O Lugar de Fradelos situou-se onde hoje se cruzam as ruas
Guedes de Azevedo e Sá da Bandeira.
Ao cimo da Rua de Sá da Bandeira, actualmente – Fonte:
Google maps
O topónimo Fradelos é muito antigo.
Há quem diga que Fradelos é o mesmo que fradinhos, ou seja,
uma referência à existência de um pequeno convento, um conventinho, de meia
dúzia de frades e daí, a carinhosa alusão aos fradinhos que viria a dar
Fradelos.
Um documento que atesta a antiguidade do topónimo Fradelos é
datado do ano de 1283, do cartório do cabido da Sé do Porto. Nele se diz que,
em data anterior àquele ano, os cidadãos Pedro Soeiro Castrelo e Mem Mouro
haviam deixado, "ao ilustre Cabido, a herdade que possuíam no lugar de
Fradelos, "com a obrigação de um aniversário", ou seja, com o
compromisso de a data da morte dos doadores ser celebrada pelo cabido com uma
missa.
Ora, os cónegos que no seu conjunto formam o cabido
deliberaram, logo a seguir, dividir a propriedade em duas, formando dois
casais, que mantiveram cada um deles o nome de Fradelos.
No século XV, um desses casais pertencia aos antepassados do
célebre Brás Cubas, um ilustre portuense que, no Brasil, fundou a cidade de
Santos.
No século XVII, possuía esse mesmo casal, o tesoureiro da
Sé da Guarda, um tal Dr. João Freire de Melo, que ali tinha a sua residência
e, anexa a esta, uma capela da invocação de Santa Catarina (de Alexandria)
que, muito provavelmente, terá dado origem ao nome da actual Rua de Santa
Catarina.
A Capela das Almas também dedicada a Catarina de Alexandria,
situada próxima, na Rua de Santa Catarina, é mais recente, pois só foi começada
a levantar no início do século XVIII.
O outro casal, em 1739, pertencia a D. Catarina
Luísa Cardoso, casada com António de Magalhães e Meneses.
A zona de Fradelos, naquele tempo, ficava nos arrabaldes do
Porto e estava situada num ponto bastante elevado ou seja, no cimo de um pequeno
monte, em terreno acidentado, junto do qual corria um ribeiro que tomou o nome
do sítio e, por isso, se chamava de ribeiro de Fradelos, vindo da zona da
Fontinha e que ia desaguar, como ainda acontece hoje, mas devidamente encanado,
em frente à Igreja dos Congregados. É um dos pequenos ribeiros que se juntam no
subsolo da Praça de Almeida Garrett e formam o célebre rio da Vila.
Por aqui, também viveu na sua Quinta das Hortas, o padre
Manoel de Passos Castro, que desempenhava o alto cargo de tesoureiro-mor da
Colegiada de Cedofeita que, após a sua morte, deixou uma choruda herança, da
qual, uma parte seria utilizada para levantar em S. Lázaro, o Recolhimento das
Orfãs.
O lugar ficou conhecido pela sua capela erigida em 1804,
junto à Fonte de Fradelos, por iniciativa do padre Manuel Pinto Barbosa, um
devoto de Nossa Senhora da Boa Hora,
para nela ser recolhida e venerada uma imagem da santa, que se encontrava numa
edícula, junto daquela fonte.
Esse local, amplo,
chegou a ser conhecido por Largo de Fradelos.
A capela de Fradelos viria a ter um lugar
especial no coração dos portuenses, pois, no dia da festa da Ascensão do
Senhor, em 11 de Maio de 1809, foram erigidas preces ao céu, para que os
franceses abandonassem a cidade, que eles vinham ocupando, o que viria a
acontecer, de facto, no dia seguinte.
Os franceses retiram tão depressa que, segundo o jornal “Periódico dos Pobres”, o jantar que Soult se preparava para comer no Palácio das Carrancas, seria saboreado por sir Wellesley.
Pelo menos até 1819, todos os anos, na festa da Ascensão, houve uma cerimónia de acção de graças na capela de Fradelos pelo “Milagre da Restauração”.
Os franceses retiram tão depressa que, segundo o jornal “Periódico dos Pobres”, o jantar que Soult se preparava para comer no Palácio das Carrancas, seria saboreado por sir Wellesley.
Pelo menos até 1819, todos os anos, na festa da Ascensão, houve uma cerimónia de acção de graças na capela de Fradelos pelo “Milagre da Restauração”.
Parte de planta do
lugar de Fradelos com o traçado das ruas e becos que o compõem, mandado fazer
por Manuel António da Fonseca e Gouveia para regularizar as artérias
desalinhadas, levantado por Luís Inácio de Barros Lima, em 1810 – Fonte: AHMP
Legenda
1. Rua de Santa
Catarina
2. Rua do Bonjardim
3. Rua do Bolhão
(actual Rua Fernandes Tomás)
4. Viela de Fradelos
(percurso correspondente hoje à Rua de Sá da Bandeira)
5. Travessa para
Fradelos (percurso correspondente hoje à Rua do Bolhão)
6. Travessa de
Fradelos (percurso correspondente hoje à Rua Guedes de Azevedo)
A. Capela das Almas
B. Fonte do Bolhão
C. Capela de
Fradelos (antiga)
T1. Fábrica de
Curtumes
T2. Fábrica de
Chitas
X. Local de
implantação futura do mercado do Bolhão
F. Fonte de Fradelos
Planta entre o Largo
de Fradelos e Rua Fernandes Tomás, em 1846 – Fonte: AHMP
Legenda
1. Rua de Santa
Catarina
3. Rua do Bolhão
4. Viela do Ribeiro
(Viela de Fradelos)
5. Travessa do
Bolhão (Travessa para Fradelos)
6. Rua de Fradelos
(Travessa de Fradelos)
B. Fonte do Bolhão
C. Capela de
Fradelos
F. Fonte de Fradelos
T1. Fábrica da Sola
de Custódio Nogueira
T2. Fábrica das
Chitas de Domingos José de Chaves
T3. Propriedades de
D. Rita Braga
W. Local de
implantação da Fundição do Bolhão
Primitiva capela de Fradelos – Desenho de Tito Jorge de
Carvalho Malta (1835-1898, médico)
A gravura acima mostra a capela de Fradelos no seu local
primitivo de implantação, já dotada, aparentemente, das obras começadas em 1849 e
concluídas em 1851, pois, do lado esquerdo, parece divisar-se uma sacristia. A
elevação de terreno, atrás, será o Monte das Musas.
Com aquelas obras que tiveram o empenho do secretário da confraria, Manuel Ramos Chaves Lameiro, a capela ficou dotada de uma capela-mor mais profunda, mais dois altares laterais, uma nova e mais ampla torre, que só tinha lugar para dois sinos e passou a suportar quatro.
A capela passou a apresentar então, dois púlpitos e um grande coro.
A partir de 1854, começa a ser pensado uma ligação entre a
Rua do Bonjardim e a Rua de Santa Catarina, aproveitando o leito da Travessa de
Fradelos, no que viria a ser, anos mais tarde, a Rua de Fradelos.
Plano (editado) traçado
para sobre ele se estabelecer o alinho da rua que se projeta rasgar desde a Rua
do Bonjardim á Rua de Santa Catarina – Fonte: AHMP
Legenda
2. Rua do Bonjardim
6. Travessa de Fradelos
F. Fonte de Fradelos
C. Capela de Fradelos
Obs. O percurso ladeado a amarelo realça a ligação
pretendida
Em Junho de 1861, a poucos metros da Rua do Bonjardim, Manuel
José da Cruz Magalhães oferecia à edilidade uma porção de terreno, onde tinha
um lagar (a transferir).
A Rua de Fradelos continuava por realizar.
Acima, pode observar-se a composição da mesa administrativa da capela da Senhora da Boa Hora, cujo provedor, o conde de Lagoaça, tinha sido presidente da Câmara do Porto entre 1858 e 1865.
Com a remodelação, um pouco morosa, do Largo de Fradelos e
envolvente, a primitiva capela seria, com a ajuda da Câmara Municipal, removida
para o local onde hoje se encontra, na última década do século XIX. Assim, em 1889, devido ao seu
estado de ruína foi decidido construir uma outra, no mesmo local, que ainda
hoje se mantem de pé.
Os trabalhos de edificação de uma nova capela começaram em
1890, sendo os trabalhos concluídos, três anos depois, e inaugurado o novo
templo, com a solenidade possível, em 9 de Julho de 1893.
Em 1929, ocorre a execução pela Fábrica do Carvalhinho dos
painéis de azulejo na parte inferior do coro e, em 1931, a execução pela
fábrica Lusitana, em Lisboa, dos painéis de azulejo da capela-mor, quando era
capelão o padre Matos Soares.
Capela (implantada no seu novo chão) e Largo de Fradelos –
Postal de Alberto Ferreira
Na foto acima, pode observar-se o aspecto da envolvente à
capela, antes da abertura da ligação da Rua de Fradelos à Rua de Santa
Catarina.
Assim, na zona fronteira ao templo, no sentido transversal,
por onde corria a ribeira de Fradelos, o terreno apresentava também um desnível
que era aproveitado, por isso, como entulheira municipal.
A ribeira de Fradelos nascia no Sítio da Fontinha e corria no Sítio de Fradelos entre o Monte das Carvalheiras (onde está o silo-auto), na margem direita, e o Monte de Santa Catarina (onde foram instalados os depósitos de água dos SMAS), na margem esquerda, dirigindo-se para o Bolhão e, depois, para a Porta de Carros, junto à igreja dos Congregados, para formar o rio da Vila.
É de notar que, ainda irá demorar alguns anos, para que seja
concretizada e traçada nestes terrenos a Rua de Sá da Bandeira, na sua ligação
à Rua Gonçalo Cristóvão, a partir da Rua de Fernandes Tomás.
A decisão para esta empreitada é tomada em 1924, após a
ocorrência de um incêndio nuns prédios da Rua de Fernandes Tomás.
A edificação situada nesta rua, a histórica Fundição do
Bolhão, seria a primeira a ser sacrificada.
Fradelos na planta (editada) de Teles Ferreira de 1892
Na planta acima, a capela já está no local para o qual foi
transladada, em 1877, vinda do local C,
de área próxima à Fonte de Fradelos (F),
em virtude da doação feita por João Guedes de Azevedo, que daria o seu nome ao
topónimo anterior de Rua de Fradelos, outrora caminho de Fradelos.
O trajecto ladeado a amarelo pretende mostrar como se
concretizará a ligação da Rua de Fradelos, à Rua de Santa Catarina.
O trajecto ladeado a vermelho é, grosso modo, o chão da
futura Rua de Sá da Bandeira.
A linha a azul mostra o trajecto da Ribeira de Fradelos e a
letra L posiciona uma entulheira municipal, aí existente.
Fradelos (1905)
Comparando a foto acima com a planta anterior, podemos
concluir que, a mulher em 1º plano (na planta, com a letra Y) se encontrará na
Rua de Fradelos, tendo à sua direita a Fundição de Fradelos e que:
1. Parece que se encontra em fase de construção a ligação à
Rua de Santa Catarina, já se divisando os prédios desta rua;
2. A ribeira de Fradelos estará, naquela ocasião,
completamente encanada;
3. A Fonte de Fradelos (não visível na foto) quando J. Bahia
Junior a visita, passado 3 anos, em 1908, é apenas uma bica.
4. Os prédios em primeiro plano, à esquerda da foto, foram
demolidos e hoje, é o local onde foi levantado o Silo-Auto.
Perspectiva actual da foto anterior – Fonte: Google maps
Fonte de Fradelos, em 1908 – Fonte: J. Bahia Júnior, 1908
Planta (editada) do local de Fradelos, em 1890 – Fonte: AHMP
Acima, observamos uma planta pertencente ao projecto de
regularização do Largo de Fradelos e do terreno da entulheira municipal (L), e de continuação da Rua de Fradelos até à
Rua de Santa Catarina, aprovado em reunião de Câmara em 1890-09-11.
Na planta está representada a Fonte de Fradelos (F).
Por aqui, também existiu desde o fim da década de 1870, a
Fundição de Fradelos.
Em Setembro de 1909, Dinis Joaquim Praça, dizendo-se único
proprietário na Travessa de Fradelos, pede para emparedar a via que ligava a
Rua do Bolhão e a então já, Rua Guedes de Azevedo.
Requerimento e planta que o acompanhava, referente à licença
camarária nº 282/1909
O engenheiro Dinis Joaquim Praça era, à época (1909), o
proprietário (desde 1892) da Fundição de
Fradelos, fundada em 1877, por António Lopes dos Santos.
A Fundição de Fradelos era especializada no fabrico de bocas
para incêndio e rega e ainda, em mictórios, localizando-se ao cimo (de um lado
e de outro) da Rua do Bolhão, na confluência com Guedes de Azevedo.
Pavimentação da Rua de Sá da Bandeira, próximo de Fradelos, em 1940, com capela de Fradelos, visível
Excelente estudo.
ResponderEliminarNuno V. Cruz
Muito obrigado pelo incentivo...vindo de quem vem, tem um valor acrescido.
ResponderEliminarCurioso que acabo de ler o seu último trabalho sobre S. Nicolau, que está, como de costume, excelente e não pude deixar de lhe endereçar os parabéns.
Um abraço.