sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

(Continuação 23) - Actualização em 19/02/ e 21/03/2019



Mercado do Peixe

O Mercado do Peixe situava-se na parte oeste da «Cordoaria», o antigo Campo do Olival e, desde 1835, chamado de Campo dos Mártires da Pátria.
Foi construído em 1874, em local onde se situaram os antigos celeiros da cidade e onde, depois, também estiveram, nas mesmas instalações, alojados os quartéis militares dos terços destinados à guarnição da cidade. 
Até à ocorrência de um incêndio, em 1832, o edifício que surgiu no dealbar do século XVIII, por iniciativa do Senado da Câmara, albergou também corpos de defesa militar ou de manutenção da ordem pública. 
No século XVIII, começou a pensar-se transferir a venda pública de peixe, que então se fazia, desde longa data, no Mercado da Ribeira. 
Depois de terem feito um estudo para instalá-la na Praça de Santo Elói (o que não veio a acontecer), foi a venda passada para a zona da Cordoaria, para a denominada Travessa de S. Ben­to dos Frades, hoje, apenas, Travessa de São Bento. 
Uma sentença lavrada pelo Tribunal da Relação determinou em 1793, que a venda do peixe passasse para a parte do jardim da Cordoaria, mais voltada a poente. 
No começo o peixe era vendido, no novo local, ao ar livre, na via pública.
Após o incêndio, em 1832, que destruiu o que tinha sido o quartel da 1ª Companhia da Guarda Real da Polícia do Porto que, entretanto, ali se tinha instalado, mas que algum tempo antes já se tinha mudado para o Largo da Cividade, a venda do peixe passou novamente para a Praça da Ribeira, quando foi determinado pela Câmara, em Junho de 1837, que a venda do pescado passasse para junto do convento de Santa Clara, nos Guindais, encostado à Muralha Fernandina, na Postigo do Sol. Por aqui se iria manter, durante muitos anos, a venda do peixe fresco e salgado.
Entretanto, em 1869, a câmara determinou a construção de um edifício unicamente destinado à comercialização do pescado no local do quartel que tinha ardido na Cordoaria.
O Mercado do Peixe propriamente dito, ao lado do qual funcionou durante cerca de 40 anos a Roda dos Expostos para recolha de crianças abandonadas, data de 1874, ali permanecendo até finais dos anos 50 do século XX, pois no mesmo local foi construído o actual edifício do Palácio de Justiça do Porto, onde funciona o Tribunal da Relação, cuja construção se iniciou em 1958 e foi inaugurado em 1961.
O Mercado do Peixe, bem como o Mercado do Anjo, seriam substituídos pelo mercado do Bom Sucesso, por resolução camarária de 1952.
Nessa data o Mercado do Anjo estava anexo ao Mercado do Peixe, em instalações provisórias, levantadas meia dúzia de anos antes na área que tinha sido ocupada pela Roda.




A Roda (antes a brévia dos frades antoninos) esteve no primeiro edifício à esquerda da foto do qual se observa uma pequena fatia em cujo solo foi montado após a sua demolição o mercado provisório do Anjo




Junto da brévia dos frades esteve edificada também a capela de Senhor do Calvário Novo.



Traseiras do Mercado do Peixe e Roda dos Expostos




Extracto de uma planta de Telles Ferreira de 1892 – Fonte: “aportanobre.blogspot.pt”


Legenda:

1. Mercado do Peixe
2. Roda dos Expostos (antigo Hospício dos Capuchos)
3. Capela do Calvário Novo
a. Igreja das Taipas



Traseiras do Mercado do Peixe à esquerda – Fonte: “aportanobre.blogspot.pt”



Na foto acima ao centro está a traseira da Roda dos Expostos e à direita a traseira da capela do Calvário.



Mesma vista da foto anterior mas mais antiga - Fonte: “aportanobre.blogspot.pt”



A foto acima mostra no local do Mercado do Peixe as traseiras dos chamados “celeiros da cidade", depois, quartel dos Terços, que o antecederam nesse local.
É visível ainda, a igreja de Nossa Senhora da Graça e o colégio dos Meninos Orfãos, bem como, a Reitoria em construção.




Interior do Mercado do Peixe




No dia 17 de março de 1389, o rei D. João I enviou aos homens da governança do Porto uma carta a recomendar "que todo o pes­cado fresco que aí [à cidade] viesse, em na­vios ou em bestas ou em colo de homens, que antes que o descarregassem que o le­vassem logo à praça da Ribeira para as gen­tes o comprarem.
Há neste documento régio dois pontos importantes: é a primeira vez que se faz re­ferência à Praça da Ribeira; e da leitura da carta régia deduz-se que D. João I pedia ou sugeria, às autoridades portuenses da épo­ca, que se regularizasse, na cidade, a venda do peixe.
Sabemos que muitos anos mais tarde, em 1784, o problema da venda de peixe na ci­dade continuava por resolver. Com efeito, a 26 de março daquele ano, a Câmara do Porto estudava um projeto que previa a construção de uma arcaria ao redor da Pra­ça de Santo Elói, atual Largo dos Lóios, para, debaixo dela, se fazer a venda de peixe. 
Cerca de dez anos depois, em 26 de janei­ro de 1793, os vendedores de peixe anda­vam com as canastras às costas. Por essa al­tura, vendiam na Travessa de S. Bento dos Frades, atual Travessa de S. Bento, e na rua "junto à igreja da Vitória", que era a Rua de S. Bento da Vitória. Uma sentença lavrada pelo Tribunal da Relação, que funcionava ali mesmo ao lado, no edifício da antiga cadeia, ordena­va que os peixeiros fossem removidos da­queles locais para a Cordoaria, "onde - acentuava a sentença - já anteriormente se vendia (o peixe) por este sítio ser mais próprio e oferecer melhores comodidades ao público". 
Os vendedores de peixe instalaram-se na Cordoaria, onde já haviam estado, numa fase anterior e, como antigamente, a vender o seu produto mas ao ar livre, na parte do jardim mais voltada a poente. 
Em 1832, ocorreu uma tragédia na Cor­doaria que causou a morte a sete pessoas e a quinze "solípedes". Um incêndio, de pro­porções descomunais, reduziu a cinzas um grande imóvel onde estavam aquartelados os soldados de uma companhia de infanta­ria e os guardas da Guarda Real de Polícia do Porto. O edifício era histórico. Servira, durante muitos anos, de Celeiro Público da Cidade. Era lá que se arrecadavam os cereais com que se fazia a farinha para o fabrico do pão que havia de alimentar a população ci­tadina. O incêndio deve ter tido implicações sé­rias na atividade dos peixeiros, porque, seis escassos anos volvidos sobre a tragédia, em dezembro de 1838, a Câmara andava à procura de um novo sítio para a instalação dos vendedores de pescado. De facto, nas vés­peras de Natal daquele ano, os do Municí­pio deram a conhecer que "oferecendo o terreno próximo ao postigo do Sol, destina­do a mercado de palhas e ervas, a necessá­ria comodidade para igualmente nele se es­tabelecer um mercado de peixe fresco", logo deliberaram no sentido de no dito ter­reno, "junto ao muro [Muralha Fernandi­na] das religiosas de Santa Clara, "ser per­mitida a marcação de lugares para a venda de peixe, "até uma hora para além das Avé-Marias".  
Por muitos e bons anos, ficaram ainda os peixeiros junto aos Guindais. É que só trin­ta e um anos depois, em 10 de maio de 1869, foi lançada a primeira pedra para a construção, de raiz, de um mercado exclusivamen­te destinado à venda de peixe. E, curiosa­mente - ou talvez não -, o local escolhido para o novo edifício foi, na Cordoaria, aque­le onde havia estado o Celeiro da Cidade e, posteriormente, um aquartelamento mi­litar. 
O projeto da nova Praça do Peixe foi com esta designação que passou a ser conheci­da a nova estrutura, ficou a dever-se ao Eng. Gustavo Adolfo Gonçalves de Sousa, fun­cionário da Câmara Municipal. A inaugu­ração solene da nova Praça do Peixe ocor­reu em 1 de março de 1874. 
A fachada principal do edifício, que esta­va voltada para o jardim, era constituída por uma série de janelas com a parte superior em arco. A meio, havia três enormes arcos almofadados encimados por uma cornija no meio, na qual estavam as armas da cidade, as mesmas que agora estão numa parede la­teral daquele arranjo que o arquiteto Fer­nando Távora fez para a casa do Senado, jun­to à Sé. Antes de ser levado para ali, o brasão estava no Roseiral do Palácio de Cristal. 
No local, onde os peixeiros se fixaram após terem saído de S. Bento da Vitória, ha­via um cruzeiro de granito pintado, da in­vocação do Senhor da Saúde. Os vendedo­res de peixe nutriam por esta imagem uma grande devoção e todos os anos faziam uma festa em sua honra. De tal modo era vene­rado pelos comerciantes de peixe, que o cruzeiro passou à história como o "Senhor dos Peixeiros". Foi retirado do local no dia 1 de junho de 1869. Está na capela de S. Jo­sé das Taipas, onde pode ser visitado. Onde esteve a Praça do Peixe está agora o moder­no edifício do Palácio da Justiça.”
Com a devida vénia a Germano Silva




O “Cruzeiro dos Peixeiros” no mini-museu da igreja de S. José das Taipas - Ed. Graça Correia




Mercado do Peixe e, à esquerda, a Roda dos Expostos




Mercado do Peixe – Ed. Arnaldo Soares




O desnível do terreno da foto acima foi rematado por um varandim.



Mercado do Peixe



Pedra de armas do antigo Mercado do Peixe




O brazão do antigo mercado do peixe da Cordoaria encontra-se hoje numa das paredes da Torre de Fernando Távora, na reconstituição da antiga Casa da câmara, mesmo junto à Sé.




À porta do Mercado do Peixe



Mercado do Peixe ao fundo à direita



Mercado do Peixe à direita



Na foto acima da esquerda para a direita, vemos sucessivamente o que foi a capela do Calvário Novo, o Hospício dos Capuchos e, finalmente, o Mercado do Peixe.
É visível também que nos anos 30 do século XX, já tinham sido abertas 4 portas no edifício que tinha sido capela, já que, durante décadas, ele foi dedicado à actividade comercial.




Vista actual, com a mesma perspectiva da foto anterior – Fonte: Google maps


Preparação do terreno, em 1952, no Campo Mártires da Pátria, para construção do Palácio da Justiça






Construção do Palácio da Justiça


Como já vimos cerca do ano de 1660, já existia no local uma ermida. Em 1703 veio a receber obras, e seria transformada numa capela, de acordo com o texto que se segue:

“Tendo grande devoção, Magdalena da Cruz Campobello, da Villa de Guimarães com o Senhor, fez o contracto de doação à Confraria, em 1703, com a obrigação de lhe fazerem huma Caza junto à Capella que julgo ser a terra da cerquinha da dita Magdalena da Cruz, para a dita viver .... Consistia a Capella naquelle tempo ser pequena, baixa, com hum alpendre de fora e huma Caza ao pé da Fabrica e Ermitão...
Em o anno de 1703 emprazarão os Mordomos à Camera a terra para reedificarem o corpo da Capella com o alpendre por Prazo fateuzim ... acabarão o corpo da Capella em 1705 e continuarão a obras de 1737 ... Em 1734 forão inquietados pelos Religiozos vezinhoos capuchos, alem das demandas, em pedirem a Capella ao Rey o Senhor D. João Quinto. Em 1737 fizerão os assentos ao redor da Capella e outras obras, tudo á custa da Confraria, como se vê de huma pedra nella esculpida que diz:
« Esta obra assim cazas como pateo e assentos se mandou fazer à custa das do Calvario Novo anno 1737»…
(…)Não se descuidarão os Capuchos em verem de que modo havião de uzurpar a Capella, de sorte que começarão a miná-la pela parte de traz que confina com a sua Cerca, e movendo-se pleitos sobre isto se fez vistoria que se julgou por sentença ... e de que dipois rezultou fazer-se o paredão. Da parte da Viella intentou o Galvão fazer humas Cazas terreas encostado ao muro do paceio e Logradouro da dita Capella e fazendo-se vistoria, se julgou ser a terra do Publico ....
Em 1784 tornaram a pedir a Capella os Capuchos à Raynha a Senhora D. Maria primeira, vindo a informar responderão até o anno de 1787 por motivo de que fizerão o contracto de transacção com a Ordem [da Trindade].”
Fonte: Bernardo Xavier Coutinho (História documental da Ordem da Trindade), In “aportanobre.blogspot.pt”

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