Pretende-se com a apresentação do que resta de alguns
lugares e aldeias do Porto, sensibilizar, quem de direito, mas sobretudo os
portuenses, para a defesa de um património que está quase a desaparecer.
Há que estudar, de conluio com os arquitectos e paisagistas,
formas de, sem entravar o progresso, preservar também o passado.
Lugares do Porto
1. Nevogilde
“Nevogilde surge como Lovygildus nas Inquirições de 1258,
composto por uma igreja ou freguesia do Julgado de Bouças, com casais povoados
ou não: 4 regalengos, 5 do mosteiro de Santo Tirso, 2 da Ordem dos
Hospitalários, 1 da Igreja de Vermoim (Maia), 2 do mosteiro de S. João de
Tarouca e 2 do mosteiro de Macieira de Sarnes.
Através da doação de
D. João I em 1399, o primeiro alcaide-mor do Porto, João Rodrigues de Sá, o “Sá
das Galés”, fica com o senhorio direto de prazos em Nevogilde, que foram
passando para os seus descendentes. Estes casais ou quintas foram emprazadas e
subemprazadas a famílias que as mantinham produtivas, germinando à sua volta
aldeias e lugares.
O lugar de Nevogilde
cresceu junto ao Casal da Igreja, que no século XVIII foi sendo emprazado
parcelarmente, originando a Quinta do Padrão, prazo que passou para os
descendentes de Tomás Pereira Morais, que por casamento ficaram unidos aos
Andrade Vilares e depois aos Lacerda Lobo.
Da existência de uma
igreja primitiva apenas se tem a informação que seria noutro local, a pouca distância
e talvez românica. A atual construção (barroca) foi obra impulsionada pelo
abade Pedro de Barros Ribeiro e atribuída ao mestre Domingos da Costa. Foi
construída entre 1729 e 1750 e sofreu uns acrescentos entre 1934 e 1935. Está
classificada como monumento de interesse público.”
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
Lugar de Nevogilde e ocupação habitacional, em 1892, na
planta de Telles Ferreira. A igreja de Nevogilde está identificada com o nº 1
Traseiras da Igreja
de S. Miguel de Nevogilde e adro
Largo de Nevogilde
2. Passos
“O lugar de Passos
está ligado à passagem dos mouros pela zona, pois apesar de surgir como uma das
quatro aldeias das Memórias Paroquiais (1758), poderá ser bem mais antigo. Até
ao século XX, no meio da aldeia ou lugar, existia uma capela dedicada a S. Paio
(ou Pelágio), mártir do século X, menino de 10 anos, sobrinho do bispo de Tui
que é aprisionado pelo emir de Córdova. O culto a este mártir é introduzido em Leão
e Oviedo pelos moçárabes.
Seria um dos 20 casais
que os Hospitalários detinham em 1258, comprovado por um dos marcos divisórios
existentes na rua de Fez.
A capela desaparece
com o arranjo da rua de Passos
(depois rua de Fez), mas não a total
ruralidade da área, sobejam alguns imóveis com características típicas de
quintas de produção. Neste lugar nasceu o lavrador Manoel da Silva Passos e
seus pais casaram na capela de S. Paio, a 5 de abril de 1761. Este lavrador é o
pai de dois vultos da política nacional: José da Silva Passos (Passos José) e
Manoel da Silva Passos (Passos Manuel)”.
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
Manuel da Silva
Passos (Guifões, 5 de Janeiro de 1805 – Santarém, 16 de Janeiro de 1862), criador
do 1.º Código Administrativo, mais conhecido por Passos Manuel e José da Silva Passos (Passos José) eram
filhos de um outro Manuel da Silva Passos, que morreu em 25 de Novembro de 1825
e de Antónia da Silva, nascida na freguesia de S. Martinho de Aldoar.
Passos Manuel foi
uma figura importante ligada ao liberalismo vintista e, mais tarde, uma figura
chave do Setembrismo.
Parlamentar
brilhante, foi ministro do reino com funções na área da educação, nos anos de
1836 e 1837.
Em 13 de Janeiro de
1837, Passos Manuel decreta a transformação da Academia Real da Marinha e
Comércio em Academia Politécnica do Porto.
Casado em 1838, com
uma rica herdeira, passa a viver em Santarém. Nos anos seguintes seria
parlamentar e, voltando ao Porto, participaria ao lado do irmão na Patuleia.
Lugar de Passos e ocupação habitacional, em 1892, na planta
de Telles Ferreira
Passos, também foi, por aqui – Fonte: Google maps
À direita, o pouco que resta de Passos. Estamos na Travessa de Passos - Ed. Manuela Campos (2019)
Ao centro, à margem da Travessa de Paços, o pouco que resta de Passos, actualmente - Fonte: Google maps
3. Vilarinha
“Aldoar, cuja origem é
controversa, está envolto em lendas relacionadas com a ocupação árabe. Surge
nas Inquirições de 1258 como igreja do Julgado de Bouças, composto por 3 casais
regalengos e 20 dos Hospitalários. Um pequeno templo, com invocação a S.
Martinho de Tours (o mata-mouros), foi dotado no século X e consagrado pelo
bispo do Porto, D. Godesendo. Nessa altura já existiria um pequeno cenóbio
misto e nas imediações o “castro Mafamudi”, identificado pelo Dr. Carlos
Alberto Ferreira de Almeida.
Nas Memórias
Paroquiais de 1758, entre as 4 aldeias nomeadas, está a da Vilarinha que poderá
corresponder à zona envolvente à igreja e junto à antiga estrada romana, depois
caminho para Santiago de Compostela, com passagem pelo Bom Jesus de Bouças.
Durante o Cerco do
Porto (1832-1833), nas imediações deste lugar, esteve alocado o “Reduto da
Vilarinha”. E a partir de 1990, o núcleo rural é integrado nos 45 hectares que
fazem parte do espaço verde, que é hoje o Parque da Cidade, tornando-se a sua
entrada oriental.”
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
Lugar da Vilarinha e ocupação habitacional, em 1892, na
planta de Telles Ferreira. A velha igreja de Aldoar está identificada com o nº
1 e, com nº 2, o edificado principal do lugar, de que hoje resta, apenas, um núcleo rural do Parque da Cidade
Vista aérea do actual núcleo rural do Parque da Cidade, ou seja, do que resta da antiga Aldeia da Vilarinha
Vilarinha, defronte da antiga igreja de Aldoar – Fonte: Google maps
4. Vila Nova
Situava-se este lugar, na área que, hoje, foi parcialmente
ocupada pelo Hospital da CUF.
Ainda existe uma Rua de Vila Nova e um aglomerado
habitacional degradado que faz lembrar o antigo lugar.
“Entre os 3 casais
regalengos e 20 Hospitalários das Inquirições de 1258 pertencentes à igreja de
Aldoar do Julgado de Bouças, está o lugar ou aldeia de Vila Nova.
Nas Memórias
Paroquiais de 1758, surge como uma das quatro aldeias da freguesia, para no
século XIX (1892) aparecer já na Carta Topográfica da Cidade do Porto,
levantada e dirigida por Augusto Gerardo Telles Ferreira, como lugar de Vila
Nova de Cima.
Cercada de campos de
produção agrícola, foi perdendo parte da sua feição rural no século XX, embora
ainda mantenha um traçado característico.”
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
Lugar da Vila Nova e ocupação habitacional, em 1892, na
planta de Telles Ferreira, em que o nº 1, identifica a Estrada da Circunvalação
Por aqui, ficava Vila Nova – Fonte: Google maps
5. Ouro
“O Ouro, lugar com
ocupação remota, durante a romanização corresponderia a um ponto de travessia
fluvial, utilizada como ponto de passagem para a via romana e mais tarde
caminho medieval, que ligava o litoral ao norte.
Junto a esta zona
ficava, na época medieval, uma granja cisterciense, em volta da ermida de Santa
Eulália (Ovaia). Em 1395, D. João I doa aos marinheiros de Lordelo do Ouro, um
terreno para a construção de um orago a Santa Catarina. Pela sua localização no
topo do monte, desde sempre serviu de baliza para a navegação.
Zona piscatória, com
areal extenso, cedo demonstrou ter as condições propícias para a construção
naval, desenvolvida principalmente a partir do século XVI. Os ofícios ligados a
esta atividade crescem e agrupam-se, concentrando-se os cordoeiros na
Cordoaria, e marinheiros, calafates e mestres no Ouro. Cria-se o Arsenal ou
Trem da Fazenda Nacional, mesmo em frente aos estaleiros.”
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
Lugar do Ouro e ocupação habitacional, em 1892, na planta de
Telles Ferreira
Legenda
1. Companhia Portuense de Iluminação e Gasómetros
2. Rua das Condominhas
3. Nova Companhia da Fundição do Ouro
4. Rua do Aleixo
O que resta da "Companhia Portuense de Iluminação" e
Gasómetros – Fonte: Google maps
6. Regado
“Núcleo de
proprietários agricultores, a quinta do Regado surge no século XII como
pertença de um cavaleiro da Ordem de Malta que a doou à mitra do Porto. Nas
Memórias Paroquiais de 1758, o lugar do
Regado é mencionado com 23 vizinhos, um núcleo rural bem mais habitado que
o central, o da Igreja. Manteve-se essencialmente agrícola no decorrer do
século XX, até que a urbanização e construção da Via de Cintura Interna
transformou a paisagem.”
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
A igreja referida no
texto anterior é a Paroquial de São Veríssimo de Paranhos.
Regado, deverá ter
constituído um marco identificativo e limitativo do território doado por D.
Teresa ao bispo D. Hugo e, que, à data, foi referido como “Mamoa Pedrosa”. Naquele
território, estava englobado a cidade do Porto, centrada no Morro da Pena
Ventosa.
O Lugar do Regado e a ocupação habitacional em planta de
Telles Ferreira, de 1892, em que a Rua Silva Porto está identificada com o nº 1
Aspecto do local da planta anterior, actualmente
Aldeia do Regado, actualmente, o que ainda resta, com perspectiva obtida de norte para sul, desde a Rua de Silva Porto - Fonte: Google maps
Perspectiva aérea, com a mesma orientação da vista anterior, do que resta da aldeia do Regado - Fonte: Google maps
7. Campo Lindo
O Campo Lindo surge como um desmembramento do medieval Casal
do Couto, foreiro ao Cabido da Sé do Porto, por onde passava a Estrada para
Braga (antiga via romana).
Nas Memórias Paroquiais de 1758, Couto, surge como um dos quinze
lugares da freguesia e um dos mais habitados, a saber, Couto, Agueto,
Igreja, Lamas, Tronco, Carvalhido, Vale (ou da Valle),
Regado, Cruz da Regateira, Antas, Travessa, Amial, Azenha, Bouça e Cabo.
Em 1892, na planta de Telles Ferreira, era aqui o Largo do Couto, no
Lugar do Couto, hoje, a Rua Carvalho Araújo
Em 1864, nos terrenos da família Loureiro, é construída uma
capela em madeira, com altar dedicado a Nossa Senhora da Soledade, imagem doada
por Manuel Alves de Oliveira Paranhos. Em 1871, é substituída por uma capela em
pedra e, em 1873, passa a orago do Senhor dos Passos, passando a ser conhecida
como a Capela do Encontro. Em 1887, tem lugar a primeira festa de Nossa Senhora
da Saúde, passando a realizar-se anualmente.
Junto à capela, fica a Casa do Campo Lindo que, em 1862,
pertence a Aniceto Pinto Monteiro e, que, mais tarde, entra para a família
Almeida Garrett, através dos descendentes do irmão do escritor, Alexandre José.
A casa ficou conhecida pelo seu jardim romântico, o Jardim
das Camélias.
Campo Lindo e capela da Senhora da Saúde, à esquerda –
Fonte: Google maps
Planta do piso 1, da Casa do Campo Lindo – Cortesia da
Arquitecta Susana Azevedo Oliveira Santos, Atelier Sucrre
Na gravura anterior está representada, em planta, a Casa do
Campo Lindo. Nela, pode ver-se, que a capela da Senhora da Saúde está em cima,
no canto esquerdo.
Alçado principal, a Nascente (observável a fonte e o brasão)
8. Lugar da Igreja de
Paranhos
“Entre as muitas vilas
que pertenciam às Terras da Maia, estava a “villa de paramus”. Terrenos de
lavradio, organizados em núcleos de agricultores e senhores (“domini”), que
ergueram as suas quintas e casais em redor de uma capela ou igreja também de
sua obra, elegendo o santo padroeiro e dando origem a Paranhos, no século X.
As primeiras
referências documentais surgem no século XI e XII, entre elas, a carta de
doação do couto do Porto, pela condessa D. Teresa ao bispo D. Hugo, que refere
a “ecclesia de paramios”. No século XIV, D. Afonso IV confirma à mitra do Porto
como sendo couto dos bispos.
Desconhece-se a data
de construção da primitiva igreja matriz, podendo já existir no século XI,
época em que o culto a São Veríssimo se propaga. Em 1758, é referida como tendo
5 altares, mas em 1845 está em estado de ruína, sucedendo-se uma série de
benefícios e acrescentos que percorreram o século XIX até meados do século XX.”
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
Ocupação
habitacional, no Lugar da Igreja, em 1892, na planta de Telles Ferreira
Legenda
1. Igreja paroquial
2. Rua do Cemitério
3. Rua da Igreja de
Paranhos
Largo da Igreja de Paranhos
9. Lamas
Deste lugar, ainda se pode ter um pequeno vislumbre, numa
visita à área das traseiras das faculdades de Economia e de Engenharia.
“A aldeia de Lamas vem
referida no primeiro assento de óbito registado na freguesia (20 de novembro de
1588), embora a quinta de Lamas (ou da Viscondessa, no século XIX), próximo do
centro do lugar, tenha sido doada pelo bispo do Porto no século XII, em conjunto
com a Fonte do Outeiro, ao mosteiro de Águas Santas.
O lugar de Lamas surge
nas Memórias Paroquiais de 1758 com 35 vizinhos, um dos mais habitados da
paróquia, o que demonstra o seu crescimento. Em 1834, o coronel Arbués Moreira,
na sua Carta Topográfica das Linhas do Porto (Cerco do Porto), indica a
existência do forte de Lamas.
Até aos dias de hoje,
conseguiu manter o seu aspeto rural, apesar das construções universitárias que
o invadem e a autoestrada que lhe retirou a ligação com a Fonte do Outeiro.”
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
Lugar de Lamas – Fonte: Google maps
Planta com posições relativas de alguns lugares de Paranhos
Legenda
1. Lugar de Lamas
2. Lugar da Bouça
3. Lugar de Telheiras
4. Lugar da Azenha
5. Rua do Ameal
6. Lugar do Tronco
10. Vila Cova
“No século XI existe a
referência a um convento de Agostinhas, na povoação de Rio Tinto. Já no século
XII surge como vizinha de “castrum amai”, pertença do rico-homem de Gondomar, o
alcaide Mendo Estrema.
D. Afonso Henriques,
em 1141, dá foro de couto ao mosteiro (agora da regra beneditina) e à abadessa
de Rio Tinto, que englobava entre as diversas aldeias, Vila Cova. Este lugar
tinha caseiros foreiros ao Cabido da Sé do Porto, que teve relações tensas com
a abadessa no século XIV, por causa das áreas de mato, pasto e cultivo de que
dependiam estes caseiros. Este facto demonstra que os limites de Campanhã
tinham-se expandido.
Lugar com grande
componente rural, ainda nos dias correntes, apresenta alguns exemplares arquitetónicos
dos séculos XVII/XVIII.”
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
Rua de Vila Cova – Fonte: Google maps
11. Pêgo Negro
“Tal como outros
lugares da freguesia de Campanhã, também a aldeia de Pego Negro surge entre as
que foram englobadas no foro de couto de D. Afonso Henriques, doado em 1141 ao
mosteiro e abadessa de Rio Tinto. Mais tarde, este lugar surge como pertença de
Campanhã.
Esta denominação é uma
das marcas remotas de atividades artesanais associadas aos cultivos das margens
dos rios Tinto e Torto. Pego derivado de “pelagus” designa ribeiro, rio,
riacho, lagoa, qualquer agrupamento de água. No entanto, o cónego Arlindo da
Cunha associa-o à tarefa de curtir o linho que foi metido na água depois de
ripado.
Neste lugar ainda
permanecem intactos alguns dos moinhos/azenhas que laboravam nas margens dos
dois rios já referidos.”
Fonte: Jornadas
Europeias do Património — 2016
Ocupação
habitacional, no lugar de Pêgo Negro, na planta de Telles Ferreira, de 1892
Legenda
1. Lugar de Pêgo
Negro
2. Estrada da
Circunvalação (começada em 1889)
3. Rio Tinto
Pêgo Negro, junto da ponte sobre o rio Tinto – Postal de 1917
Pego Negro – Ed. “cidadedoporto.pcp.pt”
“Na toponímia da
Câmara Municipal, lê-se que a mais antiga referência que se conhece ao Pêgo
Negro é de 1591, num registo de óbito da Freguesia de Campanhã. Outra
referência é de 1785 como Ribeiro do Pêgo Negro.”
Fonte: JPortojo
Os moinhos do Lugar de Pego Negro situavam-se, junto da ponte, sobre o rio Tinto – Ed. JPortojo
A Rua do Pêgo Negro, que herda o topónimo do antigo lugar, começa
na Rua das Areias, é interrompida pela moderna Alameda de Azevedo, contorna o
Parque Oriental, afunda-se no vale do rio Tinto, faz um gancho apertado, passa
sobre o rio e sobe até à Circunvalação.
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