quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

25.177 Jardins do Palácio de Cristal. Feira Popular e outras actividades lúdicas

 
“Os Jardins do Palácio de Cristal incluem o chamado Jardim Emílio David que possui belos exemplares de rododendros, camélias, araucárias, ginkgos e faias, para além de fontes e estátuas alegóricas às estações do ano.
A Avenida das Tílias constitui o eixo mais marcante deste parque e está ladeada pela Biblioteca Municipal Almeida Garrett (onde se situa a Galeria do Palácio), pela Concha Acústica e pela Capela de Carlos Alberto da Sardenha (edificada em 1849 pela princesa de Montléart). Perto situam-se um restaurante e uma esplanada com vista para o lago. Nesta avenida e noutros locais encontram-se estratégicos miradouros que proporcionam vistas panorâmicas do rio Douro e da cidade. É ao fundo desta avenida que encontramos a capela que a princesa de Montléart mandou erguer em homenagem ao seu irmão, o Rei Carlos Alberto.
Os jardins temáticos estão também representados, nomeadamente pelo Jardim das Plantas Aromáticas, o Jardim das Medicinais, o Jardim das Cidades Geminadas (inaugurado em 2009) e ainda o Jardim dos Sentimentos (inaugurado em 2007), onde se encontra a estátua “Dor” de Teixeira Lopes. Outros espaços aprazíveis são o Bosque, a Avenida dos Castanheiros-da-Índia e o Jardim do Roseiral que está enriquecido com significativos elementos do património artístico da cidade. Nas proximidades surgem sete magníficos exemplares de palmeiras da Califórnia.
Contíguos aos Jardins do Palácio de Cristal estão o Museu Romântico e o Solar do Vinho do Porto, ambos na Quinta da Macieirinha. Muito próximo encontra-se, também, a Quinta Tait, com jardins recheados de colecções de rosas, camélias, brincos-de-princesa e um majestoso Liriodendrum tulipifera que circundam a Casa Tait, onde funciona um Gabinete de Numismática”.
Fonte: pt.wikipedia.org

 
 

Fachada principal do Palácio de Cristal, c. 1910
 
 
 
 

Capela de Carlos Alberto na Avenida das Tílias - Ed. Delcampe.net

 
 

O Chalet - Ed. “O Porto e os seus Fotógrafos”, coordenação Teresa Siza, Porto 2001



A construção do chalet suíço, da foto anterior, já era anunciada pelo jornal "O Comércio do Porto" em 1864, dando-se notícia do seu arrendamento por seis anos a um negociante lisboeta, Sr. Jansen, proprietário da Fábrica de Cerveja Jansen. Esse equipamento destinava-se ao comércio de bebidas e comidas frias, sendo a oferta gastronómica completada por mais uns quantos restaurantes distribuídos pelos espaços, para além do restaurante principal. 
Para o chalet, a construção de três andares, em madeira, foi implantada sobre a denominada Gruta de Camões, por forma a servir também como mirante sobre o rio.
Muitos anos depois, naquele “chalet”, ao fundo da Avenida das Tílias, à direita, e perto da tal gruta, esteve o Real Velo-Club do Porto antes de ser transferido para as traseiras do Palácio dos Carrancas.

 
 

"Gruta Camões" sobre a qual esteve o chalet

 
 

“Chalet do Palácio de Cristal” e a “Gruta Camões” – Ed. SIPA
 
 
 
 
Durante a Exposição Industrial de 1891, os jardins do Palácio seriam beneficiados com um lago e uma gruta, com projecto de uma firma belga e cujo projectista, Florent Claes trabalhou, também, nos jardins do Palacete Braguinha, a S. Lázaro e foi autor, ainda, de alguns melhoramentos do Jardim da Cordoaria.
 
 
 

Lago e gruta do Palácio de Cristal inaugurados em 1891
 
 
A 6 de Novembro de 1891, seria nomeado para calafate da flotilha de 6 barcos a operar no lago, Miguel Pedro Correia, enquanto, em Setembro, os técnicos da empresa belga que conceberam os equipamentos já tinham partido.
No Domingo, 22 de Novembro de 1891, um dia de muita chuva, lago e gruta eram finalmente inaugurados pelo rei D. Carlos.
O poeta, escritor e historiador Sousa Viterbo, em 1907, sobre o projectista Florent Claes, deixou-nos algumas notas que estão expressas no texto abaixo.




In revista “O Tripeiro”, Vª série, Ano VII, Junho, 1951

 
 

Outra perspectiva da gruta e do lago do Palácio de Cristal

 
 

Jardins e lago original do Palácio de Cristal, em 1903

 
 

Lago do Palácio, em 1905, com a sua frota de barcos de recreio


 

Lago do Palácio de Cristal, actualmente - Ed. “bucolico-anonimo.blogspot.com”
 
 
 
Acabada a Exposição Internacional de 1865, a Sociedade do Palácio de Cristal, que lançou o empreendimento, passou a administrá-lo.
Passado pouco tempo, decidiu entregar a rentabilização dos espaços e equipamentos à firma Burnay & Guichard que, para o efeito, promoveu diversos tipos de espectáculos.
Na realidade, a exploração empresarial do edificado foi sempre deficitária.
Entre os espectáculos, de diversa índole, destacaram-se, nas últimas décadas do século XIX e pelos primeiros anos do século seguinte, o lançamento de balões, normalmente, tendo por base de operações a Avenida das Tílias. Era espectáculo muito concorrido e apreciado.
No dia 3 de Abril de 1904, o balonista António Fernandes, conhecido como “Ferramenta”, gaiense, nascido no Candal e serralheiro de profissão, partia do Palácio de Cristal como conta a notícia.
 
 
“António Bernardes construiu o seu balão que denominou de “O Português”, com uma capacidade para 1 200 metros cúbicos, que poderia elevar-se com o peso bruto de 800 Kg e marcou a sua primeira ascensão para o dia 3 de Abril de 1904 nos jardins do palácio de Cristal.
No dia aprazado o balão foi conduzido ao Palácio, em dois carros de bois, com a filarmónica a abrir caminho. Quando se ensaiava a ascensão o governador civil, temendo o pior, proibiu a subida. No entanto o “Ferramenta” cortou as cordas e o balão depois de roçar nas tílias subiu mesmo, perante os aplausos do público. Andou quatro horas pelo ar e foi pousar num campo, em S. Cosme, no concelho de Gondomar”. 
 
 
O balonista “Ferramenta” subiria, mais algumas vezes, no Palácio de Cristal, como quando o fez em benefício da aeronauta espanhola Mercedes, que tinha partido uma perna numa ascensão, na Praça de Touros da Rua da Alegria, e que terminou na Quinta de Sacais, tendo sido socorrida pelo Dr. Alfredo de Magalhães.
O balão do “Ferramenta”, dessa vez baptizado como “Internacional”, foi pousar a Rio Tinto, no meio de um viçoso nabal, tendo o seu proprietário, na ocasião, exigido a reparação dos prejuízos causados. 

 
 

António da Costa Bernardes, “O Ferramenta”
 
 
 

Balão de ar quente, no Palácio de Cristal, junto da Concha Acústica, no início do século XX


 

Publicidade a uma subida de balão a efectuar no Palácio de Cristal, em 1907

 
 
Durante o século XIX, os portuenses começaram, também, a dedicar uma atenção especial aos festejos de Carnaval.
Os cortejos carnavalescos sempre prestigiaram com a sua presença os jardins do Palácio de Cristal durante as suas exibições.


 

Palácio de Cristal no Carnaval de 1905 – Ed. Photo Guedes


 

Corso carnavalesco na primeira década de 1900



Muitos portuenses usufruíam dos jardins do Palácio de Cristal para socializarem e passearem pelas suas avenidas, observando os espectáculos oferecidos em diversos palcos e, por vezes, fazendo visitas ao mini-zoo que exibia, em jaulas, alguns animais e se situava num pequeno bosque.



 
Entrada lateral de acesso aos jardins do Palácio de Cristal (Esquina da Rua D. Manuel II e a Rua Jorge Vitervo Ferreira) percorrendo a Avenida dos Plátanos – In revista Brasil, 16 Setembro 1903
 
 
 

Viajando no Autoped, no Palácio, em 1918




Avenida das Tílias
 
 
 
 

Antigo zoo no bosque do Palácio de Cristal


 

Jaula dos macacos, em 1910



A música e o teatro tiveram grande expressão, em alguns palcos, nos jardins do Palácio de Cristal.
No topo sul da Avenida das Tílias, ainda hoje existe uma concha acústica, que é um equipamento cénico, disposto à volta da orquestra e aberto para a plateia, que reflecte o som dos instrumentos musicais para o público, e que é um elemento icónico do jardim.
Foi inaugurada na década de 1880.


 

Concha Acústica - Fonte: gisaweb.cm-porto
 
 
 
“A concha acústica é uma construção de pedra provavelmente edificada na década de oitenta do séc. XIX, exibindo na sua base a inscrição de uma conceituada fundição do Porto: Massarellos. A concha ostenta uma requintada decoração em ferro e a ladear a sua abertura encontram-se duas esculturas (provenientes do Val d’Osne) de mulheres, uma representando uma negra e a outra, uma egípcia”.
Fonte: Paula Torres Peixoto
 
 
Em Julho de 1886, passaria a funcionar como teatro um novo espaço nos jardins do Palácio de Cristal, junto da Avenida das Tílias.
Tal actividade aconteceria no Palco-Coreto, em alvenaria e ferro, de concepção do arquitecto Tomás Augusto Soller.
O arquitecto Tomás Soller (1848-1883) faleceu muito novo, com 35 anos.
Nessa ocasião, os seus colegas de profissão terão promovido uma recolha de fundos para prover a sua viúva.
Assim, a construção do palco-coreto, com projecto de Tomás Soller, ocorreria cerca de três anos após a morte do arquitecto.
 
 
"Inaugura-se amanhã o novo teatro-coreto recentemente construído nos jardins do Palácio de Cristal, segundo o plano delineado pelo falecido arquitecto Soller.
o cenário foi pintado por Guilherme de Lima e o pano de boca apresenta o Terreiro do Paço, em Lisboa."
Jornal "O Primeiro de Janeiro", de 10 de Julho de 1886 – Sábado
 
Passados dois dias, dizia o mesmo jornal a propósito do palco-coreto:
 
"É de alvenaria e ferro e, como se sabe, extremamente elegante. A cobertura metálica saiu das oficinas da Fundição de Massarelos."

 
 

Primeiro palco-coreto implantado nos jardins do Palácio de Cristal, à esquerda e, em frente, a meio, o Palácio dos Terenas e a sua torre – Gravura, madeira, por F. Pastor, in “Universo Ilustrado”- 2º vol. – Lisboa, Abril 1878

 
 
Atendendo à data de publicação da gravura anterior, o palco-coreto nela representado teria sido substituído pelo da concepção de Tomás Soller. Aliás, como se pode observar na notícia abaixo, era referido  em 1882, que tinha existido junto da "grande avenida" um coreto.

 
 
Jornal "O Comércio do Porto", de 2 de Julho de 1882

 
 
Na notícia acima, podemos observar que um dos concorrentes ao certame foi a viúva de Zeferino Matos, e que este horticultor, que teve um modesto horto na Rua da Boavista, à data, já tinha falecido.
Sabe-se que, em 1875, Zeferino Matos é vendedor de uma parcela de terreno, que se juntava a algumas outras, anteriormente adquiridas, destinadas à edificação do futuro hospital militar D. Pedro V.
Seria o seu filho, Jacinto de Matos, que na mesma actividade ficou célebre, a dar continuidade ao negócio.
Sobre o coreto e a concha acústica se apresenta o texto que segue:
 
 
“Em volta do palácio, o espaço era igualmente muito acolhedor e rapidamente se tornou num autêntico local de desfile da fina flor da sociedade portuense. No coreto (desaparecido) da conhecida avenida das Tílias, todos os domingos e feriados havia música por conta de bandas regimentais.
Mais à frente, a concha (ainda existente), apresentava peças de teatro e recitais. Ao fundo da avenida, à direita, havia um chalé alpino, de onde se apreciavam desafogadas vistas sobre a foz do rio e o mar. Nas proximidades estavam as coleções zoológicas, a aldeia dos macacos e a gaiola das águias. À volta, o compacto arvoredo convidava ao passeio e à tranquilidade”. 
Com a devida vénia a Manuel de Sousa
 



O Comércio do Porto, em 5 Julho de 1917



Barraca de tiro ao alvo, nos jardins do Palácio de Cristal, no início do séc. XX – Fonte: CMP, Arquivo Histórico Municipal






Comboio de passeio, nos jardins do Palácio de Cristal, inaugurado em 1934



Feira Popular
 
 
A partir da década de 1940, nos jardins do Palácio de Cristal, durante os meses de verão, instalava-se uma feira popular que fazia a delícia de todos, miúdos e graúdos.
Para satisfazer os aficionados das touradas chegou a ser construída, num espaço contíguo à Avenida das Tílias, uma praça de touros com 1.400 lugares.
No dia 18 de Junho de 1944, era anunciado nos jornais que se encontrava em concurso a exploração da citada praça.
Nesse ano, a feira encerrou em 23 de Setembro.
Neste âmbito, diga-se a título de curiosidade que, no dia 15 de Novembro de 1964, foi improvisada uma praça de touros no Pavilhão do Palácio de Cristal, onde evolucionaram numa corrida os cavaleiros Manuel Conde, David Ribeiro Teles, Mestre Baptista e Núncio e a participação dos forcados amadores de Lisboa capitaneados por Salvação Barreto. Não houve toureio a pé, por ser uma corrida "à antiga portuguesa", e destinou-se a recolher fundos para a campanha de Natal em favor dos soldados portugueses que lutavam nas colónias, sendo organizada pela delegação do Porto do Movimento Nacional Feminino.
A 31 de Março de 1950, o Governador Civil do Porto promete que a Feira Popular do Porto será tão boa ou melhor que a de Lisboa e, na véspera de S. João desse ano, o Subsecretário da Assistência inaugura a Feira Popular, no Palácio de Cristal.

 
 
 
“Por vezes o meu pai levava-nos, a mim e meus irmãos, ao Palácio para nos deliciarmos com as suas surpresas. Lembro-me bem da roda dos cavalinhos, dos baloiços, dos balancés, das caixas de areia, dos escorregões, do anel rolante preso ao poste… 
Saudades do lindíssimo lago com a sua ponte e gruta, onde mais tarde andava de barco ou gaivota. Dos animais, em especial do leão, da aldeia dos macacos, dos pavões e galinhas da Índia, dos papagaios…
Andei de bicicleta e triciclo naqueles grandes salões laterais e nos jardins, fiz corridas de sacos e, com os olhos tapados, tentei acertar num cântaro com água ou areia… Ainda assisti a uma inesquecível exposição de rosas que pela sua grandeza me espantou.
Pagava-se de entrada 1$50, a partir dos 6 anos. O aluguer das bicicletas pequenas custava 2$50 e dos triciclos 1$50 por hora. 
Vi uma exibição de ginástica do Sport Clube do Porto, e delirava quando meu pai me levava a ver a luta livre. Por vezes a exaltação do público era tal que eu me encostava a meu pai cheio de medo. 
Mais tarde íamos à Feira Popular onde nos divertíamos nos carroceis, carrinhos de choque, cadeiras voadoras, etc. 
Nunca deixávamos à Feira Popular sem ir ao stand da Regina “furar” a nossa sorte nos seus deliciosos chocolates”
Com a devida vénia a Rui Cunha
 
 
Em 22 de Junho de 1938, já tinha ocorrido a inauguração festiva do novo parque infantil do Palácio de Cristal que passaria, então, a ser um alvo das crianças quando, com os seus pais, visitavam a Feira Popular.
 
 
 

Vista nocturna da entrada principal da Feira Popular

 
 

Palácio de Cristal em noite de S. João de 1940
 
 
Na foto acima vemos, em primeiro plano, a fonte do Jardim de Emílio David situada mais a poente, e as iluminações do gradeamento de entrada, na noite de S. João de 1940.

 
 

Feira Popular na década de 1960


 

A Feira Popular do Palácio de Cristal, em 1958 (O algodão-doce e a roda gigante) – Fonte: “frame” do filme “A Costureirinha da Sé”




A Avenida das Tílias e a Feira Popular do Palácio de Cristal, em 1958 – Fonte: “frame” do filme “A Costureirinha da Sé”




A Feira Popular do Palácio de Cristal, a Avenida das Tílias e o “Stand” da Regina, em 1958 – Fonte: “frame” do filme “A Costureirinha da Sé”
 
 
 

Os chocolates eram aqui “furados” (sorteados)

 
 

A Feira Popular do Palácio de Cristal, a Avenida das Tílias e o “Stand” da OLIVA, em 1958  – Fonte: “frame” do filme “A Costureirinha da Sé”
 
 
 

O Pavilhão de Exposição da firma Agostinho Ricon Peres, de Máquinas e Ferramentas, que integrou a Feira Popular, durante anos
 
 
 

O novo comboio, na Feira Popular do Palácio de Cristal, em 1958 – Fonte: “frame” do filme “A Costureirinha da Sé”
 
 
 
Para a minha geração, Palácio de Cristal, ou simplesmente Palácio, será sempre sinónimo de Feira Popular. Entrando pela Rua D. Manuel II, percorrida a pequena recta ladeada de árvores, estávamos perante dois clássicos de sempre, o martelo para testar as forças e um homem muito velho com um carrinho de ferro. O carrinho tinha uma pega, devia-se empurrar com a máxima força por um emaranhado de curvas e contra curvas. Se chegasse ao cimo, batesse na porta, saltava um cabeçudo a fazer um manguito. Um prémio estranho para os dias de hoje, mas que nos enchia da satisfação do dever cumprido.
Havia aviões de sobe-e-desce, barracas de tiro, carrinhos de choque, umas cadeiras que andavam em círculo presas por cadeados numa espécie de desafio radical, barracas de chocolates em que se fazia um furo. Conforme a cor da bola que nos calhasse em sorte, um chocolate diferente.
Tínhamos as esplanadas da avenida das Tílias, onde lanchávamos tostas mistas e leite chocolatado UCAL, o lago, onde consoante a bolsa, se podia andar de barco a remos ou a motor.
Mais abaixo o «zoológico» com o chimpanzé Chico, o leão Sofala, pavões,
aves exóticas e galinhas de Angola a cacarejar «Tou fraca». Restaurantes onde se comia sardinha e frango assado, azeitonas e broa, coisas simples, num tempo simples.
Planeei ir à Feira do Livro, apoio a revitalização deste espaço da cidade, mas Palácio será sempre a alegria infantil de uma Feira Popular”. 
Com a devida vénia a Fernando Lopes



Carrinhos de choque
 
 
Na foto acima, pode ver-se que os carrinhos de choque, em uso nas décadas de 40, 50 e sessenta do século passado, têm os para-choques metálicos, sendo sobre eles, que em saltos bem medidos, de carro para carro, se movimentava o cobrador das moedas, recebendo o dinheiro da “viagem” e fazendo os trocos. O movimento dos veículos era feito em volta de uma placa central, no sentido contrário aos ponteiros do relógio.



Esplanada, com vista sobre o Douro, de um restaurante presente na Feira Popular
 
 
 

Aspecto da Feira do Palácio. Ao centro a roda de “looping”- Ed. António Tavares, In “Porto Desaparecido”
 
 
 

Feira Popular do Palácio de Cristal (1970)

 
 

Feira Popular do Palácio de Cristal, c. 1970
 
 
 
 
A Feira Popular que tinha para além do divertimento algumas funções de assistência social, foi obra na qual se empenhou o então Director do Palácio de Cristal, de seu nome António Pinto Machado.
 
 
 


Bilhete de acesso à Feira Popular, em 1958, organizada pelo Governo Civil do Porto. Inclui publicidade a sorteio de uma habitação, na Rua da Ilha Verde, 60, organizado por “O Lar do Comércio”




Lápide, de António Pinto Machado, exibida nos jardins do Palácio de Cristal
 
 
 
António Pinto Machado, natural de Vila Real, nasceu em 1895 e faleceu em 1965, na cidade do Porto.
Jornalista, escritor, poeta e Oficial do Exército, foi, ainda, Director do Palácio de Cristal desde 1935 até 1965. 
Viveu num prédio da Rua Alberto Aires de Gouveia identificado, como tal, pela Câmara Municipal do Porto.


 
Casa de António Pinto Machado, na Rua Alberto Aires de Gouveia, nº 59
 
 
 
 
António Pinto Machado viveu, também, na casa do roseiral, que reformou.
Na qualidade de jornalista, foi colaborador do “Jornal de Notícias”, Jornal “A Voz”, “Diário do Minho” e “Correio do Minho”, Jornal “O Debate”, “Diário do Norte”, Jornal “A Ordem” e revista “Os Bairristas do Palácio”. Foi Director e Editor do Jornal “A Palavra”, o qual refundou.
Célebres são os seus diálogos entre o João D`Além (seu heterónimo) e a personagem que criou – Manuel Agrónomo - inspirada no seu caseiro Manuel da Silveira, seu grande amigo.
Segundo uma sua neta, Suzana D’Eça, António Pinto Machado era um monárquico convicto.
 
 
 

Casa do Roseiral no Palácio de Cristal
 

 
Ainda no século passado, a Feira Popular encerraria no Palácio de Cristal e seria transferida para o Parque da Cidade (ocidental), para a área que o chamado Queimódromo costuma agora ocupar, onde se manteve alguns anos, até que encerrou em definitivo.




Feira Popular no Parque da Cidade, em 1994




domingo, 22 de janeiro de 2023

25.176 Quem não conhece a MAJORA? – Uma empresa portuense

 
Os jogos
 
 
Esta empresa foi fundada em 1939, no Porto, por Mário José de Oliveira (1908-1995) que, após uma viagem a Berlim, decidiu começar a fabricar jogos usando, para o efeito, a cave de casa dos seus pais, na Avenida da Boavista.
O seu primeiro jogo foi o Pontapé ao Goal, inspirado no futebol, que estava em alta de popularidade.

 
 


 
 
Aquele início de actividade fez-se, também, em 1940, com o fabrico de cubos para puzzles e jogos tendo por objectivo o ensino do abecedário — o “abc” em cubos e a caixa de tabuada.
No ano de estreia, a empresa acabou com um lucro de 1621 escudos, uma importância de relevo para a época e, em 1944, a empresa  muda-se para a Rua das Taipas, no centro histórico do Porto. 
 
 
“O sucesso dos jogos de cartão e dos cubos de madeira de Mário José fizeram-no acreditar que a marca tinha futuro. Deixou o respeitável emprego que tinha como técnico de contas na cordoaria Oliveira e Sá e lançou-se na vida empresarial com a firma de jogos e brinquedos. Em 1943, ainda o País sentia os terríveis efeitos da Guerra, convidou o irmão a juntar-se à aventura. Com Joaquim, nasce a Mário J. Oliveira & Irmão, Lda, que se instalou na rua das Taipas para fabricar os jogos Majora.
A marca consolidou o estatuto de divertimento para as crianças, com jogos como o Mikado, que punha à prova a paciência e destreza dos jogadores, obrigados a retirar de uma pilha os pauzinhos sem fazer mexer um cabelo que fosse. Outras grandes referências da Majora são ainda do tempo das Taipas. É o caso do Jogo da Glória, em que os jogadores fazem tudo para chegar ao fim sem cair na casa do inferno…”
Fonte: “cmjornal.pt/”, de 27 de Outubro de 2013

 
 


 
O sucesso de jogos como "Quebra-Cabeças", "Tarzan e a Caça às Feras", "Loto/Quino", "Tangram", entre muitos, até então completamente desconhecidos entre nós, multiplicou-se ao longo da década de 1940.

 
 


 
 
 
 

O Loto ou Quino era o jogo da noite de Natal

 
 
Continuando a apostar nos jogos de tabuleiro de cartão, a Majora cresceu e conheceu, na década de 1950, um dos grandes momentos de relevo na sua história - o início da produção da versão portuguesa do mais conhecido jogo de tabuleiro a nível mundial, o Monopólio, por acordo com a Hasbro, licença de produção que viria a perder em 1992.
É na década de 1960, mais precisamente em 1962, que é criado “O Sabichão” - um boneco mágico de madeira pintada, com um ponteiro de arame que os jogadores rodavam para fazer perguntas. Um sucesso!

 
 


 
 
O senhor Sabichão acertava sempre na resposta: rodava em cima de um espelho de vidro e apontava para a solução de todos os mistérios, fossem eles do corpo humano, da anatomia ou da história de Portugal. Gerações e gerações deliciaram-se com este jogo da Majora, que até estava para se chamar Eu Sei Tudo.
As regras da UE determinaram que o boneco de madeira e o arame podiam criar acidentes. Passou a ser utilizado o plástico e o cartão – modernices.
O Sabichão, em 2012, chegou à era dos smartphones e ipads e,  50 anos após a sua criação, uma aplicação digital voltou a pôr miúdos e graúdos a fazer perguntas para o Sebastião adivinhar as respostas.
A aplicação respectiva passou a estar disponível na loja de aplicações.
Com a continuação da actividade e do constante aparecimento de novos jogos de tabuleiro, surgiu a necessidade de expansão em termos de instalações, mudando-se a Majora, em 1967, para a fábrica que ocupou durante anos, na Rua Delfim Ferreira, na então recém-criada Zona Industrial do Porto.
Na altura da inauguração da nova fábrica, os filhos de Mário José Oliveira, António Oliveira e Alberto Oliveira passaram, também, a fazer parte da equipa de gestão.
Na empresa existia um grupo de elementos que constituíam o chamado departamento de invenções, que ligava a um ilustrador prolífero que desenhou centenas de tabuleiros – Gabriel Ferrão.
Para a posteridade ficaram jogos muito simples, que fizeram a delícia de muitos, que as famílias podiam jogar em conjunto: Volta a Portugal em Bicicleta, Rallye Automóvel ou Corridas de Cavalos são títulos que muitos recordarão.
Em 2006, o administrador António Oliveira cria um museu com os jogos, brinquedos e livros, cubos de letras, etc, onde reúne o espólio da empresa.
Em 2008, entraria na equipa de gestão a geração mais nova da família Oliveira. Pedro e Paula, filhos de António de Oliveira e netos do fundador, assumiram o comando da empresa e procuraram modernizar os produtos. Lançaram-se várias novas marcas, que ultrapassavam o universo dos brinquedos e dos jogos, mas mantendo os mais novos como público-alvo.
Nos anos de maior sucesso comercial, entre 2006 e 2009, a Majora facturou cerca de cinco milhões de euros por ano.
 
 
“A partir da edição de 31 de Julho de 2010, o jornal Expresso, numa onda de revivalismo, lançou a colecção “Jogos de Sempre Expresso”, colocando assim disponível ao público uma colecção de 5 dos mais carismáticos jogos da Majora. O primeiro jogo publicado foi o Jogo da Glória, estando previstos para o resto da colecção o Jogo das Damas, o Jogo das Escadas, o Jogo do Ludo e o Três em Linha”.
Fonte: “aminhagestao.blogspot.com/”

 
 


 
 
 
Porém, os tempos determinaram que o mercado de jogos passasse a ser dominado pelos jogos eletrónicos e, assim, não resultaram os esforços encetados pela administração da Majora, com os acordos conseguidos para fabricar as personagens da moda de então:  o Noddy, a Hello Kitty, o Ruca ou o SpongeBob.
A situação de estagnação não se alteraria apesar do lançamento, entretanto, de jogos como Aljubarrota (recriava a batalha) e de outros cujo tema era a actividade económica: Petróleo S. A., Jogo do Euro e Bolsa de Valores.
 
 
 
O sector editorial da Majora
 
 
«No entanto, a Majora desde sempre se preocupou com uma actividade editorial de livros para as camadas infanto-juvenis e particularmente para as crianças dos estratos sociais mais pobres. Alguns dos pequenos livros postos à venda logo no começo da actividade custavam 1 escudo e os mais caros 4 escudos! Só nos anos 50/60, os preços de cada volume de algumas colecções subiram para 10$00 e 12$00. E tal como refere Garcia Barreto (2002: 327), toda a intenção de criar um leitorado jovem e popular revela-se na sigla das suas publicações “um amigo que diverte, que educa e que instrui”.
(…) Este interesse pela formação de um leitorado que criasse o hábito do prazer da leitura e o amor pelo livro levou o fundador/editor da Editorial Infantil Majora, já em 1940, a criar/editar o chamado livro de pano, invenção da Majora e provavelmente os primeiros que se fizeram em toda a Europa. Estes livros eram fabricados num pano tratado de forma que ficasse uma tela maleável e lavável que podia ser impressa em máquinas tipográficas e que não se podia nem rasgar nem romper e sendo as bordas superior e inferior das páginas picotadas, conferindo-lhes assim uma grande durabilidade. Eram livros de tamanho relativamente pequeno, profusamente ilustrados e de fácil manejamento, dirigidos a crianças de muito pouca idade que ainda não conhecessem o abecedário ou tivessem começado a aprender as primeiras letras.»
Cortesia de Maria Lúcia Diogo Ayres d’Abreu (CEAUL - Centro de Estatística e Aplicações da Universidade de Lisboa
 
 
À data do arranque da publicação dos livros da Editorial Majora e, nos anos seguintes, todos eles eram obrigados a ir à aprovação da censura, inclusive os livros de pano que, como acima é referido, eram dirigidos a crianças muito novas, em alguns casos a menores de quatro anos de idade.
Além dos livros de pano, a Majora também editou os chamados livros-brinquedo, em relevo ou de armar, em cartolina, em que as ilustrações das histórias, vulgarmente contos de fadas tradicionais, se “armavam” em volume (a três dimensões) e, assim, as histórias desenrolavam-se perante o olhar das crianças.
Muitos daqueles livros acompanhavam as temáticas que o sistema de ensino do Estado Novo pretendia implementar na formatação das crianças. 
É o caso do que se segue em que o tema é o milagre de Fátima e terá sido publicado, algures, na década de 1950.
Entre a capa e contra-capa a estória que se pretendia transmitir, era realizada por desenhos elucidativos, acompanhados de uma pequena legenda.
Como é referido na contra-capa a ilustração é de uma conhecida e conceituada portuense, Laura Costa (Vitória, Porto, 1910-Porto, 1992), que irá ter uma ampla actividade na Majora. Sobre esta ilustradora é o texto que se segue.

 
“…uma das mais prolíficas ilustradoras de livros para crianças e de costumes tradicionais portugueses da década de quarenta.
Laura não retrata a fealdade dos vilões das histórias infantis. A mais cruel megera e o mais horrendo gnomo parecem tios feiotes mas simpáticos, criaturas apuradas por um paradoxal arianismo louro e azul que casava bem com o grotesco onirismo das fábulas. Laura evita a representação das odiosas cenas de sangue, fixando geralmente as personagens em trânsito ou em poses narcisistas que dispensam cenário, em trajos sumptuosos que naturalmente beneficiam do seu virtuoso traço. Se a ilustração, em geral, permite maltratar esteticamente a figuração masculina, temos em Laura Costa a excepção. Garbosos príncipes, rudes lenhadores e bondosos reis partilham o mesmo traço adocicado, efeminados até. O pouco que sabemos de Laura está em contradição aparente com a sua delicodoce obra. Senhora de refinada cultura, sem confissão religiosa, foi a primeira aluna das Belas Artes do Porto a participar voluntariamente nas aulas de desenho do nu masculino, quando na altura eram facultativas para o sexo feminino. Amava sobrinhos e primos como filhos, presenteando-os no Natal ou em aniversários com bonecas integralmente criadas e vestidas por si”.
Cortesia de João Caetano; In “almanaquesilva.wordpress.com/”
 
 
 
Capa e Contra-capa do livro infantil “História da Fátima” - Texto do P.e Armando Pereira - Ilustrações de Laura Costa - Aprovado pela Autoridade Eclesiástica - Autorizado pela Comissão de Censura
 
 
 
Ao longo dos anos, várias séries de publicações viram a luz do dia, cada uma delas com vários títulos.
Entre muitas, destacam-se as séries Gato Preto (1947), Salta-Pocinhas (1948), Coelhinho Branco (1948), Pica-Pau (1955), Série de Prata (1964), e as colecções Série de Ouro, Série Relevo, Série Extra, Séria Pequena Princesinha, etc, etc.
Fernando de Castro Pires de Lima e a desenhadora Laura Costa são, respectivamente, autor e ilustradora dos 30 volumes da colecção Varinha Mágica (1955) e mais um sem fim de publicações com a participação de desenhadores, ilustradores e argumentistas.

 
 





 
 


 
 


 
 
De destacar a publicação, em 1955, da colecção Formiguinha, composta por sessenta livros de muito pequeno formato, com cerca de uma dezena e meia de páginas e de 10 centímetros de altura. As estórias são, em grande parte, adaptações de contos de fadas e de outros contos tradicionais feitas por João Sereno e ilustradas por Costa Abott e, devido ao seu êxito levou, anos mais tarde, à sua reedição.
 


 



 
Livros da colecção Formiguinha
 
 
 
 O Fim
 
 
Ao fim de 74 anos a fabricar diversões para a família, a Majora encerraria. Para trás ficaram mais de 300 jogos.



 

Cartaz da Majora
 

 
O logótipo do cartaz acima é original da Majora e representava uma criança a jogar com uma bola, e foi idealizado a partir do  quebra-cabeças Tangram.
Acabaria por ser redesenhado com outras novas imagens destinadas a um determinado público-alvo, em substituição da figura da criança.
No início de Março de 2013, a Majora encerrou a sua produção e dispensou os últimos trabalhadores da unidade.
Apesar dos esforços dos detentores da marca Majora, foi impossível manter a empresa no seio da família Oliveira.
Assim, em 2014, a marca foi vendida ao The Edge Group, liderado pelo empresário José Luís Pinto Basto, por um valor anunciado de 600 mil euros. Este fundo de investimento ficou com todo o espólio da marca, que veio a relançar no mercado em 2016 e que ficaria inactiva em 2018.
Em Novembro de 2022, é noticiado que a empresa de brinquedos detida pela família Feist, a Concentra Brinquedos, tinha comprado a Majora ao The Edge Group por 800 mil euros.
Os novos donos pretendem relançar a marca e esperam que ela renasça forte e adaptada aos novos tempos.