domingo, 9 de junho de 2024

25.244 Ramal de Leixões, ou Ramal de Matosinhos, ou Linha de Leça - Revisitado

 

Em 1884, os empreiteiros Dauderni & Duparchy, que tinham sido contratados para levantar os molhes do Porto de Leixões, construíram, em 1884, para a Companhia das Docas do Porto, uma linha ferroviária para o transporte de pedra desde as pedreiras de S. Gens até à zona do porto de abrigo, com bitola de 900 milímetros, a chamada Linha de S. Gens.
Em 1884, seria começada a construir a Ponte de Ferro ou Ponte do Comboio, para fazer chegar a pedra ao molhe norte.
Esta ponte tinha 60 m de comprimento e unia a zona da actual Rua Heróis de França (antes, Rua da Praia ou Rua João Chagas) em Matosinhos, à Rua da Praia em Leça da Palmeira.
A pedra destinada ao molhe sul ficava pelo estaleiro levantado junto do cruzeiro do Senhor do Padrão.
A pedra que começou por ter origem nas pedreiras de Aguiar (na margem direita do rio Leça), em Santa Cruz do Bispo, cedo esgotaria o seu stock, razão pela qual, se passou a recolher aquele material nas pedreiras de S. Gens (na margem esquerda do rio Leça).
A importância da exploração dos recursos das pedreiras de S. Gens foi de tal ordem que o Governo de Sua Majestade, em 1885, mandou edificar, nas proximidades do Monte de S. Gens, um barracão com serventia hospitalar para prestar assistência médica aos operários, que na pedreira trabalhavam, devido ao surto de cólera que tendia a alastrar-se no país.
Em tempos anteriores à retirada da pedra para a construção dos molhes do Porto de Leixões, podia observar-se um belo monte que tinha sido dotado de uma “atalaia” (vigia) e no seu cume de uma capelinha da evocação de Nossa Senhora de S. Gens e que, mais tarde, após uma remodelação, passou a evocar Nossa Senhora da Nazaré.
A instalação da atalaia tinha sido uma decisão de D. João II, em Agosto de 1484.
Hoje, face a anos e anos de retirada do granito das pedreiras de S. Gens, o terreno, nada mais é que uma enorme cratera, tendo desaparecido, como é óbvio, a referida atalaia e a capelinha.
Situado num ponto privilegiado, a 137 metros de altitude, deste Monte de S. Gens ou Monte de Custóias, como também era chamado, podia avistar-se uma vasta extensão em redor, pelo menos até à serra de Valongo.
Sobre a referida e desaparecida capela, dizia Pedro Vitorino, “poucos se lembrarão já do perfil imponente do seu vulto, rematado no alto por uma capelinha recolhida à sombra de dois enormes pinheiros mansos. (…) Atacado por máquinas e fendido por pólvora, aos migalhos, abriu-se em princípio e multiplicou escombros que afastaram as aprazíveis digressões”.
 
 
Sobre o Monte de S. Gens, Dorothy Wordsworth, filha do famoso escritor e poeta romântico inglês William Wordsworth descreve, na sua obra “Diário de uma viagem a Portugal e ao Sul de Espanha”, o local quando o visitou em 1845.
 
 
 
 
 





Em 16 de Novembro de 1891, foi publicada uma portaria que estabeleceria as condições para o arrendamento da antiga Linha de S. Gens, à Companhia do Caminho de Ferro do Porto à Póvoa e Famalicão.
A partir da conclusão da construção do Porto de Abrigo de Leixões, em 1892, a população de Matosinhos mobilizou-se na exigência do aproveitamento da linha para serviço público de transporte de passageiros e mercadorias até à estação da Senhora da Hora que pertencia à Linha da Póvoa de Varzim.
Em 6 de Maio de 1893, aproveitando a estrutura da Linha de S. Gens, iniciou-se, então, um serviço ferroviário de passageiros, tendo o transporte de mercadorias sido autorizado por uma portaria de 2 de Junho daquele ano. À Linha de S. Gens sucedia, assim, aquela que foi conhecida por Ramal de Leixões, ou Ramal de Matosinhos, ou Linha de Leça.
O Ramal de Leixões apenas seria encerrado no dia 30 de Junho de 1965, com o argumento que, por causa do seu traçado urbano, causava muitos acidentes na sua passagem pelas principais ruas de Matosinhos.
 
 
 
 
 
Percurso inicial do ramal de Leixões
 
 
 
Pedreiras de S. Gens

 

Arruamento entre a Rua da Barranha e a Avenida António Domingos dos Santos – Ed. Manuela Campos
 
 
 
 
Pelo arruamento (sem trânsito) da foto acima, passava, em tempos, o comboio do Ramal de Leixões vindo das pedreiras de S. Gens, depois de atravessar a Senhora da Hora, a caminho da zona da Vilarinha (na estrada da Circunvalação), tendo por destino final a foz do rio Leça, onde descarregava o granito que transportava e, depois, os veraneantes.


Comboio, no Ramal de Matosinhos, passando na Senhora da Hora




Para esse efeito, a primeira paragem era junto ao Monumento do Senhor do Padrão, onde descarregava a pedra que iria servir para a construção do molhe Sul, seguindo depois para Leça da Palmeira, onde descarregaria o restante granito, para levantamento do molhe Norte. Esta estação, como serviço de passageiros, tinha por destino as praias de Matosinhos.
Para a frente do local indicado na foto anterior, o seu trajecto coincidia, até à chamada “Rotunda dos Golfinhos” (próximo do Hospital Pedro Hispano), com o actual percurso do Metro.
 

 
 
Entre os pontos 2 e 3, o trajecto do comboio e do Metro é comum e, entre os pontos 1 e 3, corresponde ao arruamento entre a Rua da Barranha e a Avenida António Domingos dos Santos – Fonte: Google maps




Apeadeiro da Biquinha, antes de chegar à Vilarinha na Estrada da Circunvalação

 




À esquerda, a Quelha Vitório Falcão, por onde chegava o comboio à Estrada da Circunvalação (em frente ao teatro da Vilarinha) – Ed. Google maps
 


 

Estrada da Circunvalação após a passagem pela Vilarinha - Fonte: Google Maps
 
 
Pela parte do terreno elevado que se vê na foto acima, na margem da via, na confluência da Estrada da Circunvalação com a Praceta Dom Nuno Álvares Pereira, vindo da Vilarinha, passava o Ramal de Leixões.
 
 
 
 

Avenida Afonso Henriques - Fonte: Google Maps

 
 
Por onde está agora o portão, na foto acima, vinha o comboio da Circunvalação que se dirigia para o Senhor do Padrão.


 
 

Em frente, é a direcção para a Rua Afonso Cordeiro - Fonte: Google Maps
 
 
 
O arruamento central, da foto anterior, é a via por onde o trajecto do comboio se desenrolava e que desembocava no cruzamento com a actual Rua D. João I.


 

Vista aérea de Matosinhos sul
 
 
Legenda:
 
1. Rua Manuel Dias da Fonseca confluência com Rua Dr. Afonso Cordeiro
2. Rua D. João I
3. Rua Brito e Cunha
4. Cruzamento de Rua Brito Capelo com Rua Sousa Aroso
5. Rua Carlos Carvalho
 
Na vista aérea acima pode ver-se no terreno o sulco natural por onde passava o Ramal de Leixões, no local designado por “Diagonal”, vindo da Senhora da Hora e da Vilarinha.


 

“Diagonal” em Matosinhos Sul – Ed. José Magalhães (actualmente)
 
 
 

Passagem de nível na Rua Brito Capelo, no troço denominado de “Diagonal”
 
 
 


Foto actual do local da passagem de nível da foto anterior
 
 
 
A linha férrea saía da esquina mais próxima, à esquerda da foto e, em diagonal, dirigia-se pelo canal formado agora por dois blocos residenciais à direita no sentido da seta.
Presentemente, foi aproveitada a faixa de terreno público, da antiga linha férrea entre a Rua Afonso Cordeiro e o cruzamento da foto acima, para levantar um arruamento pedestre denominado “Broadway”.
 
 
 

Estação do Senhor do Padrão
 
 
 
Em 22 de Setembro de 1897, num descarrilamento acontecido no Senhor do Padrão, voltou-se uma carruagem de 2ª classe, tendo os passageiros que enchiam o comboio sofrido, apenas, pequenas escoriações e um grande susto.
 


 

Rua do Godinho, junto do Senhor do Padrão, em 1950


 
 

Locomotiva do Ramal de Leixões ou Ramal de Matosinhos, em manobras, em 1964, junto da capela do Senhor do Padrão, em Matosinhos

 
 
 
Percurso ferroviário final do Ramal de Leixões entre o Senhor do Padrão e o Forte da Senhora das Neves
 
 


Estaleiro para apoiar construção do molhe sul do Porto de Leixões, montado junto do Senhor do Padrão

 
Após a conclusão da construção dos molhes do Porto de Abrigo de Leixões, a linha ferroviária existente continuou em funcionamento até Leça da Palmeira, junto do forte de Nossa Senhora das Neves.


 

Comboio na Rua Heróis de França (Rua da Praia), junto da lota – Fonte: Vítor Monteiro

 

Estuário do rio Leça

 
 
Na foto anterior, vemos Leça da Palmeira, à esquerda, e Matosinhos, à direita, e a unir as margens, uma ponte pedonal, a Ponte de Pau ou Ponte de Madeira.
Mais para jusante, já na chegada do rio Leça ao oceano, foi levantada uma outra ponte, que ficou conhecida pela Ponte de Ferro ou Ponte do Comboio.
Para vencer o rio Leça, o comboio atravessava, então, a Ponte de Ferro vindo do apeadeiro do Padrão, junto ao Monumento do Senhor do Padrão, em direcção ao apeadeiro de Leça da Palmeira onde entrava pela Rua da Praia.
 
 
 
 
 

Ponte de Ferro ou Ponte do Comboio, em 1900
 
 
 
Na foto acima pode ver-se o pormenor de, ao fundo, sobre a esquerda, ainda ser visível o Senhor do Padrão.


 
 

Ponte do comboio com Matosinhos no horizonte

 
 

Ponte do comboio e casario de Leça – Fonte: Óscar Fangueiro

 
 
 

Ponte do Comboio com Leça da Palmeira em 1º plano - Ed. José Rodrigues


 
 
Quando foi necessário transformar o Porto de Abrigo de Leixões, num verdadeiro porto comercial, teve que se entrar em desaterros terra dentro, desapareceu a chamada ponte do comboio e o Ramal de Leixões ficaria por Matosinhos, no Senhor do Padrão, até à década de 60 do Século XX, transportando pessoas, em especial na época estival, com os banhistas a deslocarem-se para a praia a partir da Senhora da Hora.
 
 
 
 

Estação de Leça da Palmeira e, na sua frente, a torre de posto Semafórico - Ed. Estrela Vermelha
 
 
 

Comboio junto do Forte de Nossa Senhora das Neves
 
 
 
Já um pouco distante do estuário do Leça, por outra ponte icónica se desenvolveu a linha férrea do Minho e que é apresentada na foto seguinte.

 
 

Ponte ferroviária sobre o Leça (situada entre a Travagem e Ermesinde) - Ed. Emílio Biel

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