quinta-feira, 16 de março de 2017

(Continuação 17) - Actualização em 11/03/2021

Vida Quotidiana


Alberto Pimentel, no seu livro “O Porto há 30 anos” escreveu, em 1893, sobre a vida da dona de casa: 

“ As damas portuenses de há 30 anos dedicavam-se em geral, à sua casa e à sua família. Todo o governo doméstico estava nas suas mãos, superentendiam em tudo o que se passava de portas adentro: o seu dia de trabalho começava logo pela manhã e só acabava às Trindades, à hora do lusco-fusco, chamada então do pregar da agulha. Naquele tempo, a culinária francesa não tinha ainda invadido o País. O jantar, como sabemos, era à portuguesa antiga. Mas, conquanto todos os dias fossem servidos os mesmos pratos, a dona da casa não deixava de dar uma volta pela cozinha para ter a certeza de que a cozinheira estava cumprindo os seus deveres. 
Quando o dono da casa chegava para jantar, era à esposa, e não a qualquer outra pessoa, que ele fazia esta pergunta do estilo: 
- O jantar está pronto, menina?
E a dona da casa achava-se sempre habilitada a responder imediatamente:
-Está.
Porque a verdade é que o mesmo jantar estava invariavelmente feito à mesma hora, com uma pontualidade que parecia marcada por um cronómetro. 
Era a dona da casa que dava ao rol a roupa suja, quando a lavadeira chegava, ordinariamente à mesma hora. 
Era ela que talhava, cosia e consertava a roupa branca do marido e dos pequenos. Todas as peúgas que eles calçavam eram feitas por ela. Fazer meia era uma obrigação e uma distracção até. Mas, ordinariamente, a boa dona de casa costurava durante o dia, e reservava a meia para o serão. O breve descanso entre o dia e a noite, a hora do pregar da agulha, era consagrado, muitas vezes, à oração, que principiava pelas 3 Avé Marias do Angelus. As meninas da casa, se as havia, aproveitavam a pequena folga do crepúsculo para ir à janela ver passar o namoro, que as cumprimentava muito respeitosamente e não se atrevia a olhar para trás senão à esquina da rua. 
Que santa tranquilidade patriarcal a desse tempo!”


Segundo Firmino Pereira na obra “O Porto d’Outros Tempos”, escrevia também, que muito dos tempos de lazer no último quartel do século XIX, eram passados nos cafés e botequins da baixa portuense, em idas ao restaurante Reimão para comer as tripas e o caldo verde, em passeios pelo rio acima devorando alguidares de arroz de forno e frango assado e em serões passados na estalagem da Ponte da Pedra com uns passeios de barco a remos no Leça.


Grupo de excursionistas, no Areinho de Oliveira do Douro, aqui chegados nas barcas de passagem encostadas na margem


Mas, era a taverna da Ponte da Pedra, a Meca dos destinos dos portuenses, desde a primeira metade do século XIX.



Passeio de barco a remos, no rio Leça, próximo da Ponte da Pedra



Em 1865, a taverna da Ponte da Pedra mudaria de mãos.



In "Jornal do Porto" de 4 de Julho de 1865




Estalagem da Ponte da Pedra



Passando a falar de costumes mais populares, o azeite era vendido no Porto pelos azeiteiros, tanto pelos do Porto como os vindos de Aveiro e até de Coimbra. Usavam uma corneta para chamar a atenção dos moradores. Vendiam também óleo, vinagre e petróleo.



Azeiteiro do Porto - Pintura de Columbano Bordalo Pinheiro



Azeiteiro de Aveiro



Viatura de Azeiteiro e Vinagreiro – Fonte: “raulpicasinos.blogspot.pt”



Lanterneiro de António Ramalho 1883 – Fonte: charcofrio.blogspot.pt



Latoeiro de José Malhoa – Fonte: Site “pinterest.pt”



Com uma grande saída no século XIX e parte do século XX, os lanterneiros e os latoeiros (nas imagens anteriores), hoje apenas com procura, por quem gosta de peças de cariz artesanal.

“Uma figura típica de então era também, o “amola tesouras e navalhas” que passava de tempos-a-tempos, tocando uma flauta de pan tirando dela, por vezes, lindas melodias.
Compunha ainda guarda-chuvas, punha solda nas panelas, “gatos” nas porcelanas partidas e fazia outras utilidades que muito contentavam os portuenses.
Pelas ruas da cidade estavam espalhados os engraxadores, em especial nas zonas de maior movimento e prestavam um bom serviço. Nessa altura era “chic” trazer sempre os sapatos ou botas de couro muito bem limpos. Por mais que nos esforçássemos nunca conseguíamos, em casa, pô-los tão brilhantes. Mas a C. M. Porto mandou-os retirar das ruas pelo que só os encontrávamos nas entradas das casas ou cafés. Hoje estão praticamente extintos”.
Fonte: portoarc.blogspot.pt


A flauta do amolador



O amolador


Outros profissionais que pululavam pela cidade eram os engraxadores.
Estabelecidos, regra geral, individualmente em lugares fixos das praças e jardins, em alguns casos actuavam em grupo, em verdadeiras oficinas, normalmente, em portais de prédios da baixa portuense que apresentavam movimento desusado.
 
 
 

Engraxadores na entrada de prédio, na Rua Sampaio Bruno, nº 12 (em frente ao café Embaixador)
 
 
 
Um outro grupo de engraxadores, muito conhecido e com uma clientela fiel, exercia a sua profissão no portal de entrada para o piso onde se localizavam os bilhares do café Imperial, na Praça da Liberdade.



Engraxador na Praça da Liberdade - Cortesia de Adriano Miranda, In jornal "Público", 2017


Engraxadores junto da Farmácia Birra, na Praça da Liberdade





A fotografia feita em espaços exteriores, parques e jardins era feita pelos fotógrafos “à la minute”. Dado que, algumas máquinas não tinham “zoom” a distância da fotografia teria de ser sempre a mesma.
Esta profissão de fotógrafo seria uma de muitas, que desapareceriam com a evolução das máquinas. 


Fotógrafo no jardim de S. Lázaro


Galinheira na Ribeira do Porto



Galinheira no Porto - Desenho de João Gaspar



Texto sobre as galinheiras – Fonte: portoarc.blogspot.pt


Vendedor de gelados em Miragaia


Vendedor de gelados


Vendedor de gelados, na Ribeira






Leiteira



Na foto acima observa-se a forma como o leite era distribuído porta a porta pelas leiteiras que o faziam transportar em recipientes de folha-de-flandres, os chamados canados e era medido ao quartilho (c. 1/2 litro).
Uma profissão que teria existência a partir da década de 1940, foi a da “apanhadeira de malhas”.
A fibra de nylon, que começou a aparecer a partir de 1935, foi um dos materiais utilizados durante a Segunda Guerra Mundial para fazer tendas e roupas para o exército. Com o fim do conflito, aquela matéria-prima ficou disponível para outros usos como, por exemplo, as chamadas meias de vidro para senhora. Apresentadas ao público na Feira Internacional de Nova Iorque, a 27 de Outubro de 1938, a sua produção aumentou a partir de 1945, com o fim da guerra.
No entanto, como não era um produto barato, sempre que “caía uma malha”, entrava em acção a “apanhadeira de malhas”, uma profissão exercida por mulheres, que geralmente trabalhavam em casa, à janela, ou em portais de prédios com acesso de público, com a ajuda de uma agulha e de um ovo para esticar a meia.
Mais tarde surgiram pequenas máquinas que substituíram o trabalho manual, mas, com o desenvolvimento da indústria, o preço das meias desceu e, por isso, ficava mais barato comprar um par novo do que mandar apanhar uma malha.

 
 
Copo e agulha para apanhar malhas caídas em meias de nylon
 
 
“Lembro-me muito bem de ver a minha avó e mãe a apanharem as malhas nas meias. A meia era enfiada no copo e esticada a barbela da agulha num movimento de vai vem tecia novamente a fibra , no final da malha apanhada, rematava-se com um fio do mesmo ton.
A estas agulhas podia adicionar-se um motor eléctrico que facilitava a apanha das malhas, na minha casa nunca houve esse motor, era caro e nunca houve hipótese de adquiri-lo”.
Cortesia de “trilhos-da-ana.blogspot.com/”

 
 
Publicidade às “Máquinas de Apanhar Malhas Vitos”, cujo agente no Porto estava sedeado na Rua de Trás, nº 10 - 2º



Lavadeira de Grijó
 
 
Muitos outros profissionais de diversos ofícios vagueavam pela cidade tentando vender os seus produtos, entre eles, os vendedores de passamanarias e bugigangas e, com grande aceitação os vendedores de gravatas.


 

Vendedor de passamanarias, junto do palacete das Cardosas, c. 1900 – Ed. Aurélio da Paz dos Reis

 
 

Vendedor ambulante de gravatas – Ed. Garcia Nunes



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