“Tudo começaria com a morte de D. João VI, em
Março de 1826 foi criado um conselho de Regência a que presidia a Infanta
Isabel Maria.
D. Pedro IV que havia enviado do Brasil a
carta constitucional que Saldanha havia feito jurar era o natural herdeiro do
trono, mas viria a abdicar a favor da sua filha Maria da Glória. Entretanto
conhecidas as pretensões de seu irmão, D. Miguel, consertou-se o casamento
deste com a sua sobrinha e ele seria nomeado lugar-tenente de D. Pedro para reger
o reino em conformidade com a Carta que D. Miguel, ainda exilado em Viena tinha
jurado.
Em Fevereiro de 1828 D. Miguel volta para
Portugal e reafirma fidelidade ao rei e à Carta, mas pouco tempo depois
dissolveu a Câmara dos Deputados.
A 7 de junho D. Miguel prestou juramento como
rei.
A revolta principiou em Aveiro, estendeu-se
ao Porto e a muitas outras cidades e durante 45 dias a cidade manteve-se
independente do governo usurpador de Lisboa.
Entretanto alguns refugiados afectos à causa
de D. Pedro, como o Saldanha, o Palmela e o Vila-Flor, que estavam em
Inglaterra, alugaram um barco de nome Belfast e rumaram ao País, mais
propriamente ao Porto.
(...) os revoltosos haviam
de ser derrotados e os que tinham vindo no Belfast fizeram a viagem em sentido
inverso.
Conta a história que o avô de Eça de Queiroz,
Joaquim José de Queiroz, só apanhou o navio em Vigo, pois fez questão de
acompanhar até à Galiza os soldados do seu destacamento que tinham saído
derrotados.
Outros dignamente ficaram e foram presos e
executados em 1829.
Seguem-se anos de fortíssima perseguição aos
liberais e aos seus ideais. Muitos fogem para o exílio, outros tentam
resistir, pagando com a vida tal veleidade.
Procurando restituir o trono a sua filha e
devolver a Portugal o regime liberal, D. Pedro abdica pela segunda vez na
vida de uma coroa, desta feita a brasileira, e inicia um processo que culminará
na organização de um exército, composto por imensos liberais
exilados, por voluntários fugidos do país, e por experientes mercenários.
É essa expedição militar, o “Exército Libertador”, que zarpa de Ponta Delgada a
27 de Junho de 1832. O desembarque destes “7.500 Bravos” processar-se-á na
Praia da Arnosa de Pampelido a 8 de Julho. Designado até aí por Praia dos
Ladrões, este local será rebaptizado oito anos depois como Praia da
Memória, em resultado do obelisco à memória do Desembarque que então (1 de
Dezembro de 1840) começou aí a ser erguido”.
Cortesia de Joel
Cleto
Usurpado o trono de Portugal, D. Miguel em 13 Março 1928
instala o regime absolutista, após ter dissolvido as Cortes Constitucionais e proíbe o Hino da Carta.
O governo do, agora, rei usurpador foi reconhecido pelos Estados Pontifícios, Espanha e Estados Unidos da América. Começava, então, um período negro da nossa história.
O Porto sempre na vanguarda da liberdade não podia deixar
que a situação se mantivesse.
António Bernardo de Brito e Cunha vai, então, encabeçar uma
revolta, que irá ser planeada na sua Casa do Ribeirinho, em Matosinhos.
A chamada Revolta Liberal será desencadeada, em Aveiro, em 16 de Maio de 1828, e estender-se-á ao Porto, com o
desembarque de um grupo de exilados liberais vindos de Inglaterra a bordo do
navio Belfast, daí o nome pelo qual passou à história a sublevação militar
- Belfastada.
Esta ofensiva liberal não teve êxito, pelo que os liberais
foram obrigados a refugiar-se no navio e partir de novo para Inglaterra.
"O nome Belfastada designa um dos movimentos revolucionários
portuenses contra D. Miguel, ocorridos após a restauração do poder absolutista,
período marcado por uma grande instabilidade.
A revolta do Porto chegou ao conhecimento dos políticos
liberais exilados em Londres. O marquês de Palmela, ao ser informado de que o
seu rival político, o general Saldanha, estava decidido a viajar até ao Porto
para assumir a liderança dos revoltosos, providenciou a sua partida imediata
com o financiamento de um brasileiro de nome Itabaiana.
Para viajar até à Cidade Invicta fretou um barco a vapor
chamado "Belfast", pela quantia de 47 libras diárias, embarcou em
Plymouth, a 16 de junho de 1828, na companhia dos seus companheiros
aristocratas liberais.
Uma vez no Porto o marquês de Palmela entrou na Junta
Revolucionária, e com ele os seus correlegionários da fação liberal mais
moderada. O sucesso desta revolta foi seriamente comprometido pelas desavenças
entre as duas fações liberais: a ala mais moderada de Palmela e a ala mais
radical de Saldanha. Assim iria ser durante várias décadas.
O exército absolutista conseguiu chegar ao núcleo da revolta
devido à inoperância de Saldanha. Desse modo, as tropas comandadas pelos
generais Póvoas, Gaspar Teixeira e Álvaro da Costa não foram travadas pelos
liberais.
A 30 de junho, Palmela passou em revista as tropas numa
falsa ostentação de poder, pois de seguida recolheu-se em Santo Ovídio, na
margem de Gaia, numa altura em que era certa a sua derrota. O Presidente da Junta
e marechal de campo estava de tal modo convicto da sua derrota que pedira asilo
ao comandante das tropas britânicas estacionadas no Douro.
Numa reunião extraordinária da Junta, a 2 de julho, foi
decidida a sua dissolução e a retirada das tropas para a Galiza. Nessa noite,
todos voltaram para o Belfast, à exceção de Sá Nogueira, o futuro marquês de Sá
da Bandeira, do brigadeiro Pizarro, e do desembargador Teixeira Queirós. O
vapor partiu no dia seguinte com destino a Inglaterra. Nesse dia, o exército real
entrava na cidade, onde o que restava do exército liberal preparava a retirada
para a Galiza sob as ordens de Sá Nogueira".
Fonte: Infopédia - Porto Editora
Na sequência destes acontecimentos, António Bernardo Brito e
Cunha foi preso nos calabouços do Castelo da Foz, com o rótulo de agitador
político altamente perigoso e, mais tarde, transitado para as celas da Cadeia
da Relação no Porto e condenado à forca a 09/04/1829, pela Alçada, que reuniu
em sessão plena e secreta, entre as 10.00 e as 22.00 horas, desse dia, tendo as
suas sentenças ficado secretas até 04/05/1829.
Morreu enforcado na manhã de 07/05/1829, na Praça Nova,
actual Praça da Liberdade, no Porto, juntamente com outros nove Mártires da
Liberdade condenados, também, à forca, a 09/04/1829.
Os seus corpos ficariam expostos no cadafalso durante meses
naquela praça.
António Bernardo de Brito e Cunha foi o Senhor da casa,
capela e quinta do Ribeirinho, em Matosinhos e da casa das Taipas, no Porto,
15º administrador do vínculo de Nossa Senhora da Esperança e Morgado da Cunha,
Cavaleiro fidalgo da Casa Real, Cavaleiro professo nas Ordens de Cristo e de
Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, Contador da Real Fazenda da comarca
do Porto e Deputado da Companhia Geral da Agricultura dos Vinhos do Alto Douro.
Entretanto, o ódio das gentes do Porto, contra o regime, ia
crescendo.
“(...) Ainda em 1831, o estadista José
Bonifácio obrigou o
imperador Dom Pedro I, acusado de excesso de
autoritarismo, a abdicar da Coroa
do Brasil no filho Dom Pedro II do Brasil.
Vendo-se obrigado a viajar para a Europa, instala-se entre Paris e
Londres, onde os novos regimes saídos da Revolução de 1830 lhe podiam ser
favoráveis. Em seguida, utilizando
O OURO do Brasil devido a Portugal pelo tratado de paz Luso-Brasileiro
de 1825, reúne um Exército de
Portugueses Emigrados e de Mercenários Estrangeiros, que embarca numa
frota com a finalidade de conquistar uma posição em território português
Continental. Conquistada que fora a fortíssima posição Militar e Naval de
Angra, nos Açores, o Corpo Expedicionário de Dom Pedro parte daí, para
desembarcar no Continente português, o que ocorrerá em 9 de Julho de 1832, a
norte do Porto, na Praia dos Ladrões, com um efectivo de 7500 homens (sendo
2300 Franceses, 2130 Ingleses, 900 Belgas, 500 Polacos, 500 Irlandeses, 370
Escoceses e 900 Portugueses) ”.
D. Pedro avançou com a sua armada em direção
a Vila do Conde, local onde planeara o desembarque.
Na manhã de 8 de julho foi enviado a terra,
para parlamentar com as forças militares aí estacionadas, o major Bernardo de
Sá Nogueira - futuro marquês de Sá da Bandeira. As negociações foram, no
entanto, completamente estéreis, tendo aquele emissário sido recebido com
ameaças de fuzilamento. Frustradas, pois, que foram estas tentativas de
desembarque pacífico, foi decidido efetuá-lo em pé-de-guerra.
Este ocorreu ao princípio da tarde desde as
praias de Mindelo até à Praia dos Ladrões, em Arnosa de Pampelido, no limite
das freguesias de Lavra e Perafita”.
In pt.Wikipédia.org
O desembarque das tropas de D. Pedro IV, nas praias de
Arnosa de Pampolido, foi antecedido de uma outra tentativa feita no Mindelo,
Vila do Conde.
Memorial ao
desembarque falhado, em Vila do Conde
Memorial na Praia da Memória – Ed. MAC
Feito o desembarque das tropas liberais na que, mais tarde,
ficou a ser conhecida por Praia da Memória começa, de imediato, o exército
desembarcado a rumar à cidade do Porto.
“Não encontrando praticamente qualquer tipo de
resistência, as forças liberais avançam muito rapidamente em direcção ao
Porto, depois de passarem por Pedras Rubras e Custóias, onde atravessam o rio
Leça na ponte de D. Goimil.
Nessa mesma noite
acamparão no Largo do Carvalhido
que, por tal motivo, passou a ser designado, por deliberação da
Câmara Municipal do Porto em 1835, por Praça do Exército Libertador.
Por sua vez D. Pedro pernoitaria na casa de
um abastado lavrador em Pedras Rubras e junta-se na manhã seguinte ao seu
exército no Carvalhido.
No dia seguinte,
9 de Julho, prosseguem a sua avançada em direcção à cidade através da
velha estrada que, do Carvalhido, conduzia à Rua de Cedofeita, e que,
desta forma, se passou a denominar Rua 9 de Julho.
Recebido festivamente
pela população, até porque os partidários de D. Miguel, incluindo as
forças militares que lhe eram fiéis, haviam fugido da urbe, o Exército
Libertador entra numa cidade desmilitarizada, com as pontas das suas
baionetas floridas, engalanadas com hortênsias azuis, a cor dos liberais. Mas
tais facilidades não faziam adivinhar o verdadeiro inferno em que
a cidade se transformaria nos longos meses seguintes. Afinal a fuga
precipitada dos absolutistas acabou por funcionar como uma ratoeira. Rapidamente
reorganizadas, as forças militares miguelistas acabariam por conseguir cercar a
cidade no final desse mês de Julho. E se de início o cerco se estabelece a uma
distância razoável do Porto, a verdade é que entre Agosto e Setembro o
bloqueio se torna muito mais apertado e os 7500 bravos, mais a população
do Porto, vêm-se completamente confinados e remetidos aos limites da cidade,
cercados por um exército constituído por 60 mil homens. Vila Nova de Gaia
cai no poder dos absolutistas a 8 de Setembro não obstante os actos
de grande coragem e sacrifício dos liberais, como foi o caso, nesse
dia, no lugar do Alto da Bandeira, do intrépido Bernardo de Sá Nogueira que aí
perde um braço. A sua acção irá valer-lhe a atribuição do título de
Visconde da Bandeira e o seu nome ficará imortalizado numa das mais
famosas ruas do Porto: Sá da Bandeira.
Há, no entanto, um
local de Gaia que, dada a sua grande importância estratégica, os liberais nunca
abandonarão ao longo de todo o Cerco, apesar das contínuas investidas e
bombardeamentos a que foi sujeito: a Serra do Pilar. Tivesse essa elevação
sido tomada pelos absolutistas e, face à facilidade com que daí
bombardeariam o Porto, o desfecho do conflito teria sido
muito provavelmente outro. A resistência liberal neste reduto foi
liderada por um famoso comandante posteriormente homenageado com a
atribuição do seu nome a uma das artérias mais importantes de Vila Nova de
Gaia: a Avenida General Torres.
Na resistência na
Serra do Pilar destacou-se também um grande punhado de aguerridos mercenários.
E é por isso que, ainda hoje, naquela elevação gaiense subsiste a Rua dos Polacos. Os Polacos
referenciados em V. N. de Gaia, não eram oriundos da Polónia, mas, sim,
soldados de grande heroísmo e valentia, por isso designados por semelhança, de
Valentes, a Polacos.
Cercada a cidade, os
absolutistas começam de imediato a promover fortes investidas militares para
retomarem o controlo da cidade. Os ataques repetem-se, mas as tropas
liberais, com a ajuda da população, conseguem travá-los. Foi o que
aconteceu, por exemplo, em Francos, junto à actual estação do metro, local
sintomaticamente designado por Rua
da Travagem.
A 2 de Dezembro tem
lugar, na Areosa, um forte embate entre os dois exércitos, do qual
resultará a morte de um destacado militar liberal cujo nome foi
atribuído ao topo da elevação do Mirante: Largo do Coronel Pacheco.
Por esta altura,
no entanto, e há já várias semanas, a estratégia absolutista passara a
ser outra: bombardear intensamente a cidade, de forma a provocar o maior
número possível de baixas entre os militares, independentemente do número
de vítimas que provocasse entre os civis, ao mesmo tempo que destruía todo
o tipo de estruturas que pudessem ser úteis aos sitiados”.
Cortesia de Joel Cleto
Ponte de D. Goimil
ao fundo da Rua das Carvalhas, em Moreira – Ed. MAC
A ponte medieval de
D. Goimil, onde se fazia o atravessamento do rio Leça, durante o reinado D.
Afonso III (1210-1279), em meados do século XIII, substituiu, possivelmente,
uma outra que aí terá existido ,pertencente à antiga via romana que ligava os
rios Douro e Ave e ficou conhecida como
"via veteris" (estrada velha).
Com efeito, esta
estrada constituíra, na época da ocupação romana, a mais importante ligação
existente entre as localidades do Porto e de Vila do Conde.
Casa onde pernoitou D. Pedro IV, com placa alusiva visível
Placa comemorativa da passagem de D.
Pedro pela casa de Manuel Andrade
Casa onde pernoitou D. Pedro IV
Fachada principal da casa de Manuel Andrade onde pernoitou
D. PedroIV
Aqui se localizava a casa onde pernoitou o rei D. Pedro IV
agora totalmente remodelada – Ed. MAC
Na foto acima está a actual casa, que substitui uma outra,
que pertenceu ao lavrador Manuel José de Andrade, onde dormiu D. Pedro IV, na
noite de 8 para 9 de julho de 1832, sita no lugar de Pedras Rubras, na Rua de
Pedras Rubras nº 88.
Praça do Carvalhido, em 1930
Sobre o Cerco do Porto, o professor e escritor Hélder
Pacheco, em texto publicado no Jornal de Notícias, diz:
"O período mais
empolgante da história do Porto é, para mim, o do Cerco que, entre 22 de Agosto
de 1832 e 18 de Agosto de 1833, lhe foi imposto pelo exército Absolutista.
Defendido por um corpo de 8 000 homens do exército liberal, o burgo foi sitiado
por cerca de 80.000 soldados, providos de larga superioridade também de
armamento. A partir de 26 de Julho, em que D. Pedro e o seu Conselho Militar,
perante os insucessos das acções ofensivas, optaram por uma guerra defensiva, a
sorte da cidade estava traçada resistir a todo o custo ("a guerra seria um
cerco; o Porto um baluarte defendido pelas suas íngremes encostas, pelo fosso
natural do rio, ligado ao Mundo pelo cordão umbilical da Foz; um baluarte de
gente perdidamente heróica, no meio de um aluvião de soldados; um ponto, como
uma ilha no vasto pélago do reino inteiro miguelista!", Oliveira Martins).
Meses depois, a situação tornar-se-ia quase desesperada e tudo os portuenses
tiveram de suportar: fome, epidemias (cólera e tifo), deserções de soldados,
bombardeamentos e destruições. (Oliveira Martins: "As noites seguiram
tremendas, com o céu constelado de estrelas errantes portadoras de morte. Havia
tifos e a fome era já tanta que os soldados de Shaw saíam a caçar os cães que
vinham cevar-se nos cadáveres, para os venderem à libra às casas de pasto.
Havia frio sem lenha.")
A defesa da cidade,
delineada por Bernardo Sá Nogueira, assentava num sistema de fortificações - as
"linhas" - constituído por parapeitos, trincheiras e fossos,
guarnecidos por estacadas. As linhas iam, inicialmente, da Quinta da China até
ao Bicalho, passando pelo Padrão de Campanhã, Lomba, Bonfim, Póvoa de Cima,
Aguardente, Monte Pedral, Carvalhido, Bom Sucesso. Ao longo delas, havia
redutos e batarias. Posteriormente, seriam ampliadas do Carvalhido por Francos,
Van Zeller e Pasteleiro até à Senhora da Luz.
Fora das linhas, nuns
sítios próximos, noutros afastadas, os miguelistas construíram também batarias
e fortes. Alguns destacavam-se pela sua importância, entre os quais o da
Ervilha. Construído em 1832, aproveitando talvez a elevação (com 4x6 metros) já
utilizada como Linha de Defesa do Porto, em 1809, contra os franceses, dominava
a vizinhança e tinha ligação visual com elevações semelhantes, cuja utilização
militar concedia relativo domínio sobre as forças inimigas postadas nas
proximidades. Em cima, existiam duas pequenas grutas servindo de paiolins ou de
abrigos das guarnições dos canhões ali postados.
O Espaldão ou Forte da
Ervilha, juntamente com os do Monte do Crasto e de Serralves, integrava um
conjunto fortemente organizado das linhas sitiantes. Eram obras bem concebidas
e executadas, rodeadas por muros de sebes e estevas, reforçados com parapeitos
à prova de bala. No interior, havia instalações para as guarnições. Em
24.1.1833, o forte foi atacado e temporariamente ocupado por uma força liberal,
na tentativa de o neutralizar. O que resta do Forte da Ervilha constitui a
única posição desta área fortificada ainda existente e único vestígio material
da saga heróica das Linhas do Porto e testemunho essencial à memória histórica
da cidade”.
Planta (1834) militar da cidade do Porto, durante o cerco,
da autoria do Coronel Moreira
Devido à sua localização, um dos locais que foram alvo de
disputa entre liberais e absolutistas, foi a Quinta do Covelo, que esteve na
posse, alternadamente, dos dois contendores.
“A casa e a capela, um
belíssimo conjunto da arquitectura setecentista, foram incendiadas e
destruídas, em 16 de Setembro de 1832, na sequência de combates entre liberais
e miguelistas, ocorridos durante o Cerco do Porto. Logo a seguir à entrada no
Porto do Exército Liberal, a 9 de Julho de 1832, os miguelistas trataram de
montar, a partir do que, então, eram considerados os arrabaldes da cidade, um
apertado cerco aos sitiados. Nesse sentido, criaram posições ofensivas em
sítios de onde mais facilmente, através das suas peças de artilharia, lhes
fosse possível atingir o centro da cidade e, ao mesmo tempo, impedir o
reabastecimento das tropas liberais e dos próprios civis.
O alto do Covelo, a
que popularmente se chamava "o
monte", foi considerado pelas tropas absolutistas como o sítio ideal
para montar a artilharia que havia de metralhar o centro do Porto e vigiar as
movimentações de civis no sentido de impedir, por exemplo, que os lavradores de
Paranhos introduzissem na cidade mantimentos e outros víveres através da
estrada da Cruz das Regateiras. E com estes propósitos criaram uma autêntica
fortificação na Quinta do Covelo. Só que os liberais não ficaram quedos. Consta
que por iniciativa do próprio D. Pedro IV as tropas constitucionais resolveram,
em 16 de Setembro de 1832, desalojar os miguelistas do reduto do Covelo, a fim
de ficarem com o controlo daquela zona, de grande importância estratégica para
os combates que estavam para vir. Os objectivos dos liberais foram conseguidos.
Uma força de "mais de 1400 baionetas", além de terem escorraçado os
miguelistas, a quem causaram inúmeras baixas, ainda arrasaram fortificações e
destruíram baterias e canhoneiras. Mas por muito pouco tempo os soldados de D.
Pedro lograram manter as posições que haviam conquistado. Os absolutistas
contra atacaram, em Março de 1833, e conseguiram, depois de renhidos combates,
com enormes perdas para as duas partes, retomar as posições que pouco antes
haviam perdido. De imediato iniciaram a construção de "defesas do
monte" erguendo ao redor estacadas ou paliçadas, com o que pretendiam
ocultar os trabalhos de fortificação que andavam a fazer. E os liberais? Que
fizeram? Voltaram ao ataque. Numa das digressões que diariamente fazia aos
locais onde o perigo mais se fazia sentir, D. Pedro passou pela Aguardente
(actual Praça do Marquês de Pombal) e apercebeu-se do perigo que constituía
para a sua causa o facto de os miguelistas terem retomado o Covelo e providenciou
para aquela posição voltasse a ser ocupada pelos liberais. Isso aconteceu a 9
de Abril de 1833. E a delicada e arriscada tarefa foi confiada ao coronel José
Joaquim Pacheco que, mais tarde, viria a morrer, em combate, na Areosa. A
cidade, agradecida, deu o seu nome à antiga Praça do Mirante que é hoje a Praça do Coronel Pacheco”.
Com a devida vénia a Germano Silva
Uma crónica da época refere uma segunda tomada do Covelo
pelos liberais, da seguinte forma:
“A 7 de Abril
descobriu-se a longa estacada feita pelos miguelistas desde as primeiras casas
de Paranhos até às eiras do Covelo. Queriam fortificar-se ali. Não havia tempo
a perder. Era preciso desalojá-los. A artilharia dos liberais começou a
responder desde as primeiras horas da manhã do dia 9 e durou o fogo até às seis
da tarde. Cruzaram-se os fogos das
baterias da Glória (Lapa), do Pico das Medalhas (Monte Pedral), do Sério (alto
da Lapa), da Aguardente (Marquês de Pombal) e de S. Brás. Uma força de mil
homens saiu fora das linhas para tomar de assalto o monte do Covelo. Mas no dia
seguinte (10 de Abril) os absolutistas voltaram com o intuito de retomarem as
posições perdidas e onde os liberais haviam levantado um reduto em menos de
oito horas. Estavam lá dentro apenas 200 soldados. Foram atacados por mais de
2000 do inimigo. Foram momentos decisivos. Duzentos homens livres conseguiram
pôr em fuga 2000 do inimigo.”
Fonte: “portoarc.blogspot.pt”
Um outro local de grande importância foi a Serra do Pilar que
os Liberais defenderam até à exaustão.
Serra do Pilar durante o Cerco do Porto
Na Quinta da Fraga, na capela de Nosso Senhor do Carvalhinho,
funcionou, durante o Cerco do Porto (1832/1834), o quartel da Marinha de D.
Pedro IV.
A esquadra liberal estava fundeada na marginal do rio Douro
num ancoradouro a montante da Calçada da Corticeira, protegida pela artilharia
dos liberais, instalada na serra do Pilar.
Quando era necessário abastecer o reduto da serra do Pilar
de munições, de mantimentos e de armas, peças de artilharia incluídas, os
liberais faziam-no através de barcos que estabeleciam a ligação com a serra
desde o local onde estava ancorada a armada liberal até ao cimo da serra,
através da capela do Senhor de Além.
“Devido à sua
privilegiada posição, no cimo do morro chamado, antigamente, da Meijoeira ou de
S. Nicolau, as antigas instalações monásticas foram consideradas, logo nos
primeiros dias do Cerco do Porto (1832/1833), de capital importância para a
defesa da cidade.
Por esse motivo, as
tropas liberais de D. Pedro IV ocuparam aquele espaço onde montaram um reduto
ou baluarte, impedindo que os miguelistas ali se instalassem e de lá,
facilmente, bombardeassem a cidade. A conquista da Serra pelos liberais e a sua
permanência naquele posto, durante o período do Cerco não foi tarefa fácil,
como veremos mais adiante, mas foi determinante para a vitória da causa de D.
Pedro IV.
Cumpriu-se, aliás, o
que já se sabia e que fazia parte de uma antiga tradição popular, que os militares
não rejeitavam, quando se falava da defesa do Porto: "venceu sempre aquele
que com a Serra contou e que dela se soube servir com inteligência e
tenacidade". Assim aconteceu sempre, ao longo dos tempos. A primeira
referência histórica à ocupação da Serra do Pilar como estratégia de defesa
militar remonta ao século X, ao tempo em que D. Sancho I, rei de Leão, desceu
pela Galiza para se dirigir a Santiago de Compostela e submeter à sua soberania
o bispo rebelde D. Sesinando, que pretendia separar a Galiza do reino de Leão.
O prelado contava com
a colaboração dos condes Gonçalo Mendes, que governava o Porto, e Gonçalo
Moniz, que governava o território compreendido entre o rio Douro e o Mondego.
Depois de castigar, severamente, o bispo recalcitrante, D. Sancho I avançou
sobre o Porto com o intuito de submeter Gonçalo Mendes e Gonçalo Moniz, à sua
jurisdição. O que aconteceu com o primeiro. Mas não com o segundo.
Prudentemente, Gonçalo
Moniz, "com o seu numeroso exército, foi fortificar-se no alto da Meijoeira,
onde resistiu ao todo-poderoso D. Sancho I". Aqui, temos como a Serra do
Pilar, antes ainda de ter esta denominação, já servia como ponto estratégico de
defesa da cidade do Porto.
Vieram depois as
invasões francesas, e a Serra do Pilar voltou a ser determinante para a
reconquista da cidade do Porto, que os soldados de Napoleão, durante a segunda
invasão, haviam ocupado, nos finais de março de 1809.
Com efeito, no dia 11
de maio seguinte, o general inglês Wellesley, à frente do exército anglo-luso,
contemplou do alto da Serra do Pilar o panorama da cidade ocupada e concebeu,
logo ali, um audacioso plano para o desalojamento dos franceses do Porto. O que
veio a acontecer com a debandada das tropas de Soult pela estrada de Valongo.
Seguiu-se a guerra civil
e o Cerco, posto pelos miguelistas à cidade do Porto que durou de 1832 a 1833.
Como é geralmente sabido, D. Pedro IV entrou no Porto, à frente do seu
exército, no dia 9 de julho de 1832. O acolhimento da cidade foi caloroso. O
"rei soldado", como ficaria conhecido aquele soberano, chegara com o
propósito de acabar com o regime absolutista, imposto por D. Miguel, e
restituir o liberalismo ao país. Mas a tarefa apresentou-se difícil, com os
miguelistas a montar o cerco à cidade.
De imediato, os
estrategas militares de D. Pedro IV constataram que era fundamental para a
defesa do Porto a ocupação da Serra do Pilar, dominada pelo monumental edifício
do mosteiro dos frades regrantes de Santo Agostinho que, entretanto, haviam
abandonado o convento.
Logo no dia seguinte à
ocupação do Porto, os liberais atravessaram o rio Douro e foram ocupar a Serra
do Pilar, que fortificaram, de imediato, com a colaboração da população local.
Nos meses que se
seguiram, por várias vezes os miguelistas tentaram, sem resultado, desalojar os
liberais do seu reduto da Serra. Houve combates terríveis, que os soldados de
D. Pedro enfrentaram heroicamente. Na defesa da Serra distinguiu-se,
nomeadamente, o brigadeiro e depois general Torres, várias vezes distinguido
por D. Pedro IV com as mais altas condecorações militares.
Em 1833, a
"Crónica Constitucional do Porto", único jornal que se publicava à
época, referindo-se ao baluarte defensivo da Serra do Pilar, "tantas vezes
roto mas sempre impenetrável" na sua qualidade de parapeito de defesa do
Porto, classificou-a como "templo da glória da liberdade"”.
Com a devida vénia a Germano Silva
Em 29 de Setembro de 1832, a queda da cidade do Porto para
as mãos absolutistas esteve por um fio. Porém o trabalho das baterias, o
comportamento estoico dos fortes e dos redutos que guarneciam a linha defensiva
do Porto, sob o comando de D. Pedro, cumpriram plenamente pondo à prova,
também, a capacidade ofensiva do exército miguelista, que se revelou ineficaz,
perante a determinação do exército liberal.
Nesta batalha destacaram-se algumas das baterias liberais,
como as do Cativo, a do Fojo, assim como as baterias do Bonfim e da Lomba. Esta
última ficou assinalada pelos cronistas da época, como o Marquês de Fronteira
que, nas suas “Memórias”, relata:
“O inimigo, apesar da
carga de cavalaria conservava-se ainda na posse da bateria da Lomba, que tinha
tomado no começo do combate e onde os bravos académicos [Batalhão Académico,
composto por estudantes da Universidade de Coimbra] que guarneciam as peças
preferiram a morte a retirar-se. O bacharel Negrão era o digno comandante: vi-o
morto no centro da bateria. Os dois bacharéis e irmãos Luiz e José Serrão
também os vi mortos, abraçados um ao outro junto de uma peça, e o bacharel
Guilherme António de Carvalho também morto ao lado d’outro.”
Marquês da Fronteira
“A construção das
linhas de defesa da cidade criaram, desde logo, certas limitações à circulação
dos portuenses e os confrontos entre absolutistas e liberais foram deixando a
cidade completamente arruinada. As explosões e os tiros aterrorizavam mulheres
e crianças e os bombardeamentos constantes, aliados à fome e às epidemias (o
tifo e a colera morbus), foram factores calamitosos para os habitantes do
Porto. A doença começou a atacar a cidade, primeiro o tifo que matava em 24
horas, não havendo cura para esta doença infecciosa. Mas, foi a collera morbus,
provocada pela falta de higiene e pelas águas conspurcadas, que mais devastou a
população e, também, muitos animais. Segundo consta, a collera morbus entrou na
cidade, após o desembarque do marechal Solignac que, acompanhado por alguns
soldados belgas, veio colocar-se ao lado de D. Pedro.
Com o decorrer da
contenda, os quatro principais hospitais existentes, no Porto, em 1832 – o da
Misericórdia ou de Santo António, o da Ordem Terceira do Carmo, o da Ordem de
S. Francisco e o da Caridade (Ordem do Terço), começaram a ficar sobrelotados
e, as fracas condições sanitárias de cada um deles, criaram um cenário
catastrófico, com um número exagerado de feridos e de doentes que de tudo
careciam para a sua salvação. Por isso se gerou uma onda se solidariedade,
através de donativos, envio de roupas, lençóis, panos para curativos, fios,
panos de linho, travesseiros, candeeiros, garfos, fronhas, camisas, toalhas,
colchões, cântaros, ligaduras, cobertores, mantas, malgas, aparadeiras,
ataduras para sangrias novas, dinheiro, sapatos, entre outros artigos…À falta
de carne, os doentes eram alimentados a sopa de bacalhau, temperada com açúcar
e aguardente. Os colchões (enxergões), feitos de palha, eram desmanchados para
alimentar os cavalos.
A mendicidade e a fome
grassavam por toda a cidade e os próprios militares viam-se em condições
deploráveis, não só pela falta de fardamentos adequados, como pela fraca
alimentação, pois faltava o pão, chegando-se ao ponto de um pão ser dividido
por quatro e, muitas vezes, nem pão tinham e só lhes eram dadas batatas ou
arroz, pois faltava a carne e outros géneros, cuja entrada na cidade era muito
condicionada, dado que os mantimentos só podiam chegar, vindos por mar mas, a
descarga dos navios era perigosa, não só pelo receio devido à presença da forte
esquadra de D. Miguel, como pela perigosa força do mar, durante um inverno
rigoroso.
A cidade padecia da
escassez de pão e carne, bem como de carvão e lenha para cozinharem e se
aquecerem. As lojas que vendiam pão e farinhas, vinho, carnes e peixe, depressa
ficavam vazias e os preços dos produtos subiam exageradamente. Começaram a
surgir algumas iniciativas de solidariedade como a “Sopa Económica” (Fevereiro de
1833), para distribuição aos mais pobres. Também o Convento das Carmelitas
distribuía uma sopa económica que, diariamente chegava a mais de oito mil
pobres”.
Cortesia de Maximina Girão Ribeiro
Rua do Barredo, à
noite, durante o Cerco do Porto
Estando a cidade
sitiada, com falta de tudo, o pouco abastecimento entrava pela estrada da Cruz
das Regateiras e algum outro por mar.
Neste último
aspecto, uma pequena enseada onde mais tarde seria levantado o molhe de
Carreiros, na Foz, foi crucial.
A referida enseada
era delimitada por uns rochedos, de um lado e de outro, e usada para fazer
descargas de bens, passageiros e correio, por intermédio de umas barcaças
(pequenos barcos), que se serviam em navios estacionados ao largo, quando era
impossível fazer a entrada na barra do rio Douro.
Dessa forma foi
muito útil aquando do Cerco do Porto.
Segundo testemunhos
da época o local foi utilizado, no mês de Janeiro de 1833, para as tropas
liberais sitiadas no Porto continuarem a receber as provisões que lhes chegavam
a bordo de navios. O desembarque era feito de noite, e abastecia a cidade dos
bens de primeira necessidade.
Eram em grande
número os barcos ancorados na costa com mercadorias, soldados e cavalos. O
exército liberal foi reforçado com soldados chegados dos Açores, Inglaterra,
França e Bélgica. E também de cavalos ingleses e franceses. Para execução
destas tarefas era essencial o domínio do Monte da Luz que, de facto, estava na
mão dos liberais e donde se podia controlar o que se passava em redor.
Contudo, a cidade
continuava estrangulada e, por isso, em 24 de Julho de 1833, as tropas liberais
comandadas pelo Duque da Terceira e que tinham desembarcado no Algarve e atravessado
o Alentejo, entram em Lisboa, sem dispararem um tiro, já que as tropas
miguelistas tinham abandonado a cidade de madrugada. A capital do país é
libertada das tropas absolutistas, antecipando o que iria acontecer no ano
seguinte (1834), a vitória definitiva do Liberalismo em Portugal e o exílio de
D. Miguel.
No final do
conflito, a cidade estava arruinada, quer economicamente, quer sob o ponto de
vista humano – o exército liberal contava, entre mortos, feridos e
prisioneiros, cerca de 3 478 perdas, enquanto o exército absolutista registava
perdas na ordem dos 23 004 homens. A população da cidade teve, também, uma
quebra substancial.
Após a obtenção da
paz na Convenção de Évoramonte, em 26 de Maio de 1834, D. Pedro IV e a sua
filha, a rainha D. Maria II, visitaram a cidade do Porto, em finais de Julho de
1834.
A comitiva real
ficou alojada no Palácio das Carrancas, à Torre da Marca, residência que já
tinha servido a D. Pedro durante o cerco, tendo visitado algumas instituições
hospitalares, participado em bailes preparados em sua honra, assistido a
espectáculos no Teatro Nacional de S. João e durante toda a estadia, recebendo
sempre o carinho dos portuenses.
Para além, daquelas
manifestações de simpatia, os reais visitantes participaram em cerimónias que
recriaram algumas das batalhas acontecidas aquando do cerco, tendo, para o
efeito, visitado diversas linhas que ficaram para a posteridade pelas acções
importantes e decisivas que nelas se desenvolveram, aquando do cerco à cidade.
A 4 de Agosto, perante
os olhares de quem assistia foi encenada uma batalha, desta vez, para dar uma
imagem dos ataques que tinham tido lugar na Serra do Pilar, e da valorosa
defesa que faziam os defensores daquele ponto.
A recriação na Foz,
no Crasto e nas baterias imediatas, fizeram recordar a forte oposição a que os
liberais se sujeitavam, aquando dos desembarques das munições de guerra e dos
mantimentos.
Em diversas
ocasiões, D. Pedro IV proferiu algumas palavras alusivas às situações antes
vividas, tentando demostrar as privações e apuros em que se viram as tropas
sitiadas.
Num dos discursos
disse:
“(...)
Eu não quis por mais tempo demorar a minha vinda a esta muito nobre e
muito leal cidade, em companhia da vossa rainha, com o fim de me congratular
pessoalmente convosco, pela terminação honrosa da guerra civil, cumprindo a
promessa que vos fiz no dia 26 de julho do ano próximo passado, imediato aquele
em que o vencedor de Argel, experimentou o primeiro revés em Portugal. Entre
vós tendes a vossa rainha, que vos agradece tantos esforços e sacrifícios que
por ela tendes feito, e vos louva, pela heroicidade que mostrásteis, a qual poderá vir a ser
imitada mas nunca excedida. Eu me felicito a mim mesmo por me ver no teatro da
minha glória, no meio dos meus amigos portuenses, daqueles a quem devo pelos
auxílios que me prestaram durante o memorável sítio, o nome que adquiri, e que,
honrado, deixarei em herança a meus filhos.”
E, parecendo que
tudo correria no melhor dos mundos, na prática, não era bem assim.
Terminado o
conflito, a Câmara enviaria à rainha uma conta corrente e documentação
respectiva, justificativa e demonstrativa do quanto a cidade era credora, «quantia esta procedida de empréstimos
gratuitos com que concorreu em dinheiro, e em géneros, para as urgências do
Estado na época do Cerco” e que importava em 11.048$300 réis.
A dívida que o
Estado tinha para com a cidade, no rescaldo da guerra e do cerco, respeitando
directamente em moeda ou ao ressarcimento pelos danos infligidos em muitos
edifícios, propriedade privada ou pública, seria reclamada, mas que se saiba,
nunca satisfeita.
Disto, dava conta a “Chronica Constitucional do Porto”, nas
suas páginas de 4 de Dezembro de 1834.
Veteranos do Cerco
do Porto, em 29 de Julho de 1883
CERCO DO PORTO -
Exposição de Amália da Silva Chaves, no início do século XX. Um salão com
peças, fardas e desenhos alusivos ao Cerco do Porto
Muitas obras relataram pormenorizadamente “O Cerco do Porto”
e uma delas foi o Coronel Owen, uma testemunha privilegiada do conflito. Este
oficial vivia no Porto quando, em 1832, o exército liberal chegou dos Açores e
ocupou a cidade. D. Pedro chamou-o para comandante da cavalaria, mas Owen, por
ser cidadão britânico, recusou a proposta, de acordo com as ordens delegadas
pelo governo do seu país. Não obstante, colaborou com os liberais durante o
cerco da cidade e todas as noites D. Pedro recebia Owen no seu gabinete. O seu
relato expõe as movimentações militares com bastante pormenor, assim como a configuração
da situação sociopolítica da época.
O Cerco do Porto – coronel Owen
Desempenho de
anónimos no Cerco do Porto
Em 1 de Dezembro de 1834, Agostinho José Freire (1780-1836),
com direito a figurar na toponímia portuense, oficial do exército português que
chegou a ser nomeado Ministro da Guerra e da Marinha e, ainda, em 1836,
Ministro do Reino e que foi assassinado na revolta da Belenzada, despachava
favoravelmente um requerimento de José de Melo, com a patente de 2º Tenente da
Real Armada para 1º Tenente da mesma, tendo em conta os feitos que
protagonizou.
José de Melo era mareante no rio Douro, proprietário de 15
barcos e fundador do
“Batalhão de
Voluntários dos Mariantes do Douro”,
que administrava com os seus cabedais, lutando ao lado das tropas sitiadas na
cidade do Porto pelo exército de D. Miguel.
José de Melo foi, assim, um dos muitos cidadãos anónimos que
lutaram e defenderam a cidade durante o Cerco do Porto.
Dos barcos que possuía, em balanço final depois das pugnas,
restaram 7, sendo que, nos badalados fornecimentos de munições e víveres às
tropas de D. Pedro aquarteladas na Serra do Pilar, com escalamento do Senhor de
Além, empregou 12 dos seus barcos, que partiam da margem direita do rio, da
zona das Fontainhas.
As suas embarcações tiveram papel de relevo em desembarques
de mercadorias ocorridos no porto improvisado de Carreiros, na Foz do Douro,
que as tropas dos liberais, estacionadas no Monte da Luz, defendiam.
Esteve, por certo, também, no corte da Ponte das Barcas, em
8 de Setembro de 1832.
Porém, como revés, deve ter estado envolvido no assalto ao
convento do Vale da Piedade, em 17 de Dezembro de 1832, quando foi pretendido
obter as pipas de Vinho do Porto para angariação de fundos destinados a pagar o
auxílio dos ingleses.
Dos antigos mareantes do rio Douro resta a associação recreativa
“Os Mareantes do Rio Douro” que, pelas festas citadinas, atroa os ares com o
som dos seus bombos.
Vista do Porto no 1º quartel do século XVIII quando os
mareantes eram os reis da passagem entre as duas margens
Desfile dos Mareantes do rio Douro