sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

(Continuação 30) - Actualização em 07/05/2018, 26/06/2019 e 13/01/2020




“A Rua do Pinheiro é uma das poucas artérias da cidade cuja fisionomia pouco se alterou ao longo dos anos. Começa, digamos assim, junto à antiga "estrada que vem de Guimarães para a Porta do Olival" (a actual Rua dos Mártires da Liberdade) e desemboca num pequeno largo que é uma espécie de miradouro arcaico daqueles sítios. Pois foi por aquelas desafogadas bandas, entre quintas, chãos sem contenda, hortas, olivais, prazos vazios e arroios secos, nos chamados campos do Pinheiro ou da Pena de Arca, que, por 1725, um tal João António Monteiro de Azevedo mandou construir a sua casa e capela da invocação de Nossa Senhora da Conceição. Foi nessa casa, cabeça de uma enorme propriedade então denominada Quinta do Pinheiro, que, desde os finais do século XIX e praticamente até aos nossos dias, funcionou uma das mais prestigiadas instituições de ensino particular que houve no Porto.
A Escola Académica resultou da fusão de três outros estabelecimentos de ensino particular da época: o Instituto Minerva, o Instituto Escolar de S. Domingos e o Colégio de S. Lázaro. O fundador da Escola chamava-se Manuel Francisco da Silva. Ainda era estudante quando, em 1880, abriu, exactamente na antiga Rua da Sovela, uma sala de estudos. Dois anos depois, comprava o Instituto Minerva e nascia a Escola Académica, que teve a sua primeira sede na Rua dos Mártires da Liberdade, onde leccionaram os mais conceituados mestres da época: João Arroio, Oliveira Alvarenga, Ventura Terra, Simas Machado, entre outros e onde em 1884 começou a estudar Rocha Peixoto, com 17 anos tendo por condiscípulos António Nobre e Alexandre Braga que viria a ser articulista, revolucionário de 1891 e académico da Classe de Ciências Matemáticas, Físicas e Naturais e professor.
A transferência para a Quinta do Pinheiro surge ao findar do século XIX. É por essa altura, 1896, que ao fundador da Escola Académica se junta António Domingues dos Santos, até aí director do Colégio da Glória. Manuel Francisco da Silva morreu em 1911. Mas o espírito da Escola Académica que ele criara ficou e vingou. Por aquele estabelecimento de ensino, passaram algumas das mais influentes figuras da cultura portuense e nacional dos finais do século XIX, começos do seguinte: Justino de Montalvão, José Régio, António Nobre, Carlos Selvagem, Ricardo Severo, Joaquim Costa, Alexandre Braga (filho), Eduardo dos Santos Silva, Emídio de Oliveira, Cristiano de Carvalho, Mário Amador e Pinho, Rui Corte Real Meireles, José Aroso e muitos mais. Entre os antigos alunos da Académica, avultavam médicos, advogados, comerciantes, engenheiros. Muitos seguiram a vida política, a diplomacia e o professorado; outros notabilizaram-se nas letras e no jornalismo. A partir de certa altura, a Escola Académica passou a funcionar como uma secção do Colégio Almeida Garrett.
Não deixa de ser curiosa esta particularidade, como curiosa é, ainda, a circunstância de, num espaço relativamente reduzido em torno da actual Rua dos Mártires da Liberdade, terem florescido algumas das mais importantes referências culturais do Porto dos finais do século XIX, começos do seguinte: o Colégio Almeida Garrett, a Escola Académica, a Renascença Portuguesa e a Livraria Académica, fundada pelo senhor Guedes da Silva e hoje do livreiro Nuno Cadavez. De todas aquelas instituições, já só esta subsiste, mantendo-se, no entanto, para além do estabelecimento onde se compram e vendem livros novos e usados, como um espaço aberto de tertúlias culturais onde se trocam ideias e se fala de livros e ponto de encontro de bibliófilos. Pela livraria passaram várias gerações de alunos e de mestres dos dois já desaparecidos estabelecimentos de ensino.
Mais uma nota curiosa sobre a Escola Académica: foi numa das suas dependências que, em 1885, Rocha Peixoto, Ricardo Severo, Fonseca Cardoso, José Júlio Gonçalves Coelho, Alexandre Braga (filho), Hamilton de Araújo, Guilherme Braga (filho), Augusto Nobre e Eduardo Arthayett fundaram o Grémio Literário "Oliveira Martins", que viria a ser o embrião da futura Sociedade Carlos Ribeiro, responsável pela edição da revista "Portugália". Trata-se de uma das mais prestigiadas revistas de cultura que se publicaram nos finais do século XIX e onde colaboraram os mais consagrados investigadores da época. A "Portugália" tem hoje um extraordinário valor bibliográfico e cultural e já só nos livreiros antiquários é possível encontrar uma colecção completa.
Ao tempo em que a Escola Académica se instalou na Quinta do Pinheiro, aqueles sítios eram ainda considerados como sendo a periferia da cidade. A ampla propriedade, situada "junto aos Carvalhos do Monte, prez da cidade", sofreu profundas alterações quando, em 1761, João de Almada e Melo deu início ao seu arrojado plano de urbanização, que previa a abertura das ruas do Almada e da Conceição, entre outras. Por esse tempo, da parte de fora dos muros defensivos da cidade, já havia a Praça Nova das Hortas, as ruas do Bonjardim e a do Pinheiro, que, por essa altura, se chamava Rua da Misericórdia, por ter sido aberta em terrenos que pertenciam a esta instituição. A casa onde veio a ser instalada a Escola Académica fora mandada construir por João António Monteiro de Azevedo, que também mandou fazer a capela cujo traço é atribuído a Nicolau Nasoni. A capela, da invocação de Nossa Senhora da Conceição, tem na sua fachada uma curiosa inscrição em latim que quer dizer mais ou menos isto: "...este lugar do Pinheiro desaparecerá; a Senhora da Conceição, porém, há-de atear chamas alterosas e estas darão água..." A frase deve estar incorrectamente escrita. O que se pretende dizer é que "a vida passará mas a devoção à Senhora da Conceição será aqui perene..."
Com a devida vénia a Germano Silva


Aqui funcionou a Escola Académica – Ed. J. Portojo



A Escola Académica, onde leccionava o conhecido padre Marcelino da Conceição, acabaria por fechar na segunda metade do século passado, e passou a ser ocupada por um Atelier de Tempos Livres (ATL) e por um jardim-de-infância geridos por uma Associação de Moradores.
A denominada “Associação de Moradores da Ex-Escola Académica do Porto”, após a revolução de 25 de Abril, ocupou as instalações da antiga Escola Académica.
A partir de Janeiro de 1981, parte das instalações da antiga Escola Académica seria ocupada pelo TEP (Teatro Experimental do Porto), vindo da sua antiga sede, situada na Rua do Ateneu Comercial do Porto.
Em 1994, um incêndio destruiria a Sala-Estúdio do TEP e, ainda, uma escola primária situada por cima do auditório, obrigando aquela companhia teatral ao abandono do local.
Era, à data, Alfredo Magalhães Basto o presidente da Associação de Moradores da Escola Académica.
Aquela Instituição de Solidariedade Social sobreviveria à catástrofe, mas, após mais de trinta anos, teve que abandonar o local por dívidas à Segurança Social e às Finanças, em 2009, sendo a propriedade reclamada pelo Montepio Geral em Tribunal.




Colégio de Nossa Senhora da Guia, Liceu da Trindade, Colégio Daniel, Colégio São Carlos e outros



Em 1856, pela Rua das Congostas, existia o Colégio de R. Russel.



Anúncio ao Colégio de R. Russel, no jornal “O Commércio do Porto”, de 8 de Janeiro de 1856



O texto da revista "O Tripeiro", que se segue, dá-nos informação sobre alguns outros colégios onde cursaram alunos que, mais tarde, se tornaram personalidades importantes da cidade.






Texto da revista "O Tripeiro", cortesia de Rui Cunha


No texto acima é referido o colégio que seria conhecido como Colégio Daniel e que, por certo, seria o "Instituto Portuense" que tinha por um dos sócios um tal Daniel d'Almeida Navarro.



In "Jornal do Porto" de 3 de Outubro de 1859



No texto é ainda referido o Colégio de Nossa Senhora da Guia que, c. 1859, esteve instalado no palacete do visconde de Veiros, às Águas Férreas e que, segundo o autor do mesmo, teria passado pelo palacete dos Castro Pereira, na Rua de Santa Catarina, onde só poderá ter estado até 1866, pois, nesta data, o prédio é alugado ao Liceu Portuense.



In "Jornal do Porto" de 1 de Outubro de 1864




O Colégio de Nossa Senhora da Guia terá, então, passado para a Rua de Fernandes Tomás, nº 62, para um prédio onde esteve o Colégio Daniel e onde viria a instalar-se um outro colégio, que ficou famoso pela sua qualidade de ensino – o Colégio São Carlos.
Neste local, anos mais tarde, instalar-se-iam os Bombeiros Voluntários Portuenses.



In "Jornal do Porto" de 1 de Outubro de 1870


Num outro texto de “O Tripeiro” série V - ano X, sabe-se que, aquando da demolição da capela do convento das carmelitas em 1900, foi procurada uma sepultura antiga de uma freira (incorrupta), numa área próxima à capela, que antes tinha sido cemitério, sepultura que tinha sido descoberta, quando aí tinha funcionado o Colégio da Guia.
Pelas informações recolhidas, parece que após a ida c. 1866, para a Rua de Fernandes Tomás, o Colégio de Nossa Senhora da Guia teria passado para as antigas instalações do convento das carmelitas.
Em 1901, o Colégio de Nossa Senhora da Guia, destinado à educação de meninas, vai ocupar, na Rua de Santa Catarina, o palacete do Castelo (entre a Rua Firmeza e a Rua Gonçalo Cristovão, bem perto do local em que esteve a Fonte do Canavarro). 
As novas instalações são inauguradas no dia 1 de Outubro, daquele ano, sob a direcção de D. Sancha Lagoa.
O colégio, alguns anos depois, passará para a Rua do Moreira, nº 178.





Bilhete-Postal do Colégio Nossa Senhora da Guia



Colégio de Nossa Senhora da Guia, no Palacete do Castelo, na Rua de Santa Catarina, nº 703 – Anúncio publicado no jornal “A Voz Pública” de 15 de Setembro de 1909




Em 1939, O Colégio de Nossa Senhora da Guia mantinha-se na Rua do Moreira, nº 178.
Por sua vez, o Colégio São Carlos, para rapazes, ocuparia, após o abandono do Colégio de Nossa Senhora da Guia, as instalações na Rua de Fernandes Tomás.
Em 1889, o Colégio de S. Carlos já estava na Rua de Fernandes Tomás, vindo da Rua da Ferraria (actual Rua Comércio do Porto) onde esteve na década de 1860.
O Colégio S. Carlos foi fundado por Carlos Brandão Vasconcelos, em 1860.




Colégio de S. Carlos, na Rua da Ferraria, nº 197 – Fonte: “Jornal do Porto” em 30 de Setembro de 1870



Em 1874, informavam que o Colégio S. Carlos iria mudar para instalações na Rua de Fernandes Tomás, onde tinha estado o Colégio da Guia.
 
 

“Jornal do Porto” de 30 de Setembro de 1874



Anúncio do Colégio São Carlos, no “Jornal do Porto”, em 29 de Setembro de 1889



Em 1908, o Colégio São Carlos estaria, de acordo com cópia do documento abaixo, numa casa de que era proprietário José Soares Dias Simões, situada na esquina da Rua de Fernandes Tomás e, daquela que é, hoje, a Rua Comandante Rodolfo de Araújo, pois, é essa a conclusão a que se chega pela leitura daquele documento.



Termo de responsabilidade do mestre-de-obras a executar numa das casas ocupadas pelo Colégio São Carlos em 1908



No documento anterior, o Colégio de São Carlos ocuparia um prédio com entrada pela Rua de Fernandes Tomás, de que faria parte ainda uma outra casa, anexa, a intervencionar, que ficaria à face de um caminho que ia daquela rua, até à Rua de S. Jerónimo (Rua de Santos Pousada).
Ora, como a moradia de Joaquim Soares da Silva Moreira que também estava no gaveto da Rua de Fernandes Tomás e da Rua do Comandante Rodolfo de Araújo e ainda da Rua da Duquesa de Bragança (Rua D. João IV), começou a ser construída em 1904, o Colégio de São Carlos ocuparia uma área de um terreno anexo, àquele onde viria a instalar-se, a partir de 1933, o quartel dos Bombeiros Voluntários Portuenses, mais propriamente, nas suas traseiras.



Fachada do Colégio de S. Carlos paralela à Rua de Fernandes Tomás


Em 1885, o corpo docente do Colégio São Carlos, sito na Rua de Fernandes Tomás, era assim constituído:
Borges de Avelar e Jacob Bensabat (Professores da Cadeira de Inglês), Alfredo Maia e Hamilton de Araújo (poesia), Francisco de Faro e Oliveira (professor da cadeira de literatura), T. de Faria e Silva Dias (Professores da Cadeira de Desenho), António Vitorino da Mota (Professor da Cadeira de Introdução), Raposo Botelho (Professor da Cadeira de Geometria), Augusto Luso (Professor da Cadeira de Geografia), entre outros.
Como alunos, nesse ano, contavam-se:
A. Rodrigues Monteiro, Joaquim Baptista Alves de Lemos, Sá de Albergaria, Raul Brandão, Fer­nando Moutinho, José Saraiva, Alexandre Gomes, Eugénio Teixeira, F. A. de Carvalho Lamas, entre outros.
O ano de 1885, foi aquele em que o colégio de São Carlos, com a colaboração de alunos e professores, editou o jornal, de número único, “O Andaluz”, que pretendeu angariar donativos para ocorrer às vítimas do terramoto acontecido na Andaluzia em Dezembro de 1884.
Após o falecimento do seu fundador, O Colégio S. Carlos foi dirigido por um tal mestre Aragão.
A ele se refere o escritor e antigo aluno Raul Brandão, na sua obra “Memórias”, vol II, pág. 228.


 


Raúl Brandão
 
 
 
 
Durante a segunda metade do século XIX, muitos outros estabelecimentos de ensino proliferaram pela cidade.
O Liceu da Trindade situava-se junto da igreja da Trindade e viu a luz do dia em 1857. Sucedeu à inauguração, pela Ordem da Trindade, em 1851, duma escola primária.
Uma aula de música seria criada no Liceu da Trindade no seu ano de fundação por Jacopo Carli, ficando como professor de canto e de piano das alunas do liceu.
Em 1859, tornou-se Escola de Canto e Piano do Liceu da Trindade e foi aberta iniciação musical a ambos os sexos.
A 8 de Dezembro de 1859, o liceu seria notícia, aquando da inauguração nas suas instalações do retrato de D. Isabel Maria, priora perpéctua e protectora do Liceu. 


 


In “Jornal do Porto”, 21 de Novembro de 1871, p. 2

 
 

Homenagem ao fundador do Liceu da Trindade - In “Jornal do Porto”, 21 de Novembro de 1871, p. 2
 
 
Em Abril de 1910, a poucos meses da implantação da República, o Liceu da Trindade envolve-se nas comemorações do centenário do nascimento de Alexandre Herculano.
O ponto alto ocorreu no Domingo, 24 de Abril de 1910, um grandioso cortejo em honra de Herculano com cerca de 20 mil pessoas, quase 200 bandeiras e estandartes e muitas bandas de música, além das autoridades, desfilam do Palácio à Biblioteca Municipal, onde foi inaugurado um busto em bronze, e foram proferidos alguns discursos.
Durante as comemorações houve sessões no Liceu da Trindade, na Sociedade de Instrução e Recreio Verdi, à Boavista, nas escolas feminina e masculina de Aldoar, onde foram descerrados retratos. À noite, como na véspera, festejos populares na Praça D. Pedro, com iluminações e concertos pelas bandas regimentais. 




Publicidade ao Colégio de Santa Maria, no “Jornal do Porto”, em 01 de Outubro de 1859



Publicidade ao Colégio de Nossa Senhora dos Remédios, no “Jornal do Porto” de 2 de Outubro de 1870



Publicidade ao Colégio do Senhor do Bomfim, no “Jornal do Porto” de 30 de setembro de 1871



Publicidade ao Colégio Porto, no “Jornal do Porto”, em 01 de Outubro de 1876



À Praça dos Poveiros, o Colégio Porto (dentro da elipse a preto), na Rua de Santo André, nº 18, em planta da época




Publicidade ao Colégio de Santa Catarina, no jornal “A Voz Pública”, em 30 de Setembro de 1897



Publicidade ao Externato Anselmo Gomes, no jornal “A Voz Pública”, em 30 de Setembro de 1897

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