O citado Café Lisbonense que se localizava
quase na esquina da Rua de Santo António e da Rua de Sá da Bandeira, começou
por pertencer a João Bento Teixeira e, mais tarde, passou para a gerência de
José Fernandes Nogueira. Encerrou as suas portas no final do primeiro quartel
do século XX, tendo sido inaugurado c. 1870.
Era um café do tipo “café-concerto”.
Ocupava dois edifícios e possuía um salão interior que se dividia em dois: um
virado para a frente do estabelecimento e vocacionado para a especialidade do
café, com as suas mesas de mármore e cadeiras, para os seus velhos
frequentadores, e um outro atrás, onde ficavam os bilhares. No primeiro dos
dois compartimentos encontrava-se, inclusive, um pequeno espaço para a actuação
das orquestras de tercetos e quartetos.
No andar superior tinha um restaurante.
Em 3 de Setembro de 1900, o Café Lisbonense, após os seus proprietários J. Henriques Gonçalves e esposa Ana Ferreira Gonçalves terem passado o estabelecimento em 26 de Agosto, começa a ser alvo de obras para introdução de alguns melhoramentos, pelo que, até ao final dos trabalhos previstos para o mês seguinte de Outubro, a entrada passou a ser feita pelos bilhares.
"Café Lisbonense: ontem Carlos Quilez,
reputadíssimo professor de música, executou um trecho de violoncelo a solo, de
difícil execução, acompanhado a piano por Xisto Lopes. Sucesso perante um
elevado número de damas e cavalheiros que ali estavam para o ouvir."
In jornal “A Voz Pública”, 20 Abril de1901, p. 2
Publicidade ao programa musical do Café Lisbonense em 1905 - Fonte: "O Tripeiro" série III de 15/12/1927
Anúncio de programa
musical do Café Lisbonense, In jornal “A Voz Pública” de 24 de Dezembro de 1907
“Já em finais do século XIX, e no âmbito de
uma época histórica em que o hábito da escrita se tornou uma obsessão para
grande parte dos intelectuais, tendo-se publicado imensos periódicos, ocorreu
um episódio deveras caricato nas instalações deste café, que personifica bem o
espírito da época. Trata-se da circulação de um periódico, intitulado Gazeta do Realismo: Órgão da última boémia,
onde se podia ler que os autores, por dificuldades financeiras, tinham decidido
editar o jornal no próprio Café
Lisbonense. Neste sentido, e atendendo ao conteúdo
algo ofensivo dos artigos que formalizaram
esta gazeta, os autores resolveram utilizar como pseudónimos, os nomes de
escritores franceses prestigiados.
Assim sendo, Sampaio Bruno era A. Dandet,
Joaquim Araújo era C. Mendes, Francisco Carrelhas era Émile Zola, José da Luz
Braga era E. Fey Deau e Gaspar de Lemos era Gustave Flaubert373. Facilmente se
percebe que o jornal foi imediatamente apreendido, tendo-se ficado pelo
primeiro número de lançamento”.
Com a devida vénia a
Nuno Fernando Ferreira Mendes
Em 31 de Outubro de 1902, João Bento Teixeira, co-proprietário do Café Lisbonense requereu que as portas do estabelecimento fossem fechadas, para que se efectuasse um exame à escrita da sociedade, fruto de desintiligências com o sócios José Fernandes Nogueira e Bernardino Machado de Freitas.
Ultrapassado que foi o litígio, o Café Lisbonense manter-se-ia de portas abertas durante mais alguns anos, até à abertura do troço da Rua de Sá da Bandeira que começa junto da igreja dos Congregados.
O jogo do bilhar
viria a dar origem, em meados do século XX, a cafés de referência na cidade
como sejam os cafés Avenida,
Monumental, Águia d’Ouro, Chave d’Ouro
e, sobretudo, o Palladium.
Todos eles, possuíam
autênticos salões especializados, com dezenas de mesas que se encontravam à disposição
dos praticantes.
O Café Águia D’Ouro abriu portas em
1839.
“Fundado em 27 de janeiro de 1839, o Café Águia d‘Ouro localizava-se na
Praça da Batalha (antigo Largo de Santo Ildefonso). Foi seu proprietário, até
junho de 1904, Luís Ferreira de Carvalho que, nesse ano, o passou para os seus
dois empregados: Alberto Joaquim e Manuel Ventura Vieira de Mesquita.
Este café possuía uma “sala principal no
rés-do-chão e hospedaria no primeiro andar”.
Nesta sala, ao nível da rua, localizava-se o
café com o seu bilhar. No primeiro piso a hospedaria era frequentada,
diariamente, “pela mocidade estúrdia e folgazã que se reunia frequentemente em
jantares e ceias animadíssimas”.
Este café foi, sem dúvida, um dos principais
pontos de encontro de todas as personalidades da literatura, da política e das
artes da cidade do Porto da segunda metade do século XIX e primeira da centúria
de novecentos. Camilo foi seu frequentador habitual, após o encerramento do Café Guichard. Nos anos 30 do século
XX fecha as suas portas, de forma temporária, para renovação, em adequação ao
movimento de remodelações, ocorrido, naquela década, em praticamente todos os
cafés da cidade e reabre a 7 de Fevereiro de 1931 com nova fachada de vidro e
pórtico com o símbolo do estabelecimento (a águia). Terminou os seus dias, de
forma definitiva, por meados do ano de 1978”.
Com a devida vénia a
Nuno Fernando Ferreira Mendes
No Almanaque Portuense,
para 1854/55, já era mencionado o Hotel Águia d’Ouro, juntamente com mais outras
oito unidades hoteleiras.
O café Águia d’Ouro ocupava, juntamente com o restaurante, o piso térreo e, no primeiro andar, estava a hospedaria.
O café Águia d’Ouro ocupava, juntamente com o restaurante, o piso térreo e, no primeiro andar, estava a hospedaria.
Em 21 de Novembro de 1891, o "Jornal do Porto" noticiava uma reabertura do café Águia d'Ouro.
No dealbar do século XX, o prédio seria também ocupado pela sede do Clube Fenianos Portuense.
Em 5 de Novembro de 1898, segundo Germano Silva, “Jornal de Notícias”, 10 Junho de 2018, p. 28, completamente remodelado, reabriria ao público o café da Águia de Ouro.
Café Águia d’Ouro
Entrada do café Águia d’Ouro “O Tripeiro”, série nova, n.º2, ano IX, 1990, p.60
O Café Monumental inaugurado em 10 de Janeiro de 1930 na
Avenida dos Aliados (a Poente) durou poucos anos e, hoje, decorrem obras para
transformar o espaço num hotel de luxo.
“Estabelecimento da tipologia de café-concerto, conhecido pelas suas
grandes dimensões de três pisos: bar na cave, café (com um palco para a
orquestra) ao nível da rua e salão com vinte e quatro bilhares no primeiro
andar. Em questões decorativas, proliferavam os espelhos e «florões que
entornam, do alto, orgias de luz».
Desenvolveu-se, neste estabelecimento, uma
novidade técnica para a época, que foi o secador de mãos, que era anunciado:
«mãos que se limpam sem toalhas». Este novo estabelecimento destacou-se também
pelo facto de possuir um «sistema sonoro com um aparelho Klingsor e altifalantes, que
permitiam a audição da música nos três pisos». Mas a música ao vivo também foi,
aqui, uma constante: duas orquestras de jazz e música clássica animavam o café
durante a tarde e também à noite. Diversos anúncios eram expostos no
estabelecimento e espalhados pela cidade, publicitando os quintetos de música
jazz e clássica que ali atuavam permanentemente.
António Soares Correia, exímio executante de
violino e o quarteto Vieira Pinto (um violoncelista de seu nome Antunes e
pianista D. Olímpia) por diversas vezes proporcionaram espetáculos de música de
salão ao agrado da época”.
Com a devida vénia a
Nuno Fernando Ferreira Mendes
Café Monumental na década
de 30 do século XX
Edifício do Café
Monumental antes da última intervenção
Por outro lado, também pela Avenida dos Aliados (a
Nascente) esteve o Café Avenida que daria origem, mais tarde, ao Café
Vitória.
O Café Palladium abriria em 1940 num edifício com projecto do
arquitecto Marques de Silva inaugurado em 1927, que inicialmente se destinava
aos Grandes Armazéns Nascimento, para a comercialização de mobiliário.
A remodelação interior
para adaptação do espaço a café, foi da autoria do arquitecto Mário Abreu.
Inaugurado em
4/11/1940, tinha café, restaurante, salas de jogo de cartas, bilhares e um
cabaret no 4º andar. Era o maior café do Porto e talvez de Portugal.
Café Palladium
(interior em 1940)
“Em meados de 1935 é inaugurado o Café
Luso que é um espaço situado na Praça Carlos Alberto intimamente ligado à
história da cidade do Porto, tendo sido fundado como Café Luso-Africano veio a
adoptar a designação Luso Café e assim ficou conhecido durante as décadas
seguintes, sendo um ponto de paragem obrigatória para Portuenses de todas as
classes e extractos sociais bem como várias personalidades ligadas à cultura.
O emblemático Café Luso, veio a ser a sede de
campanha do general Humberto Delgado e a 14 de Maio de 1958 é aí que, no seu
discurso, exclama: "O meu coração ficará no Porto!" Foi a maior
enchente de pessoas jamais vista nesta praça. Em 1980 acolhe uma conversa
rotineira entre Mário Dorminsky, Beatriz Pacheco Pereira e o pintor José Manuel
Pereira. Os dois primeiros, já entusiasmados com o cinema, queriam mostrar
filmes e o pintor queria, naturalmente, mostrar quadros. Conversa puxa
conversa, senta-se mais uma pessoa na mesa, o actor António Reis, e surge,
então, a ideia de fazer um festival de cinema fantástico e assim nasce o
Fantasporto. Encerrado durante dez anos, reabre remodelado em 2010.
“A partir do primeiro quartel do século XX, o
Porto assumiu, decididamente, uma das suas mais requintadas tradições, através
da construção de cafés, desenhados e ornamentados por arquitetos, escultores e
pintores, que imprimiram aos lugares da sua implantação (…) a marca de bom
gosto (…)”. De facto, foi, nesta época, que se construíram alguns dos mais
notáveis cafés portuenses, que tinham como principais características, as suas
qualidades estéticas de muito bom gosto artístico, teorizadas pelas vanguardas
que se faziam sentir naquele período, com especial relevo para os movimentos Arte Nova e Arte Deco.
De facto, foi, nesta época, que se
construíram alguns dos mais notáveis cafés portuenses, que tinham como
principais características, as suas qualidades estéticas de muito bom gosto
artístico, teorizadas pelas vanguardas que se faziam sentir naquele período,
com especial relevo para os movimentos Arte
Nova e Arte Deco.
Durante este período, dois estabelecimentos
se notabilizaram como “as duas grandes instituições de referência neste mundo
do convívio e da sociabilidade dos cafés”. Foram eles o Café A Brasileira e o Café Majestic”.
Com a devida vénia a
Nuno Fernando Ferreira Mendes
Pedido de construção,
em Junho de 1927, de prédio que viria a ser ocupado pelo Café Luso, que começou
por ser, o Café Luso-Africano – Fonte: AHMP
Café Luso (actual)
“”A Brasileira” foi fundada por
Adriano Teles que, ainda jovem decidiu tentar a sua sorte emigrando para o
Brasil. Lá, dedicou-se ao negócio do café, com o que enriqueceu nos finais do
séc. XIX.
De regresso ao Porto, montou uma torrefação e
fundou "A Brasileira", inaugurada e 4 de maio de 1903, para servir
café à chávena. Não havia na cidade, por essa altura, o hábito de tomar café em
estabelecimentos públicos. Adriano Teles para promover o seu produto ofereceu,
durante os primeiros treze anos de "A Brasileira", o café à chávena
de graça no seu estabelecimento a quem comprasse um saquinho de grãos de café”.
In Wikipédia
Com uma visão
avançada Adriano Teles, que tinha como sócios, Félix de Melo e Cândido Alves,
abre lojas em Lisboa a 4 de Novembro de 1905 e em Coimbra haveria de fazê-lo em
1928 e divulga por todo o lado o slogan: “O
melhor café é o da Brasileira”.
“A Brasileira” de Braga
seria aberta em regime de “franchising” e seriam abertas, ainda, “Brasileiras”
em Aveiro e Sevilha.
Entretanto “A
Brasileira” sofre obras de ampliação e de remodelação em 1916 de acordo com
projecto do arquitecto Francisco de Oliveira Ferreira (1884 - 1957) passando a
ter uma magnífica fachada e um pára-sol de ferro e vidro e um interior no qual
sobressaem os cristais, o mobiliário com os couros gravados e os mármores.
Fachada da
Brasileira primitiva antes de 1916
Interior da Brasileira em 1903
Brasileira depois de
1916 - Ed. Aurélio da Paz dos Reis
Na foto acima vê-se
o barracão provisório em madeira para venda, enquanto decorriam as obras em
1916. Já se observa o alpendre envidraçado.
No toldo da direita
a Casa Lima de comércio de malas e carteiras, que teve existência desde 1918, nas
mãos da mesma família.
Interior do barracão
em madeira – Fonte: restosdecoleccao.blogspot
Na foto acima está
sentado Adriano Teles, e de pé, ao balcão, o seu sócio Félix de Melo.
Interior da Brasileira
após as obras de 1916
Em 2013 o café “A
Brasileira” encerra e todo o edifício é fechado para obras.
Desde o ano de 2016,
o edifício onde se localizava este quase centenário café, foi alvo de uma
intervenção de fundo para instalação de um hotel e, ainda, de ressuscitar na
medida do possível, uma nova "Brasileira".
Entrada principal do
antigo café “A Brasileira”
A 23 de Março de
2018 o edifício onde esteve o café “A Brasileira”, após importantes obras de
recuperação a cargo dos arquitectos António Ginestal Machado e Maria Ginestal, fica de novo ao serviço da
cidade.
Um novo café “A
Brasileira” com a traça do que encantou gerações de portugueses e visitantes
estrangeiros abre no mesmo espaço, passando os pisos superiores a albergar um
hotel de luxo, resultante de um acordo do grupo Pestana com um investidor.
Este investidor, que
tornaria tudo isto possível, foi o conhecido ex-futebolista do Futebol Clube do
Porto, Sporting C.P. e F.C. Penafiel, bem como ex-treinador e ex-seleccionador
de futebol, António Oliveira.
O hotel tem 90
quartos distribuídos por seis pisos temáticos, relacionados com as especiarias
importadas nos séculos XV e XVI durante a expansão marítima portuguesa,
nomeadamente café, canela, chá, chocolate, anis e pimenta rosa.
Integrado no café e
hotel existe, ainda, em complemento, um restaurante com capacidade "para mais de uma centena de pessoas,
que se manteve fiel ao desenho original do reputado arquitecto Januário
Godinho".
Desenho integrante
de projecto do edifício do novo café “A Brasileira” e de Hotel do Grupo Pestana
Mural recuperado do
antigo café “A Brasileira” – Outros tempos
Aspecto do novo café
“A Brasileira” – Ed. “Rádio Portuense”
Pormenor do
mobiliário do novo café “A Brasileira”
Em questões
estéticas, nos anos da República, O Majestic na Rua de Santa Catarina, era um
símbolo do que de melhor se desenhava na cidade do Porto.
O Café Majestic foi projectado pelo arquitecto José Pinto de Oliveira.
Atravessou o período
da ditadura como local de encontro de uma panóplia diversificada de gente que
povoava a baixa portuense e que ia dos trabalhadores do comércio às
personalidades das Belas-Artes, passando por intelectuais de tendências
variadas. Por volta dos anos 20 e 30, intelectuais como Leonardo Coimbra,
Teixeira de Pascoaes e António Nobre, fizeram deste café o seu local de encontro
habitual. Uns anos mais tarde, também por lá passava José Régio.
Fruto, em 1921, da associação de alguns comerciantes numa sociedade por quotas, estava para se chamar Café Elite, mas acabaria por ficar, desde da sua inauguração, em 2 de Dezembro de 1922, com o nome que agora ostenta, de Café Majestic. Hoje, tem o estatuto "de interesse público".
Entrada do Café Majestic – In Illustração Portugueza, 10
Março 1923
Interior do Café Majestic – In Illustração Portugueza, 10
Março 1923
Café Majestic actualmente - Ed. J. Portojo
Jardim do Café Majestic - Ed. J. portojo
Em 1925, pela mão do arquitecto João Queiroz, o
pátio da foto acima, é inaugurado como um Jardim de Inverno.
Café Majestic e a entrada pela Rua Passos Manuel para o pátio
Como se vê na foto acima, foi aberta uma janela no muro do
pátio que dá para a Rua de Passos Manuel, em 1925, por onde se passou a vender
tabaco e rapé, explorada pela Tinoco & Irmãos, a partir de uma pequena
cabine construída para o efeito, como tabacaria.
Em 1927, ainda sob a alçada da Sociedade Majestic Café, era
inaugurado o Pavillon Majestic, uma cervejaria amovível, localizada em frente à
Rua do Crasto, onde mais tarde esteve o Bar do Molhe e onde, hoje, se
encontra a Pizza Hut.
Em 1934, após obras de remodelação o Café Majestic, surgiria
com uma cervejaria no seu terraço ao ar livre onde era servido o afamado “Bife
à Majestic”.
Publicidade ao Café Majestic em 15 Julho 1934 - In Revista
Ultramar, Fonte: “restosdecoleccao.blogspot.pt”
Na entrada dos anos 60, do século XX, o café entra em declínio
e em 1983 é decretado “Imóvel de interesse Publico” e nesse ano é comprada por
Agostinho Barrias.
Em 1992, o Majestic é encerrado para obras de restauro da
responsabilidade da arquitecta Teresa Mano Mendes Pacheco, abrindo com novos
ares em 1994, apresentando o mobiliário original.
Na sua cave, outora salão de bilhares, passou a ser local de
encontros de cultura com piano e bar de apoio.
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