“Esta visita do rei,
«para assistir às manobras militares, chamou a atenção de todo o paiz para a
povoação de Vallongo, até então principalmente afamada pela beleza das suas
padeiras e pelo sabor dos seus biscoitos» Alberto Pimentel (1894)
Mas Sobrado, igualmente, foi notícia e andou nas páginas dos
jornais, pelas manobras militares ocorridas no Lugar da Balsa em 1893.
Este lugar já era conhecido por, em 1860, aí se ter
inaugurado a Fábrica de Fiação da Balsa, um marco da indústria portuguesa,
especialmente da região Norte porque foi equipada com máquina de vapor e que utilizava,
também, as águas do rio Ferreira como força motriz. Foi uma das primeiras
unidades do género no norte do país e a primeira no concelho de Valongo.
Haveria de encerrar cerca de 100 anos depois.
“Em setembro de 1893,
portanto há 123 anos, Sobrado teve visita do rei D. Carlos. A sua deslocação a
esta terra teve como intuito o acompanhamento de exercícios militares que se
desenvolveram no lugar da Balsa.
Vários foram os
periódicos que noticiaram os exercícios da Balsa. Inclusive os Caminhos de
Ferro do Minho e Douro colocaram uma carruagem à disposição dos repórteres que
fizeram a cobertura do acontecimento.
No dia 19 de setembro,
D. Carlos chegou ao Porto de manhã e seguiu, acompanhado pelo ministro de
guerra, para Valongo, onde permaneceu, dentro da carruagem, uma hora e meia
devido à chuva e trovoada. Em Sobrado, pernoitou na residência do abade António
Thomé de Castro, onde houve um jantar e, no dia seguinte, um almoço real com
brindes. D. Carlos brindou à pátria e ao exército.
Residência do abade de Sobrado, em Setembro de 1893 - Álbum
fotográfico de Joaquim Bernardo Mendes (Visconde de Paredes), In Arquivo Municipal de Paredes/CMP; Fonte: Centro
de Documentação da Bugiada e Mouriscada
Varanda da residência do abade, em Setembro de 1893, com D.
Carlos no topo da mesa - Álbum fotográfico de Joaquim Bernardo Mendes (Visconde
de Paredes), In Arquivo Municipal de Paredes/CMP; Fonte: Centro de Documentação
da Bugiada e Mouriscada
Para os oficiais que
não tiveram lugar na casa do abade foram montadas barracas. Aliás
verificaram-se algumas dificuldades devido à muita chuva e à falta de casas
para acomodar gente e cavalos. O acantonamento ocorreu entre Sobrado e a Balsa.
Houve bivaque no pinhal das Córtes. E o rei visitou o acampamento e provou o
rancho.
Acampamento militar, em Setembro de 1893, em Valongo - Álbum
fotográfico de Joaquim Bernardo Mendes (Visconde de Paredes), In Arquivo Municipal de Paredes/CMP; Fonte: Centro
de Documentação da Bugiada e Mouriscada
Nas ruas o monarca
teve receção entusiasta e foi muito saudado, dada a muita concorrência de boa
gente. Das janelas, mulheres fartaram-se de lançar flores sobre D. Carlos e
toda a gente da terra quis beijar a sua mão.
No dia 20 dá-se o
regresso. O rei a cavalo, seguido do seu estado-maior, artilharia e trens,
vitorioso em todo o trajeto, entrou na cidade do Porto por volta das cinco da
tarde, partindo posteriormente em direção a Lisboa.
Espaço fronteiro à igreja matriz de Sobrado com militares e
populares, em Setembro de 1893 - Álbum fotográfico de Joaquim Bernardo Mendes
(Visconde de Paredes), In Arquivo
Municipal de Paredes/CMP; Fonte: Centro de Documentação da Bugiada e Mouriscada
No dia 27 seguinte, em
reunião da vereação da Câmara Municipal de Valongo, o presidente, referindo-se
às manobras na Balsa, indica que o acampamento se deu no lugar do Souto da
Igreja. O mesmo presidente, informou ainda os vereadores de que, em nome dos
seus munícipes, havia-se dirigido ao rei e ao ministro de guerra
oferecendo-lhes os seus serviços e a sua casa, o que ambos agradeceram.
Por esta mesma altura,
realizaram-se exercícios em larga escala em vários pontos do país. A ocorrência
destas manobras parece que teve por objetivo o fortalecimento de uma monarquia
já em decadência, tentando contrariar uma imprensa que não era tão favorável
como a que aqui serve de fonte documental, o caso do Diário Illustrado, que, de
certa forma, exalta a visita do rei a Sobrado.”
Fonte: “Sobrado - Comunidade | Facebook”
“O que é certo,
voltando á visita del-rei a Vallongo, é que as padeiras da povoação tiveram
então um momento de celebridade na pessoa de uma sua collega que se dirigiu ao
senhor D. Carlos, perguntando-lhe com uma ingenuidade de simples :
— Como vai v. s.ª , a
senhora e os meninos?
Um jornal portuense
reproduziu este episódio, creio que com mais ou menos phantasia, porque outro
jornal, O Commercio do Porto, limitou-se a dizer:
«Uma padeira de Vallongo
entrou na carruagem salão, com permissão de S. M., e alli um official
comprou-lhe uma das saborosas regueifas, especialidade d'aquela villa. A pobre
mulher, a tremer, cumprimentou el-rei, que, sorrindo, lhe dirigiu palavras
affectcuosas».
De mais a mais eu fico
desconfiado de que uma padeira de Vallongo, se fizesse aquelle cumprimento a
el-rei, em vez de vossa senhoria, teria dito vossemecê, que é o seu tratamento
habitual para toda a gente.
E não era certamente
n'um momento de atrapalhação que a vallongueira se lembraria de procurar um
tratamento mais conveniente para a pessoa de el-rei.
Como quer que fosse,
Vallongo esteve em evidencia, para Vallongo foram tropas, para Vallongo foi
el-rei, para Vallongo foi o snr. ministro da guerra, para Vallongo foram
dezenas de curiosos.
Já agora, a residência
parochial de Sobrado, onde o senhor D. Carlos se hospedou, ficará notável,
porque sob aquellas telhas pernoitou o rei de Portugal.
Visitas como esta são
indispensáveis no regimen de democratisação por que tem passado a realeza
moderna»
Um rei actual deve
saber como toda a gente vive, conhecer de perto a simplicidade parcimoniosa da
vida de provinda, porque o paiz não é unicamente a corte: ha factos domésticos
e factos económicos a estudar, ver- dades sociaes a estabelecer, defeitos de
organisação administrativa a corrigir.
Já pertence aos
domínios da opereta o tempo em que o rei perguntava a um valido:
- Que horas são?
e em que o valido
respondia todo curvo:
— São as horas que
vossa magestade quizer. Agora, no tempo era que estamos, um bom abbade minhoto,
abrindo a sua casa e o seu coração a el-rei, seria capaz, sem faltar ao
respeito devido ao chefe do estado, de responder áquella mesma pergunta cora
estas simples e sentenciosas palavras :
— São horas de olhar
por isto, meu senhor. Também já não fica a menor distancia o tempo em que o
famoso cozinheiro Vatel se suicidou por não haver peixe para o jantar que o
príncipe de Condé offerecia a Luiz XIV.
Agora o abbade de
Sobrado offereceu a el-rei o seu modesto leito á franceza, por não ter outro
melhor, e nem por isso tentou suicidar-se. E se a cama era tão estreita como os
jornaes noticiaram, el-rei, decerto, ficou fazendo bom conceito do snr. abbade
. . .”
Alberto Pimentel (1894); O Porto na Berlinda: Memórias d’Uma
Família Portuense. Porto: Livraria Internacional de Ernesto Chardron
Não fazia ideia que El Rei D.Carlos tinha estado por Valongo. Muito obrigado pela divulgação!
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