O primeiro Jardim Botânico no Porto foi estabelecido por decreto de
Passos Manuel, de 1837, tendo sido localizado, em 1852, na cerca do extinto
Convento dos Carmelitas, embora, a sua criação, apenas se verificasse em 1866.
Em 1845, a Academia Politécnica, a Escola Médico-Cirúrgica e a Guarda
Municipal ocuparam o edifício e cerca do extinto Convento dos Carmelitas,
situado na praça do Duque de Beja. Mas, só sete anos depois, em 1852, é que se
fez a divisão e a distribuição da propriedade.
O jardim botânico ficou com uma área de cerca de 7 700 m2, com as
dimensões de 78 metros pela face voltada ao sul, 128 pela face
voltada a leste e 113 pela face voltada ao poente.
Por esta altura, o Barão de Castelo de Paiva, desenvolveu um projecto
para o jardim, tendo sido executado, em 1865, com o Dr. Alvares Ribeiro, como
Director da Academia.
Aí esteve o Jardim Botânico, até 1903, quando passou para o Jardim da
Cordoaria, por necessidade de ampliação do quartel do Carmo.
Sem condições de instalação condignas, a partir daí, pode dizer-se que
a cidade ficou, praticamente, nos 50 anos seguintes, sem Jardim Botânico.
Acabaria por ser encontrada a solução em meados do século XX, com a
ocupação da chamada, Quinta do Campo Alegre.
Em 1895, esta quinta, que tinha uma área de 12 hectares, passou para a
posse de João Henrique Andresen Júnior (1861/1900) e de sua mulher, Joana
Andresen.
Quando para aqui chegou, vindo da Rua do Príncipe, João Henrique Andresen Júnior já tinha prole.
João Andresen concluiu o projecto de renovação da casa e dos
jardins que terão a atenção do amigo do casal, o fluoricultor Moreira da Silva.
Para além de comerciante e industrial, João Henrique Andresen
distinguiu-se na sociedade Portuense dos finais do século XIX, como Presidente
da Associação Comercial do Porto (1893 a 1894) e da Comissão Permanente de
Defesa da Marinha Mercante Portuguesa.
Quinta do Campo Alegre em planta
de Telles Ferreira de 1892
Legenda
1. Lugar de Salaberca (topónimo popular que derivou do antigo
proprietário dos terrenos e quinta, até às invasões francesas no início do
século XIX, o francês Salabert. Era a Quinta Grande do Salabert)
2. Casa da Quinta do Campo Alegre
3. Rua António Cardoso
4. Rua de Entre Campos
5. Rua do Campo Alegre
Quando os Andresen compraram a propriedade, a casa estava bastante
adiantada na sua estrutura, tendo-se preocupado de uma forma muito especial na
construção dos jardins.
João Andresen era filho do homónimo industrial e comerciante de vinho
do Porto e foi avô dos escritores Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004)
e Ruben A. (1920-1975).
“João Henrique
Andresen faleceu em 17 de Outubro de 1900, com apenas 39 anos. Pouco depois,
Joana Andresen volta a casar-se com Severiano José da Silva, que manteve a
quinta na posse da família até 1949.
Naquela época, os
limites da propriedade estendiam-se quase até ao Rio Douro, ocupando um lugar
importante no contexto da cidade do Porto.
A família
Andresen introduz alterações significativas, quer na casa, quer no jardim.
Neste último, provavelmente com o apoio do jardineiro paisagista Jacinto de
Matos, consolida o traçado do “Jardim do Roseiral“ e do “Jardim dos Jotas“,
constrói a casa e campo de ténis, renova o bosque e faz um grande investimento
nas colecções de plantas, enriquecendo a colecção já existente.”
Cortesia de Ana Catarina Dias Santos Antunes (Tese de Mestrado-
Universidade de Aveiro, 2006)
Casa da Quinta do Campo Alegre vista dos pomares, em 1930
“O Professor
Américo Pires de Lima com a colaboração do alemão Franz Koepp, na sequência da
compra da Quinta do Campo Alegre pelo Estado, em 1949, procedeu à sua adaptação
para o Jardim Botânico da U.P., tirando partido do traçado de jardins e da
vegetação já existentes ao gosto das quintas de recreio do Porto de finais do
século XIX. Depois do atravessamento da propriedade pelos acessos da ponte da
Arrábida, ela ficou reduzida a 4 hectares, eram 12, tendo conservado os jardins
iniciais e na parte sobrante dos campos de cultivo e da mata foram sendo
instalados novos jardins, nomeadamente de plantas suculentas e de aquáticas
assim como um arboreto.”
Fonte: “jardimbotanico.up.pt”
“A transformação
em 1952 da Quinta do Campo Alegre em Instituto de Botânica Dr. Gonçalo Sampaio:
Laboratório e Jardim Botânico – liderada pelo multifacetado professor Américo
Pires de Lima (médico, antropólogo, botânico, explorador…) – proporcionou, para
além do grande enriquecimento em espécies botânicas, a criação de espaços
ajardinados modernos durante as décadas de 50 e 60, entre os quais se destaca o
belo Jardim do Xisto, da autoria de Franz Koepp, com as suas plantas aquáticas.
Mas muitos outros espaços foram implantados nesta época: nos antigos terrenos
de cultivo da parte baixa da quinta desenvolveu-se a área de bosque, criou-se o
lago grande e, a poente, surgiram as novas estufas e o viveiro.”
Fonte: “invasaodacasaandresen.up.pt”
Estudo para amputação de área (abaixo da via central) da Quinta do
Campo Alegre para levantamento dos acessos à Ponte da Arrábida (ponto superior
à direita)
Casa Andresen – Ed. “jardimbotanico.up.pt”
Este foi o local onde os primos Sophia de Mello Breyner Andresen e
Ruben A., brincavam quando eram crianças.
Nenhum deles nasceu aqui, mas ambos tiveram a sua infância e a
adolescência muito ligados à Quinta do Campo Alegre.
A escritora e poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen (Porto, 6 de
Novembro de 1919 — Lisboa, 2 de Julho de 2004) é uma das personalidades que
repousam no Panteão Nacional, sendo ainda conhecida, por ter sido a mãe do
escritor e jornalista Miguel Sousa Tavares.
Sofia de Mello Breiner – Foto de Eduardo Gageiro
Na célebre foto acima, de Sofia de Mello Breiner, observam-se
no beiral da janela, dois carrinhos com os quais costumava brincar o seu filho,
Miguel de Sousa Tavares.
Os denominados Jardins Literários, pela sua ligação com
as vivências de Sophia e Ruben, estão situados em volta da casa principal,
sendo possível ao visitante sentar-se no banco de azulejos descrito pela
escritora, observar a glicínia de que fala na sua obra e mesmo o bucho, que entram
num dos seus contos – O Rapaz de Bronze.
Planta do Jardim Botânico – Cortesia de Ana Catarina Dias Santos Antunes
(2006)
Legenda
1. Casa do Salabert
2. Casa da Quinta do Campo Alegre
3. Jardim do Rapaz de Bronze
4. Roseiral
5. Estufa Koepp
6. Arboreto (destaque para 2 sobreiros)
7. Lago Grande (Onde todas as águas vão parar é reservatório do jardim,
construído entre 1969/72 por Renato Raúl Barreto)
8. Estufas
9. Jardins dos Cactos
10. Jardins dos Anões
11. Antiga adega
12. Bosquetes
13. Jardim das Suculentas
14. Jardim do Carvalho
15. Jardim do Peixe
16. Jardim de Xisto ou Jardim das Aquáticas. Antigo campo de ténis
17. Rua do Campo Alegre
18. Via da Cintura Interna
19. Residência Universitária
20. Jardim dos Jotas
“À medida que se
avança no terreno contornando a casa surgem os Jardins de Sophia. Nestes
espaços é possível reviver o universo ficcional de Sophia, que se inspirou nos
jardins para escrever histórias infantis para os filhos. “O «Rapaz de Bronze»
nunca foi rapaz, é na realidade uma senhora, mas temos de lhe chamar assim”,
explicou Teresa Andresen, salientando que esta obra é de leitura obrigatória e
o facto de as crianças lerem a história neste sítio motiva para a leitura.
Aliás, as crianças ficam encantadas quando visitam o jardim e identificam os
cenários das histórias. Além do «Rapaz de Bronze», é também possível entrar no
universo do Jardim dos Anões do conto «A Floresta». O carvalho centenário onde
vivia a personagem Anão Velho teve de ser derrubado, mas o toco foi mantido. “É
um lugar para crianças, que incentiva à leitura, à ciência, à biologia. Tem uma
potencialidade fantástica”, sublinhou Teresa Andresen, referindo que o projecto
de ficcionação é da autoria dos arquitectos Paulo Farinha Marques e Ana
Catarina Antunes.”
Lúcia Pereira em “As camélias das japoneiras” (Cortesia Rui Cunha e
Maria José)
“Rapaz de Bronze” – Cortesia “bucolico-anonimo.blogspot.com”
“Rapaz de Bronze”
“...num lugar
sombrio, solitário e verde, havia um pequeno jardim rodeado de árvores
altíssimas que o cobriam com os seus ramos. No meio desse jardim havia um lago
redondo sempre cheio de folhas. No centro do lago havia uma ilha muito pequena
feita de pedregulhos e onde cresciam fetos. E no centro da ilha estava uma
estátua que era um rapaz de bronze. E durante o dia O Rapaz de Bronze não se
podia mexer e tinha que estar muito quieto, sempre na mesma posição, porque era
uma estátua. Mas durante as noites ele falava, mexia, caminhava, dançava, e era
ele que mandava nos jardins, no parque, no pinhal, nos pomares e no campo. E
todas as árvores e todos os animais e todas as plantas lhe obedeciam porque ele
era o senhor do jardim e o rei da noite”.
Sophia de Mello Breyner, In “O Rapaz de Bronze” (1965)
“Era uma vez um
jardim maravilhoso, cheio de grandes tílias, bétulas, carvalhos, magnólias e
plátanos. Havia nele roseirais, jardins de buxo e pomares. E ruas
muito compridas, entre muros de camélias talhadas… -Os jardins civilizados- são
sempre jardins de buxo. Perto dos gladíolos estava um caramanchão com glicínias
e bancos de azulejos… -Nos jardins antigos – diziam os gladíolos – há sempre
azulejos. Os buxos, quando ouviam isto, sorriam e murmuravam com voz de buxo,
que é uma voz pequenina, húmida e verde. –Nos jardins antigos havia buxo e
azulejos, mas não havia gladíolos…”
Sophia de Mello Breyner, O Rapaz de Bronze (1965)
Na realidade o rapaz de bronze é uma senhora, mas Sofia descreve-o
assim nos seus contos infantis.
“Nas traseiras da casa destacam-se ainda o
Jardim das Plantas Aquáticas (construído onde outrora estava o campo de ténis
da casa da Quinta do Campo Alegre), a adega (que serve de depósito de água e é
um dos edifícios mais antigos da Universidade do Porto), o Jardim das Plantas
Anuais (que era a horta), o Roseiral e o Jardim dos Jotas (de João e Joana
Andresen). Estes espaços estão separados por meio quilómetro de Camélias
talhadas em sebes. “É único, mais ninguém tem, podia entrar para o Guiness”,
salienta Teresa Andresen. A arquitecta paisagista salientou ainda que nestes
jardins se encontram os cenários da obra de Sophia, por exemplo a glicínia, que
envolve o caramanchão do Jardim dos Jotas”.
Lúcia Pereira em “As camélias das Japoneiras” (Cortesia Rui Cunha e
Maria José)
Jardim dos Jotas (João e Joana Andresen ) – fotos de
manueladlramos
Jardim dos Jotas (João e Joana Andresen )
Jardim de buxo cercado de japoneiras
Jardim do Roseiral e fachada a Sul da casa Andresen
Jardim do Roseiral
Jardim dos cactos
Estufas
Sem comentários:
Enviar um comentário