Vida Quotidiana
Alberto Pimentel, no seu livro “O Porto há 30 anos” escreveu, em 1893,
sobre a vida da dona de casa:
“ As damas
portuenses de há 30 anos dedicavam-se em geral, à sua casa e à sua família.
Todo o governo doméstico estava nas suas mãos, superentendiam em tudo o que se
passava de portas adentro: o seu dia de trabalho começava logo pela manhã e só
acabava às Trindades, à hora do lusco-fusco, chamada então do pregar da agulha.
Naquele tempo, a culinária francesa não tinha ainda invadido o País. O jantar,
como sabemos, era à portuguesa antiga. Mas, conquanto todos os dias fossem
servidos os mesmos pratos, a dona da casa não deixava de dar uma volta pela
cozinha para ter a certeza de que a cozinheira estava cumprindo os seus
deveres.
Quando o dono da
casa chegava para jantar, era à esposa, e não a qualquer outra pessoa, que ele
fazia esta pergunta do estilo:
- O jantar está
pronto, menina?
E a dona da casa
achava-se sempre habilitada a responder imediatamente:
-Está.
Porque a verdade
é que o mesmo jantar estava invariavelmente feito à mesma hora, com uma
pontualidade que parecia marcada por um cronómetro.
Era a dona da
casa que dava ao rol a roupa suja, quando a lavadeira chegava, ordinariamente à
mesma hora.
Era ela que
talhava, cosia e consertava a roupa branca do marido e dos pequenos. Todas as
peúgas que eles calçavam eram feitas por ela. Fazer meia era uma obrigação e
uma distracção até. Mas, ordinariamente, a boa dona de casa costurava
durante o dia, e reservava a meia para o serão. O breve descanso entre o dia e
a noite, a hora do pregar da agulha, era consagrado, muitas vezes, à oração,
que principiava pelas 3 Avé Marias do Angelus. As meninas da casa, se as havia,
aproveitavam a pequena folga do crepúsculo para ir à janela ver passar o
namoro, que as cumprimentava muito respeitosamente e não se atrevia a olhar
para trás senão à esquina da rua.
Que santa tranquilidade
patriarcal a desse tempo!”
Segundo Firmino Pereira na obra “O Porto d’Outros Tempos”, escrevia
também, que muito dos tempos de lazer no último quartel do século XIX, eram
passados nos cafés e botequins da baixa portuense, em idas ao restaurante
Reimão para comer as tripas e o caldo verde, em passeios pelo rio acima
devorando alguidares de arroz de forno e frango assado e em serões passados na
estalagem da Ponte da Pedra com uns passeios de barco a remos no Leça.
Grupo de excursionistas, no Areinho de Oliveira do Douro, aqui chegados
nas barcas de passagem encostadas na margem
Mas, era a taverna da Ponte da Pedra, a Meca dos destinos dos portuenses, desde a primeira metade do século XIX.
Passeio de barco a remos, no rio Leça, próximo da Ponte da Pedra
Estalagem da Ponte da Pedra
Passando a falar de costumes mais populares, o azeite era vendido no
Porto pelos azeiteiros, tanto pelos do Porto como os vindos de Aveiro e até de
Coimbra. Usavam uma corneta para chamar a atenção dos moradores. Vendiam também
óleo, vinagre e petróleo.
Azeiteiro do Porto - Pintura de Columbano Bordalo Pinheiro
Azeiteiro de Aveiro
Viatura de Azeiteiro e Vinagreiro – Fonte: “raulpicasinos.blogspot.pt”
Lanterneiro de António Ramalho 1883 – Fonte: charcofrio.blogspot.pt
Latoeiro de José Malhoa – Fonte: Site “pinterest.pt”
Com uma grande saída no século XIX e parte do século XX, os
lanterneiros e os latoeiros (nas imagens anteriores), hoje apenas com procura,
por quem gosta de peças de cariz artesanal.
“Uma figura
típica de então era também, o “amola tesouras e navalhas” que passava de tempos-a-tempos,
tocando uma flauta de pan tirando dela, por vezes, lindas melodias.
Compunha ainda
guarda-chuvas, punha solda nas panelas, “gatos” nas porcelanas partidas e fazia
outras utilidades que muito contentavam os portuenses.
Pelas ruas da
cidade estavam espalhados os engraxadores, em especial nas zonas de maior
movimento e prestavam um bom serviço. Nessa altura era “chic” trazer sempre os
sapatos ou botas de couro muito bem limpos. Por mais que nos esforçássemos
nunca conseguíamos, em casa, pô-los tão brilhantes. Mas a C. M. Porto mandou-os
retirar das ruas pelo que só os encontrávamos nas entradas das casas ou cafés.
Hoje estão praticamente extintos”.
Fonte: portoarc.blogspot.pt
A flauta do amolador
O amolador
Outros profissionais que pululavam pela cidade eram os engraxadores.
Estabelecidos, regra geral, individualmente em lugares fixos das praças
e jardins, em alguns casos actuavam em grupo, em verdadeiras oficinas,
normalmente, em portais de prédios da baixa portuense que apresentavam
movimento desusado.
Um outro grupo de engraxadores, muito conhecido e com uma clientela
fiel, exercia a sua profissão no portal de entrada para o piso onde se
localizavam os bilhares do café Imperial, na Praça da Liberdade.
Engraxador na Praça da Liberdade - Cortesia de Adriano Miranda, In jornal "Público", 2017
A fotografia feita
em espaços exteriores, parques e jardins era feita pelos fotógrafos “à la
minute”. Dado que, algumas máquinas não tinham “zoom” a distância da fotografia
teria de ser sempre a mesma.
Esta profissão de
fotógrafo seria uma de muitas, que desapareceriam com a evolução das
máquinas.
Fotógrafo no jardim de S. Lázaro
Galinheira no Porto - Desenho de João Gaspar
Texto sobre as galinheiras – Fonte: portoarc.blogspot.pt
Leiteira
Na foto acima observa-se a forma como o leite era distribuído porta a
porta pelas leiteiras que o faziam transportar em recipientes de
folha-de-flandres, os chamados canados e era medido ao quartilho (c. 1/2
litro).
Uma profissão que teria existência a partir da década de 1940, foi a da
“apanhadeira de malhas”.
A fibra de nylon, que começou a aparecer a partir de 1935,
foi um dos materiais utilizados durante a Segunda Guerra Mundial para fazer
tendas e roupas para o exército. Com o fim do conflito, aquela matéria-prima
ficou disponível para outros usos como, por exemplo, as chamadas meias de vidro
para senhora. Apresentadas ao público na Feira Internacional de Nova Iorque, a
27 de Outubro de 1938, a sua produção aumentou a partir de 1945, com o fim da
guerra.
No entanto, como não era um produto barato, sempre que “caía
uma malha”, entrava em acção a “apanhadeira de malhas”, uma profissão exercida
por mulheres, que geralmente trabalhavam em casa, à janela, ou em portais de
prédios com acesso de público, com a ajuda de uma agulha e de um ovo para
esticar a meia.
Mais tarde surgiram pequenas máquinas que substituíram o
trabalho manual, mas, com o desenvolvimento da indústria, o preço das meias
desceu e, por isso, ficava mais barato comprar um par novo do que mandar
apanhar uma malha.
“Lembro-me muito bem
de ver a minha avó e mãe a apanharem as malhas nas meias. A meia era enfiada no
copo e esticada a barbela da agulha num movimento de vai vem tecia novamente a fibra , no final da malha
apanhada, rematava-se com um fio do mesmo ton.
A estas agulhas podia
adicionar-se um motor eléctrico que facilitava a apanha das malhas, na minha
casa nunca houve esse motor, era caro e nunca houve hipótese de adquiri-lo”.
Cortesia de “trilhos-da-ana.blogspot.com/”
Publicidade às “Máquinas de Apanhar Malhas Vitos”, cujo
agente no Porto estava sedeado na Rua de Trás, nº 10 - 2º
Lavadeira de Grijó
Vendedor de passamanarias, junto do palacete das Cardosas,
c. 1900 – Ed. Aurélio da Paz dos Reis
Vendedor ambulante de gravatas – Ed. Garcia Nunes
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