domingo, 26 de março de 2017

(Continuação 1) - Actualização em 11/10/2018

Teatro de Santa Catarina


O Teatro de Santa Catarina funcionou num edifício, entretanto demolido, para dar lugar à Camisaria Confiança, na Rua de Santa Catarina, próximo da Viela das Pombas.
O teatro, onde pela 1ª vez actuou um prestidigitador, foi criado por Joaquim António da Silva Guimarães, e não se conhecendo a data de abertura sabe-se, no entanto, que em 1852, já era alvo de remodelações.
Em 21 de Agosto de 1852, o jornal “ O Cronista” anunciava que:

“O teatro de Santa Catarina está sendo regenerado. Ali se instalará o Novo Ginásio Portuense com a velha trupe”

O mesmo jornal dizia, um mês depois, que o teatro tinha aberto portas para dar os seus espectáculos.
Em 1858, passou por este teatro a Sociedade Juventude Dramática, estando presente na estreia, a 15 de Maio, a atriz Emília das Neves, como espectadora.
A partir da 2ª metade de oitocentos, este teatro atravessou um período mais irregular da programação, recebendo apenas companhias amadoras. 
Em 1 de Agosto de 1860 podia ler-se um anúncio que dizia: "Aluga-se a casa do Teatro de Santa Catarina para bazar ou estabelecimento. Também se vende todo o cenário".
Como a “Bela Jardineira” que antecedeu a “Camisaria Confiança” nesse local, teve o seu início de actividade c. 1880 (ano em que o “Grande Hotel do Porto” também foi inaugurado), o teatro deve ter sido demolido em meados da década de 60.



Teatro Camões (Teatro das Liceiras) e Teatro das Variedades



“Construído na Rua das Liceiras, próximo da Feira dos Carneiros na actual Rua do Alferes Malheiro, o Teatro Camões foi, na década de 50 do século XIX, frequentado pela «boa sociedade», tendo passado por lá várias personalidades da época como Camilo Castelo Branco, entre outros.
 O Teatro de Camões passaria a designar-se posteriormente por “Teatro das Variedades”, inaugurando esta nova fase da sua existência no dia 5 de Junho de 1858 com uma companhia de teatro declamado.
Após as obras remodelação e “embelezamento”, dizia-se que o mesmo iria «notabilizar-se e tomar ares de fidalgo» (O Comércio do Porto, 5.06.1858, p. 1), tendo inclusive a sua empresa contratado elementos à «companhia de baile» do Teatro S. Carlos. Porém, as expectativas criadas acabariam frustradas.
O Teatro das Variedades era, sem dúvida, um espaço aberto a associações, sociedades ou companhias de amadores que, por mero divertimento ou com o intuito de entrar no circuito teatral, aqui encontravam espaço para dar visibilidade aos seus trabalhos e ao seu mérito. As associações tinham igualmente aqui a sua casa para espectáculos de beneficência. Foi exemplo disso a «reunião preparatória» realizada neste Teatro a 2 de Maio de 1863, com vista à organização de uma sociedade dramática que se propunha a realizar uma série de espectáculos em que as receitas retiradas das quotas dos sócios, após abatidas as despesas, teriam como destinatários os «operários fabricantes sem trabalho e estabelecimentos pios», (O Comércio do Porto, 2.05.1863, p. 2).
Com a devida vénia a António Coutinho Coelho



No ainda Teatro Camões inaugurado, supõe-se, na década de 40 do século XIX, foi representada a primeira tentativa dramática de Camilo a 30 de Dezembro de 1848, com a subida ao palco da peça “Agostinho de Ceuta”, escrita em Vila Real, enquanto vivia com Patrícia Emília de Barros. 
A primeira representação daquela obra data de 1846, realizada num barracão, adaptado a teatro (em Vila Real), pertencente a João Pinto da Cunha.
Também o professor de “Introdução à História Natural” no liceu de Viseu, Henrique Luso, que tendo publicado na Grinalda, escreveu várias composições teatrais que foram representadas pela companhia dramática Académica do Porto, teve obras suas representadas no Teatro Camões. Entre elas destacam-se, Amor e amizade, A tomada de Sebastopol (Guerra da Crimeia, entre 1854/55), O dia de S. Miguel, Um anacronismo, etc.
O último sinal de vida desta casa de espectáculos data de 15 de Outubro de 1866, com a representação do drama Santo António.
Ao Teatro das Variedades chamava CamiloA barraca de Liceiras”.
Há quem localize esta sala de espectáculos, na Rua de Liceiras, actual Rua Alferes Malheiro, nos nºs 128-138, no local posteriormente ocupado pela oficina e fábrica de carruagens de Emídio Quintela.
Em 12 de Janeiro de 1848, o teatro encheu-se completamente de um público curioso e expectante. Ia debutar nas salas do Porto, a "Linda Emília" - Emília das Neves, com a peça "Madalena".
No quarto acto, o público que até aí se mantivera frio, rompeu em aplausos frenéticos.
A actriz voltaria ao Porto, mas já no Teatro S. João, em 1851, 1852 e 1857/58. Em 1859/60, trabalhou no teatro Baquet, quando a Ristori actuava no Teatro S. João. Em 1862/63 voltaria a este teatro.
Em 26 de Fevereiro de 1863, os estudantes da Academia Politécnica e da Escola Médico-Cirúrgica prestaram uma homenagem a Emília no teatro Baquet, tendo-a acompanhado, em apoteose, até ao hotel em que ela estava hospedada na Praça da Batalha.
Um outro Teatro das Variedades funcionou durante algum tempo, nas instalações do convento de S. José e Santa Teresa das Carmelitas Descalças, após o seu abandono pelas religiosas, vindo depois a ter várias ocupações, entre outras, os Correios e Telégrafo e a Escola Normal.




Teatro Chalet da Trindade ou Teatrinho de Camões


Em Novembro de 1886, abriu as suas portas o Teatro Chalet, na Feira dos Carneiros, no local onde hoje está a Estação do Metro da Trindade, próximo do local onde, alguns anos antes, tinha estado, mais a poente, o antigo Teatro Camões, depois, Teatro das Variedades.
Em Fevereiro de 1886, já o seu proprietário tinha solicitado, à Câmara do Porto, uma construção destinada a teatro, que iria obter a Licença de obra nº 656/1886.
O teatrinho Camões, como também ficou conhecido, era rotulado de «verdadeiramente popular», no mesmo patamar do Teatro de Recreios, à Praça da Batalha. O seu aspecto interior descrevia-se como «bonito (…) e muito asseiado», destacando-se o notável trabalho decorativo levado a cabo pelo cenógrafo Eduardo Machado.
O seu proprietário era António Joaquim Alves Duarte, o também proprietário do Bazar Universal.
O arrendatário/empresário seria a conhecido Joseph Dallot.
Sobre o aspecto do teatrinho de Camões dizia o jornal “O Comércio do Porto”:
 
“Tem uma ordem de camarotes, quatro frisas, duas de cada lado, e tres plateias; não possue galerias. Comquanto pequeno e baixo, o theatro agrada pela apreciavel pintura [de E. Machado] e pela disposição”.
O Comércio do Porto, 28.11.1886, p. 2
 
“A respectiva companhia ficaria a cargo do ensaiador Pedro Nunes Ferreira, que teria uma orientação programática totalmente popular, explorando o filão das mágicas e revistas, mostrando o persistente sucesso destes géneros, o primeiro dos quais datando do século XVIII”.
Cortesia de Daniel Rodrigues Micaelo Rosa
 
O teatro tinha a sua frontaria virada para o Largo da Feira dos Carneiros, precedida de um pátio descoberto, resguardado por um gradeamento e portão de ferro.
Uma fiada de amoreiras funcionava como um tapa-vistas dessa fachada principal.
Para o lado da Rua de Camões, o acesso a uma porta que servia o palco, fazia-se por uma escada de meia-dúzia de degraus, pois estava abaixo do nível daquela rua.
Em 1888, o teatro depois de intervencionado para cumprimento da legislação que se prendia com a segurança dos espectadores, reabriria.
 
 
 
 

Notícia de “ O Jornal do Paiz”, em 8 de Agosto de 1888
 
 
Conceição Vitória Marques, de seu nome artístico Mercedes Blasco, actuou no Chalet da Trindade, em Agosto de 1888, na peça em 4 actos, “Espelho da Verdade”, com arranjo de Augusto Garraio, durante a récita de inauguração daquela sala de espectáculos, acima referenciada.
Com uma programação de cariz popular, por lá passaram também algumas companhias lisboetas, em tournée e outros artistas de mais nomeada como Rosa de Oliveira, Tereza Prata, Carlota Veloso, Firmino, França, Seta da Silva, etc.
 
 
 

“Jornal do Porto”, 7 de Novembro de 1891
 
 
 
 
Em 14 de Abril de 1898, em sessão da Câmara, Alfredo Meneres, aproveitando o facto do arrendatário do teatro não pagar, desde há muito tempo, as respectivas rendas, propõe que se proceda à demolição do edifício, para aí erguer, o horto municipal. A proposta mereceu a devida aprovação.
Com o drama “A escravatura na América” realizou-se o último espectáculo em 2/4/1899, no Teatro Chalet, tendo sido em seguida demolido para ampliação do Horto Municipal. 





Feira do carvão junto ao Teatro Chalet da Trindade - Ed. Emílio Biel




O teatro Guinol esteve pela Cordoaria em 1890.

«Inaugurou-se domingo ultimo este elegante theatro barraca construido recentemente em frente ao jardim da Cordoaria. N‘este theatro que interiormente se acha distintivamente ornamentado há todas as noites variados espectáculos por fantoches.»
In Jornal Moderno, nº 3, ano 1, Porto, 27 de Novembro de 1890

Em 16 de Fevereiro de 1892 ainda era possível ver um anúncio no jornal “O Independente”, na pág. 3, ao Teatro Guinol, no Campo dos Mártires da Pátria:
 “Todos os dias variados espectáculos”





Em 1865 num barracão instalado na antiga cerca do convento o francês Paulo Barnabó exibiu o seu espectáculo de feras.
Em 1866 o italiano Marcelo Servini apresentou espectáculo semelhante e no ano seguinte aproveitando as instalações do barracão, Miguel Puga expôs outra colecção de animais ferozes e o espanhol Manuel Sanchez Lara deu os seus espectáculos de prestidigitação.
Mas os tempos áureos da cerca das carmelitas ficaram a dever-se a partir de 1869, aos irmãos Dallot e ao seu comparsa, o palhaço Tainha e às peças de teatro e velhas comédias e, ao desempenho do tenor Osório, vindo do Ginásio de Lisboa, que tornaram um sucesso o chamado, Teatro das Carmelitas.



“Na rua das Carmelitas surgiu, em 1869, o Teatro das Carmelitas junto da cerca do Convento. As paredes e a cobertura deste recinto eram “de madeiras muito fracas, profusamente revestidas de bandeiras e junto ao palco e plateia podiam ver-se enormes floreiras. A iluminação era feita através de vários lustres”. A proximidade ao jardim da Cordoaria atraiu mais público do que seria esperado, incentivando o arrendatário, Agostinho Lopes Cardoso, a remodelar este teatro, convertendo-o num edifício de pedra, surgindo então a 28 de Dezembro de 1872 o novo teatro, designado (desde há algum tempo), Teatro das Variedades com a Empresa Dramática Nacional. Neste palco foram apresentados espetáculos de cariz mais popular como as zarzuelas e as operetas, mas também comédias e dramas”.
Com a devida vénia a Maria Isabel Alves Mesquita Rosinhas


Publicidade no Jornal do Porto em 31 de Dezembro de 1870

Anúncio do Jornal do Porto em 15 de Março de 1871

Como se pode observar nos anúncios acima na década de 70 do século XIX, o teatro situado na Cerca das Carmelitas já era conhecido por Teatro das Variedades.

“Em 1872 o teatro atingia o auge, mas pouco depois ardeu.
Carlos Dallot voltou a erguer o teatro, reforçou o elenco, mas outro incêndio voltou a devorar as instalações e Dallot desanimado voltou para os espectáculos de estrada donde provinha.
Novamente reconstruída a sala de espectáculos foi tomada pelo empresário Ferreira Nunes, mas a empresa faliu.
Um outro empresário, Coelho Ferreira conseguiu levantar a empresa, mas um sessão numa véspera de Natal, levou tal quantidade de público que parte do teatro desabou e em vez de festa houve ida de vários espectadores para o hospital.
Em 1875 destruído o teatro da Trindade na Cancela Velha por um incêndio, a “Barraca das Carmelitas” levou obras, foi alindada…e entregue em aluguer à empresa Guilherme Lima Alves Rente e Silva Junior.
Nessa época era frequentado por Pinto Bessa, Farmacêutico da Praça Carlos Alberto, poeta Pedro Lima, o Braga dos Lavadouros, o velho fidalgo da Fábrica e muitos outros.
Com o sucesso do Teatro do Príncipe Real, …o Teatro Variedades alvo de 2 incêndios e falências daria lugar à Cozinha Económica, instituída pela companhia Utilidade Doméstica em 1892”.
Fonte: Firmino Pereira In “O Porto d’Outros Tempos”

Segundo “O Comércio do Porto” de 8 de Outubro de 1882, o Teatro das Variedades foi demolido a 7 de Outubro de 1882.


Jornal do Porto 31 de Dezembro de 1875


Esta casa de espectáculos seria construída num terreno em parte alugado a Manoel Vanzeller e outra parte adquirido ao município, e foi inaugurada em Fevereiro de 1874.
“O teatro pertencia a uma sociedade por acções designada “Companhia Theatral do Porto”sendo seus gerentes António Paes da Silva e Albano de Miranda Lemos. A empresa, já com o teatro em funcionamento, não devia ter muita liquidez, pois, por anúncio de 20 de Outubro de 1874, convidavam os «os accionistas desta sociedade anonima de responsabilidade limitada a fazerem as suas entradas de 15$000 réis por acção no escriptorio da companhia no Teatro da Trindade», no que tudo indica ser um suprimento ou aumento de capital”.
Fonte: Luís Soares Carneiro



Fachada do Teatro da Trindade - Fonte: AHMP, "Theatro da Trindade", Livros de Plantas de Casas nº 49, Fls. 127



Entre a rua Formosa e a rua do Laranjal, num terreno que pertencia a Manuel Clamhouse Brown Van Zeller, existia o Teatro da Trindade. O seu novo proprietário, António Pais da Silva, deu início à construção desta casa em março de 1873, inaugurando a 22 de fevereiro de 1874, com a representação do drama A pastora de Ivry pela Companhia Dramática Nacional dirigida por Romão.
O Trindade possuía três plateias, camarotes, frisas e balcão”.
Com a devida vénia a Maria Isabel Alves Mesquita Rosinhas

Quanto à localização, do Teatro da Trindade, em descrições antigas aparece como encontrando-se “ao cimo da Rua de D. Pedro, no sítio chamado Cancella Velha, em frente da Rua Formosa” e que “as trazeiras davam para a Rua do Laranjal. O teatro implantava-se no lado Noroeste da rua. O seu corpo fazia uma torção em relação à direcção da fachada de cerca de 25º, aproximando-se o seu eixo longitudinal da direcção Nascente-Poente. Deste modo, as traseiras do teatro ligavam, por uma estreita passagem, com o enfiamento da Viela do Cirne que, por seu lado, entroncava na Rua do Laranjal.
Na noite de 5 de Julho de 1875, seria o teatro consumido por um incêndio, que o destruiu completamente.

“Nas suas ruínas iria instalar-se um “teatro-barraca” – denominado Theatro Chalet de que os irmãos Dallots foram os primeiros empresários (um outro Teatro Chalet surgiria, também, na zona da Praça da Batalha).
Só no Porto, os Dallots tiveram pelo menos quatro teatros em quatro diferentes localizações:
“Vimo-lo nas feiras de S. Miguel e de S. Lázaro, a seguir assentou os alicerces para se demorar, na rua dos Carmelitas, e depois foi para a Cancella Velha. Esse barracão teatro foi vítima por duas vezes de incendio, se casual ou não, ou se antes pelo contrário, é lá com eles. O que é certo, é que os Dallots criaram nome e fama e ganharam um par de cobres bons, mas...como os dinheiros do sacristão, cantando vem e cantando vão, eles se bem o ganhavam, bem o gastavam...”
Fonte: O Tripeiro, nº13 de 1 Novembro 1908, p.203, In A Feira de S. Miguel, ou o S. Miguel

“Por iniciativa de um tal Soares, que era madeirense e possuía um armazém na Rua do Almada, esquina com a Travessa da Trindade, construiu-se depois, no mesmo terreno onde funcionara o Trindade e aproveitando-se as suas enegrecidas paredes, devidamente beneficiadas, e as antigas portas de entrada, um barracão de madeira, aliás muito bem feito, que tinha, além da indispensável Plateia, Camarotes e Galerias”.
Fonte: Armando Ribeiro



Aquele “teatro-barraca” também iria arder em 1880.
Uma nova empresa comprou o terreno e decidiu avançar com a construção de um novo teatro, o Teatro da Rainha”.
Em 21 de Abril de 1883, entrava na CMP um pedido de autorização de construção para o local do antigo Trindade “na rua e largo da Cancella Velha”. O requerimento vinha assinado pela firma Benjamins & Moutinho.
Numa tese de doutoramento de Luís Soares Carneiro pode conhecer-se mais alguns pormenores do Teatro da Rainha.

“Depois do incêndio deste teatro que foi de Joaquim Paes da Silva, e depois de uma companhia por acções, fez-se um outro teatro, em madeira, pertencente a António Francisco Soares (proprietário de uma estância de madeiras da Rua do Almada, esquina da Travessa da Praça da Trindade). Mais tarde é que se principiou o Teatro da Rainha, que foi muito além das fundações pois estava quase concluído.
Como não se pôde levar a cabo foi demolido, para dar lugar ao Pateo ridículo que hoje se goza no Largo da Cancella Velha; feito este pateo com unico fim de inutilizar um terreno onde se poderia levantar um teatro. O projecto era de Thomas Soler. Estudos, fachada, plantas, cortes, detalhes, planta do antigo Teatro da Trindade, etc. etc, sabemos que tudo está em poder do Maestro Manoel Benjamim. Segundo informação que temos, sabemos que também a história desse Teatro da Rainha vai ser publicada num livro que Júlio Moutinho tenciona fazer ácerca da vida artistica de seu pai António Moutinho de Sousa, pois que este foi um dos societários da guerreada empresa do demolido teatro. Seria uma nota de frisante actualidade se O Tripeiro conseguisse do seu valioso colaborador Julio Moutinho, a publicação dos seus escritos àcerca de seu pai e do Teatro da Rainha nas suas páginas”.
(Assinado: O Diabo)
Fonte: “O Tripeiro” nº 59, 10 de Fevereiro de 1910


Seja como for o Teatro da Rainha nunca se construiu totalmente. A pedra e as colunas em ferro foram “…melhor ou pior aproveitados para as obras da Praça de Touros ‹‹Coliseu Portuense››”, na Boavista. Os desenhos de Thomaz Soller e demais documentos foram para a Torre do Tombo, onde ficaram esquecidos… Até terem sido redescobertos.



Fachada do que seria o Teatro da Rainha

Planta do Teatro da Rainha – Ed. Luís Soares Carneiro





“O leitor é capaz de imaginar a existência, hoje em dia, de um teatro na empinada e estreita Rua da Fábrica? Mas existiu. E dizemos-lhe mais: em 1 de Novembro de 1873, nesse mesmo teatro foi representada uma peça da autoria de um tipógrafo.
Este teatro já tinha sido inaugurado em 2 de Fevereiro de 1872 e era conhecido como o “Teatro de Bolso da Sociedade Filarmónica dos Tipógrafos Portuenses”.
O que acima se diz só vem comprovar que, ao contrário do que muita gente pode pensar, o Porto, em meados do século XIX, não era apenas uma cidade mercantil, que só se preocupava com o Deve e Haver; os seus habitantes tinham, também, muitas e profundas preocupações intelectuais e artísticas.
Naquela época, o Teatro e a Imprensa, a par com as tertúlias dos cafés, apareceram como os mais importantes mentores e difusores da cultura portuense.
No que ao Teatro diz respeito há que esclarecer que uma parte significativa das salas então existentes funcionava em casas particulares.
O teatro da Rua da Fábrica, acima referido, chamava-se Teatro Minerva (foi inaugurado em 1863) e pertencia ao poeta e ilusionista e mestre de magia, amador, David Castro, que era filho da baronesa de Nevogilde, proprietária do palácio dos Carrancas, na então chamada Rua do Triunfo, a Rua de D. Manuel II. Trata-se do edifício onde está o Museu de Soares dos Reis.
Na Rua dos Bragas, em casa de Francisco António de Lima, havia outra sala de espectáculos: o Teatro Apolo; e onde está o Grande Hotel do Porto, na Rua de Santa Catarina, existiu antes uma residência burguesa que também albergava um teatro (Teatro da Rua Santa Catarina), onde se representavam comédias, farsas e entremezes, com a Sociedade Melpómene e a Sociedade Filoscénica.
Em 1858, passou por este teatro a Sociedade Juventude Dramática, estando presente na estreia, a 15 de Maio, a atriz Emília das Neves, como espectadora. A partir da 2ª metade de oitocentos, este teatro atravessou um período mais irregular da programação, recebendo apenas companhias amadoras.
Até na Rua dos Clérigos, no edifício onde em tempos funcionou um estabelecimento da Aveleda (quem se lembra ainda do veado na montra?), houve uma sala de espectáculos num dos andares superiores, era o Teatro Melo.
Eram inúmeros os pequenos teatros que no Porto funcionavam no interior das residências dos seus proprietários e em que actuavam, em regra, apenas amadores. Mas, às vezes, a essas pequenas salas, quase familiares, também se deslocavam, para representações, algumas das melhores sociedades dramáticas que havia no Porto. Foi o caso atrás referido da Filarmónica dos Tipógrafos, que actuou no Teatro de David Castro (Teatro Minerva); da Sociedade Dramática Lusitana que, em 13 de Janeiro de 1876, actuou no teatro que funcionava num prédio da Rua Formosa.
Em 1881, foi inaugurado num edifício da Rua de Santa Teresa, então com o número 5, mais um teatro particular para amadores a que foi dado o nome de Teatro Júlio Dinis.
Por essa altura, na Rua do Bonjardim, no troço compreendido entre as actuais ruas de Gonçalo Cristóvão e João das Regras, apareceu mais uma sala de espectáculos, o Teatro Recreio de Família que teve como director um ferroviário, de nome Júlio Moutinho.
O leitor atento já reparou que omitimos deliberadamente as referências aos teatros públicos, como o S. João, o Baquet e o Príncipe Real, para citar apenas os mais importantes da época, e que nos temos vindo a referir somente a pequenos teatros particulares que existiram em residências de famílias como os que animaram as noites de António Bernardo Ferreira, o filho da célebre Ferreirinha da Régua, que manteve em actividade, durante muitos anos, um excelente teatro na sua residência da Rua de Vilar, onde hoje funciona o Instituto do Arcediago Van Zeller; e dos condes de Santiago de Lobão, no seu elegante Chalet da Avenida da Boavista, esquina com a rua de Belos Ares.
O mais importante teatro particular que funcionou no Porto, por meados do século XIX, foi, sem dúvida, o Teatro Ateneu Portuense. Nasceu na Rua do Bonjardim na residência de José Pereira de Sampaio (Bruno). Nos baixos do edifício ficava o estabelecimento de padaria do pai. Embora frequentasse ainda apenas o Liceu, Bruno começava por esse tempo a surgir na ribalta da vida intelectual da cidade com os artigos que assinava em alguns jornais da cidade. Animado pela intensa vida cultural do filho, o pai de Bruno mandou adaptar um dos andares do prédio da sua residência em sala para nela se fazerem espectáculos particulares. Era mais um pequeno teatro que teve honras de solene inauguração no dia 3 de Outubro de 1873 e que recebeu a designação de Teatro Ateneu Portuense. Por um velho prospecto da época ficamos a saber que a sala se estreou com a representação de duas peças: a comédia "Depois de velhos gaiteiros" e com a cena dramática "Cerração no mar". Consta que o êxito destas representações foi tal que os espectáculos tiveram que ser repetidos e para que um maior número de espectadores pudesse estar presente as representações foram feitas no teatro do David de Castro”.
In: JN em 22 de Agosto de 2004 


Como acima é referenciado, na Rua dos Clérigos, no local onde, a partir de 1930 e grande parte do século XX, esteve a “Aveleda”, entre 1885 e 1894, foi ocupado pelo Teatro do Melo.
Em 1 de Fevereiro de 1885, teve lugar a inauguração do teatrinho, com uma récita dedicada a D. Bernardina de Melo, a anfitriã.
Os amadores Augusto de Amorim, António Braga, Agostinho Queirós, Ferraz Brandão, D. Adelaide Teixeira e D. Bernardina de Melo, estiveram, naquele momento solene, em palco.
Em 29 de Outubro de 1893, realizou-se naquela sala, uma récita de gala para comemorar o aniversário de D. Helena de Melo, sendo levadas à cena as comédias “Ressonar sem dormir”, “Atribulações de um estudante” e  “As pragas do capitão”, com a participação do “Grupo Musical Portuense” e a exibição da pianista D. Beatriz Cília Braga.
No texto do Jornal de Notícias, acima transcrito, é feita referência também, ao Teatro Minerva.
Situava-se na Travessa da Fábrica, em terreno que tinha sido, em parte, chão da antiga e extinta, à data, Real Fábrica do Tabaco e cuja área total tinha sido alvo de uma arrematação em 19 de Março de 1860.
O Teatro Minerva, inaugurado em 1863, pertencia a David Castro, de seu nome completo David Augusto Borges D´Alvim Morais de Castro (Porto, 06/03/ 1838-1888), filho da 3ª baronesa de Nevogilde que, em 1861, alienou em favor da Coroa a sua residência – o Palácio dos Carrancas.


“Vendido o prédio a el-rei D. Pedro V (1861), a família Nevogilde foi habitar a linda vivenda da rua da Fabrica na qual David de Castro mandou construir o teatrinho Minerva, onde se deram espetáculos verdadeiramente notáveis. Representaram-se ali peças de grande responsabilidade artística, como o Marquez de Villemer. Também no Minerva se cantou o Barbeiro de Sevilha e a Grã-Duqueza, postos em cena com grande esplendor. O «galã» da companhia era o José Augusto da Silva, armador, da rua dos Caldeireiros, e a primeira dama a senhora D. Sibilina de Castro, ainda viva. O brilhante grupo de amadores era ensaiado pelo dr. Soares Franco, há pouco falecido, e da orquestra faziam parte os melhores professores portuenses. De todas as sociedades de amadores a Minerva era a mais notável. Dela e das outras igualmente se escreverá a seu tempo”.
Firmino Pereira, In “O Porto d’Outros Tempos” (1914)



David Castro é conhecido, sobretudo, no mundo da arte do ilusionismo, para o qual foi seduzido após assistir a um espectáculo do género.
No teatro, que era seu, levava à cena os seus espectáculos de magia e tem obra sobre o tema publicada.
 
 
 

Planta de Telles Ferreira de 1892

 
 
Na planta acima, a seta vermelha indica a entrada para o nº 17 da Travessa da Picaria (hoje, a Rua de Avis) para os terrenos em que esteve o Teatro Minerva (inaugurado em 1863) e onde, igualmente, a baronesa de Nevogilde, o seu filho e a sua nora tinham a sua morada.
Por aqui haveria de surgir, mais tarde, em 1915, o Teatro Apolo Terrasse que se supõe ter-se aproveitado dos alicerces do Minerva.
Em sequência da aplicação de um plano de 1942, de reformulação urbanística da cidade, pelo qual era previsto o prolongamento da Rua Elísio de Melo, em meados de 1949, procede-se à demolição do Apolo Terrasse e edifícios  próximos, para abertura da actual Rua de Ceuta.
David Castro o Prestidigitador e Poeta deixou-nos como legado “O Prodígio das Salas” (1872), “Vislumbres”, “Museu Ilustrado”, “Álbum Literário”, “Trevas e Luz”, “O Thesouro da Magia”(1884), “A Carteira de Satan” (1888).
 
 
 

David Castro
 
 
 
“David Castro, referência incontornável na história do Ilusionismo em Portugal para além de gostar de apresentar-se como executante da Arte do Ilusionismo, foi autor de livros de grande valia para a época, como “O Prodígio nas Salas” em 1872, com segunda e terceira edições em 1880 e 1890, respectivamente, sendo as duas primeiras da responsabilidade da Livraria Internacional, Porto e, a última, de Lugan & Genelioux também do Porto”.
 
 
 





Convite para o Teatro Minerva


 

Após a morte da sua mãe, em 29 de Fevereiro de 1880, seria atribuída a David Castro uma pensão vitalícia de sobrevivência no valor de 456$000 réis, por decreto de 17 de Agosto de 1882.
Do seu enlace com D. Sibilina da Glória Pinto da Fonseca Rangel e Castro resultaria um filho único, de seu nome Arnaldo Augusto Borges de Alvim Morais e Castro, nascido em 17 de Junho de 1871, e que viria a ser oficial do exército.
Na segunda metade do século XIX, apareceram também as sociedades dramáticas amadoras, que se constituíram à luz de um espírito associativo. Era o caso da “Real Sociedade de Amadores Luz e Caridade”, com objectivos filantrópicos.



Anúncio de espectáculo de benefício da “Real Sociedade de Amadores Luz e Caridade”




A “Real Sociedade de Amadores Luz e Caridade” estava sedeada num 2º andar de um prédio que fazia ângulo entre as ruas do Almada e do Dr. Ricardo Jorge.
Foi o seu primeiro sócio protector D. Fernando, rei consorte e seu presidente perpétuo o rei D. Luís I. 
No dia 9 de Dezembro de 1880, foi interpretada no Teatro do Princípe Real, por este grupo cénico, durante a sua 15ª récita, a opereta "Os sinos de Corneville".

1 comentário:

  1. O Porto não precisava copiar os nomes dos teatros de Lisboa. Não precisava copiar nada de Lisboa. Mas desde que a igreja de Roma decapitou Prisciliano, a imaginação ficou no lado de lá.

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