A Rua da Cancela Velha ia da Rua do Bonjardim ao Largo do
Laranjal.
O topónimo de Largo do Laranjal seria, primeiro, atribuído
ao que viria a ser a Praça da Trindade e passaria, depois, após o segundo
quartel do século XIX, a ser atribuído a um pequeno largo junto da confluência
da Rua do Laranjal e da Rua da Cancela Velha, situado um pouco mais abaixo onde
está hoje a estátua de Almeida Garrett, em frente à Câmara Municipal.
Nos finais do século
XIX, começos do século XX, a Rua da Cancela Velha era uma das mais movimentadas
da cidade daquele tempo. Nela estavam sedeadas as redacções de dois
importantes jornais do Porto: "A Montanha", fundado por Júlio
Ribeiro em Março de 1911, que começou como vespertino e acabou matutino; e a "Aurora",
que começou a circular logo a seguir à implantação da República e que ainda se
publicava em 1913.
Legenda:
1. Café Primavera
2. Companhia do Gás
3. Farmácia Rica
4. Guimarães & Medina – loja de couros
5. Entrada da viela do Cirne
6. Saída da Rua Elias Garcia
Na foto acima vêem-se, a meio, ao fundo, uns prédios na Rua
do Bonjardim. A rua, que até eles percorre a nossa visão, é a Rua da Cancela
Velha. A meio dela, à direita, desemboca a Rua de Elias Garcia (antes da
implantação da República chamada de D. Pedro) e, entre os dois primeiros
prédios, à esquerda, a Rua do Laranjal (que vinha “lá de baixo dos Lavadouros”). Os Lavadouros situavam-se
sensivelmente onde hoje fica o café Guarany.
Um pouco mais acima ainda, à esquerda, mas não visível,
partia para Norte a Viela do Cirne, e ainda um pouco mais acima, uma outra rua
que nunca passou de beco (pois não tinha saída) e se chamou Rua Adriano
Machado.
Em 13/12/1888 já havia projectos com indicação de terrenos e
proprietários a alienar, para fazer a ligação da Rua Formosa à Praça da
Trindade, no que viria a ser a tal Rua Adriano Machado.
«Em um dos prédios do
referido largo [do Laranjal] estavam instalados os conhecidos armazéns de
vinhos Morêda. E nos altos do mesmo prédio foi a sede durante bastantes anos do
célebre e muito recordado ginásio Paul
Lauret... Vê-se na gravura, no primeiro plano depois do chafariz, a rua
do Laranjal, mais acima, do lado esquerdo e ao fundo a rua do Bonjardim. Na
casa que faz esquina para a rua Adriano Machado, em que se vêm os toldos
descidos, eram os escritórios da velha companhia
do Gás, e na casa mais alta que se vê na rua do Bonjardim e que também tem
os toldos descidos, era a farmácia Rica,
propriedade do saudoso poeta Maximiano Rica.
Em época muito mais
recuada e quasi em frente á rua de D. Pedro existiu um teatro que desapareceu,
parece destruído por um incêndio. O nome do teatro não me recordo (...) Isto
vai talvez há mais de 65 anos!... Muito mais tarde começaram a construir, mais
para o lado da rua do Bonjardim, um novo teatro de grandes proporções, mas não
chegou a concluir-se e depois foi demolido para a abertura da rua de Adriano Machado
- abertura é como quem diz, pois a rua era .. tapado, um autêntico beco sem
saída...»
Fonte: F.M.N.J., In “O Tripeiro”, Vol. 1 da 5.ª Série
O teatro mencionado no texto anterior foi inaugurado em
fevereiro de 1874 e chamava-se “Teatro da Trindade”. Em Julho de 1873, o teatro
foi devorado por um incêndio e substituído, no mesmo local, por um
teatro-barraca chamado “Teatro Chalet” que também ardeu em 1880.
Foi então decidido construir uma outra sala de espectáculos
o “Teatro Rainha” que não chegaria a abrir, apesar de já estar praticamente
concluído.
Ainda, de acordo com o texto anterior, no largo em que se
encontra o chafariz, no Largo do Laranjal, nº 4, existia um prédio que no seu
piso térreo era ocupado pelo armazém de vinhos do conhecido comerciante de nome
Moreda e, no piso superior, desde 24 de Julho de 1884, pelo ginásio de Paul
Lauret, que para aqui veio proveniente do Largo da Picaria, nº 13, onde tinha
sido, primitivamente, inaugurado em 1882 e, cuja entrada para o ginásio, se
fazia junto das escadas que do largo davam acesso à Rua do Pinheiro.
Mais tarde, Paul Lauret (1852-1918) transferiria o seu
ginásio para a Rua do Laranjal, nº 193, para um belo edifício situado mais a
norte, em frente à Viela do Cirne.
Paul Lauret começaria por dar aulas de ginástica no Colégio
Pestalozzi-Jardim Escola Froebel, que esteve instalado na Rua da Alegria, um
pouco acima da Rua Firmeza.
Ginásio Lauret (2) na Rua do Laranjal e antigas instalações
no Largo do Laranjal (1) em Planta de Telles Ferreira de 1892
Ginásio de Paul Lauret na Rua do Laranjal – Fonte: Desenho
de João Ribeiro Cristino da Silva, com base numa gravura de Domingos Caselas
Branco, publicada na Revista “O Occidente” de 21 de Janeiro de 1887
“A imprensa
caracteriza-o como possuindo todas as diversões próprias de um club, embora se
tratasse de uma escola de ginástica e sala d’armas onde “se
ensina methodicamente estas duas artes, com notavel aproveitamento dos
discipulos, tanto creanças como adultos” e considerando que “nesta nova casa acha-se o Gymnasio Lauret
perfeitamente instalado, tendo salas de gymnastica, de armas, bilhares, dança,
tiro defferentes jogos, electricidade, banhos etc., o que tudo faz um conjuncto
de estabelecimento de primeira ordem”. (Ginásio Lauret no Porto, 1887, p. 19)”.
Fonte: “lauret.pt”
“O ensino no Gymnasio
Lauret está devidido em differentes cursos, conforme as idades dos discipulos,
e regulado de modo a dar rezultados mais praticos e proveitosos. A sua
frequencia é de 100 alumnos devididos do seguinte modo: meninas 7, meninos 33,
adultos 60, tem um medico effectivo, o sr. Dr. Aureliano Cirne, e 250 socios
protectores. (Ginásio Lauret no
Porto, 1887)”.
Fonte: Revista “O Occidente”
Em 12 de Junho de 1896, Paulo Lauret foi viver com a filha
para o Rio de Janeiro, onde abre o Gymnasio Lauret e Sala D’Armas, tendo
realizado com os seus alunos inúmeras apresentações públicas, amplamente
cobertas pela imprensa.
No Rio de Janeiro viria a falecer Paulo Lauret, em 1918.
Após o fecho do ginásio de Paulo Lauret, as instalações na
Rua do Laranjal foram ocupadas pelo “Ginásio Clube”, vindo da Rua do Breiner e
que tinha como professor de ginástica artística Tomé Coelho.
Subindo a mencionada Rua do Laranjal iríamos desembocar na Praça da Trindade.
A Rua do Laranjal, já a montante do chafariz do Laranjal,
com a Igreja da Trindade, em fundo, c. 1900
Rua da Cancela Velha e os trabalhos de demolição dos prédios
adjacentes ao seu leito – Fonte: Blogue “A Porta Nobre”
Na foto acima vêem-se, a meio, ao fundo, uns prédios na Rua
do Bonjardim, visíveis também na foto anterior e ainda hoje existentes.
À esquerda, de frente, vêem-se as fachadas de prédios que
deviam estar na Rua Adriano Machado.
Em toda esta área iria situar-se, mais tarde, o Palácio dos
Correios.
Legenda:
1. Largo do Laranjal com Chafariz do Laranjal
2. Rua da Cancela Velha
3. Rua do Bonjardim
4. Rua do Laranjal
5. Prédios da Rua do Bonjardim ainda existentes
6. Rua do Almada
Como é visível, na planta anterior, a antiga Rua da Cancela
Velha não alinhava com a Rua Formosa, inclinando um pouco mais para Norte,
relativamente ao arruamento que a veio substituir - a Rua Guilherme Costa
Carvalho.
Por essa razão, pode observar-se que os prédios da Rua do
Bonjardim presentes na foto anterior, que mostrava o chafariz, ainda existem e
localizam-se na planta com o nº 5.
À esquerda os 3 prédios da Rua do Bonjardim, em frente dos
quais desembocava a antiga Rua da Cancela Velha – Ed. Google maps
Vista geral c. 1900, do edifício da «Guimarães &
Medina», loja de couros curtidos, solas, cabedais; e da «Associação de Socorros
Mútuos Commércio e Indústria no Porto», na desaparecida Rua da Cancela Velha,
n.º 18 – Ed. Foto Guedes; Fonte: AHMP
No local assinalado na planta acima, com um rectângulo
negro, na esquina das ruas da Cancela Velha e Adriano Machado, tinha estado a
Companhia do Gás.
Os prédios identificados a azul estavam presentes em foto
anterior na qual aparecia o Chafariz do Laranjal – Ed. Arquivo Histórico
Municipal
Os prédios frontais, com as fachadas voltadas a norte, são o
que ainda restava, em 1939, da Rua da Cancela Velha - Ed. Guilherme Bonfim
Barreiros, In: “nocentenariodaavenida.up.pt”; Fonte: AHMP
À esquerda da foto acima, na Rua de António Sardinha, actual
Rua Dr. António Luís Gomes, nasceria, depois do necessário desaterro, o Palácio
dos Correios.
A perspectiva da foto anterior é obtida a partir das
existentes, à data, escadas do edifício da Câmara Municipal do Porto, na Praça
do Município (hoje do General Humberto Delgado), na década de 1940 e observa-se
à esquerda, os antigos edifícios da Cancela Velha, entretanto, demolidos, onde
hoje está a Rua de Guilherme da Costa Carvalho e, ao centro, a Rua de Rodrigues
Sampaio, que conduz à praça de D. João I, na época ainda em construção. Tudo se
passa na sequência da abertura da Avenida dos Aliados.
Uma perspectiva actual, aproximada, da foto anterior, pois a
antiga Rua da Cancela Velha, desenvolvia-se por parte do chão do Palácio dos
Correios - Fonte: Google maps
Para além dos Paços
do Concelho, ainda em construção, são reconhecíveis, à esquerda, o edifício
César Augusto Bordallo ocupado, em 1933, pelo Futebol Clube do Porto e o do
Clube dos Fenianos, ocupado em 1935.
Sem comentários:
Enviar um comentário