quarta-feira, 24 de setembro de 2025

25.286 Os monges Beneditinos instalaram-se no Olival há mais de 400 anos

 
Implantação das estruturas
 
 
O Mosteiro de S. Bento da Vitória foi erguido no Morro do Olival, na actual Rua de S. Bento da Vitória, que já foi Rua de S. Bento dos Frades e Rua de S. Bento, tendo sido, ainda, Rua de S. Miguel, quando esta tinha a configuração de um L.
Hoje, dessa Rua de S. Miguel, só resta o troço do braço pequeno do L.
Situava-se no interior das muralhas e junto da Porta do Olival.
O mosteiro e a sua igreja de S. Bento da Vitória serviam à Ordem Beneditina, fundada por S. Bento (480-547), tendo a sua construção ocorrido em finais do século XVI, no local anteriormente ocupado pela Judiaria do Olival.
Aqueles monges obedeciam à Regra de S. Bento que consagrava os princípios da humildade, pobreza e obediência.
Em função do que tinha sido decidido no Mosteiro de Tibães, os beneditinos entraram no Porto com o intuito de construírem um mosteiro na cidade, o que veio a acontecer depois de resolvidos alguns entraves, embora, a construção, só tenha terminado cerca de um século depois.
Expulsos os judeus por D. Manuel I, em 1496, os bens que deixaram para trás foram distribuídas pelo Cabido e pela Câmara que, por vezes, se mostraram relutantes na transferência da posse das propriedades para os beneditinos. Por esta razão, alguns dos litígios tiveram, mesmo, de ser sanados em tribunal.
O Mosteiro de S. Bento da Vitória foi o único mosteiro beneditino masculino construído no Porto, tendo sido instituído em 1596, onde, antes, estavam os terrenos e casebres ocupados pelos judeus.
A sua construção terá, então, arrancado, mas, em Março de 1597, o rei Filipe II chamava à ordem a Câmara do Porto pelo facto da construção do mosteiro ter avançado sem a necessária autorização do monarca e, ao mesmo tempo, a Câmara era avisada que, de futuro, tal não deveria mais acontecer.
Talvez, por este facto, a construção só arrancaria, em pleno, em 1604, no local onde estavam as ruínas de uma antiga sinagoga.
 
 
 
“Convento maneirista com igreja cruciforme, de nave única precedida por galilé, capelas colaterais intercomunicantes e abóbada de berço em caixotões, e dois claustros. Capelas com retábulos de talha dourada de estilo nacional e joanino. O claustro principal tem motivo serliano. O cadeiral, de estilo nacional, com relevos narrativos da vida de São Bento de grande qualidade, é um dos melhores do estilo. O retábulo-mor constitui o mais grandioso exemplar do tipo de retábulo com tribuna de estilo nacional na variante em que as colunas alternam com pilastras. Retábulos de estilo joanino de vários andares e sanefa do arco triunfal também joanino, de forma tradicional”.
Fonte: monumentos.gov.pt
 
 
 
 

Em primeiro plano, a fachada do mosteiro voltada para a Rua de S. Bento da Vitória e cujas traseiras se debruçam sobre a Rua de Trás
 
 

O complexo monacal tinha dois claustros: o claustro dos carros e, o chamado claustro nobre que, mais tarde, seria coberto e tinha sido concluído em 1743, apresentando uma fonte no seu centro.
 
 
 
“O claustro contíguo à portaria, todo em cantaria, possui dois pisos separados por cornija e ritmados por duplas pilastras com vãos rectangulares entre elas. Em cada ala, abre-se no 1º piso três arcos plenos e no 2º janelas de sacada com bandeira, balustrada de cantaria e frontões triangulares e circular. Sobrepujando as coberturas, bolas sobre plintos no alinhamento das pilastras e cartelas com enrolamentos ao centro. O outro claustro, de três pisos separados por frisos, têm apenas duas alas com arcos plenos sobre pilares e janelas de guilhotina nos pisos superiores”.
Cortesia de Isabel Sereno e João Santos, 1994
 
 
 
 

Claustro dos carros do Mosteiro de S. Bento da Vitória
 



Mosteiro de S. Bento da Vitória e o claustro dos carros, em 1989, durante obras de restauro
 
 
 

Mosteiro de S. Bento da Vitória e o claustro nobre, actualmente
 
 
 
No que diz respeito à Igreja do Mosteiro de S. Bento da Vitória, o seu projecto é do arquitecto Diogo Marques Lucas, discípulo do italiano Filipe Terzio, em estilo clássico já deturpado pela Contra-Reforma, com uma harmonia, solidez e proporções equilibradas.
De notar os três nichos da fachada, nos quais estão representados São Bento, a Santa Escolástica, irmã gémea de São Bento e, ainda, Santa Gertrudes.
 
 
 

Fachada principal da igreja de S. Bento da Vitória, observando-se os três nichos

 
 
 

Gravura de Joaquim Villanova da igreja de S. Bento da Vitória, em 1833
 
 
 
Em 1693, a igreja, apresentando no seu exterior e interior as tipologias maneirista e barroca, estava concluída, embora tardasse até finais do século XVIII a conclusão do seu interior.
No coro alto da igreja, pode observar-se um belo cadeiral em talha, considerado um dos mais belos da Europa, obra concretizada entre 1716 e 1719 pelo entalhador bracarense Marceliano de Araújo, em parceria com Gabriel Rodrigues Álvares, de Landim. Nos seus espaldares estão colocados quadros policromados e que narram episódios da vida de S. Bento. 
Como curiosidade diga-se que a igreja possui um órgão imponente, alvo de várias intervenções e um outro como cópia em frente deste, apenas para dar uma ideia de simetria sem outra qualquer funcionalidade.
Por outro lado, o seu órgão, situado do lado do evangelho, possui 2022 tubos e, em tempos de rotina monástica, era tocado de 3 em 3 horas, alternando com o coro.
 
 
 

Interior da igreja de S. Bento da Vitória, actualmente – Fonte: oportoencanta.com
 
 

 
Ocupação das instalações do Mosteiro de S. Bento da Vitória após 1834
 
 
Durante a Guerra Peninsular, uma parte do mosteiro foi ocupada pelas tropas invasoras francesas e, posteriormente, pelas portuguesas, tendo servido como hospital militar.
Em 30 de Maio de 1834, na sequência da implantação da lei assinada por D. Pedro IV e proposta pelo seu ministro Joaquim António de Aguiar, ocorre a extinção das ordens religiosas, e o complexo monacal de S. Bento da Vitória foi confiscado pelo Estado.
Desocupados, o mosteiro e a sua igreja acabariam por passar para o Clero secular.
O Clero secular também referido, geralmente, na actualidade, como Clero diocesano, é a designação dada à parcela do clero da Igreja Católica Romana que desempenha actividades voltadas para o público em geral e que vive junto dos leigos, exercendo as mais variadas formas de apostolado e assegurando a administração da Igreja.
A igreja do Mosteiro de S. Bento da Vitória substituiria a Igreja Paroquial de Nossa Senhora da Vitória  entre 1833 e 1852, durante as obras de reconstrução desta, que tinha sido alvo de um incêndio.
Depois, em 25 de Julho de 1853, a igreja do Mosteiro de S. Bento da Vitória torna-se sede da Arquiconfraria do Santíssimo e Imaculado Coração de Maria, a qual ficou detentora da Igreja por Alvará da Rainha D. Maria II.
Após 1834, as antigas instalações do mosteiro funcionaram como Tribunal, até 1864 e albergaram, ainda, várias unidades militares, onde estiveram aquarteladas, sucessivamente, tropas da Junta do Porto (1846-1847), o Regimento de Infantaria nº. 6, o Batalhão Nacional de Artilharia, o Batalhão de Caçadores nº 9, o Batalhão de Caçadores nº 1 e outros serviços militares, nomeadamente, a Reclusão Militar e o Tribunal Militar.
Na noite de 12 para 13 de Março de 1922, o imóvel foi atingido por um incêndio que destruiu a área ocupada pela Casa de Reclusão Militar, pelo Tribunal Militar e pelo quartel dos dois regimentos (Infantaria 31 e Engenharia).
Vinte anos volvidos sobre este episódio, em 1942, por decisão do Bispo D. Agostinho de Jesus e Sousa, a igreja e parte do edifício claustral foram confiados ao Mosteiro Beneditino de Singeverga.
Em 1977, o Mosteiro de S. Bento da Vitória é classificado como monumento nacional.
Nas décadas de oitenta e noventa do século XX, o mosteiro foi restaurado pelo IPPAR (1984-1990), sob orientação dos arquitectos Carlos Guimarães e Luís Soares Carneiro, o que permitiu a reinstalação de uma pequena comunidade de beneditinos e a instalação do Arquivo Distrital do Porto, na área do claustro dos carros e da Orquestra Sinfónica do Porto, na área do claustro nobre.
 
 
 

Antigo Refeitório dos Monges transformado num salão de exposições afecto ao Arquivo Distrital do Porto
 
 
 
Em 2007, dois anos após a orquestra ter ocupado a Casa da Música, foi cedida ao Teatro Nacional S. João a ala nascente e parte da ala sul e o claustro nobre, onde passaram a realizar-se espectáculos teatrais, musicais e outros eventos.
Os beneditinos ocupam a denominada “Cela dos Padres Beneditinos” na zona da igreja, a ala Norte e 3º piso da ala Oeste.
Cela, neste caso, refere-se ao local onde os monges se reúnem ou habitam.
 
 
 
 
Outros factos
 
 
Sobre o Mosteiro de S. Bento da Vitória, “O Arquivo Pitoresco”, de 1840, descreve uma cerimónia habitual que ocorria na sua igreja:
 
 
“No dia 5 de Março passava-se uma cerimónia assaz ridícula na Igreja de S. Bento da cidade do Porto. No altar colateral da direita, de hora a hora, estava um frade rezando os exorcismos e orações de levantamento de excomunhão; no fim das quais saía pela igreja abaixo batendo com umas varinhas de marmeleiro presas na extremidade de uma comprida cana, em as pessoas, que de joelhos queriam receber esta cerimónia. E como quase sempre os frades se desmandassem um pouco, deu isso lugar a algumas cenas incidentes, sendo por fim necessário ir uma guarda de polícia para a igreja, pois os frades não quiseram nunca quebrar por si, deixando de fazer a cerimónia”.
 
 
 
Por outro lado, em 1872, a igreja de S. Bento da Vitória celebrava o São Marçal substituindo, nesse ano, nessas festividades, a igreja dos Orfãos de Nossa Senhora da Graça que lhe ficava próxima.
 
 
 

In “Jornal do Porto” de 28 de Junho de 1872, pág. 2
 
 
 
 
 
Mais recentemente, sobre os azulejos da foto, abaixo, no Tripeiro I série, volume 2, nº 62 de 10 de Março de 1910, pág 412, o autor S.A., diz:
 
 “A bela sala da livraria de que roubaram os ricos azulejos, parte dos quais foram guarnecer uma propriedade pertencente ao vizinho João Pereira Vellado, era sumptuosa”.
 
 
 
 

Prédio na Rua S. Miguel, nº 4, antes de 2017
 
 
 
A  livraria referida, acima, era a do Convento de S. Bento da Vitória.
Em 2017, o painel de azulejos foi retirado e arrecadado pela Câmara do Porto.

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