terça-feira, 30 de julho de 2019

25.59 Portuenses, acordem!


Na esquina das ruas Ciríaco Cardoso e Carlos Dubini, está situada uma casa, que se descobriu ter sido projectada pelo arquitecto Raúl Lino (1879 – 1974), e que corre o risco de desaparecer.
Será, por certo, única obra projectada para a cidade do Porto, por aquele famoso arquitecto.
Com projecto de 1930, aquela descoberta foi feita por Carla Garrido de Oliveira, em 2014, durante a elaboração da sua tese de doutoramento, e dedicada à obra daquele arquitecto.
Durante as suas investigações, Carla Garrido revelou que o projecto fora uma encomenda do médico João de Almeida, tendo sido assinado pelo arquitecto José dos Santos e não, por Raul Lino, por razões que se desconhecem, mas usuais na actividade.
Estando em marcha um processo para demolição do imóvel, e reconversão do espaço que ocupa, para um novo empreendimento imobiliário, várias personalidades portuenses, entre elas, Alexandre Gamelas, Carlos Machado e Moura, Francisco Queiroz, José Costa Marques, José Pedro Tenreiro, Nuno Gomes Oliveira, Nuno Quental, Paulo Ferrero, Sérgio Braga da Cruz e Virgílio Marques enviaram uma mensagem de alerta para o Presidente da Câmara, começando por dizer:

“Esta casa, embora actualmente abandonada e vandalizada, é um exemplar de referência na obra de Raul Lino, tendo sido por este arquitecto destacada no livro Casas Portuguesas por si escrito. É de notar que existem poucas obras de Raul Lino na região Norte, sendo esta uma das poucas casas edificadas neste território e a única conhecida na região do Porto”.

Raúl Lino (Lisboa, 1879 - Lisboa, 1974) fez os seus estudos na Grã-Bretanha e Irlanda, para onde se deslocou com 10 anos de idade e, depois de 1893, na Alemanha, onde trabalhou no atelier de Albrecht Haupt, com quem manteve uma longa amizade.
Da sua vasta obra, destacam-se a “Casa da Quinta da Comenda” (1903), em Setúbal, a “Casa dos Patudos”(1905), em Alpiarça e o Teatro Tivoli (1925), em Lisboa.

“Raul Lino regressou a Portugal em 1897, onde continuou os seus estudos. Foi uma personalidade única no que se refere ao panorama das artes em Portugal, muito devido ao facto de ter conseguido articular a tradição portuguesa com as inovadoras correntes europeias, do início do séc. XX. Com 70 anos de atividade profissional, Lino é autor de mais de 700 obras. Também é importante referir que apesar do seu leque de projetos, ele também foi um homem com uma vasta obra teórica ou escrita, o que se tornou muito determinante, para os seus seguidores ao longo de décadas em Portugal.
(…) Desempenhou cargos no Ministério das Obras Públicas e foi Superintendente dos Palácios Nacionais. Foi membro fundador da Academia Nacional de Belas Artes, sendo seu presidente no momento da sua morte. No setor da imprensa, foi colaborador artístico em diversas publicações periódicas, nomeadamente nas revistas: Atlantida (1915-1920), Homens Livres (1923), Ilustração (1926) e na Revista Municipal de Lisboa (1939-1973).”
Fonte: “pt.wikipedia.org”



Casa de Raúl Lino, com vista obtida a partir da Rua Carlos Dubini – Ed. Google maps


Aspecto da fachada voltada para a Rua Ciríaco Cardoso – Ed. Manuela Campos


Desenhos de projecto inserido na obra de Raúl Lino, intitulada “Casas Portuguesas” – Cortesia de Abel Coentrão, In jornal “Público” de 28 de Fevereiro de 2019


Capa do livro “Casas Portuguesas” de Raúl Lino


Sobre este achado, mais uma joia a acrescentar a muitas outras para o engrandecimento da história da arquitectura da cidade do Porto, qualquer portuense, que se preze, deve defender que, pelas suas características e pela sua raridade, a obra de Raúl Lino deverá ter, da parte das autoridades, uma protecção patrimonial.
A Drª Carla Garrido de Oliveira está de parabéns.
Espera-se que, à “Casa de Raúl Lino”, não ocorra o mesmo que aconteceu, há poucos meses, com uma moradia histórica, situada na Rua de Pinto Bessa.
Tendo deixado de integrar, há 15 anos, a lista de imóveis de interesse municipal, foi completamente demolida, da noite para o dia, como resultado de alguma magia.
Em Janeiro de 2019, a Câmara do Porto deu um parecer positivo para novo projecto, mas nada parece ter sido feito, para de algum modo, ser preservada a memória, que se impunha.
O edifício, de 1913, tinha arquitectura de Francisco de Oliveira Ferreira (discípulo de Marques da Silva e Teixeira Lopes), sendo um dos arquitectos que mais marcaram a cidade, na primeira metade do século.
Francisco de Oliveira Ferreira, nascido a 25 de Setembro de 1884, projectou a Câmara Municipal de Gaia e alguns outros edifícios emblemáticos – como o do Clube Fenianos Portuenses ou a Clínica Sanatorial Heliantia, em Valadares.


Moradia com risco de Francisco Oliveira Ferreira, na Rua de Pinto Bessa (Desaparecida)


“A moradia da Rua de Pinto Bessa era o primeiro projecto de habitação do arquitecto Oliveira Ferreira no Porto e representante de uma “transição entre uma arquitectura vagamente eclética, com alguns aspectos de arte nova, e uma arte com algumas marcas portuguesas, como é o caso dos azulejos.” Guardava algumas preciosidades do trabalho de Oliveira Ferreira com o seu irmão, o escultor José de Oliveira Ferreira, e era “o último vestígio” de uma certa tipologia de habitação burguesa no Porto do início do século XX”.
Cortesia de Mariana Correia Pinto, In jornal “Público” de 17 de Maio de 2019


Azulejos do edifício demolido na Rua de Pinto Bessa - Cortesia de Francisco Queiroz



Há já, alguns anos, que na cidade do Porto, existe um processo que não se compreende e que vai, sucessivamente, apagando parte da nossa história edificada.
O primeiro passo, consiste em desafectar da protecção do “Interesse Municipal” alguns edifícios icónicos da cidade. São exemplo disso, os dois casos a seguir referidos.


“O Bloco Residencial Manuel Duarte, do arquitecto Januário Godinho, na rua de Santos Pousada, apeado, em 2006; ou o edifício multifuncional (residência, escritório, armazém, fábrica) requerido por João da Fonseca Carvalho, nos anos 30 do século passado, na Avenida Fernão de Magalhães, recentemente demolido para a construção de um hotel.”
Cortesia de Jorge Ricardo Pinto (Doutor, mestre e licenciado em Geografia pela UP)



Bloco Residencial na Rua de Santos Pousada, de Januário Godinho


A mesma perspectiva da anterior foto – Fonte: Google maps



Fábrica/Armazém de João F. Carvalho, na Avenida Fernão de Magalhães - Cortesia de “portosombrio.blogspot.com”



“Foi no início dos anos 30 do século XX, quando a Avenida Fernão de Magalhães ainda não havia chegado ao Campo 24 de Agosto que o industrial João da Fonseca Carvalho requereu licença para a construção deste prédio (…).
Constituído por três pisos, sob uma linguagem mais austera da Art Deco, o projecto do prédio esteve a cargo do engenheiro Joaquim de Oliveira Ribeiro Alegre, muito envolvido nos projectos de urbanização nas colónias portuguesas (principalmente em Moçambique); continha uma garagem no rés-do-chão e um escritório no primeiro andar, enquanto as partes restantes serviriam para habitação. O último piso tornou-se um salão único, servindo de ampliação à fábrica do proprietário que já funcionava num prédio contíguo, onde foram instalados teares.”
Cortesia de “portosombrio.blogspot.com”

Hoje, este edifício, depois de recuperado, está ocupado por um hotel.

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