Em 1 de Março de 1872, D. Pedro II (1825-1891), imperador do
Brasil, começa uma visita à cidade do Porto, acompanhado pela imperatriz, D. Teresa
Cristina Maria de Bourbon.
O imperador D. Pedro II do Brasil era filho do Imperador D.
Pedro I do Brasil (Rei D. Pedro IV de Portugal) e de Maria Leopoldina.
Sobe ao trono, em 1841, tendo o Brasil, durante 1831 e 1840,
vivido o chamado “Período Regencial”, já que D. Pedro I, seu pai, tinha abdicado
e ele ainda era menor de idade.
No Porto, a comitiva irá ficar alojada, no Hotel do Louvre,
à Rua do Triunfo (Rua D. Manuel II) que, para o efeito, foi alvo de diversas
remodelações por parte da sua proprietária, D. Henriqueta Alvellos.
O primeiro andar do Hotel foi destinado aos Imperadores, e o
segundo para a sua comitiva.
Aquela estadia ficaria para a história, entre outros factos,
pela situação de embaraço criada, quando o imperador, influenciado pelo cônsul
do Brasil, no Porto, achando especulativa a conta apresentada, se recusou a
liquidá-la. Um escândalo!
A dona do hotel, após decisão de um tribunal lhe ter dado razão, ao fim de 5 anos, na acção judicial que, entretanto, correu, haveria de
embarcar num navio para o Brasil, tentando resgatar a conta de mil
libras em dívida.
Para obstar ao escândalo, quatro ricos portugueses, residentes no Brasil, pagariam do seu bolso a dita maquia.
A visita acontecida em 1872, à cidade do Porto, começaria a ser preparada alguns meses antes.
Assim, em 25 de Maio de 1871, D. Pedro II e a sua mulher D.
Teresa Cristina de Bourbon (1822-1889) partem do Rio de Janeiro no paquete
Douro.
Chegados a Lisboa a 12 de Junho, permanecem de quarentena
obrigatória no Lazareto, tendo recusado a oferta de D. Luís para o fazerem na
corveta portuguesa Estephanea.
Finda a quarentena, instalaram-se no Hotel Bragança até à
partida no caminho-de-ferro para uma digressão pela Europa, em Junho de 1871.
Visitaram Espanha, França, Inglaterra, Alemanha, Áustria, Itália e o Egipto.
No fim do dia 29 de Fevereiro de 1872, estão na fronteira
espanhola e no comboio do correio dirigem-se para o Porto, tendo desembarcado
na estação das Devesas, em V. N. de Gaia, pelas 7,30 horas da manhã, do dia 1
de Março, 6ª Feira, onde são recebidos pelas autoridades, seguindo-se o
atravessamento do rio Douro e, finalmente, a cidade do Porto.
Ponte Pênsil sobre o rio Douro. Na chegada do Imperador,
duas linhas de bandeiras tremulavam nas guardas da ponte - Foto: Calótipo de
Frederick William Flower
Arco Triunfal, ao cimo da Rua de S. João, no percurso do
Imperador D. Pedro II, após atravessar o rio Douro, vindo das Devesas e da
Ribeira onde esteve montado um elegante pavilhão
Largo da Feira de S. Bento (com a Igreja dos Congregados, em
fundo), e o pavilhão montado e devidamente preparado para receber o Imperador
em 1872
Arco Triunfal, na Rua dos Clérigos, com o palacete das Cardosas,
à esquerda
Os Imperadores do Brasil, entraram na cidade em carro
descoberto, tendo as tropas apresentando armas.
Uma breve homenagem, ainda nas Devesas, foi feita ao filho
do Imperador-Soldado, numa alocução redigida por João Luís de Melo e entregue a
S.M., e assinada por antigos soldados que combateram com seu Pai.
Alojada a comitiva no Hotel do Louvre, depois de desfilar
pelas ruas da cidade, ornamentadas com seus arcos triunfais, e terminado o
almoço, seguir-se-ia a visita à cidade.
A jornada começaria pela presença numa missa na Lapa às 11h.
Depois, visitaram a Bolsa, a Igreja dos Franciscanos, a
Misericórdia e, aí, apreciaram o quadro (Fons Vitae) dessa instituição, o
Ateneu Portuense e a Academia Portuense de Belas-Artes, onde foram recebidos
pelo subinspetor Conde de Samodães.
Durante a visita à Academia Portuense de Belas Artes,
sedeada no extinto convento de S. Lázaro, D. Pedro II procurou conhecer os
pintores Francisco Rezende e João Correia e as suas obras, pelo prestígio que tinham,
entretanto, adquirido.
Disso, nos dá conta o texto seguinte:
“Depois de reparar no mau estado em que se acha o
edifício, cuja reparação compete à camara municipal da cidade, subiu às aulas
da Academia, e ahi notou os quadros dos srs. Francisco José Resende e João
António Corrêa, que elogiou, perguntando pelo primeiro, o qual se não
achava presente. Mais tarde foi o sr. Resende recebido no hotel do Louvre,
aonde foi offerecer-lhe dois quadros, um de costumes, outro com o retrato
del-rei o sr. D. Luiz.”…
In Viagem dos Imperadores do Brasil em Portugal. Imprensa da
Universidade. Coimbra 1872. (pág.103)
Entretanto, no Jornal “O Primeiro de Janeiro” de 3 de Março
de 1872 dizia-se a propósito daquela visita:
“Hontem, pelas 7 horas da manhã foi o snr. Resende
collocalos na sala de espera do hotel do Louvre, e quando procedia áquella
operação, entraram na sala o snr. D. Pedro II com os snrs. Marquez de Ficalho,
Andrade Corvo e seu secretario António Sampaio, os quais não só muito elogiaram
os quadros como também dirigiram affectuosissimas palavras ao notável artista.
Suas magestades querem que aquellas pinturas vão já na sua companhia para o Rio
de Janeiro.
Os Paços do Concelho e a Igreja dos Clérigos foram os alvos
seguintes da imperial comitiva.
Às 7h, houve recepção de diversas autoridades no Hotel do
Louvre.
Na oportunidade, uma delegação de Estudantes Brasileiros no
Porto, foram entregar e ler uma mensagem a S.M.I., D. Pedro II.
Às 9h, aconteceu um espectáculo no Teatro Bacquet. S.M.
manifestou, então, desejos de falar a Camilo Castelo Branco.
Durante a noite a cidade esteve iluminada, nomeadamente, a
Praça D. Pedro, o edifício da Câmara, a Rua de Santo António e as escadas da
igreja de Santo Ildefonso, arco dos Lóios e o pavilhão da Feira de S. Bento.
O dia seguinte, 2 de Março, um Sábado começou cedo, tendo o
imperador visitado, na companhia do marquês de Ficalho, a Foz, Leça e
Matosinhos.
Antes, pelas 7 horas da manhã, já o pintor Francisco Rezende tinha deixado no Hotel Louvre as pinturas que se destinavam ao Imperador.
Na Foz, D. Pedro II visitou o Salva-Vidas e o Castelo da Foz, a que se
seguiu a fortaleza da Serra do Pilar.
A Escola Politécnica, o mercado do Anjo, o Instituto
Industrial, o mercado do Bolhão e a fábrica da Companhia de Fiação Portuense,
ao Campo 24 de Agosto, foram também alvo da atenção de D. Pedro II.
E, era chegado o momento da visita a Camilo Castelo Branco.
Antes, D. Pedro II tinha feito, um convite ao escritor
Camilo Castelo Branco para que o visitasse, no Hotel do Louvre, para o agraciar
com a Ordem da Rosa.
O escritor declinou o convite, dizendo-se doente, mas o
imperador toma, então, a decisão de ser ele a dirigir-se a casa do enfermo, a
S. Lázaro.
Na primeira casa, à esquerda, a S. Lázaro, morava Camilo,
quando foi visitado pelo Imperador D. Pedro II, em 1872
Só após treze anos decorridos sobre esta visita, o decreto
que fez Camilo, Visconde de Correia Botelho, acabaria por ser assinado, por D.
Luís, a 18 de Junho de 1885.
Antes do jantar, ainda foi visitado o Hospital de Santo
António, a Escola Médico-Cirúrgica e o Museu Municipal da Rua da Restauração.
Após aquele repasto, houve recepção ao corpo consular e
pelas 9 horas no Teatro S. João subiu ao palco a ópera “Poliuto”, uma tragédia
lírica de Gaetano Donizetti.
Após passar dois dias completos, no Porto, a comitiva imperial,
logo no dealbar da madrugada de 3 de Março, um Domingo, parte para Braga, pernoita
em Barcelos e, no dia seguinte, estavam outra vez na estação das Devesas, onde
foram apresentados os cumprimentos das autoridades. Seguir-se-ia a visita a
Coimbra e a chegada a Lisboa com hospedagem no Hotel Bragança, depois de passagem
por Leiria, Alcobaça, Caldas e Batalha.
O regresso à cidade
do Porto
O imperador D. Pedro II e a imperatriz D. Teresa Cristina
Maria de Bourbon haveriam de retornar à cidade do Porto, alguns anos mais
tarde, embora em situação nada festiva.
Em 1889, aqui chegavam para se exilarem, em consequência da
implantação da República no Brasil.
Seria no Grande Hotel do Porto, na Rua de Santa Catarina,
que se hospedaram e, num dos seus quartos, que a imperatriz morreu, no começo
da tarde do dia 28 de Dezembro de 1889, quando D. Pedro II realizava uma visita
de cortesia à Escola Portuense de Belas Artes, a S. Lázaro.
Nos tempos que se seguiram, o imperador exilado irá ser alvo
de diversos actos de grande amizade, cujo protagonista foi o conde de Alves Machado,
nomeadamente, custeando as despesas de funeral da imperatriz e auxiliando, pontualmente, o imperador na sua estadia em Paris.
O conde Alves Machado foi a personagem que se destacou, para
sempre, por ter vivido cerca de quarenta anos no Hotel Francfort, sendo dono de
um magnífico palacete na Praça da República, que ainda hoje existe, mas em completa ruína.
Antecâmara da visita
de D. Pedro II a Camilo Castelo Branco
Alguns dias antes da visita de D. Pedro II à sua casa em S. Lázaro, por uma questão de deferência para com o
imperador, tinha Camilo Castelo Branco dado ordens à sua editora para parar com
a impressão do seu romance “A Infanta Capelista” que tinha por tema central o
tráfico negreiro efectuado pelos portugueses, no Brasil.
A Casa de Bragança era também criticada.
Um dos 50 exemplares (Edição fac-similada) mandado
reproduzir, em 1952, no Porto, pela Livraria Moreira da Costa, filha – Cortesia
do Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro
Em meados do século XX, tendo conseguido reconstituir um
exemplar completo, a Livraria Moreira da Silva-Filha vai publicar uma edição
fac-similada de 50 exemplares da “Infanta Capellista” sendo, por isso,
processada por Flora Augusta Castelo Branco Vilaça, neta de Camilo Castelo Branco,
que vem a ganhar o processo e é indemnizada em 18.500 escudos, em sentença proferida
em 12 de Janeiro de 1959.
No processo judicial se narrava o modo como a Livraria
Moreira da Costa tinha feito a reconstituição da obra literária:
“raríssimos exemplares
escaparam à destruição ordenada, nomeadamente, as folhas impressas, dadas por
Camilo, como papel velho, a um barbeiro, tendo-se conseguido pelo menos
reconstituir um exemplar completo e depois, com a reconstituição imprimiu
alguns exemplares.”
Ainda no ano de 1872, a Livraria Ernesto Chardron vai
publicar, poucos meses após a destruição de “A Infanta Capelista”, a obra “O
Carrasco de Vítor Hugo José Alves”, romance cujos personagens e história seguiam
o rumo de “A Infanta Capelista”, com as poucas alterações que o escritor
decidiu introduzir.
Eram, entre outros, seus alvos, os brasileiros de
torna-viagem e antigos negreiros, Manoel Pinto da Fonseca e Joaquim Pinto da
Fonseca.
Em 1916, a Livraria Lello publica, em reedição, “O Carrasco
de Vítor Hugo José Alves”.
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