sábado, 25 de março de 2017

13. Lazer e Espectáculo


Em 26 de Agosto de 1896, chegou pela primeira vez à cidade do Porto e ao " Theatro do Príncipe Real " (futuro "Teatro Sá da Bandeira" a partir de 1910), o grande acontecimento desse ano, que foi a estreia em Portugal do Animatographo Portuguez Pinto Moreira, um aparelho rudimentar de projecção de imagens. As apresentações, consistiam em sessões públicas com doze quadros, de uma enorme novidade para o público portuense.
A 12 de Novembro de 1896, decorria no Theatro do Príncipe Real, no Porto, a apresentação ao público do Kinetographo Portuguez por Aurélio da Paz dos Reis e seu cunhado, Francisco de Magalhães Bastos Júnior.

Programa da Sessão do Kinetographo

Na mesma sessão, uma Companhia de Zarzuela cantou Los Africanistas.
Entre os quadros exibidos, cinco dos quais estrangeiros, constam Saída do Pessoal Operário da Fábrica Confiança (Rua de Santa Catarina, Porto), A Rua do Ouro (Lisboa), Marinha no Tejo, Saída de Dois Vapores. Além de Jogo do Pau (Santo Tirso), Chegada d’Um Comboio Americano a Cadouços (Foz do Douro), O Zé Pereira na Romaria de Sto. Tirso e A Feira de S. Bento , já revelados dois dias antes, no dia 10 de Novembro aos jornais diários e alguns convidados.
O cinema em Portugal surgiria assim, no Porto, pela mão de Aurélio Paz dos Reis em 1896, sendo a sua primeira experiência de captação de imagens em movimento, «Saída dos Operários da Fábrica Confiança», sem dúvida, uma cópia de «Sortie des Usines Lumière» dos Irmãos Lumiére. Naquela sessão foram apresentados por Aurélio da Paz dos Reis, os primeiros filmes realizados por um português.
Paz dos Reis era florista, fotógrafo amador e proprietário da “Flora Portuense”. Bastos Júnior era fotógrafo profissional, e co-proprietário da “Photographia Central”.
O cinema começaria no Porto, a partir de 1896 e não mais pararia de crescer.
Animatographo foi a designação usada em Portugal, introduzida por Edwin Rousby, agente comercial de William Paul nas suas digressões em 1896 pelo nosso país, para a apresentação do Teatrógrafo que era apenas, um simples projector.
Por sua vez o Kinetographo ou Cinetógrafo era uma máquina de filmar, de revelar e de projectar filmes.



Teatro dos Duques de Lafões ou Teatro do Corpo da Guarda


O primeiro teatro do Porto foi construído nas cavalariças do entretanto demolido e conhecido como, Palácio dos Condes de Miranda ou dos Marqueses de Arronches ou, ainda, dos Duques de Lafões, perto da Sé.
Contam que em 1623, tinha já ali sido representada (dizem que em cima de dois carroções) por uma companhia dramá­tica espanhola, a comédia, "Malmaridada", a convite do conde de Miranda. 
Mas a sua verdadeira inauguração seria em 15 de Agosto de 1760, quando aí foi levada à cena uma ópera lírica para homenagear o casamento de D. Maria I com D. Pedro. Este D. Pedro era filho de D. João V e portanto tio da esposa. Foi rei-consorte com o nome de D. Pedro III “ O Capacidónio”.
Dois anos depois, em 15 de Maio de 1762, agora por iniciativa do corregedor da cidade, João de Almada e Melo, uma companhia italiana levou à cena, também, nas cocheiras do palácio, a ópera italiana “Il Trascurato" (O Descuidado) de Pergholese e em que a prima-donna se chamava Giantini.
O Teatro do Corpo da Guarda que foi desenhado por João Glama Stroeberle continuou a ter mais algumas representações de companhias profissionais e amadoras, com destaque para a ópera Demofonte, levada à cena em 1772, para celebrar o aniversário do rei D. José I.


Palácio dos Condes de Miranda - Desenho de Gouvêa Portuense


Mais três espetáculos se realizariam, em 1785, para celebrar o casamento do futuro rei D. João VI, com a princesa Carlota Joaquina.
A descrição que existe desse teatro, apresenta-nos uma estrutura efémera instalada nas cocheiras do Palácio do Duque de Lafões, na altura habitado pelo influente D. João de Almada e Melo, primo do marquês de Pombal e governador da cidade, e frequentado, como é óbvio, por ele e pela melhor sociedade portuense.


Palácio dos Duques de Lafões

Este solar situava-se no Largo do Corpo da Guarda, na envolvente à Sé do Porto, mais precisamente a meio do que é hoje a Avenida D. Afonso Henriques.

“Pertenceu ao 1º. Duque de Lafões D. Pedro, filho de um filho ilegítimo de D. Pedro II, que este perfilhou, nascido em 10/1/1718 e falecido em 1761”.
Horácio Marçal em O Tripeiro, Série VI, Ano IX


Por aquele palco teatral, passou Luísa Todi e a "formosa e voluptuosa" Giuntini, a diva italiana por quem o filho do governador João de Almada e Melo, Francisco de Almada e Mendonça se haveria de tomar de amores, a tal ponto que, decidiu patrocinar a construção de um teatro lírico de raiz, com que o Porto iria também responder, ao S. Carlos de Lisboa – o teatro S. João.
Rebelo Bonito em O Tripeiro Série VI, Ano III afirma: 

“Em 28 de Fevereiro de 1797 realizou-se o último espectáculo neste teatro, após ter funcionado durante cerca de 30 anos. A sala teve depois destino pouco nobre: foi sucessivamente quartel de guardas de segurança pública, quartel de guarda barreiras e depósito de “calcetas” ou vadios coagidos pelas autoridades a trabalhos de pavimentação de ruas e caminhos, levando corrente amarrada à cinta e artelho do pé direito para não fugirem.”






O Palácio de Cristal continha duas salas de espectáculos: a Nave Central ou Teatro Popular; e o Teatro Gil Vicente.
Ambos se tornaram palcos regulares para a música, acolhendo os primeiros concertos sinfónicos no Porto e aproveitando o esplendoroso órgão de 2750 tubos.
Em 1868 numa tentativa de aumentar as receitas a direcção do Palácio de Cristal decide transformar uma sala de leitura num teatro.
Nasce assim o Teatro Gil Vicente que é conhecido como “teatro de algibeira” devido às suas reduzidas dimensões.
O Gil Vicente passa a ser o palco preferido da colónia britânica no Porto e mais tarde do Orpheon Portuense.
Desde a sua fundação o teatro recebe vários artistas de renome mundial que culmina em 24 de Novembro de 1929 com o concerto de Maurice Ravel integrado na temporada do Orpheon Portuense.
Em 1931 dá-se a estreia nacional de “Petrouchka” de Igor Stravinsky pelo pianista Cláudio Arrau.



Teatro Gil Vicente em 1930 no Palácio







O Teatro Baquet mandado construir pelo alfaiate portuense António Pereira Baquet, em 21 de Fevereiro de 1858, foi estreado com um baile de Carnaval, em 13 de Fevereiro de 1859. Foi projetado por Guilherme Correia.
A inauguração solene ocorreu em 16 de Julho de 1859 com a representação da comédia-drama, “O segredo de uma família”, original de José Carlos Santos representada pela Companhia do Teatro do Ginásio de Lisboa.

Anúncio da inauguração

Crónica descritiva do dia da inauguração


“Chamava-se António Pereira e nasceu na freguesia do Bonfim. Era criança, quando deixou a sua cidade natal para acompanhar os pais, quando estes rumaram a Espanha, para onde foram "à procura de melhores dias". Em data não determinada, regressou ao Porto e já vinha casado, com uma cidadã espanhola. E tinha um ofício por sinal bem rendoso naquela recuada época. Era alfaiate. Ao seu nome de batismo acrescentara, entretanto, o apelido afrancesado de Baquet. Era agora António Pereira Baquet.
No seu regresso ao Porto, Baquet começou por montar uma oficina de alfaiate na Praça da Batalha. Mas não ficou ali muito tempo. Mudou-se, logo a seguir, para um edifício mais amplo e mais confortável, na então moderníssima Rua de Santo António, hoje Rua de 31 de Janeiro. Era um homem de visão larga, viajado e que granjeara algum dinheiro com o seu rendoso ofício de alfaiate”.
Com o devido crédito a Germano Silva


O teatro Baquet desde cedo passaria a viver anos conturbados, e só estabilizaria a partir de 1870, com a gestão da empresa “Moutinho de Sousa” e a empresa “Perry”. A situação agravar-se-ia com o falecimento de António Pereira Baquet em 1869. 
António Moutinho de Sousa (Porto 1834-Idem 1898), poeta e autor dramático foi, então, empresário do Teatro Baquet.
Escreveu em 1856, “Pelaio ou a vingança de uma afronta” e “Amor e honra”, entre muitas outras peças.
A viúva casaria, então, com António Teixeira Assis (contramestre da alfaiataria de António Baquet).
Este, porém, também viria a falecer pouco depois, passando o teatro, a partir daí, para Ana Vitória de Ascensão, mãe de António Assis.
Em 1880 por vontade de Ana Vitória, é construída uma nova fachada do teatro voltada para a Rua de Sá da Bandeira que desde 1875 vinha a substituir a famigerada e desadequada Viela da Neta.
Em 21 de Março de 1888, durante a representação da ópera cómica “Os Dragões de Villars”, deflagrou um fulminante incêndio no Teatro Baquet devido à chama de um bico de gás de uma gambiarra do palco, que pegou fogo a uma bambolina e destruiu por completo o edifício e motivou inúmeras mortes. Nessa noite fora a representação daquela ópera, estava ainda prevista a apresentação da zarzuela “Gran Via” dirigida pelo músico-empresário portuense, Ciríaco Cardoso.
Atendendo ao programa previsto, a sala acolhia muito público, o qual entrou em pânico. Viveram-se momentos de horror, durante e após o acontecido, conforme testemunha a imprensa da época.
Uma das fontes consultadas aponta para 84 vítimas mortais e 86 feridos, enquanto outra refere que perderam a vida cerca de 170 pessoas.
Não deixa de ser curiosa a referência, em 1876, de Alberto Pimentel ao temor dos portuenses pela possibilidade de ocorrer um incêndio no Teatro Baquet, o que aconteceria onze anos depois.
 
 

Alberto Pimentel, In “Guia do Viajante na cidade do Porto e seus arrabaldes” (1877)


Memorial de homenagem às vítimas do Teatro Baquet no cemitério de Agramonte



No desenho abaixo mostra-se a entrada do teatro pela Rua de Santo António, sendo que as traseiras davam para antiga Viela da Neta, nesse momento já, Rua de Sá da Bandeira.





Teatro Baquet em desenho de Nogueira da Silva - Fonte: Archivo Pittoresco


Fachada do teatro voltada para a Rua de Santo António após o incêndio




Foto do ataque ao incêndio do Teatro Baquet pela Rua Sá da Bandeira



Na foto acima à esquerda vê-se a sede da firma João Tomaz Cardoso, proprietária da fábrica Tomaz Cardoso, fundada em 1840.
A sede da empresa, situada no n.º 92, da Rua de Sá da Bandeira, funcionava como estabelecimento de venda ao público de cofres, fogões, camas e colchoaria.
Logo a seguir ficava no rés-do-chão do teatro, o Café e Restaurante "High-Life", e a sua sala de bilhares, de João Baptista Carvalho, que sofreriam danos avultados no dia fatídico.


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