Revolta de 31 de Janeiro de 1891
No dia 31 de Janeiro de 1891, na cidade do Porto,
registou-se um levantamento militar contra as cedências do Governo (e da Coroa)
ao ultimato britânico de 1890, por causa do Mapa Cor-de-Rosa, que pretendia
ligar, por terra, Angola a Moçambique.
Aliás, a actividade política, no Porto, nos meses que
antecederam a revolta, ia muito tumultuosa.
Assim, em Setembro de 1889, uma bomba rebentaria junto do
Governo Civil do Porto e, a 26 de Setembro daquele ano, morreria Augusto de
Bragança, Duque de Coimbra, o 8º filho de D. Maria II e de D. Fernando, que
esteve na linha de sucessão ao trono, até ao nascimento de D. Carlos.
O rei D. Luís I morreria em 19 de Outubro, desse mesmo ano
e, nas eleições para deputados, efectuadas um dia depois, em 20 de Outubro, o
Partido Progressista arrasou o Partido Regenerador.
Em Dezembro, daquele agitado fim de ano, D. Carlos seria
aclamado rei.
A 1 de Janeiro de 1891, reuniu-se o Partido Republicano em
congresso, de onde saiu um directório eleito, constituído por: Teófilo Braga,
Manuel de Arriaga, Homem Cristo, Jacinto Nunes, Azevedo e Silva, Bernardino
Pinheiro e Magalhães Lima.
Estes homens apresentaram um plano de acção política a longo
prazo, que não incluía a revolta que veio a acontecer, no entanto, a sua
supremacia não era reconhecida por todos os republicanos, principalmente por
aqueles que defendiam uma acção imediata. Estes, além de revoltados pelo
desfecho do episódio do Ultimato, entusiasmaram-se com a recente proclamação da
República no Brasil, a 15 de Novembro de 1889.
As figuras cimeiras da "Revolta do Porto", que
sendo um movimento de descontentes grassando, sobretudo, entre sargentos e
praças careceu do apoio de qualquer oficial de alta patente.
Assim, foram o capitão António Amaral Leitão, o alferes
Rodolfo Malheiro, o tenente Coelho, além dos civis, o Dr. Alves da Veiga, o
actor Miguel Verdial e Santos Cardoso, além de vultos eminentes da cultura como
João Chagas, Aurélio da Paz dos Reis, Sampaio Bruno, Basílio Teles, entre
outros, aqueles que tomaram as rédeas da revolta.
Esta tem início na madrugada do dia 31 de Janeiro, quando o
Batalhão de Caçadores nº 9 (sedeado no convento de S. Bento da Vitória),
liderados por sargentos, se dirigem para o Campo de Santo Ovídio, hoje Praça da
República, onde se encontra o Regimento de Infantaria 18 (R.I. 18). Ainda antes
de chegarem, junta-se ao grupo, o alferes Malheiro, perto da Cadeia da Relação;
o Regimento de Infantaria 10, sedeado na Torre da Marca, liderado pelo tenente Coelho; e uma companhia da
Guarda Fiscal. Embora revoltado, o R.I. 18, fica retido pelo coronel Meneses de
Lencastre que, assim, quis demonstrar a sua neutralidade no movimento
revolucionário.
Às 4 horas da manhã, o jornal “A República Portugueza”
imprimia o seguinte comunicado:
Eram 4 da manhã, quando as forças sublevadas (os quartéis de
Caçadores 9, Infantaria 10 e Infantaria 18, este último invadido por populares
que puseram fim às hesitações quanto à sua adesão), comandadas pelo alferes
Malheiro, capitão Leitão e tenente Coelho, se encaminharam para a Praça D.
Pedro, posicionando-se frente aos Paços do Concelho.
À frente da coluna, uma banda militar tocava “A Portuguesa”,
de Alfredo Keil.
Os revoltosos descem a Rua do Almada, até à Praça de D.
Pedro, (hoje Praça da Liberdade), onde, em frente ao antigo edifício da Câmara
Municipal do Porto, ouviram Alves da Veiga proclamar da varanda a Implantação
da República. Acompanhavam-no Felizardo Lima, o advogado António Claro, o Dr.
Pais Pinto, Abade de São Nicolau, o Actor Verdial, o chapeleiro Santos Silva, e
outras figuras.
Verdial leu a lista de nomes que comporiam o governo
provisório da República e que incluíam: Rodrigues de Freitas, professor;
Joaquim Bernardo Soares, desembargador; José Maria Correia da Silva, general de
divisão; Joaquim d'Azevedo e Albuquerque, lente da Academia; Morais e Caldas,
professor; Pinto Leite, banqueiro; e José Ventura Santos Reis, médico.
Foi, então, hasteada uma bandeira vermelha do “Centro
Democrático Federal de 15 de Novembro” (a bandeira vermelha e verde só será
adoptada a partir de 1910) no mastro do frontão, apoiado pelos vivas e pelo
entusiasmo da multidão.
É Santos Cardoso, um dos chefes civis da revolta,
proprietário, editor e redactor do jornal “A Justiça Portuguesa”, que atiçou
durante longos meses a violência contra a Monarquia, e constituiu o elemento
preponderante da aliciação dos militares que participaram na revolta quem irá
subir no mastro da varanda da Câmara aquela bandeira vermelha.
Com fanfarra, foguetes e vivas à República, a multidão
decide subir a Rua de Santo António, em direcção à Praça da Batalha, com o
objectivo de tomar a estação de Correios e Telégrafos.
No entanto, o festivo cortejo foi barrado por um forte
destacamento da Guarda Municipal, posicionada na escadaria da igreja de Santo
Ildefonso, no topo da rua. O capitão Leitão, que acompanhava os revoltosos e
esperava convencer a guarda a juntar-se-lhes, viu-se ultrapassado pelos
acontecimentos.
Em resposta a dois tiros, que se crê terem partido da
multidão, a Guarda solta uma cerrada descarga de fuzilaria vitimando
indistintamente militares revoltosos e simpatizantes civis. A multidão civil
entrou em debandada e, com ela, alguns soldados.
“ A Guarda
Municipal abrigada pelas varandas de pedra que guarnecem as escadas e patamares
que dão acesso à Igreja de Santo Ildefonso … que permitem estabelecer como
começou e desenvolveu o combate da Rua de Santo António… inesperadamente, e por
via da falta de disciplina militar que a Polícia Fiscal não possuía, uma ou
duas praças dessa polícia, saindo da forma fizeram 2 ou 3 tiros sobre a guarda
municipal. O Major Graça (comandante da Guarda Municipal) … logo que ouviu aqueles
tiros ordenou o toque de fogo às suas forças, reiterando-o, e mandando em
seguida que se fizesse fogo vivo, pelo corneteiro sob as suas ordens…
Refeitos, porém,
dessa desordem e do espanto que causara o início da luta, em pequenos grupos,
ou isoladamente, os soldados da revolta começaram um fogo nutrido contra a
Guarda Municipal… até que as munições se lhes esgotavam”.
A Revolta do Porto
de João Chagas e ex-Tenente Coelho
Os mais bravos tentaram ainda resistir. Cerca de trezentos
barricaram-se na Câmara Municipal, mas, por fim, a Guarda ajudada por
artilharia da serra do Pilar, por Cavalaria e pelo Regimento de Infantaria 18,
sob as ordens do chefe do Estado Maior do Porto, General Fernando de Magalhães
e Menezes força-os à rendição, às dez da manhã. Terão sido mortos 12 revoltosos
e feridos 40.
Alguns dos implicados conseguiram fugir para o estrangeiro:
Alves da Veiga iludiu a vigilância e foi viver para Paris; o jornalista Sampaio
Bruno e o advogado António Claro alcançaram a Espanha, assim como o Alferes
Augusto Malheiro que, daí, emigrou para o Brasil.
Croquis de L. Freire sobre o bombardeamento dos Paços do
Concelho no 31 de Janeiro de 1891 - Ed. “O Occidente” n.º 437 11de Fevereiro de 1891
Os nomeados para o "Governo Provisório" trataram
de esclarecer não terem dado autorização para o uso dos seus nomes. Dizia o
prestigiado professor Rodrigues de Freitas, enquanto admitia ser democrata-republicano:
"…mas não
autorizei ninguém a incluir o meu nome na lista do governo provisório, lida nos
Paços do Concelho, no dia 31 de Janeiro, e deploro que um errado modo de
encarar os negócios da nossa infeliz pátria levasse tantas pessoas a tal
movimento revolucionário."
A reacção oficial seria, como de esperar, implacável, tendo
os revoltosos sido julgados por Conselhos de Guerra, a bordo de navios, ao
largo de Leixões: o paquete Moçambique, o transporte Índia e a corveta
Bartolomeu Dias.
Para além de civis, foram julgados 505 militares. Seriam
condenados a penas entre 18 meses e 15 anos de degredo, em África, cerca de
duzentas e cinquenta pessoas. Em 1893, alguns seriam libertados em virtude da
amnistia decretada para os então criminosos políticos da classe civil.
Em memória desta revolta, logo que a República foi
implantada em Portugal, a então designada Rua de Santo António foi rebaptizada
para Rua de 31 de Janeiro, passando a data a ser celebrada, dado que se tratava
da primeira de três revoltas de cariz republicano efectuadas contra a monarquia
constitucional (as outras seriam o Golpe do Elevador da Biblioteca e o 5 de
Outubro de 1910).
Revolta de Fevereiro
de 1927
A Rua de Santo
António ficaria também ligada a outra revolta importante ocorrida na cidade e
que seria votada ao insucesso.
Entre 3 e 9 de Fevereiro de 1927, o Porto foi palco de uma
rebelião militar liderada pelo general Sousa Dias. Foi a primeira tentativa
consequente de derrube da Ditadura Nacional que então se consolidava em
Portugal, na sequência do golpe de 28 de Maio de 1926.
A intentona terminou com a rendição e prisão dos revoltosos
e saldou-se em cerca de 80 mortos e 360 feridos no Porto e deu início ao
período chamado “ O Reviralho”.
“A rebelião
iniciou-se pelas 4:30 da madrugada do dia 3 de Fevereiro, com a saída do
Regimento de Caçadores 9, a que se juntou a maior parte do Regimento de
Cavalaria 6, vindo de Penafiel, vários núcleos de outros regimentos da cidade e
uma companhia da Guarda Nacional Republicana aquartelada na Bela Vista, Porto.
O comando das
forças fora confiado ao general Adalberto Gastão de Sousa Dias, tendo como
chefe do estado-maior o coronel Fernando Freiria, apoiado por um comité
revolucionário constituído por Jaime Cortesão, Raul Proença, Jaime Alberto de
Castro Morais, João Maria Ferreira Sarmento Pimentel e João Pereira de
Carvalho. Entre os apoiantes incluía-se também José Domingues dos Santos, o
líder da esquerda democrática que em 1918 dirigira a conspiração civil contra a
Monarquia do Norte.
Jaime Cortesão
foi de imediato nomeado governador civil do Porto e Raul Proença, além de
conspirador, foi organizador e combatente de armas na mão, servindo de ligação
aos co-conspiradores de Lisboa.
Durante a
madrugada e manhã do dia 3 de Fevereiro, as forças dos revoltosos dirigiram-se
para a zona da Praça da Batalha, onde estavam as sedes do quartel-general da
Região Militar e do Governo Civil e a mais importante estação do telégrafo. As
forças governamentais, depois de algumas horas de desorganização, passaram a
ser constituídas por uma parte reduzida do Regimento de Infantaria 18, que
tinha como comandante o coronel Raul Peres, o Regimento de Cavalaria 9 e o
Regimento de Artilharia 5, este aquartelado na Serra do Pilar. Na tarde do dia
3 de Fevereiro, sob o comando do coronel João Carlos Craveiro Lopes, chefe do
estado-maior da Região Militar e governador militar da cidade, as forças
pró-governamentais concentraram-se no quartel da Serra do Pilar e abriram fogo
de artilharia contra os revoltosos.
Na manhã desse
mesmo dia 3 de Fevereiro, numa manobra arriscada, mas indicativa da certeza de
que estava assegurada a fidelidade ao Governo das tropas de Lisboa, o Ministro
da Guerra, coronel Abílio Augusto Valdez de Passos e Sousa, saiu de Lisboa num
comboio com destino a Vila Nova de Gaia, onde chegou ao anoitecer. Assumiu
então o controlo operacional das forças pró-governamentais ali instaladas sob o
comando do coronel João Carlos Craveiro Lopes, mantendo-se na frente de combate
até à subjugação dos revoltosos”.
In Wikipédia
A trincheira da morte, ao cimo da Rua de 31 de janeiro, na
revolta de 1927 - Ed. monumentosdesaparecidos.blogspot
Trincheira na Sé, no acesso à ponte Luís I, na revolta de
1927 - Ed. monumentosdesaparecidos.blogspot
Raúl Proença, em 4 de Fevereiro, tenta que os civis se
juntem ao movimento, solicitação que não vai ter grande adesão.
Quanto a forças militares, aderem tropas pertencentes a
unidades aquarteladas em Viana do Castelo, Figueira da Foz e Faro, estas
últimas apoiadas por forças de Olhão, Tavira e Vila Real de Santo António.
Pior é que o esperado envolvimento das unidades militares lisboetas
não acontecem. Pela capital o quotidiano é feito de hesitações, que irão durar
até ao fim dos confrontos. É quando tudo já está perdido para o lado dos
revoltosos portuenses, que Lisboa esboça algo que irá ficar conhecido como a
“Revolta do Remorso”.
O quartel general das tropas governamentais assentou
arraiais nas Devesas, em V. N. de Gaia.
Embarque junto da Estação das Devesas, em V. N. de Gaia,
para o Porto a 5 de Fevereiro de 1927 - Ed. Ferreira da Cunha, Arquivo
Municipal de Lisboa
Na manhã do dia 5 de Fevereiro o vapor Infante de Sagres chegava a
Leixões, com tropas governamentais, comandadas pelo coronel Augusto Manuel
Farinha Beirão, enquanto mais forças governamentais atravessavam o Douro em
Valbom e se encaminhavam para o centro da cidade.
Sem o apoio das unidades militares de Lisboa, os revoltosos
tentam uma conciliação, que leva o comandante Jaime de Morais e o major
Severino a visitar o quartel-general do Ministro da Guerra, instalado num
prédio da Avenida das Devesas, em Gaia, numa tentativa de negociar a rendição
em troca da liberdade para os revoltosos.
Os parlamentários dos revolucionários foram obrigados a
atravessar a cidade vendados, mas o resultado foi inconclusivo já que o
Ministro recusou uma rendição que não fosse incondicional: ou a rendição total
ou o bombardeamento da cidade.
Os parlamentários, comandante Jaime Morais e o major
Severino dirigindo-se vendados para o quartel-general das forças governamentais
Na sequência do malogro das conversações, as duas partes
começaram a metralharem-se.
Altar da igreja dos Congregados atingido por um projéctil
lançado pela bataria governamental instalada na serra do Pilar. Ainda hoje é
visível o dano e, a propósito, numa vitrina está exposta a munição referida, que
acabou por não explodir. Eram quatro e um quarto da tarde do dia 6 de Fevereiro
“Finalmente, na
tarde do dia 7 de Fevereiro, esgotadas as munições, o quartel-general dos
revoltosos, instalado no Teatro de S. João, manda dispersar os civis ali
aquartelados. À meia-noite o general Sousa Dias faz chegar ao Regimento de
Artilharia 5, em Gaia, por intermédio do major Alves Viana, da GNR, um
documento apenas por si subscrito, em que propõe a rendição, com salvaguarda da
isenção de responsabilidades de sargentos, cabos e soldados. Passos e Sousa
aceita apenas a isenção de cabos e soldados, declarando que os oficiais e
sargentos envolvidos seriam punidos. Qualquer civil apanhado de armas na mão
seria imediatamente fuzilado.
Sem mais opções,
pelas 3:00 horas da madrugada do dia 8 de Fevereiro Sousa Dias aceita as
condições propostas e ordena a rendição dos revoltosos. Pelas 8:30 horas, Passos
e Sousa entra triunfalmente na cidade, pela Ponte D. Luís. Estava terminada a
revolta no Porto.
Durante os 5 dias
que durou a revolta no Porto perderam a vida mais de 100 pessoas, entre
militares e civis, entre os quais o jornalista António Maria Lopes Teixeira,
director do Diário do Porto. Foram mais de 500 os feridos, alguns dos quais
viriam a sucumbir nos dias imediatos. Os estragos causados pelos
bombardeamentos e tiroteios também foram grandes, com muitas casas devastadas e
muitos edifícios públicos grandemente danificados”.
In Wikipédia
A malograda revolta
de Fevereiro de 1927 foi a última tentativa séria de colocar o País no rumo da
democracia. Tal só seria alcançado com a revolução do 25 de Abril.
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