Neste capítulo irão
fazer-se referências breves a algumas quintas existentes na cidade e no seu
termo, pelo que, interessará dissecar o conceito.
«Sobre a origem do
conceito «quinta» contamos com o precioso estudo de Alberto Sampaio - As Vilas do Norte de Portugal, obra
editada em 1923. Segundo este investigador vimaranense foi o processo de
desagregação das vilas romanas
na Alta Idade Média que originou a formação de várias “subunidades culturais”
designadas por casales, quintanas ou quintas,
e vilares. O casal era
uma pequena parcela de terreno arrendado (com casa) ao caseiro “de casariius”. As subunidades
agrícolas: quintana, quintanale ou quintal (“gleba hortícola
junto a uma casa”) designavam uma “superfície
de cinco ou de um múltiplo de cinco
medidas agrárias”. Os vocábulos quinta
/quintã traduzem a mesma realidade económica, fundiária e até
sociológica. A quinta funcionava
como um prazo ou casal e, dependendo do tipo de
propriedade, podia incorporar várias parcelas dispersas constituídas por casais, quintas, quintãs, vilares (…). Segundo Aurélio de Oliveira, este
“tipo de estrutura orgânica” foi consolidada no período medieval, sendo
composta por uma unidade central que “muitas
vezes herdou diretamente o nome do assento da antiga domus ou paço ou residência do senhor”, ou ao
“assento da grande casa ou solar”.
Geralmente estava ligada a uma parcela de terreno de dimensões reduzidas que
fazia parte do domínio eminente e
funcionava como uma unidade
administrativa ou prestamista.
As restantes parcelas de terrenos formavam o domínio útil sendo alienada a terceiros sob a modalidade do foro ou da simples colónia. A prática desta modalidade de exploração
agrária, dominada por uma aristocracia terratenente, militar e religiosa
vigorou no Antigo Regime até às leis da desamortização (1832-1834).»
Com a devida vénia
ao Professor Manuel Almeida Carneiro; Dissertação de Doutoramento, 2016
No âmbito das matérias a tratar seguidamente, importa
dissecar outras realidades de carácter toponímico e de divisão administrativa,
como sejam, o Casal o Lugar e a Aldeia.
Referente à primeira insere-se o conceito de casal que deve
ser entendido como aglomerado populacional que etimologicamente deriva de casa.
Casal significará então:
1. Conjunto de propriedades duma família;
2. Propriedade rústica = Quinta ou Herdade;
3. Pequeno povoado;
4. Pequena propriedade murada e produtiva não longe da
residência (significado regional transmontano).
Estes aglomerados populacionais partiam duma Casa e cresciam
em volta dela tornando-se nalguns casos lugares de maiores dimensões que foram
depois assumindo classificações de aldeias, vilas etc.
Oficialmente a classificação de aldeia não existe mas sim a
de lugar que representa um aglomerado populacional de pelo menos 15 habitações
ocupadas não distantes entre si de mais de 100 metros.
A classificação de aldeia, vila, cidade é já uma
nomenclatura de divisão administrativa que corresponde a aglomerados com um
número mínimo de habitações contíguas, um mínimo de população e a existência de
determinados serviços às populações.
Por outro lado, uma
personalidade que passará a ser diversas vezes referida é Robert Chester Smith.
Este cidadão
estado-unidense, nascido em Cranfort (New Jersey) em 1912, no seio de uma
abastada família norte-americana, tornou-se a partir da década de 40 do século
XX, um dos maiores especialistas internacionais em arte portuguesa, tendo
também dedicado uma parte da sua vida, ao estudo da arte monumental brasileira.
Na Exposição do
Mundo Português participou como delegado dos Estados Unidos. Deixou ainda um
legado imenso de fotos de monumentos e igrejas, etc.
Sobre o Porto e as
suas quintas, dizia Júlio César Machado na sua obra “Scenas da minha Terra”:
«Diz-se geralmente que é para sentir que no Porto, nem mesmo nos arrabaldes, haja quintas: quintas? Como: quintas? quintas, para que, — se o paiz por si só é uma quinta, a maior das quintas, uma quinta em grande! Eu nunca por ali olhei para um lado ou para outro, que não visse arvores a erguerem-se! É uma vegetação esplendida, de que não tem, não podem ter ideia os que nunca saíram de Lisboa!»
«Diz-se geralmente que é para sentir que no Porto, nem mesmo nos arrabaldes, haja quintas: quintas? Como: quintas? quintas, para que, — se o paiz por si só é uma quinta, a maior das quintas, uma quinta em grande! Eu nunca por ali olhei para um lado ou para outro, que não visse arvores a erguerem-se! É uma vegetação esplendida, de que não tem, não podem ter ideia os que nunca saíram de Lisboa!»
20.1 Quinta do RIO
A Quinta do Rio, inicialmente chamada Casal do Moinho,
situa-se na freguesia de Ramalde, em Ramalde do Meio, entre a Travessa de
Requesende e a Rua Direita do Viso, junto da bifurcação dos dois ribeiros que
formam o espesso caudal da Ribeira da Granja, ou do Rio da Granja que deu nome
à referida propriedade, no antigo Lugar do Moinho.
Foi então o rio que
deu nome à propriedade, também conhecida por Quinta da Ponte por se situar
junto da antiga travessia que unia a antiga estrada da Senhora da Hora ao
centro da cidade do Porto, como vem assinalado na Planta da cidade do Porto e
arredores.
Quinta do Rio - Ed.
Teófilo Rego 1958
A Quinta do Rio é constituída, além do vasto espaço verde de
pomar, horta, jardim e campos agrícolas, por um conjunto de edifícios de que se
destacam o núcleo habitacional e a capela.
Sobre a sua história, a denominada, a partir da década de 1880, como Quinta dos
Meireles, sabe-se que fora do Capitão Manoel da Silva Guimarães, homem de negócios e morador em
“Sima do Muro dos Banhos”, na cidade do Porto, que edificara a Capela
Setecentista de invocação a Santo António.
“Para a fábrica da
capela, Manoel da Silva Guimarães tinha de assegurar património suficiente para
a manutenção dos ofícios divinos. Para esse efeito, adquiriu a Damião de Sousa
Botelho Lucena, seis leiras de terra lavradia e de mato, mais as bouças: dos Outeiros, do Padrão, da Cancela,
da Feiteira, da Detrás e a bouça Da Metade, localizadas na freguesia
de Leça do Balio75, por 39.300 réis76. O rendimento anual destes prédios
atingia os quatrocentos mil réis, para garantir a manutenção do culto com
«bom ornato e decência».”
Fonte: Manuel Almeida Carneiro
Manoel da Silva Guimarães contrai matrimónio em 17 de Setembro de 1756, com Antónia Maria de Jesus.
No respectivo contrato de casamento, o noivo entrou com "1 conto e 400 mil réis" e a noiva foi dotada de algumas leiras e pelo Casal do Moinho, propriedade foreira do Marquês de Abrantes e de Fontes, a título de prazo de vidas com uma renda anual de: três alqueires de trigo, quatro alqueires de centeio, quatro
e meio alqueires de milho, quinze alqueires de cevada, um carro de palha triga
e uma galinha. Domínio de vinte um.
O Casal do Moinho era então constituído pelos
seguintes prédios:
Pomar de Cima, Campo de Meio ou cortinha de Baixo, Bouça da Fonte, Bouça Grande, Campo da Bouça do Meio, Campo de Feital, Campo do Rio, Bouça do Paúl e Campo da Cavadinha.
Pomar de Cima, Campo de Meio ou cortinha de Baixo, Bouça da Fonte, Bouça Grande, Campo da Bouça do Meio, Campo de Feital, Campo do Rio, Bouça do Paúl e Campo da Cavadinha.
A 1 de Setembro de 1759, Manoel da Silva Guimarães, é dado
como alferes e morador na
Quinta do Rio. Ascendeu ao posto de Capitão das Ordenanças e recebeu a patente,
do Brigadeiro das Armas do Partido do Porto, João de Almada e Melo, a 16 de
Julho de 1760, com todas as «honras,
privilégios, liberdades, isenções e franquezas».
A 17 de Agosto de 1774, na quinta do Rio, na Freguesia de
Ramalde do Julgado de Bouças, é feita uma escritura de dote de casamento, por
Manoel da Silva Guimarães e sua mulher, a sua filha Dona Ana Maria Joaquina,
para casar com o capitão José Gonçalves Lopes, acto ao qual esteve presente a mãe do noivo, Ana Maria do Espírito Santo, viúva de Domingos Gonçalves Lopes.
Para esse efeito, deslocou-se, propositadamente, até à quinta
do Rio, o tabelião.
José Gonçalves Lopes, capitão-mor do couto de Leça
do Balio, era quem administrava a Quinta de Sam Thiago, em Custóias.
“O Capitão Manoel da Silva Guimarães lavrou testamento a 30
de Setembro de 1781 e após o seu falecimento, sucedeu no governo da Casa o seu filho homónimo que também
enveredou pela carreira das armas no Regimento de Milícias da cidade do Porto. Em
19 de Outubro de 1811, Manoel da Silva Guimarães (II) reformou-se no Posto de
Major com o aval do Príncipe Regente. Faleceu em 1818, no estado de solteiro,
mas tinha um filho que foi desvalido na Roda dos Expostos da cidade do Porto e que
veio a suceder na Casa após ter sido legitimado por testamento.
O Auto de Posse de todos os prazos de vidas da Quinta do Rio, datado de 1818, permitiu a Manoel da Silva Guimarães (III) tornar-se o herdeiro universal dos bens do seu progenitor. Tendo sido exposto na Roda, o então Segundo Sargento da Segunda Companhia do Batalhão de Caçadores Número Nove, tornou-se o sucessor directo «[de] todas as propriedades da mencionada Quinta (…)»”.
O Auto de Posse de todos os prazos de vidas da Quinta do Rio, datado de 1818, permitiu a Manoel da Silva Guimarães (III) tornar-se o herdeiro universal dos bens do seu progenitor. Tendo sido exposto na Roda, o então Segundo Sargento da Segunda Companhia do Batalhão de Caçadores Número Nove, tornou-se o sucessor directo «[de] todas as propriedades da mencionada Quinta (…)»”.
Cortesia do Dr. Manuel Almeida Carneiro
Para além da Quinta do Rio, o património da Casa incluía
também a «Propriedade do Seixo», que ficava em Ramalde, e a «Quinta da Devesa»
localizada junto à Estrada Velha de Braga, em S. Mamede de Infesta.
Manoel da Silva Guimarães (III) não tem descendentes, acabando os seus bens por beneficiar uma sua prima, em 2º grau, Marcelina Nogueira da Silva Guimarães.
Manoel da Silva Guimarães (III) não tem descendentes, acabando os seus bens por beneficiar uma sua prima, em 2º grau, Marcelina Nogueira da Silva Guimarães.
Segundo a tese de doutoramento do Dr. Manuel
Almeida Carneiro, em meados do século XIX a propriedade pertenceu a um filho de
Jacinto da Silva Pereira fundador da Fábrica de Fiação e Tecidos Jacinto, de
seu nome Henrique da Silva Pereira Magalhães em virtude do seu matrimónio
concertado com Marcelina Nogueira da Silva Guimarães, filha de Joaquim
Francisco da Conceição e de Ana Nogueira dos Reis, moradores no Lugar de
Gondivai, na freguesia de Leça do Balio. Para ter acesso à herança, a
herdeira-sucessora, Marcelina Guimarães devia dar de entrada sete ou
oito contos de réis, como garantia das obrigações de dívida eventualmente
existentes em nome de Manuel da Silva Guimarães (neto do capitão de
ordenanças), seu segundo primo.
Em 11 de Abril de 1857, Henrique da Silva Pereira Magalhães
pediu ao Bispado a cessação do culto religioso na sua capela, em virtude da «mui
pouca concorrencia do pôvo, pois que até mesmo em alguns dias se acha
devoluta, e somente com a familia do suplicante.
O casamento de Henrique com Marcelina, durou pouco e dele
resultou a orfandade de três filhos menores, um rapaz e duas raparigas. O rapaz
viria a falecer com 19 anos no Brasil, e as suas irmãs assegurariam a
continuidade do património familiar e aliando-se pelo matrimónio à família da
Quinta das Virtudes.
Emília da Silva Pereira Magalhães casou com Artur de Azevedo
Meireles e Júlia da Silva Pereira Magalhães casou com Álvaro de Azevedo
Meireles. Desde então, o património ficou na posse dos herdeiros da Casa até
aos anos de 1985.
“Em 1985, o imóvel já se encontrava numa situação de abandono e semi-arruinado. Foi também
nesse ano que a Quinta do Rio recebeu o estatuto de Imóvel Classificado de Interesse
Público, depois de um conturbado processo de expropriação desencadeado
pelo Estado que punha em causa a sua preservação e salvaguarda. Posteriormente
o imóvel foi adquirido por Artur Brás que o reabilitou para fins de residência
e a obra ficou a cargo do arquitecto Manuel Teixeira de Carvalho”.
Com a devida vénia a Manuel Almeida Carneiro
Casa da Quinta do Rio em 1966 (alçado poente, o andar e a
eira) – Fonte: Manuel Almeida Carneiro, Mestre em Arqueologia, Faculdade de
Letras da Universidade do Porto
Quinta do Rio,
passadiço e fonte à esquerda - Ed. João Vieira Caldas, “Casa Rural”
Quinta do Rio na actualidade - Ed. Google Maps
Esquema representativo da área de implantação da Quinta do
Rio – Ed. Manuel Almeida Carneiro, 2003
Legenda:
A – Casa Nobre
B – Estrebarias
C – Capela
D – Casa secundária
E – Casa dos caseiros
F – Anexos de Lavoura
G – Casa-celeiro
H – Casa-celeiro
I – Eira
J – Área ajardinada
L – Tanque
M – Casa do Moinho
P – Poço
Casa da Quinta do Rio – Ed. “lifecooler.com/”
“A casa de granito
assenta em base rochosa. O primeiro piso era utilizado para habitação. O piso
térreo funcionava com arrecadações e estábulos. Exteriormente, o corpo central
é dividido por pilastras com uma porta ao meio emoldurada e com um óculo.
A quinta do Rio foi
vendida por Mª Isabel Perdigão a Artur Armindo Rola Sousa Bráz em 1987. Em 1988
a casa sofreu obras de reabilitação e restauro.
Considerado Imóvel de
Interesse Público pelo Dec. nº 45/93, DR 280 de 30 Novembro 1993.”
Fonte: “lifecooler.com/”
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