terça-feira, 21 de março de 2017

(Continuação 21) - Actualização em 14/05/2021

A Rua da Fábrica, dada a sua proximidade à Praça D. Pedro, sempre alojou hotéis de referência.
 



Hotel Internacional (antigo Hotel Real), em 1913


 
No prédio da gravura acima, esteve em tempos, o célebre Café das Hortas. O Hotel Internacional, fundado em 1905, ainda existe hoje, no mesmo local, tendo sido em 2014, adquirido pelo "Grupo Barrias", proprietário do "Café Majestic", "Café Guarany", "Café Vera Cruz", "Hotel dos Aliados" e "Hotel Pão de Açúcar".
Em 26 de Maio de 1938, reabriria com remodelação a cargo de Adelino Caetano.
 
 
 

O Hotel Internacional ainda existe
 
 
 
Bem perto do Hotel Internacional, uns metros acima, no lado oposto, ainda na Rua da Fábrica, esteve desde 1877, o Grande Hotel Paris.
O edifício onde se encontra o Grande Hotel Paris foi começado a levantar em 1855, por mando de um importante homem de negócios da cidade, Manuel Fernandes da Costa Guimarães, morador na Rua do Correio, nº 98-102 e, dois anos depois, começava a ser ocupado.
Antes, o prédio que ali se encontrava, tinha sido alvo de um incêndio.
Os primeiros inquilinos foram a Sociedade Filarmónica Portuense, em 1857.
Em 1877, aí se instalaria o Grande Hotel de Paris, com Manuel da Costa Guimarães como administrador da sociedade que passa a gerir o hotel, sendo o seu director um cidadão francês, Gabriel Dupuy.
Cerca de três dezenas de anos antes, já se tinha instalado, na Rua da Fábrica, nº 41 (antiga numeração que, até 1860, era corrida), a “Hospedaria Francesa”, vinda do Largo da Batalha, à esquina da Rua de Cima de Vila, de João Baptista Arismendi, a qual havia “sucumbido” num incêndio, anos antes.

 
 

Publicidade, em 1846, à mudança para a Rua da Fábrica, da Hospedaria Francesa
 
 
 
Em 1848, a hospedaria continuava de portas abertas como publicitava o periódico lisboeta “O Estandarte”.
 
 
 

“O Estandarte”, de 31 de Dezembro de 1848
 
 
 
A hospedaria receberia como cliente, desde a primeira hora, o escritor Camilo Castelo Branco acabado de chegar de Vila Real.
Segundo Camilo, a hospedaria ficava num prédio apalaçado, cujo rés-do-chão era ocupado pelas oficinas e escritório do jornal "O Nacional." 
Ficou célebre a descrição que Camilo Castelo Branco fez sobre uma sua estadia na hospedaria quando, estando doente, recebeu a visita da cozinheira e sua amiga Gertrudes que lhe serviu, em 1849, um prato de mão de vaca… e ele se curou.
Quem por lá também se hospedou foi Pedro Bartholomeu Dejante um marceneiro famoso da época que, em Outubro de 1852, anunciava na imprensa:

 
 
“Pedro Bartholomeu Dejante, marceneiro de SS. Magestades, tendo de retirar-se para Lisboa, annuncia que no dia 20 do corrente pelas 11 horas da manhã, na Hospedaria Franceza, rua da Fábrica nº 43, faz leilão de móveis novos de pau mogno, espelhos em caixilhos dourados para tremós e fogões de sala, um variado sortimento de marmores de Itália, e Nacionaes, promptos para lavatórios, toucadores, mezas, commodas, e escaparates; tudo acabado na última perfeição”.
In jornal "O Periódico dos Pobres", Nº 246, 18 de Outubro de 1852, pág. 1053, cit. por José Francisco Ferreira Queiroz


No início do ano de 1851, no seu regresso ao Porto vindo de Lisboa, o escritor encontrou "extinta" a Hospedaria Francesa, dizendo sobre o gerente da mesma o seguinte:
 
 
”Uma nota impertinente: O chefe desta hospedaria era Mr. Ayresmen, ou um nome assim parecido. Tinha ele duas filhas, uma das quais dera muito que fazer aos logrados amadores das boas caras. Chamava-se M.lle Pauline. Uma bela manhã, o proprietário da casa penhorou tudo por dívida. O chefe morreu, mendigando. Uma filha morreu de fome. A outra, M.lle Pauline, suicidou-se. Eis aqui meia dúzia de linhas que revelam a saudade com que me recordo dessa infeliz família com a qual vivi um ano. Não devem rir-se disto.” 
"Um Homem de Brios" de Camilo Castelo Branco

 
Sobre a prosa anterior, é possível  que o fecho, no início de 1851, da Hospedaria Francesa, tenha sido apenas esporádico e ocorrido face à ausência do seu antigo gestor.
Aquela hospedaria, seria também conhecida por “Hotel Francês”. 
Será ainda, certamente, aquele hotel que, em 1854, Camilo Castelo Branco identifica como o “Hotel Barthès”, onde ele visita o casal José Augusto e Fanny Owen, na Rua da Fábrica.
Em 1855, começaria a ser construído um novo prédio, pois, o anteriormente aí existente, tinha sido alvo de um incêndio. O novo edifício haveria de ser ocupado pela Sociedade Filarmónica Portuense e, depois, pelo Hotel de Paris.
Na chamada “casa dos herdeiros Sampaio”, uma casa setecentista, situada quase em frente, ao que viria a ser a sede da Sociedade Filarmónica e do Hotel Paris, na Rua da Fábrica, existiu, também, na 2ª metade do século XIX, uma pensão muito concorrida.
Essa morada haveria de dar pensão, até muito depois do dealbar do século XX.
 
 
“O “Grand Hotel de Paris”, situado na rua da Fábrica, num edifício apalaçado contruído por um abastado negociante, foi inaugurado a 27 de novembro de 1877, e funcionou inicialmente como sucursal do “Hotel de Paris” em Lisboa.
No ano seguinte é aberta a sala “Café-Restaurante” que mais tarde viria a ficar conhecida pelos seus acepipes, adotando o nome de Casa Transmontana, por ser frequentada por muitos viajantes de Trás-os-Montes.
O Grande Hotel de Paris é o hotel mais antigo da cidade do Porto, tendo sido inaugurado em 1877, o mesmo ano da ponte D. Maria Pia.
Camilo Castelo Branco, Eça de Queirós, Guerra Junqueiro e Rafael Bordalo Pinheiro, foram algumas das personalidades da cultura portuguesa que ficaram hospedadas no Grande Hotel de Paris.
No dia 27 de novembro de 1877, anunciava-se na imprensa a inauguração de "um magnífico hotel de primeira ordem".
Porquê tantos nomes de vulto das letras portuguesas entre os hóspedes?
A ligação à literatura e aos livros é umbilical, nasceu com o hotel.
Ou não fossem alguns dos seus fundadores, como Ernesto Chardron e Mathieux Lugan, os proprietários da Livraria Internacional Ernesto Chardron, hoje a famosa Livraria Lello.
O francês Gabriel Dupuy geriu a primeira sociedade, constituída por cidadãos ilustres do Porto da época.
Durante boa parte da segunda metade do séc. XX, o afamado restaurante do hotel servia "os melhores acepipes da cidade" – dizia-se, de boca em boca. Época em que era também conhecido como a "casa transmontana do Porto" – lugar de tertúlias e convívio, costumes que vinham de trás, dos primórdios dos saraus musicais, dos jantares-concertos, dos encontros de homens da política e da cultura.
Atualmente, a construção apalaçada tipicamente portuense e de linha sóbria, guarda no seu interior uma pequena pérola histórica e arquitetónica, uma surpresa ainda desconhecida para muitos que sobem e descem a rua da Fábrica”.
In facebook.com/PortoDesaparecido
 
 
 

Anúncio da formação da sociedade gestora do Grande Hotel Paris em 14 de Dezembro de 1877, inserido no “Commercio Portuguez”
 
 
 
Em 1879, teve lugar o primeiro sarau musical no jardim interior iluminado, sendo que, neste ano, passam também a ser disponibilizados serviços como, cabeleireiro e sala de leitura.
Em 1881, o hotel cria os “Diners-Concerts” (jantares/concertos), destinado a servir as famílias.
O Grande Hotel Paris ficou, entre outros motivos célebre, por ter um café restaurante que se mantinha aberto para lá do horário do fecho dos teatros, e pelas suas salas de jogos.


 

Publicidade ao Hotel Paris em 27 Novembro de 1877


 
 

Jardim interior do Grande Hotel Paris
 
 
 
A partir de Novembro de 1885 até Fevereiro de 1886, viveu neste hotel Eça de Queiroz, nas semanas que antecederam o seu casamento com D. Emília de Castro.
Aqui, Camilo Castelo Branco e Guerra Junqueiro reatam também a sua amizade, sob a acção conciliadora de Ricardo Jorge.
Entre os anos 1888 a 1907 tiveram lugar os banquetes dirigidos pelo maître Joseph Aufrére, altura em que o hotel era gerido por proprietários franceses (1877-1887 Gabriel Dupuy, 1888-1907 Joseph Aufrére, 1908-1918 Gustave Cérez).
Sobre o Grande Hotel de Paris (Rua da Fábrica) é a notícia seguinte:

 
“Teve importantes reformas no ano de 1880.
Um soberbo ómnibus da casa acha-se na estação de caminho de ferro, a todas as horas de comboio, para a condução de passageiros.”
In “O Primeiro de Janeiro”, de 29 de Abril de 1880 – 5ª Feira

 
A estação ferroviária referida devia ser a de Campanhã (que já existia), ou a das Devesas, em V. N. de Gaia e, neste caso, o atravessamento do rio Douro seria feito, pela ponte D. Maria II.
Posteriormente, em 1919, começou a época dos proprietários portugueses (Manuel Ferreira Da Silva, Augusto Teixeira de Carvalho e Joaquim da Silva Petiz e da gerente francesa Pauline Buton), sendo que durante a década de 20, se executaram inovações nas instalações.
A segunda metade de século XX, foi a época dos proprietários galegos, em  que ficou conhecido como “Casa Transmontana” porque havia muitos viajantes de Trás-os-Montes.
Desde 1999, a família Ferreira é proprietária do Grande Hotel de Paris. Esta é uma família tradicional transmontana. Adquiriu este hotel aos proprietários galegos. Procedeu-se então a um trabalho de restauro, remodelação e preservação da identidade e personalidade histórica do hotel.

 
 

Entrada do Grande Hotel de Paris
 
 
 

Etiqueta de 1970

 
 
E, um pouco por toda a baixa da cidade, as unidades hoteleiras procuravam as melhores instalações.
 
 
 
Rua de Sá da Bandeira (antiga Rua do Bonjardim) - Ed. Tipografia Renascença Portuguesa
 
 
 
Na foto acima, em frente, era o começo da Rua da Bonjardim, junto aos Congregados e, pela direita, é a Rua de Santo António.
A partir de 1916 esse troço passou a fazer parte da Rua de Sá da Bandeira.
Na última metade do século XIX, no local que se vê na foto (pela esquerda), ficava uma estação de Char-à-Bancs que fazia ligação com a estação ferroviária das Devesas em V. N. de Gaia, términos da linha do Norte, desde 1864.
Um dos andares superiores dessa estação foi ocupado, em tempos, pelo Hotel Estrela do Norte (não confundir com um outro da Rua de Entreparedes), onde se costumavam hospedar os artistas estrangeiros que faziam parte das companhias a actuar no Baquet e no Príncipe Real.
Nesse local, chegou a estar estabelecido, também, o depósito da Fábrica da Marinha Grande.
À entrada da rua, à esquerda da foto, ficava o Hotel Real, de que Camilo Castelo Branco foi várias vezes hóspede.
Nesse troço da Rua Sá da Bandeira no nº 21, mais tarde, instalar-se-ia o Hotel Peninsular, que ainda hoje tem as suas portas abertas.



 

Hotel Peninsular, na Rua de Sá da Bandeira, nº 21

 
 

Grande Hotel do Porto
 
 
 
Acima, um folheto publicitário do Grande Hotel do Porto situado, tal como hoje, na Rua de Santa Catarina e que foi inaugurado em 1880.




Hotel Oriental, na Rua das Flores, nº 221, em 1913
 
 
Em 18 de Fevereiro de 1916 a gerência do Hotel Oriental seria intimada a fazer obras para melhorar as condições de higiene, segurança e comodidade dos seus hóspedes, pelos Engºs José de Vasconcelos Lima Júnior e Manuel Domingues dos Santos e Carlos Nogueira Pontes.
Na mesma intimação foram englobados ainda, o Hotel Arouca, o Hotel Luso-Brasileiro, o Hotel Amazonas, o Hotel Minho e Douro e o Hotel Livração, todos eles contemporâneos do Hotel Oriental.



 

Hotéis no Porto, em 1879 – Fonte: Guia do Viajante nos Caminhos de Ferro no Norte do Douro

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