Segundo Horácio
Marçal, a Rua das Hortas ia da Calçada dos Clérigos até à Rua
de Santo António dos Lavadouros depois, Rua dos Lavadouros (actual Rua Elísio
de Melo), como é explicitado, abaixo, na porção de um texto daquele
historiador.
In revista “O
Tripeiro”, Vª Série, Ano IX, Março de 1954, pág. 339
A partir dali, para
norte, começou a ser aberto em 1761, o arruamento que começou por
chamar-se Rua Nova do Almada e que, mais tarde, passaria a ser
a Rua do Almada.
Naquela data, a Rua
das Hortas já existia há alguns anos.
Em 29 de Julho de
1760, D. José I tinha autorizado a construção da Rua do Almada. As obras de
abertura e calcetamento começaram em 1761 e duraram até 1785.
Planta de 1761 de
Francisco Xavier do Rego, sargento-mor de Infantaria, com o exercício de
engenheiro, técnico escolhido por João Almada para abertura da Rua do Almada
Legenda da planta
acima:
- A Rua de Santo
António dos Lavadouros (1) seguiria, para poente, pela antiga Rua da Picaria
(2), que era no lado Norte da actual Praça de Filipa de Lencastre. A actual Rua
da Picaria era a antiga Travessa da Picaria (3), que termina na Praça da
Conceição.
- Na parte nascente
do Monte da Douda (4) foi construída, mais tarde, a igreja da Trindade.
- A Rua das Hortas
(5) estendia-se para lá da Rua da Fábrica (6)
Atribuição de n.ºs de polícia
Para fazer a
identificação de algumas moradas, na cidade do Porto, é necessário ter como
referência a data de Abril de 1860.
Acontece que, antes
daquela data, as moradas eram identificadas por um n.º de polícia, cuja
atribuição ocorreu gradualmente, ao longo do tempo, com o objectivo de
organizar e facilitar a localização de edifícios, principalmente, para
distribuição do correio e que era atribuído da seguinte forma:
Começava-se numa
origem e a rua ou praça, em causa, era percorrida no sentido dos ponteiros do
relógio.
Como se depreende da
aplicação daquele método, os n.ºs de polícia eram corridos.
As identificações
eram afixadas às habitações pela distância de portas e janelas ao ponto de
origem.
Aquela distância era
executada em metros ou varas (1,10 metros) de acordo com os técnicos que
procediam à tarefa.
A obrigatoriedade da
aplicação do sistema métrico, só se verificaria no início do século XX, pelo Código
de Posturas do Município do Porto de 1905, nomeadamente, no seu n.º 3, do art.º
186.
Da aplicação prática
daquela determinação resultaram alterações óbvias, com algumas excepções, pois
algumas moradas mantiveram-se.
A partir de 1860, o
visconde de Gouveia, Governador Civil do Porto faz publicar um edital com um
conjunto de regras que subsiste até hoje.
Assim, o método de
determinação dos n.ºs de polícia continuaram a ser corridos, apenas para os
largos e praças.
No caso das ruas, um
lado passa a ter números pares (direita) e o lado oposto ímpares (esquerda), de
acordo com a orientação a partir de uma origem, na qual o observador tomava o
rio Douro, nas suas costas, como referência.
No caso das ruas
paralelas ao rio Douro o sentido de orientação era o do seu fluxo para a foz.
Segue texto de parte
do edital atrás referido.
Edital
Jozé Freyre de
Serpa Pimentel de Mansilha e Silva Donnas Botto de Mesquita Sequeira e
Vasconcellos, 2.º visconde de Gouveia, par e grande do reino, moço fidalgo com
exercicio no paço, socio do real conservatorio de Lisboa, e do instituto de
Coimbra, juiz no quadro da magistratura judicial, e governador civil do
districto do Porto.
Convindo ao bom
regimen policial, economico, e administrativo, e ao interesse particular dos
cidadãos, que as ruas, praças, largos, e mais logares publicos desta cidade,
Villa Nova de Gaia, e seus suburbios, sejão conhecidos por denominações claras,
simples, e distinctas; e que a numeração dos predios siga uma ordem regular e
methodica; considerando que as inscripções de muitas ruas e logares publicos se
acham apagadas ou deterioradas pelo tempo, e não são em numero sufficiente
carecendo-se portante d'uma renovação geral, - sendo esta a melhor occazião
d'emendar os defeitos de muitas denominações, já por haver ruas que se
prolongão mudando de nome, já porque outras tem denominações repetidas, vagas,
ou confuzas; - attendendo a que differentes reprezentações me teem sido
inderessadas, pedindo providencias sobre a numeração dos predios, em razão das
muitas irregularidades, a que dão logar não só as multiplicadas edificações e
reformas, mas também a má ordem da antiga numeração em partes interpolada, em
partes apagada; - tendo colhido as convenientes informações dos respectivos
administradores dos bairros, e concelhos, e da camara municipal; - ouvindo o
conselho do districto, que conveio na oportunidade das medidas; - e visto o
codigo administrativo, os artigos 224 e 227; e as portarias de 27 de setembro
de 1843, e 9 de julho de 1859, determino o seguinte: (…)
O lado direito de
uma rua, travessa, ou viella (tanto aquém, como além Douro) será determinado
nas que correrem perpendicular, ou obliquamento ao rio, pela direita do
viandante, que marchar afastando-se do mesmo rio; - e nas que forem paralelas,
pela direita do que marchar no sentido da corrente.
Porto 20 d'Abril de 1860. - O governador civil, Visconde de Gouvêa
O edital atrás
transcrito concluía com a publicação de uma reorganização toponímica que, entre
outras alterações, provocou que a rua, até aí conhecida como Rua das Hortas,
passaria a fazer parte da Rua do Almada.
Casa onde nasceu Ana Plácido
Ana Augusta Vieira Plácido
era filha de António José Plácido Braga (1795-1852) e de Ana Augusta Vieira
(1799-1855), tendo nascido em 27 de Setembro de 1831, na Travessa da Praça D.
Pedro, nºs 5 a 9.
Hoje, o perfil
correspondente à tal travessa coincide com a Rua do Dr. Artur Magalhães Basto,
pelo que, a casa onde teria nascido Ana Plácido, não existe mais, como se verá.
Na igreja de Santo
Ildefonso, no registo do seu baptismo, é dada uma morada da Praça Nova.
Os pais de Ana
Plácido construíram uma família numerosa e, para além dela, conceberam Antónia Cândida
Plácido Braga, Eduardo Augusto Plácido, Alberto Augusto Plácido, Emília Antónia
Plácido e 10 outros.
Assim, impunha-se
que os cómodos para alojar tamanha prole tivessem de ser de uma certa
envergadura.
Acontece que, em 14
de Julho de 1838, António José Plácido Braga fez um pedido de licenciamento, para
executar obras num prédio, de que se dizia proprietário, sito na Travessa D.
Pedro, nºs 3 a 9, com frente para a Rua das Hortas, nºs 149 a 151.
Pelas regras de
atribuição de números de polícia e para o caso concreto anterior, se pode
concluir que, no caso da Rua das Hortas, a numeração tinha a sua origem na sua
confluência com a Calçada dos Clérigos e continuava pelo lado poente da rua
passando, depois, para o lado nascente, seguindo o sentido dos ponteiros do
relógio.
Pedido de
licenciamento de 14 de Julho de 1838, que originou a licença nº 169/1838 –
Fonte: AHMP
Assim, se pode
concluir, que o prédio onde teria nascido Ana Plácido fazia esquina com a Rua
das Hortas. Falta saber se seria a esquina a norte ou a sul.
Um requerimento
dirigido por José António Silva Braga, à Câmara do Porto, três anos após a
morte de António José Plácido Braga, para execução de obras num prédio e que obteve
a licença nº 434/1855, parece resolver a dúvida.
O requerente, junto
dos serviços camarários, apresenta-se como proprietário do prédio em causa e
solicita o lançamento nele de mais um andar.
Desenho das fachadas
do prédio integrante de projecto apresentado à Câmara do Porto, que obteve o nº
434/1855, para solicitar o acrescento de mais uma andar
No desenho anterior,
a fachada, ao centro, é indicada como sendo a da Travessa da Praça D. Pedro, a
da direita, como a voltada para a Rua das Hortas e, a da esquerda, a voltada
para a Praça D. Pedro (antes, Praça Nova).
Acrescenta-se que,
no mesmo desenho, está representada, à esquerda, uma fachada identificada como
voltada para a Praça, o que está de acordo com o registo de baptismo de Ana
Plácido, existente na igreja de Santo Ildefonso, que a dá como nascida,
algures, na Praça Nova.
Pode, então,
concluir-se, que o prédio onde nasceu Ana Plácido é o da esquina a sul que,
hoje, é chão da delegação do Banco de Portugal, no Porto.
O requerente,
anteriormente mencionado, José António da Silva Braga, passados cerca de oito
anos, encontrava-se comerciando, naquele local, de acordo com o anúncio
seguinte.
In jornal “O
Comércio do Porto” de 30 de Abril de 1863
Antes da edificação
da actual delegação do Banco de Portugal, no prédio do gaveto formado pela Praça
D. Pedro (Praça da Liberdade), Travessa da Praça D. Pedro (Rua Dr. Magalhães
Basto) e Rua do Almada (nesse local, antes, a Rua das Hortas), aí estava, a
firma de materiais de construção e aparelhos sanitários "Arnaldo
Lima" e a empresa de transportes L'Éclair.
Casa onde morou, em jovem, Ana Plácido
Tudo aponta que Ana
Plácido viria a mudar-se, ainda muito jovem, para a Rua do Almada, nºs 27 a 30,
acompanhando a família e aqui viveu até se casar.
De facto, em
Fevereiro de 1839, António José Plácido Braga solicita à Câmara do Porto a
realização de obras em duas moradas de casas que possuía na Rua Nova do Almada,
nºs 27 e 30, que obtém a Licença de obra n.º 221/1839, dizendo-se, então,
morador na Travessa da Praça D. Pedro, nºs 5 a 9 (morada atribuída para o
nascimento de Ana Plácido).
Durante muitos anos
a Rua do Almada era denominada Rua Nova do Almada e, a Rua das Hortas, por Rua
Nova das Hortas.
De acordo com o
anúncio abaixo, aquelas duas moradas de casas, de dois andares, tinham ligações
à Picaria e, por isso, situar-se-iam, na Rua do Almada, no sentido ascendente,
à esquerda.
De notar, que aquele
n.º de polícia é anterior a 1860.
A arrematação
anunciada, acima, realizava-se após decorridos, cerca de sete anos, sobre o
naufrágio do vapor Porto, no qual morreu o pai de Ana Plácido e decorreria de
um processo de partilhas.
Legenda da planta
acima:
1. Rua das Hortas
2. Rua dos
Lavadouros
3. Travessa da
Picaria
4. Rua do Almada
Legenda da planta
acima:
1. Rua das Hortas
2. Rua do Almada
3. Rua dos
Lavadouros
De acordo com a
atribuição dos n.ºs de polícia, antes de 1860, a morada da Rua do Almada, 27 a
30, distaria entre 27 a 30 varas ou metros da confluência das ruas das Hortas e
dos Lavadouros, á esquerda, sentido ascendente.
Considerações sobre
a planta anterior:
- Todas as moradas
englobadas na elipse preta já existiam desde o lançamento da Rua do Almada, em
1761, pelo que, à data de 1839, faziam e fizeram parte da Rua das Hortas;
- A elipse amarela
aparentemente numa área não construída era o local de implantação daquela que
ficou conhecida como a Primeira Fonte da Rua do Almada e que tinha existência
desde 1795.
- O prédio, mais a
poente, na esquina da Rua da Picaria, dentro da elipse azul, tinha existência
desde há mais de um século quando, em 1865, viu ser-lhe acrescentado mais um
andar.
Pertencia, à data,
ao visconde da Penna (título nobiliárquico atribuído pela corte espanhola).
A atribuição de
números de polícia, na Rua do Almada, antes de 1860, tinha a sua origem, no seu
lado poente, após a fonte da foto e passaria, depois, para o lado nascente,
seguindo o sentido dos ponteiros do relógio.
Morada de Ana Plácido, após casamento
Em 28 de Setembro de
1850, no dia seguinte ao seu 19º aniversário natalício, Ana Augusta Vieira
Plácido iria casar e passaria a ser Ana Augusta Plácido Pinheiro Alves,
passando a viver, ao que se sabe, na casa alugada onde vivia na Rua do Almada o
seu marido, Manuel Pinheiro Alves (1807-1863).
Àcerca deste
casamento, Camilo Castelo Branco ironizava:
"E no Porto?
Isso então, rapariga bonita, às duas por três, está num papo dum brasileiro que
tenha 50 contos, tanto faz que ele seja velho, com zarolho, como
raquítico".
O romance de "A
Paixão de Camilo (Ana Plácido)" de Rocha Martins, Lisboa, 1900, sobre o
afortunado noivo, narrava:
“Tinha quarenta e tres anos e era do logarejo
de Souto, visinho de S. Miguel de Seide, um povoado triste, à beira de
Famalicão onde se chegava por atalhos e quinteiros, saltando barrocos, à sombra
das uveiras; os seus labutavam na chã e ele, depois de talhar a estrada do
ganho, comprar a casa de portão na aldeia, acomodara-a, tomara servos e
deixando os parentes a lidar partira para o Porto, abrira escritório de
corretagem de barcos, instalara-se num andar espaçoso no 378 da rua do
Almada donde espreitava a noiva que ia completar o seu sonho de
“brasileiro” opulento.
Puzera-se a auxiliar o futuro sogro e talvez
fosse esta ajuda o motivo primaz daquela união. Os cônjuges diferiam tanto em
edades que não se poderia levar á conta de reciproca simpatia o acto que se ia
realizar”.
Sobre a imposição
deste casamento a Ana Plácido, por parte da família, ela acabaria por descrever
o acto como a busca da felicidade pela
abastança.
Sendo a obra acima
citada uma das mais conceituadas sobre a vida de Camilo Castelo Branco, começou
a aceitar-se, desde a sua publicação, que a morada do primeiro casamento de Ana
Plácido fosse a da Rua do Almada, n.º 378.
Naquela obra, era
apresentada uma foto do prédio, em causa, exibida a seguir.
Actualmente, em
primeiro plano, o prédio da Rua do Almada, n.º 378, onde está o Restaurante
Camilo que é o mesmo da foto anterior
Desconhece-se como
Rocha Martins resolveu a conversão do n.º de polícia anterior a 1860 para o
actual.
Para complicar a
situação, no romance, o seu autor legenda a foto, colocando o prédio exibido,
na Rua do Almada, n.º 385, como se mostra, na foto abaixo, em destaque.
Acreditando, que
esta última morada é anterior a 1860, podemos concluir que nela viveu Ana
Plácido até a 28 de Janeiro de 1859, quando foi expulsa de casa, com o seu filho
pequenito, Manuel Plácido.
Então, Rocha Martins
teve acesso a documentos que não divulgou.
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