domingo, 3 de julho de 2022

25.161 Governo Militar do Porto e seu termo

 
Trem, Fortes e Fortins
 
Trem do Ouro
 
Os Trens eram depósitos de pólvora, salitre, munições, armas e artilharia, situados em fortalezas, castelos, em locais apropriados ao reabastecimento rápido das tropas.
Mais tarde, os Trens viriam a funcionar subordinados à arma de Artilharia, quando para além de depósitos eram, também, oficinas.
Em 1763, seria criado para o Porto o Regimento de Artilharia do Porto, que inicialmente tinha sido pensado formar a partir do 2º Regimento de Infantaria do Porto que, entretanto, se manteve.
Depois de uma reestruturação em 1766, o Regimento de Artilharia do Porto fica com um efectivo de 673 praças, incluindo os oficiais.
Em 1793, vieram para o Regimento de Artilharia do Porto três companhias: duas foram divididas pelas fortalezas existentes na área e a terceira (dos artífices) foi para os armazéns da antiga Administração de Intendência da Marinha.
O Trem da cidade passou, então, a ser identificado pelo local em que se encontrava instalado, por Trem da Ribeira do Ouro, ou Trem do Ouro, ou ainda Trem e Ferraria da Ribeira do Ouro.

 
 

Largo do Ouro e Estação do Ouro
 
 
Na foto acima observa-se, a meio, a estação de serviço afecta ao “americano” e onde, junto, se localizava desde há 100 anos antes, o Trem do Ouro. Neste local, durante o século XX, esteve também a Manutenção Militar.
Devido às necessidades crescentes de manutenção junto das fortalezas de Matosinhos, Foz e Castelo do Queijo, o Trem do Ouro tinha necessidade de se ampliar.
Assim, em 12 de Janeiro de 1802, seria feita uma proposta da autoria do coronel Carlos António Napion, para que fosse criada no Porto uma companhia de artífices, privativa do Trem, o que nunca viria a concretizar-se.
Finalmente, pela Carta Régia de 12 de Julho de 1802, era fundado, no Porto, o Arsenal Real do Exército que iria absorver o Trem, já sedeado na Estrada do Ouro, em Lordelo, junto à foz do Rio Douro.
Este Arsenal tutelaria os Trens das três províncias militares do Norte de Portugal (Trás-os-Montes, Minho e Beira), sobretudo no que dizia respeito aos provimentos. Estes provimentos consistiam no fornecimento de fardamentos, artilharia, munições e equipamento de guerra.
Nesse contexto foram dadas instruções à Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra para proceder a uma inspecção ao Trem, já existente no Porto, que pela sua localização e pela natureza do edifício, teria capacidade para lá se concentrarem artilharia, armas e munições para abastecimento das Praças de guerra das Províncias do Norte.
O Arsenal Real do Exército, no Porto, teve como seu primeiro director o major de artilharia Manuel Ribeiro de Araújo. (cit. revista “O Tripeiro”, V Série, Ano XIV, Maio 1958, pág. 18-24)
Em 1806, com uma nova reestruturação para o Porto, o antigo regimento de artilharia passa a ser o Regimento de Artilharia 4.

 
 
“O Regimento de Artilharia do Porto foi criado por Decreto de 12 de Maio de 1763 com aula respectiva, em Valença do Minho. Fixou o seu quartel em Viana em 1795 e no Porto a partir de 1801, regressando a Viana em 1802. Ficou conhecido também por Regimento de Artilharia de Valença ou Regimento de Artilharia de Viana. Por Decreto de 19 de Maio de 1806 passou a designar-se Regimento de Artilharia 4. Reorganizado no Porto pelo Edital de 30 de Setembro de 1808, fixou o seu quartel em Lisboa em 1809 e regressou ao Porto em 1814, sendo extinto por Decreto de 9 de Julho de 1829”.
Fonte: “ahm-exercito.defesa.gov.pt/”
 
 

 
À direita, a Rua do Ouro e a ilha do Frade, à esquerda, parcialmente visível, quando a Manutenção Militar, que abriria em 1937, ainda não tinha sido construída 

 
 
Forte de Nossa Senhora das Neves
 
 
No início do século XVI e, até antes, as preocupações dos governantes no capítulo da salvaguarda do território tinham aplicação prática na preparação de defesas para obstar aos ataques dos piratas que assolavam o litoral do país. Para o efeito, alguns fortins, fortes e outros baluartes foram surgindo ao longo da costa.
São exemplo na área do Porto e seu termo, o Fortim de Santa Catarina substituído, depois, pelo Forte da Senhora das Neves (Castelo de Leça, em Leça da Palmeira), o forte de S. Francisco Xavier (Castelo do Queijo) e o Forte de S. João Baptista da Foz do Douro (Castelo da Foz).
A partir da revolução de 1640, aquelas fortificações foram reforçadas, com a finalidade de defesa perante os espanhóis.

 
 

Cortesia de Francisco de Sales Loureiro

 
 


 
 
O texto anterior dá conta da preocupação vivida pelo governo central, em plena dinastia Filipina, que se traduziria pela decisão do levantamento, em 1638 ou 1639, do Fortim de Santa Catarina, em Leça da Palmeira.

 
 

Local, na Avenida de Antunes Guimarães, onde foi implantado o Fortim de Santa Catarina e onde, até ao fim do século XIX, esteve o Hotel Estefânia – Fonte: Google maps
 
 
 
Entretanto, já com o trono recuperado pelos portugueses, decidiram que o Fortim de Santa Catarina seria substituído por um outro mais robusto, começado a construir, em 1651, a algumas centenas de metros, e cuja construção se arrastaria ao longo das décadas seguintes, e se chamaria Forte de Nossa Senhora das Neves. As duas fortificações haveriam de coexistir durante os anos em que decorreu a construção deste último.
Assim, um relatório de 1701 dá conta de que a fortificação ainda se encontrava incompleta, embora artilhada com quatro peças e guarnecida por oito soldados sob o comando de um tenente. Acredita-se que o forte tenha sido concluído em 1720.
Tendo perdido a sua função militar, em pleno século XIX, aí se instalou em 1844, a Alfândega do Porto e, em 1899, a secretaria do Porto de Leixões, quando na sua área foram erguidos alguns edifícios para alojamento de pessoal.

 
 

Forte de Nossa Senhora das Neves, em Leça da Palmeira
 
 
 
 
Forte de S. João Baptista da Foz
 
 
Antes, de D. João IV ascender ao poder, em 1642, já tinha sido determinado, recuperar e remodelar a fortificação ineficiente que existia há décadas em S. João da Foz.
Esta fortaleza tinha sido construída no reinado de D. Sebastião, em 1570, quando o trono era ocupado pela regente, avó do monarca e esposa de D. João III.
Foi, então, quando ocorreu a demolição da capela renascentista aí existente, mandada erguer pelo bispo D. Miguel da Silva e da qual restaria, apenas, a capela-mor.
Adossada à referida capela, D. Miguel da Silva tinha mandado erguer um paço abacial para sua residência. Francisco de Cremona foi o responsável pelo traço de ambos os edifícios, tendo as obras sido iniciadas em 1527, e prolongadas até 1546.
No final do século XVII, em 1684, o forte estava guarnecida por 22 artilheiros, congregando seis regimentos de Cavalaria e dezoito de Infantaria, e continuava a ser uma estrutura de defesa importante do Porto e, até, da região Norte.
Durante a guerra civil, esteve sob o comando dos liberais afectos a D. Pedro IV, e juntamente com o Monte da Senhora da Luz foi possível fazer a defesa do pequeno porto de Carreiros, essencial para desembarque de pessoal, mantimentos e munições.
Com o passar do tempo, o forte perdeu a sua função defensiva passando a funcionar como prisão, por onde passaram na condicção de presos, ao longo dos anos, José de Seabra da Silva, José de Passos Manuel e o duque da Terceira.
No século XIX, perdeu o fosso e a ponte levadiça, e viu a foz do rio afastar-se por remoção de alguns penedos e areia, que rodeavam a fortaleza.
Actualmente, o Castelo da Foz é a sede do Instituto de Defesa Nacional.
 
 
 

Capela renascentista do forte de S. João Baptista da Foz - Ed. Isabel Silva
 
 
 

Forte de S. João Baptista da Foz, c. 1900
 
 
Este forte, com muita história, está sobretudo ligado a um episódio particular quando, durante a segunda invasão do exército francês, a 7 de Junho de 1808, o recém-nomeado Governador do Castelo de S. João da Foz, sargento-mor Raimundo José Pinheiro, manda içar ali a bandeira portuguesa, começando a revolta contra a ocupação francesa.
Nesse dia, ocorreria a retirada das tropas espanholas do Porto, que tinham acompanhado os franceses, mas que voltavam a Espanha na sequência da revolta acontecida em Madrid, a 2 de Maio, para reposição da independência dos espanhóis. Ficaria conhecida como a revolta do “2 de Maio”.
Devido a este facto, foi decidido festejar, todos os anos, a 7 de Junho de 1808, no Castelo da Foz, a Virgem do Rosário, pelo auxílio prestado na expulsão dos Franceses.
Em 1809, o Governo Inglês entregaria ao comandante Raimundo José Pinheiro uma espada de honra, pela forma como ele se conduziu nos dias 6 a 8 de Junho de 1808.
 
 
 

Castelo da Foz, em 1907
 
 
 
Forte de S. Francisco Xavier
 
 
Da mesma época, que o Forte de S. João Baptista da Foz, é o Forte de S. Francisco Xavier edificado num local onde inicialmente esteve um forte, no século XV que, dado o seu estado de ruína, em meados do século XVII, serviu como alicerce para esta fortificação marítima, erguida às custas da Câmara Municipal da cidade do Porto, durante a Guerra da Restauração da Independência Portuguesa (1640-1668).
Assente sobre um enorme rochedo, que dada a sua forma sugestiva, aparentava um queijo, viria por sugestão popular a ganhar a designação pelo qual o forte é conhecido – Castelo do Queijo.
Durante o conflito entre os irmãos, D. Miguel e D. Pedro IV, a fortaleza esteve ao serviço do usurpador da coroa.
Até 1910, esteve sob a jurisdição da Guarda-Fiscal.
Depois de uma ocupação entre 1944 e 1949, pela Junta de freguesia de Nevogilde foi cedido ao Núcleo da Brigada Naval da Legião Portuguesa, que aí esteve até 1975.
Actualmente, após restauro, encontra-se sob a guarda da delegação do Norte da Associação de Comandos, que ali mantém um pequeno museu histórico-militar e uma programação de eventos culturais e de animação, aberta ao público.
 
 

Forte de S. Francisco Xavier ou Castelo do Queijo, c. 1849 – Ed. Frederick William Flower

 
 

Vista aérea do Castelo do Queijo




Governadores das Armas, Terços e Quartéis

 
 
Com a Restauração do Reino, D. João IV nomeou Governadores das Armas para cada uma das províncias.
Um governador das armas constituía cada um dos comandantes territoriais.
No Exército Português, entre 1641 e 1836, cada governador das armas, tinha a seu cargo um governo das armas, sendo responsável pelas tropas estacionadas numa província.
O alcaide-mor era também o governador de uma província ou uma praça.
Durante as guerras da Restauração era a mais alta patente do exército português, seguindo-se-lhe, por ordem decrescente, mestre-de-campo general, general da cavalaria e general da artilharia.
Os governadores das armas sucederam aos antigos fronteiros-mores da Idade Média, que exerciam funções em territórios fronteiriços.
Em 1669, D. Pedro II criou o cargo de Governador de Comarca, figura semelhante à de Governador das Armas.
A 1 de Junho de 1678, surge o 1º Regimento relativo aos Governadores das Armas.
Até 1751, existiam seis governadores das armas, cada qual correspondendo a cada uma das seis províncias: Entre-Douro-e-Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura (este com o título de "Governador das Armas da Corte e Província da Estremadura"), Alentejo e Algarve (com o título de "Governador e Capitão-General do Algarve" até 1816 e "Governador das Armas do Reino do Algarve", a partir de então).
O Governo das Armas do Partido do Porto surge por Decreto de 19 de Julho de 1759, juntando-se aos seis governos de armas já existentes, com uma área geográfica específica para actuação. 
Com a extinção dos Governos das Armas, substituídos por Divisões Militares, de acordo como o Decreto de 26 de Novembro de 1836, o Governo das Armas do Partido do Porto deu origem à 3ª Divisão Militar.


Terços






Sobre o texto anterior, deve entender-se que as “Ordenanças” constituíram o escalão territorial das forças militares de Portugal, entre o século XVI e o princípio do século XIX.
A designação "ordenanças" começou a ser aplicada às companhias e outros corpos de tropas criados no reinado de D. Manuel I.
Em 1807, é ordenada a reorganização das Ordenanças. O país ficaria dividido em 7 Governos Militares, onde seriam distribuídas 24 Brigadas de Ordenanças, sendo estas Brigadas designadas pelos números dos Regimentos de Infantaria, e cada Brigada recrutava pessoal para os Regimentos de Infantaria e teria 2 Regimentos de Milícias. Ainda na dependência das Brigadas ficavam as Companhias de Ordenanças, onde eram constituídas por todos os homens válidos entre os 17 e os 40 anos.
Por sua vez, o “Terço” (que corresponderia a um regimento) incluía oito companhias de ordenanças, cada qual com cerca de 250 homens.
Como entidade máxima passaria a pontificar, desde 1759, o General das Armas do Partido do Porto.
A partir da Guerra da Restauração, os Terços passaram a constituir uma espécie de 3.ª linha do Exército, servindo de fundo de recrutamento e de complemento à 2ª linha (tropas auxiliares ou milícias) e a 1.ª linha (tropas pagas).
Geralmente, os Terços ainda se mantêm na primeira linha do Exército Português - Terços pagos - até 1707, quando passam a designar-se "regimentos de infantaria" e na sua segunda linha - Terços auxiliares - até 1796, altura em que passam a designar-se "regimentos de milícias".
Na altura da sua extinção, os Terços já tinham todas as caraterísticas de regimentos, havendo apenas uma mudança na designação.
Entretanto, em 20 de Março de 1659, foi criado o Terço da Câmara do Porto, reorganizado em 1696, por meio do Alvará de D. Pedro II de 19 de Novembro.

 
 

Fardamento do século XVII
 
 
 
Não se conhece onde se terá alojado o Terço da Câmara do Porto, mas há quem especule que, à data, já existiria um aquartelamento para as bandas da Torre da Marca.
Em Setembro de 1762, durante a “Guerra do Pacto de Família”, o Terço da Câmara do Porto foi desdobrado formando os Regimentos de D. António de Lencastre e de Jorge Francisco Machado de Mendonça.
O tratado conhecido pelo "Pacto de Família" (o terceiro), foi firmado pela família dos Bourbon, assinado a 5 de Agosto de 1761, entre os reis da França, da Espanha e o duque de Parma, visando a criação de superioridade sobre o Reino Unido da Grã-Bretanha.
Portugal colocou-se, como era tradicional, ao lado do velho aliado, tendo sofrido uma invasão dos espanhóis por Trás-os-Montes, que ficou conhecida por "Guerra Fantástica".
O episódio ficou conhecido por aquele epíteto porque, apesar da humilhante derrota infligida aos invasores, os recontros mais importantes não foram batalhas convencionais mas acções de guerrilha conduzidas pelas milícias locais, tendo o resultado da guerra ficado decidido por uma série de sucessivas e brilhantes movimentações de tropas sob o comando do conde de Lippe, um dos melhores soldados da sua era.
Reinava D. José I, casado com Mariana Victória de Espanha.
O Tratado de Paris, assinado a 10 de Fevereiro de 1763, encerrou a guerra deflagrada pelo “Pacto de Família”.
No fim deste conflito, o Terço do Porto dá origem, por decisão régia, a dois regimentos.
O 1º Regimento de Infantaria do Porto que se aproveita das instalações existentes na Torre da Marca e o 2º Regimento de Infantaria do Porto (que primitivamente se pretendeu que fosse uma unidade de Artilharia) que permanecerá no edifício que o Terço do Porto ocupava desde 1732, na Cordoaria, e que tinha sido o Celeiro do Pão, desde o dealbar do século XVIII.
Os Terços do Porto mantiveram-se na Cordoaria, desde 1732, até ao seu desdobramento em dois regimentos em 1762.
 
 
 

A elipse amarela destaca o edifício onde estiveram os Celeiros do Pão e, depois, os Terços do Porto, o 2º Regimento de Infantaria do Porto e a 1ª Companhia da Guarda Real da Polícia do Porto
 
 
Na foto acima, a mais antiga que se conhece do local, é visível ainda, a igreja de Nossa Senhora da Graça e o colégio dos Meninos Orfãos, bem como, a Reitoria em construção.
As instalações da Cordoaria, antigos Celeiros da Cidade, virão a ser alvo de um incêndio, ocorrido em 1832, que destruirá as instalações do que tinha sido o quartel da 1ª Companhia da Guarda Real da Polícia do Porto que, entretanto, ali se tinha estabelecido.
A partir de 1874, seria erguido, naquele local, o Mercado do Peixe.
Hoje, encontra-se por lá o Palácio da Justiça.
 
 
«Aquele espaço hoje ocupado pelo Palácio da Justiça, na parte ocidental do tão maltratado Jardim da Cordoaria, foi um dos mais pitorescos trechos do Porto antigo e tem sido um dos menos estudados por quem se debruça sobre a história da cidade.
Para o sítio, onde, já nos nossos dias, se construiu o edifício onde funcionam os tribunais, esteve prevista a edificação, no século XVIII, do Colégio ou Recolhimento de Nossa Senhora da Esperança "por aly ser mais acomodado às circunstâncias de que se necessitava". Como se sabe aquele colégio foi instituído pelo padre Manuel de Passos Castro, tesoureiro mor da Colegiada de Cedofeita que, para aquele efeito, deixou à Santa Casa da Misericórdia do Porto o remanescente da sua herança, no total de 6 474 600 réis. Pelos vistos, o pedido para a construção do edifício na Cordoaria não obteve aprovação camarária e a Santa Casa optou por o erguer em terrenos seus, no Campo de S. Lázaro.
O pedido da licença para a construção do Recolhimento na Cordoaria dizia expressamente que a obra era para ser feita onde, por esse tempo, funcionavam os Celeiros da Cidade.
É muito curiosa a evolução por que passaram esses celeiros. Um alvará municipal de 24 de Junho de 1699 dá-nos conta de que "tendo a cidade do Porto experimentado grande detrimento pela falta de Terreiro e Celleiros, onde se pudesse recolher o pão que à dita Cidade viesse, a Câmara foi autorizada a tirar do cofre dos Sobeijos das cizas, 4 666 000 réis, quantia pela qual fora arrematada a obra do dito Terreiro e Celleiro para se fazer no sítio junto à Lameda".
A empreitada da construção foi entregue "por dez mil cruzados, menos vinte mil réis", ao Mestre João da Maia, pedreiro de Gaia, que se comprometeu a concluir a obra em oito meses. Mas a 8 de Setembro de 1700, uma vistoria feita às obras mandou demolir tudo o que já estava feito, "… por não ir conforme o contrato".
Trinta e dois anos depois (1732), o edifício onde se guardavam os cereais com que se fazia o pão para a cidade muda radicalmente de funções. Vai passar a guardar armas.
Segue-se um período em que os edifícios destinados aos Celeiros são ocupados pelos militares dos Terços destinados às guarnições da cidade. Como eram bastantes, alguns aboletavam-se em casas particulares com os inconvenientes que daí resultavam.
Tudo isto aconteceu enquanto não foi construído o quartel do Corpo da Guarda edificado nas imediações do sítio que ainda hoje evoca essa denominação - Rua do Corpo da Guarda. Entretanto, a tropa deve ter deixado o local que voltou a mudar de funções. É pelo menos isso que se depreende de um ofício, datado de 20 de Junho de 1806, em que se solicita à Câmara que "ceda a Casa dos Celleiros para Armazém da Real Fazenda".
No ano da Revolução Liberal (1820) ordenava-se que o Hospital Militar "que ali (nos celeiros) se achava, se transferisse para outra parte".
Após a vitória do Liberalismo as antigas instalações dos celeiros são alugadas a particulares. Entre 1838 e 1840, "esteve alugado por 600 réis pagos adiantados". Em 1850, a Câmara deliberou "não prorrogar mais o arrendamento dos armazéns denominados dos celeiros, para se levar a efeito o projectado Mercado do Peixe".
É a primeira vez que se fala na construção deste mercado. Mas sete anos depois aquelas instalações ainda estavam ocupadas, agora pela Companhia da Illuminação a Gaz, que é intimada pela Câmara "a desocupar os armazéns dos celeiros".
Finalmente, em 1869, cento e setenta anos depois da arrematação da obra para a construção dos Celeiros, começou a ser construído, exactamente no mesmo sítio, o Mercado do Peixe que viria a chegar até aos nossos dias.
Os celeiros da Cordoaria não foram os únicos que houve na cidade. Como se sabe, junto ao rio de Mijavelhas, que passava pelos terrenos onde hoje é o Campo de 24 de Agosto e desaguava no rio Douro, junto à Quinta do Prado, actual cemitério, e no lugar das Azenhas de Vilar, actual Rua de D. Pedro V, funcionaram azenhas e moinhos onde se moía o grão. A maior parte desses moinhos pertencia ao bispo e aos cónegos. O Cabido, em 1547, tinha o seu celeiro junto à Sé, nos baixos de um edifício em cujo sobrado se venerava a imagem de Nossa Senhora de Agosto. Sete anos depois, o edifício foi demolido para, no seu lugar, se construir uma nova capela da evocação da mesma padroeira. Para facilitar a obra, o Cabido cedeu a parte do celeiro que transferiu para outro local ali perto, numa rua junto do Auditório ou Tribunal Eclesiástico. A capela em causa, da invocação de Nossa Senhora de Agosto, é a conhecida Capela dos Alfaiates que nos idos de 40 saiu de junto da Sé, sendo reconstruída à entrada da Rua do Sol. Dos alfaiates por nela figuram as imagens de Nossa Senhora de Agosto ou da Assunção e de São Bom Homem, padroeiros dos profissionais do dedal».
Cortesia do Dr. Germano Silva, In “Jornal de Notícias” de 24 de Setembro de 2006
 
 
 

Mercado do Peixe, c. 1900, à direita
 
 
 
À esquerda do Mercado do Peixe, observa-se o edifício que foi sucessivamente brévia dos padres franciscanos antoninos de Vale da Piedade, Biblioteca Pública do Porto e Roda dos Expostos.


(Continua)

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