segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

25.108 Movimento associativo dos estudantes universitários portuenses

 
“Associação de Estudantes do Porto” e “Associação Filantrópica dos Estudantes de Medicina do Porto”
 
 
A “Associação de Estudantes do Porto” foi fundada pelo estudante de engenharia, Pedro Alcântara de Andrade Morais, formado em Matemática pela Universidade de Coimbra e matriculado em Engenharia na Universidade do Porto.
A possibilidade de formação daquela associação foi gizada à mesa do Restaurante Portugal, fronteiro ao actual edifício da Reitoria, na Praça Gomes Teixeira (Praça dos Leões) e teria a sua concretização em Abril de 1911, sendo que, cerca de um mês antes, a 22 de Março, tinha a Academia Politécnica do Porto dado lugar à Universidade do Porto.
Para angariar fundos para dar existência à associação de estudantes, já em 1910, tinha um numeroso grupo de estudantes levado à cena, no palco do Teatro Águia de Ouro, uma engraçada revista intitulada “É dos Livros”, com letra do estudante de medicina Artur da Cunha Araújo e música do maestro Manuel Benjamim, cuja receita reverteria para as inerentes despesas de instalação da associação, que começaria por ter morada num prédio da Praça Carlos Alberto, onde se instalaria em 1935, o “Café Luso”.

 
 


Os vários compartimentos em que se dividia a casa compreendiam, sala de leitura, biblioteca, gabinete da direcção, secretaria e sala de jogos, sendo a renda mensal de cem escudos, com os lentes da Universidade a contribuírem com 10 escudos e os estudantes com 30 centavos. Os estudantes pobres estavam isentos do pagamento de quota.
A maioria dos estudantes, à época, frequentava, nas imediações, o Restaurante Portugal e o Café Universidade.
Entretanto, e na mesma senda, alguns estudantes de medicina para ajudarem os estudantes mais necessitados, fundariam a “Associação Filantrópica dos Estudantes de Medicina do Porto”, fornecendo-lhes livros e pagando-lhes as propinas e acompanhando-os em caso de doença.
Esta associação de estudantes de medicina instalou-se na Praça Almeida Garrett, nº 14 (prédio do lado sul da nova passagem pedestre aberta para ligação da praça à antiga cerca dos padres Lóios).
Para fazer face às despesas, a associação lançava mão de actuações em diversos teatros, tendo até actuado no Teatro de S. Geraldo, em Braga, com a peça “Os Velhos”, com interpretações do conhecido e consagrado Vasco Verdial e ainda, Francisco Guimarães, Primavera Rodrigues e Maria do Patrocínio Tomás.
Da Praça Almeida Garrett, a associação transitou para a Rua do Almada, 358, e finalmente, para o Beco do Paço, à Praça do Duque de Beja (hoje conhecido, como Jardim do Carregal).

 
 
No prédio que ostenta o reclame esteve a “Associação Filantrópica dos Estudantes de Medicina do Porto”, na Rua do Almada – Fonte: Google maps
 
 
 
 
 
“Tuna Académica do Porto” e “Tuna Universitária do Porto” 
 
 
Aceitando-se o ano de 1888 como de surgimento duma tuna na academia portuense, na realidade, a primeira notícia que se conhece sobre a “Tuna Académica do Porto”, também conhecida por “Estudantina Académica do Porto”, data de 25 de Fevereiro de 1897, quando, em plena crise académica, em virtude de confrontos com as polícias, durante o carnaval desse ano, é noticiado que a “Tuna Académica do Porto” partia em digressão para Espanha.
Presidia ao grupo o estudante Félix Magalhães, do 5º ano de medicina, da Escola Médico-Cirúrgica do Porto e a estudantina teve ainda a companhia do seu grupo dramático-cómico, composto por César Viriato França, Francisco Ferreira Leitão, Luís Ferreira Gomes e Bernardo Dias Carvalho.
Antes, tinha chegado à secretária do Presidente da Academia de Santiago de Compostela uma carta, datada de 14 de Fevereiro de 1897, endereçada pelo presidente da “Estudantina Académica do Porto”, de cujo teor se dá conta a seguir:

In revista “O Tripeiro”, Vª série, ano VII, n.º 10 (Setembro de 1951), pág. 97
 
 
 
 
 
A chegada da estudantina a Santiago de Compostela ocorreu na noite de 28 de Fevereiro, tendo havido, antes, uma paragem em Pontevedra, onde no casino local foi “obrigada” a actuar a que se seguiu uma noitada no salão de baile.
Em Santiago de Compostela a sessão de boas-vindas ocorrida na universidade foi antecedida pela chegada, em apoteose, ao som de música e foguetes.
 
 
 
“Tuna Académica do Porto”, em 1897 – Fonte: Photo Moderna, In revista “O Tripeiro”, Vª série, ano VII, n.º 10 (Setembro de 1951), pág. 99
 
 
Em 6 de Julho de 1898, é noticiada uma homenagem, levada a efeito pela Tuna Académica do Porto, dirigida ao maestro Sousa Morais, a quem Santos Silva e Azevedo de Albuquerque entregam o diploma de sócio honorário da agremiação académica, como prova dos serviços prestados à Tuna e à cultura musical portuguesa.
Em 1902, é notícia uma outra digressão da Tuna Académica do Porto, por terras da Galiza, sob a regência Henrique Carneiro.
 
 
Jornal "A Voz Pública", em 6 de Janeiro de 1902


Tuna Académica do Porto, junto da igreja de Santo Ildefonso, em 1907



Até 1913, conhecem-se mais algumas actuações da Tuna Académica do Porto, mas, a partir daquele ano, não se tem notícias dela e, provavelmente, terá entrado em inactividade.
 
 
Tuna Académica do Porto, em 1909, na Galiza
 
 
A anterior e inactiva Tuna Académica reapareceria, em 1922, sob a regência de Modesto Osório, estudante da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, que viria a organizar a “Tuna Académica do Porto”, apresentando-a no Teatro Carlos Alberto.
A Tuna, para os seus espectáculos, servia-se várias vezes do Teatro Carlos Alberto, mas chegou a actuar, também, no Teatro D. Afonso Henriques, em Guimarães.
A morte prematura de Modesto Osório mergulharia, novamente, a Tuna no caos e na desorganização.
Surgiria, de novo, em 1937, com a designação de “Tuna Universitária do Porto”, sob a batuta do Maestro Afonso Valentim, sendo, no entanto, efémera a sua existência.
Mais tarde, em Novembro de 1960, um grupo de Orfeonistas, desejosos de reatar a tradição, organizou um “Agrupamento” que actuou em todos os Saraus do Orfeão Universitário do Porto realizados no ano de 1960-61, sob o nome de Orquestra Típica.
A sede da Tuna e do Orfeão foi no Largo Moinho de Vento, onde se juntaria a Associação de Estudantes, que abandonaria a Praça Carlos Alberto, após o falecimento do seu fundador.
 
 
 
“Orfeão Académico do Porto” e “Orfeão Universitário do Porto”
 
 
O “Orfeão Académico do Porto” foi fundado em 6 de Março de 1912, nas comemorações do primeiro aniversário da Universidade do Porto.


“Desde 1864, data em que pelo Dr. Aires Borges foi escrito para um agrupamento coral, o «Hino Académico», que na Academia Portuense existia uma tradição orfeónica que, apesar disso, só em 1912 passou a ter tradução efectiva.
A 6 de Março de 1912, após animada e concorrida Assembleia Magna, realizada na Nave do Palácio de Cristal, fundara-se no Porto o Orfeão Académico, sendo atribuída a direcção artística ao ilustre regente Fernando Moutinho. Rapidamente surgiram candidatos e os 200 inscritos foram seleccionados e ensaiados na antiga sala de concertos do Orfeão Portuense à Rua do Laranjal, típica artéria do velho burgo portuense que ligava a Trindade à Praça Nova.
(…) Em Março de 1937, o maestro Afonso Valentim aceitou o encargo de ensaiar um grupo dedicado de rapazes e raparigas da nossa Universidade, satisfazendo o desejo formulado pelo Reitor Pereira Salgado.
E, a 15 de Abril do mesmo ano, decorrido pouco mais de mês e meio, é realizada uma Récita de Gala no teatro Rivoli em comemoração do 1º Centenário da Academia Politécnica é Escola Médico Cirúrgica do Porto, em que se faz ouvir, pela primeira vez, o Orfeão Universitário do Porto.
Revista mensal do Orfeão Universitário do Porto (Março de 1963, nº4)
 
 
 
 
O "Orpheon Académico do Porto", assim denominado nessa época, surgiu com o intuito de interpretar exclusivamente música portuguesa, contribuindo para o início de um período de renovada valorização da canção portuguesa. O seu primeiro director artístico foi o Maestro Fernando Moutinho. Sucederam-lhe o Eng. Futuro Barroso, o Dr. Clemente Ramos e, já nos anos trinta, o Maestro Afonso Valentim, que assumiria o cargo durante trinta anos.



Orfeão Académico do Porto, em 1912
 
 
“Nas Comemorações do Centenário da Academia Politécnica e da Escola Médico-Cirúrgica do Porto, em março de 1937, o Maestro Afonso Valentim assume o cargo de regente do então chamado Orfeão Académico da Universidade do Porto que, depois de reformulado, foi o primeiro grupo coral universitário a apresentar naipes femininos.
Apesar da sua existência atribulada, a ideia de um Orfeão Académico persistiu e em 1942, reorganizado, ressurge em novos moldes com o nome de Orfeão Universitário do Porto.
É por esta altura, 1945, que pela primeira vez as universitárias passam a envergar o ainda atual traje académico, posteriormente adotado noutras universidades.
É também ao longo da década de 40 que o Orfeão passa a incluir regularmente nos seus espetáculos a Tuna Universitária do Porto, o fado académico, a orquestra de tangos, entreatos e rábulas humorísticas. Surgem também Grupos de Bailados e Cantares Regionais, passando o Orfeão a dedicar o maior interesse à divulgação do folclore nacional, através de recolhas etnográficas junto das diversas regiões do nosso país, procurando melhorar e aprofundar o reportório e a qualidade de cada grupo, dispondo hoje em dia de um valioso espólio de trajes regionais.
O Maestro Afonso Valentim manteve-se como regente até 1967, sucedendo-lhe os Maestros Günther Argleb (1967/1969), Fernando Jorge Azevedo (1969/1973) e Mário Mateus (1973/2006), sendo o Maestro António Sérgio Ferreira o atual regente.
O Orfeão Universitário do Porto comemorou, em 2012, um século de existência.”
Fonte: “orfeao.up.pt/”
 
 
 
Em 1942, o Orfeão Académico ressurge com o nome de Orfeão Universitário do Porto.
O Orfeão Universitário do Porto já teve actuações nos Estados Unidos da América, Brasil, Venezuela, Angola, Moçambique, Cabo Verde, África do Sul, França, Itália, Grécia, Inglaterra, Alemanha, Polónia, Suíça, Holanda, China, Hong-Kong, Índia, Macau, Malásia e Tailândia, entre outros.

 
 
Bandeira do Orfeão Universitário do Porto
 
 
 
Antigas instalações das oficinas de mecânica da Faculdade de Engenharia do Porto, na Rua dos Bragas, 289, sede actual do Orfeão Universitário do Porto
 
 
 
Lutas estudantis
 
 
 
No começo dos anos 20, assiste-se a um ressurgir da actividade da Academia Portuense sendo prova disso a disseminação do uso de capa e batina, a reorganização da Associação dos Estudantes, a criação do jornal "Porto Académico", sendo, esse, o período áureo do Orfeão e da Tuna.
 
 
 
“Em 1928 a Faculdade de Letras (politicamente indesejável) é extinta pelo governo da Ditadura (continuaria a funcionar até 1932 só para permitir aos alunos inscritos que terminassem os seus cursos); o Orfeão e a Tuna desaparecem em 1930, no rescaldo de sérios confrontos entre estudantes e a polícia, de que resultou a morte de um académico; o Porto Académico deixa de se publicar também nesse ano de 1930; a Associação Académica é extinta por despacho ministerial de 24 de Novembro de 1932. Os organismos que tinham sido os grandes bastiões da vida académica, e até uma das cinco faculdades da Universidade, desapareciam”.
 
 
Não se pense que, apenas, durante a ditadura do Estado Novo, ocorreram contestações estudantis.
Em 1897, durante o período do carnaval desse ano, a academia esteve a ferro e fogo.
Assim, no dia 19 de Fevereiro daquele ano, os estudantes da Politécnica iniciam os festejos da quadra carnavalesca. Com aquela escola como quartel-general, lançam sobre os passantes, grossa metralha de toda a qualidade. A “futricada tripeira” irrita-se, reage e a brincadeira descamba num arraial de pancadaria.
Uma força da Guarda da Cadeia e a infantaria e cavalaria da Guarda Municipal acode e a festa termina no Hospital da Misericórdia (Santo António), ali perto.
Nos dias seguintes, os confrontos continuaram e a Polícia recebe ordens para acabar com os desmandos, a qualquer preço.
No dia 23, os estudantes montando uns longos paus e com as cabeças cobertas por tigelas de barro, à laia de capacetes e munidos de colheres de pau, imitando espadas, são confrontados na Rua de Sá da Bandeira por uma barragem policial e as vítimas dos confrontos acontecidos recebem assistência nas farmácias da baixa e no posto da “Inspecção de Incêndios” que ficava atrás da Câmara Municipal, junto à capela dos Reis Magos.
A situação piorava de dia para dia, como nos dá conta um texto resumo, inserido na revista “O Tripeiro”, Vª série, II ano, 10 Fevereiro de 1947, que a seguir se apresenta:
 
 





No dia 3 de Março, dia seguinte à 3ª Feira de carnaval, reuniria num prédio da Rua do Laranjal a Comissão Académica de Resistência, para tratar do conflito, cujo auge, foi a 24 de Fevereiro, com a invasão da Politécnica.
Após, Santos Silva, que presidiu à reunião, e os estudantes Manuel Carvalho e Freitas Sanches terem informado das diligências feitas para desagravar a academia, ficou decidido o retorno às aulas.
No dia 6 de Março, é dado por concluído o inquérito, sendo os autos entregues no Governo Civil que, face à proposta do inquiridor, resolveu arquivar o processo.

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