve, desde 1951, a Livraria e Papelaria ASA.


 
 

Livraria ASA
 
 
 

Rua de Avis, em perspectiva actual, aproximada, à da fotografia original  – Fonte: Google maps


 
A Rua de Avis, acima na foto, vai terminar na Praça D. Filipa de Lencastre que foi começada a implantar a partir da década de 1940 e determinou a demolição de um importante aglomerado habitacional.

 
 
 

Levantamento da Praça D. Filipa de Lencastre

sábado, 13 de dezembro de 2025

25.293 Apontamentos para uma abordagem à indústria portuense de curtumes

 
Em Portugal, a indústria de curtumes começa a desenvolver-se a partir do século XVI, assistindo-se a uma concentração de artesãos dos curtumes em Guimarães, Porto e Alcanena.
Não tendo este sector da actividade económica grande expressão, hoje, na cidade do Porto, esteve, no entanto, bem presente, principalmente, durante o século XIX e nas primeiras décadas do século XX, quando chegaram a existir cerca de meia centena de fábricas afectas a essa indústria.
A curtição das peles tem, mesmo, tradução prática em topónimos, de que é exemplo, o referente à “Rua dos Pelames”, à Sé.
Devido a arranjos urbanísticos, no tempo dos Almadas, segundo a opinião do Dr. Jorge Ricardo Pinto, a indústria dos curtumes é transferida da Sé, no que diz respeito ao tratamento de pelicas, para a zona das Fontainhas, Praça da Alegria e S. Vítor e, no que concerne ao tratamento da sola, para a Rua do Bonfim, Rego do Lameiro e Esteiro de Campanhã.
O tratamento de pelicas era executado em pequenas unidades familiares e as do tratamento da sola em unidades industriais que empregavam, já, dezenas de trabalhadores.
Em 1820, na cidade do Porto existiam as seguintes unidades industriais para o tratamento da sola: Dâmaso da Silva Guimarães, Rua de Santa Catarina, a S. Marçal (Bolhão); Vicente José Aguiar, no Lugar da Póvoa; Penha & Ribeiro, ao Esteiro de Campanhã; Manuel Joaquim Simões & Irmão, no Lugar de Campanhã de Baixo; Joaquim José Pinto da Silva, na Ribeira de Abade, Valbom.
Em 1877, o Porto tinha 11 fábricas de curtumes.
No Rego do Lameiro a fábrica de curtumes, existente em meados do século XIX, ficou para a posteridade, ao ser mencionada num passeio reflexivo de Manuel Quintino, no romance de Júlio Dinis, “Uma Família Inglesa” e, num inquérito de 1881, era propriedade de António José Mendes Sampaio.
O tratamento da sola exigia, preferencialmente, que as unidades industriais estivessem junto de fluxos de água, o que era o caso dos lugares do Esteiro de Campanhã e do Rego do Lameiro e, regra geral, atendendo à matéria-prima, em causa, era acompanhada nas imediações por fábricas de sabão.
 
 
 
“Fonseca & Ferreira”
 
 
No Esteiro de Campanhã, esteve, desde meados do século XIX, a Fábrica do Esteiro de Campanhã, comprada em 1859, pelos brasileiros de torna-viagem, Caetano José Ferreira e Inácio Pinto da Fonseca.
A fábrica, em ruínas, foi recuperada surgindo, assim, a “Fonseca & Ferreira” que se apresentaria na Exposição Industrial de 1861, com um bom sortido da sua produção de couros e que, naquele ano, já usava o vapor e a possibilidade de tratar 12.000 couros.
  
 

Fábrica do Esteiro, Lavandaria de Lãs e Fábrica de Sabão, a poente do Palácio do Freixo, no Esteiro de Campanhã
 
 
 
Como se observa no Bilhete-Postal acima, o complexo industrial dá guarida à Fábrica do Esteiro, uma “Lavandaria de Lãs” e a uma “Fábrica de Sabão”. 
 
 
 
 
 
Curtumes Gama
 
 
Porém, a maior fábrica para tratamento da sola, desde a primeira metade do século XIX, era propriedade do industrial António Domingos de Oliveira Gama e situava-se, na Rua do Bonfim e, no início do século XX, tinha na mesma área geográfica de influência, aquela unidade fabril que laborou durante toda a primeira metade do século XX, na Rua Lameira de Cima, n.º 5, de propriedade de Domingos de Oliveira Pinto.
Em 1940, a propriedade já era de Américo Rodrigues Alves, situada no mesmo local de sempre (Lugar de Lameira de Cima) que, hoje, tem como curiosidade que o seu chão se situava no arruamento que margina a sul o Estádio do Dragão.


 
 
António Domingos de Oliveira Gama
 
 
O industrial António Domingos de Oliveira Gama teve a sua unidade fabril na Rua do Bonfim, onde era feito o tratamento da sola. Possivelmente, a fábrica já existiria em meados do século XIX.
Em 6 de Novembro de 1856, na qualidade de proprietário, António Domingos de Oliveira Gama solicitava obras, à Câmara do Porto, para uma morada da Rua do Bonfim, que obteve a licença de obra n.º: 179/1856.
Chegou a ter ao dispor mais de 50 operários e meios mecânicos para o batimento da sola e para proceder aos despejos dos fluídos.
Anualmente, por lá se preparavam cerca de 20.000 couros.
António Domingos de Oliveira Gama teve residência no Monte do Bonfim ou Monte das Feiticeiras, às Eirinhas (2), como vai indicado na planta abaixo.
 
 
 

Localização da casa e quinta de António Domingos de Oliveira Gama, cuja área ficou para a posteridade como Quinta do Gama, junto da Rua de Barros Lima (1), no local que, mais tarde, em parte, seria ocupado pelos depósitos de água dos SMAS – Fonte: Planta de Telles Ferreira de 1892
 
 
 
A Quinta do Gama ficaria, também, até aos nossos dias (2025), como uma área de ocupação de habitação operária.
Em 1871, António Domingos de Oliveira Gama fazia parte da vereação camarária, quando a edilidade era presidida por Francisco Pinto Bessa, pois foi escolhido para preparar os arranjos festivos para a visita que se iria realizar, no ano seguinte, dos imperadores do Brasil.
 
 
“Na vereação de 1 de Julho de 1871, foi estabelecido que: se fizesse uma recepção condigna, o que obrigava a terem um orçamento para esse efeito; se levantasse um pavilhão, na praça da Ribeira, «para recepção de S.M. Imperial»; se cantasse um Te Deum na igreja da Lapa; e se nomeassem comissões de ruas «a fim de promoverem os festejos possíveis e condignos de tão Augusto Hospede, e dos brios dos Portuenses». Como responsáveis para «dirigir todos os trabalhos concernentes as demonstrações festivas por parte da Câmara, e bem assim da nomeação dos cidadãos que deverão compor as comissões de ruas», foram nomeados, na mesma sessão, três vereadores: António Domingos de Oliveira Gama; Manuel Justino de Azevedo; e Augusto Pinto Moreira da Costa”.
Cortesia de Joaquim Jaime B. Ferreira Alves
 
 
 
António Domingos de Oliveira Gama teve pelo menos dois filhos: António Domingos de Oliveira Gama Júnior e Guilherme Augusto de Oliveira Gama.
Do primogénito sabe-se que foi casado com Carolina Rosa Simões de Oliveira Gama, que faleceu com 22 anos, em 15 de Julho de 1877.
Desconhece-se como, em 8 de Novembro de 1883, António Domingos de Oliveira Gama Júnior aparece como requerente/proprietário em solicitação de obras à Câmara do Porto, para a Quinta das Virtudes, à Rua dos Fogueteiros, que receberá a licença de obra n.º: 905/1883.
Quanto a Guilherme Augusto, o seu percurso de vida será feito na indústria dos curtumes.
 
 
 
Guilherme Augusto de Oliveira Gama
 
 
Esta empresa acabaria pela zona de Francos, na Rua Direita de Francos, n.º 230.
Antes, foi fábrica de curtumes de “Guilherme Augusto Oliveira Gama, Sucº, L.da”, mais conhecida por Fábrica do Gama.
Actualmente, e desde há alguns anos, em seu lugar, foi construído um grande edifício de apartamentos.
A empresa começou a actividade, de facto, em 1894, no Campo 24 de Agosto, n.º 142, situando-se a uma trintena de metros, a jusante da “Companhia de Fiação Portuense”, em instalações arrendadas por 200$000 réis por semestre, com os capitais de António Nunes de Sousa Bonfim, um brasileiro de torna-viagem que, como muitos, tinha feito fortuna no Brasil.
De início, algum do capital da empresa pertencia, também, a Brunner & Hitzemann, o que dava à firma um ar de respeitabilidade.
Guilherme Augusto de Oliveira Gama tinha conhecimento da actividade de curtir peles, por exercê-la na fábrica, ao Monte do Bonfim, do seu pai, António Domingos de Oliveira Gama. 
Tendo-se incompatibilizado com o progenitor, foi aplicar os seus conhecimentos para a fábrica de curtumes de Joaquim Dionísio Jorge, ao Campo 24 de Agosto.
Guilherme Augusto de Oliveira Gama acaba casado com Leopoldina Bonfim de Oliveira Gama, uma brasileira que acompanhou o seu pai, António Nunes de Sousa Bonfim, no seu regresso a Portugal.
Em 1901, Guilherme Augusto de Oliveira Gama já tem responsabilidades na fábrica que lhe chega ao regaço pela via matrimonial e vai emprestar, para sempre, o seu nome à firma
Não havendo descendentes do enlace, atrás referido, Guilherme Gama chama para consigo trabalhar um sobrinho de sua mulher e afilhado de ambos, Luís Bonfim de Brito Barreiros.
Guilherme Gama morre em 11 de Março de 1909 e a sua viúva, no início do ano de 1910, vende a empresa ao seu sobrinho.
A fábrica vai crescendo o que obriga à sua mudança, em 1918, para a Rua Direita de Francos.
Neste ano, Luís Bonfim Barreiros cede uma quota a seu irmão José Barreiros, que já era seu empregado e a firma passa de sociedade em nome individual para sociedade por quotas, com denominação social “Guilherme Augusto Oliveira Gama, Sucº, L.da”.
 
 
 

Facsimile de papel de carta de “Guilherme Augusto Oliveira Gama, Sucº, L.da”
 
 
 
 

Primeiras instalações, na Rua Direita de Francos, de “Guilherme Augusto Oliveira Gama, Sucº, L.da”

 
 
Em 1928, Luís Bonfim Barreiros vai dar sociedade a Fernando Galhano, que tinha fundado, ao Amial, a Empresa Industrial de Curtumes e a Nova Empresa Industrial de Curtumes, mas que não se sentia confortável no desempenho da sua actividade naquelas funções.
Da associação resultante, as quotas ficaram assim repartidas: Luís Bonfim Barreiros – 50%, José Barreiros – 30% e Fernando Galhano – 20%.
Nos anos seguintes, entram para o comando da empresa, o filho de Fernando Galhano, o filho e o genro de Luís Bonfim Barreiros e, mais tarde, o genro de Galhano.
Em 1966, a firma passa a sociedade anónima e a ser “ Curtumes Guilherme Augusto de Oliveira Gama, SARL, mais conhecida pela Fábrica do Gama.
Mais tarde, será “Curtumes Gama S.A.”.
O século XXI seria o fim da linha para a empresa centenária.
 
 
 

Fábrica do Gama, em Francos
 
 
 
 
Fábrica de Curtumes do Bessa
 
 
Uma outra fábrica de curtumes importante da cidade foi a Fábrica de Curtumes do Bessa, fundada em 1852, por António Bessa Leite, donde haveriam de sair os fundadores da Fábrica Portuguesa de Curtumes de Monteiro, Bessa Ribas & Cia Lda e, de que, hoje, só resta o local ocupado por elegante zona habitacional e uma chaminé.
António Bessa Leite foi sempre solteiro e dono de uma fortuna colossal que já vinha de herança de família. Era dono de uma quinta enorme que ia da igreja de Lordelo até à Avenida da Boavista (zona do Foco) e parte desta. Foi um grande benfeitor da Santa Casa da Misericórdia do Porto.

 
 

Área habitacional antes ocupada antes pela Fábrica de Curtumes do Bessa – Fonte: Google maps

 
 

A chaminé que restou da Fábrica de Curtumes do Bessa – Fonte: Google maps

 
 
Muitas outras unidades ligadas ao sector dos curtumes tiveram as suas instalações na cidade.
 


Fábrica Portuguesa de Curtumes de Monteiro, Bessa Ribas & Cia Lda.
 
 
Em 15 de Setembro de 1937, Manuel Alves Monteiro e António Bessa Ribas constituem uma sociedade por quotas, a Fábrica Portuguesa de Curtumes de Monteiro, Bessa Ribas & Cia Lda.
Manuel Alves Monteiro estava ligado à indústria de curtumes, já que tinha trabalhado na Fábrica de Curtumes do Bessa, que tinha sido fundada, em 1852, por António de Bessa Leite e, da qual, era sócio António de Bessa Ribas.
A sociedade criada adquire, então, com o apoio do Banco Borges & Irmão, entretanto, as instalações da Companhia Portugueza de Cortumes, fundada em 1917 e, à data, em liquidação, estabelecendo aí a sua sede, no local que ainda hoje ocupa, na Estrada Exterior da Circunvalação ao Amial.
 
 
 

Construção de instalações da Fábrica Portugueza de Cortumes
 
 
 

Instalações da Companhia Portugueza de Cortumes, na Estrada da Circunvalação, ao Amial
 
 
 
No final dos anos 40, do século passado, com uma 2ª geração de gestores, personalizada em Josué Monteiro e Almiro Monteiro, dá-se uma acentuada expansão da empresa.
O surgimento de materiais alternativos ao couro não foi impedimento do seu contínuo desenvolvimento.
Em 1952, vai iniciar funções na empresa o engº Durval Carteado Mena, já uma experiência de 20 anos no sector, passando a ocupar funções de direcção industrial e técnica.
Então, a Companhia Portuguesa de Curtumes vai associar-se à Nova Empresa Industrial de Curtumes e que tinha sido Empresa Industrial de Curtumes.
É o momento de implantação no mercado do calçado com materiais alternativos ao couro.
Em 1962, arranca o fabrico de plásticos e, em 1967, de couro artificial.
É alargado o fabrico aos artefactos de borracha que, para além do calçado, serve também a indústria automóvel e de electrodomésticos.
Neste âmbito, é adquirida a empresa Flexopol, em 1973, que se dedicava ao fabrico de peças de borracha com metal. Depois, outra empresa é adquirida, a WoodMilne, com expressão no sector do calçado e material ortopédico.
No início da década de 70, a Companhia Portuguesa de Curtumes toma o nome de Monteiro, Ribas – Industrias S.A, quando empregava 700 pessoas e ocupava 42.000m2.
Em 1993, no Porto, apenas é feito o tratamento de peles, pois tinha sido inaugurada uma fábrica de curtumes nova, em Alcanena, e estabelecida uma participação numa fábrica na China.
Em 2010, a área de curtumes seria vendida e foi estendida uma diversificação para o sector das Embalagens Flexíveis, continuando a preponderância no sector da borracha.
Antes, em 2008, tinha sido dado termo à ligação associada à empresa Nova Empresa Industrial de Curtumes", a qual terminou a sua actividade em 19/09/2008, passando esta empresa a denominar-se Carneiro Ribas e Sousa, SA, situada na Rua do Ameal, nº 831 e que, entretanto, entrou em liquidação e já encerrou.

 
 
 



Fábrica de Curtumes do Amial

 
 
Entrada das instalações da Fábrica de Curtumes do Amial – Fonte: Google maps
 
 
Aquela empresa de curtumes, sedeada na Rua do Amial, era bem antiga, começando por se chamar Empresa Industrial de Curtumes do Amial.


 
 


Fábrica de Curtumes do Riobom
 

Uma outra unidade fabril de referência deste sector industrial foi a Fábrica de Curtumes Riobom, de Joaquim Riobom dos Santos, próxima do Largo Baltazar Guedes, no início do século XX.

 
 

Fábrica de Curtumes do Riobom (1), em desenho de projecto apresentado à Câmara do Porto em 1908

 
 
Como se vê acima, a fábrica ficava ao lado da entrada da ponte ferroviária Maria Pia.


 

Fábrica de Curtumes do Riobom, no Monte do Seminário


 
 

À direita da Ponte Maria Pia, observa-se a Fábrica do Riobom

 
 

Construção da Ponte Maria Pia (a Fábrica do Riobom ainda não foi edificada)
 
 
 

Fábrica de Curtumes de Valbom
 
 
Como curiosidade diga-se que esta unidade fabril chegou até aos nossos dias e o destino das suas instalações foram alvo de muita polémica. Situava-se em Ribeira de Abade, Valbom, face à EN 108.
Também conhecida como a Fábrica do Julião, por ter sido propriedade do industrial portuense Julião de Freitas Guimarães.


 
 

Fábrica de Curtumes de Valbom, antes e, depois – Cortesia de “Valbom de então e não só”
 
 
 
“Considerada uma das primeiras fábricas de curtumes de Portugal, o edifício classificado com valor patrimonial e arquitetónico, com 250 anos de história, foi sempre mais conhecido por fábrica do JuIião, por ter sido pertença do industrial portuense Julião de Freitas Guimarães (daí o nome) que "veio" para Valbom em 1880, transferida do esteiro de Campanhã. Mas antes de ser fábrica de curtumes do Julião em 1880, já era fábrica dos mesmos artigos em 1852.
Em 22 de Setembro de 1852, a mesma fábrica e terreno circundante - a quinta - foram, entre outros bens, objecto de dote para casamento de Dª Maria Beleza de Andrade (7ª Senhora de Levandeiras).
Não foram contudo os curtumes a sua primeira ocupação. Antes, foi destilaria de aguardente (!!), propriedade de D. Bartolomeu Pancorbo (percursor ou co-autor da ideia que serviria de base à criação da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto-Douro). Assim, a sua primitiva edificação datará de 1753 -1756.
Em 2002, o edifício foi adquirido por uma imobiliária com o propósito de aí construir um condomínio de luxo. Envolvida em polémicas várias, depois de um incêndio e uma alteração ao plano de urbanização de Valbom, permitiram a sua demolição em 2008”.
Cortesia de “Valbom de então e não só” (11 de Junho de 2019)

segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

25.292 A urbanização da antiga Rua do Castelo do Queijo (Avenida de Montevideu)

 
Em 15 de Fevereiro de 1865, o empreiteiro Manuel José da Silva arrematou, no 3º Bairro Fiscal, pelo preço de 3 590$000 réis, a empreitada para a construção do 2º lanço (Carreiros - Castelo do Queijo) da estrada marginal Foz - Leça da Palmeira.
Aquele lanço de via que, hoje é, desde 1926, a Avenida de Montevideu, foi, noutros tempos, a Estrada da Marginal ou Rua do Castelo do Queijo, tendo sido começada a ser urbanizada, ainda antes do fim do século XIX.
A Avenida de Montevideu desenvolve-se desde o seu entroncamento com a Rua do Molhe até ao largo onde se encontra o Forte de São Francisco Xavier (Castelo do Queijo).
Na foto abaixo, a Rua do Molhe, à direita, faz a separação das avenidas Brasil e de Montevideu.
 
 
 
 

O carro eléctrico, vindo do Castelo do Queijo, pela Avenida de Montevideu (onde se situam uns magníficos palacetes), vai entrar na Avenida Brasil

 
 
Naquele mesmo local esteve, nos primeiros anos do século XX, a “Casa Gianola”.
 
 
 

Casa Gianola – Confeitaria, Salão de Chá e Restaurante, em chalet na esquina da Rua do Molhe e Avenida de Montevideu – Cortesia de Foto-Porto
 
 
 
Todo o complexo habitacional da Avenida de Montevideu está instalado no lado nascente da avenida e, no lado poente, hoje, apenas está uma construção – a antiga Estação de Zoologia Marinha (Aquário Augusto Nobre).
No início do século XX, um outro prédio se encontrava no areal, como se pode observar na foto seguinte e que teria sido demolido para arranjo do local.

 
 

Rua do Castelo do Queijo, ainda com casa sobre a praia, em 1903 - In revista "Brasil-Portugal”, nº 96, de 16 de Janeiro de 1903
 
 
 
 

Vista aérea da Avenida de Montevideu, c. 1935

 
 
Assim, desde há algumas décadas, caminhando pela Avenida de Montevideu, no sentido do Castelo do Queijo, partindo da “Esplanada 28 de Maio” (Esplanada do Molhe), encontrávamos alguns palacetes de algumas famílias abastadas.
Alguns deles tinham a particularidade de ter acesso, também, pela Rua de Gondarém.
 
 
 
Palacete Andresen
 
 


Palacete Andresen, depois, da família Moreira
 
 
Este palacete, projecto do engenheiro António Silva, foi das primeiras construções a fazerem parte da Estrada do Castelo do Queijo, tendo sido mandado erguer por Alberto Henrique Andresen.
Teve licença de obra n.º: 228/1897.
Pertenceu, depois, até aos nossos dias, à família Moreira, sendo que, em 1924, já era seu proprietário Joaquim Alves Moreira.
Em 2017, o palacete foi vendido ao mesmo operador hoteleiro que lançou o Hotel Teatro, na baixa da cidade, à Rua de Sá da Bandeira.
 
 
 
Casa do Barão de Fermil
 
 
Esta moradia, na Avenida de Montevideu, n.º 66, na primeira década do século XX, era propriedade do negociante de vinhos de nacionalidade inglesa, Albert Mathias Feuerheerd (1870 - 1933), com escritórios na Rua do Rei Ramiro, em V. N. de Gaia.
Para a moradia, Albert Mathias Feuerheerd ainda solicitava, em 1919, à Câmara do Porto, uma autorização para nela executar obras que receberá a licença de obra n.º: 114/1919.
A residência, em questão, passará depois para as mãos do Barão de Fermil e, após ele aí ter falecido, será morada da sua filha, Delminda Sampaio Machado, casada com Dr. Francisco da Cunha Freitas Mourão de Sotomaior.
 
 
 

Casa do Barão de Fermil

 
 
Na casa da foto, anterior, viveu e aí faleceu Manuel Guilherme Alves Machado (Celorico de Basto, Veade, 25.10.1873; Porto, Nevogilde, 05.06.1943), 1º Barão de Fermil, casado, em 1900, com Maria Augusta Sampaio de Brito que, desde 1898, era proprietária do chamado Palacete dos Barroso Pereira, à Praça de Santa Teresa (actual Praça Guilherme Gomes Fernandes).
Em 1956, a sua filha Delminda Sampaio Machado e o seu genro, o Dr. Francisco da Cunha Freitas Mourão de Sotomaior, haveriam de receber a propriedade da Praça Guilherme Gomes Fernandes por doacção.

 
 

Casa do Barão de Fermil, actualmente – Ed. Graça Correia
 
 
 
 
Casa de Alfredo Carneiro Soares ou da “Viscondessa” de Carreiros
 
 
Esta moradia, na Avenida de Montevideu n.º 156, teve licença de obra n.º: 212/1901 e como primeiro proprietário Alfredo Carneiro Soares, que nela faleceu em 1918, tendo sido  casado com Maria Margarida Peixoto Guimarães e Silva Carneiro Soares.
O projecto inicial da moradia remontará a data anterior a 1897, pois, neste ano, é solicitado à Câmara do Porto, licença para levantamento de um portão em muro exterior.
A moradia terá passado, mais tarde, para a família Jervell.

 
 

Casa de Alfredo Carneiro Soares, depois, da família Jervell

 
 

Casa de Alfredo Carneiro Soares, actualmente – Ed. Graça Correia
 
 
 
 
Casa da Família Cálen
 
 
O prédio teria sido mandado construir, na década de 1940, por José Joaquim de Oliveira Cálem.
Em 1943, este proprietário solicita à Câmara do Porto uma licença para construir nessa morada um anexo, que terá como projectista o conhecido arquitecto Manoel da Silva Passos Júnior…o do cinema Júlio Deniz.
Localizada na Avenida de Montevideu, n.º 166, no final do século XX, a propriedade era de Maria Alice Cálen.




Casa da família Cálen

 
 

Casa da família Cálen, actualmente – Ed. Graça Correia
 
 
 
 
Vivenda Maria Borges
 
 


Actualmente (2024), a vivenda em trabalhos de remodelação que foi mandada erguer por Maria Fernandes Borges – Fonte: Google maps
 
 
 
 
A vivenda que, originalmente, em 1951, foi projecto do arquitecto Viana de Lima, foi mandada construir por Maria Fernandes Borges, gestora do Teatro Rivoli e mecenas, à data, viúva, para sua habitação e teve a licença n.º 267/1951. 
Localizava-se na esquina da Avenida de Montevideu e da Rua de Pero da Covilhã.
No ano anterior, para a mesma cliente, o arquitecto Viana de Lima tinha também executado um projecto para um Jazigo-Capela para ser instalado no Cemitério Oriental da cidade, também conhecido como Prado do Repouso.
Maria Assunção Fernandes Borges foi casada com Francisco António Borges (1861-1939), administrador do Banco Borges & Irmão, de cujo enlace houve uma filha, de seu nome, Maria Emília Fernandes Borges (1914-2000), condessa da Covilhã, e um filho, de seu nome, Francisco Manuel Fernandes Borges (1916-1959), de profissão engenheiro e que foi administrador do Banco Borges & Irmão.
Maria Emília Fernandes Borges ostentou aquele título nobiliárquico pelo seu casamento com o 3º conde da Covilhã, Júlio Anahory de Quental Calheiros (1900-1970), de cujo enlace houve a filha, Maria Manuela de Quental Calheiros.
O 3º conde da Covilhã chegou a este casamento, no estado de viúvo, vindo de um primeiro casamento, sem geração, com Vera de Sousa e Cruz, que faleceu muito nova, filha do Banqueiro Sousa e Cruz e de sua mulher, sendo reconhecido pelo povo anónimo como o fundador da fábrica de pneus MABOR.
 
 
 
Moradia de José Prata de Lima
 
 
Na esquina, a norte da Rua Pero da Covilhã e Avenida de Montevideu, situa-se a moradia que foi de José Prata de Lima e tem projecto do arquitecto José Luís Porto e licença de obra n.º: 118/1937.
 
 
 

Moradia José Prata de Lima – Fonte: Google maps
 
 
 
A foto anterior é da moradia emblemática da Avenida de Montevideu, existente no nº 644 (esquina com a Rua Pêro da Covilhã), é um projecto do arquitecto José Porto (1883-1965), autor de imensas obras espalhadas por várias cidades, inclusivamente pelas ex-colónias e, para sempre, ligado à Casa Manoel de Oliveira na Rua da Vilarinha. 
Actualmente, a casa foi intervencionada pelo atelier de arquitectura, Barbosa & Guimarães - Arquitectos, fundado em 1994, pelos arquitectos portuenses José António Vidal Afonso Barbosa e Pedro Luís Martins Lino Lopes Guimarães. 
 
 
 
Palacete do Rosas
 
 
Este palacete foi mandado construir por José Rosas Júnior (1885-1958), um negociante conhecido do sector da ourivesaria, possivelmente, na segunda década do século XX, com projecto do arquitecto Miguel Ventura Terra (1866-1919).
Em 1929, o palacete é dotado de um Jardim de Inverno, sob a autoria do arquitecto Leandro de Morais.
Em 1945, pela licença de obra n.º: 166/1945, são executadas obras importantes no palacete, com projecto do arquitecto António Júlio Teixeira Lopes (1903-1971).
 
 
 

Palacete do “Rosas”, depois o Restaurante D. Manoel, projecto inicial de Ventura Terra