17.6 Convento de Santo Elói ou Convento dos Lóios
e Casa da Moeda
Este convento foi fundado em 1490 e situava-se, onde temos
hoje, o Palácio das Cardosas.
Pertencia à Ordem dos Cónegos Seculares de S. João
Evangelista, cujos religiosos eram reconhecidos pelos seus hábitos de cor
roxa-azulada, e conhecidos como os evangelistas ou padres lóios.
No local da sua implantação passavam as muralhas fernandinas
e, no interior da cerca, os padres lóios fundaram um convento no último quartel
do séc. XV que seria conhecido por Convento
Novo de Santa Maria da Consolação e, designado também, como de Nossa Senhora da Consolação do Porto por ter sido edificado junto à ermida com o mesmo nome e, que anos mais tarde,
seria substituída por uma sumptuosa igreja com fachada para o Largo dos Lóios.
Segundo o padre Francisco de Santa Maria na sua obra "O céu aberto na terra",
localiza a capela de Nossa Senhora da Consolação, que D. Violante Afonso
ofereceu aos padres lóios para, a partir dela, fundarem o seu mosteiro, "junto ao muro desta nobilíssima
cidade e ao postigo chamado postigo da
Fonte da Arca por estar fronteiro à célebre fonte deste nome".
O convento foi fruto de uma doação a pedido do Bispo do
Porto, D. João de Azevedo, que se deveu a Dona Violante Afonso, uma "autorizada e virtuosa" (rica
e piedosa) dama, viúva de um caldeireiro e rico mercador chamado Martim
Lourenço. As obras para a sua construção iniciaram-se no ano seguinte ao
pedido.
Em 1493, o convento foi agregado à congregação e, em 1496,
D. Diogo de Sousa, sucessor de D. João de Azevedo no bispado do Porto e também
ele afeiçoado aos lóios, confirmou todas as doações e privilégios anteriormente
concedidos à congregação.
Os padres lóios já tinham passado pelo Porto, mais
propriamente por Campanhã, onde tiveram um mosteiro em 1420.
A Igreja Matriz daquela paróquia era o templo desse mosteiro.
Até 1423 os padres tiveram o apoio do bispo Vasco II, mas quando este foi para
arcebispo de Évora, os lóios recolheram a Vilar de Frades, em Barcelos, onde D.
João Azevedo os foi buscar para o regresso ao Porto.
Ao convento do Porto foram anexadas numerosas igrejas e as
suas principais rendas eram constituídas por dízimos.
Em 14 julho de 1764, em despacho de João de Almada e Melo, é
definida a abertura de uma praça em frente do convento e a abertura de uma
porta de acesso à mesma e em 1790 é modificada a frontaria do convento, voltada
para a Rua da Natividade (actual Rua dos Clérigos), acrescentando-lhe
duas pequenas torres.
Planta de José
Champalimaud de Nussane do Largo dos Lóios e envolvente em 1790
Legenda:
1. Praça Nova das
Hortas
2. Fonte da
Natividade
3. Largo dos Lóios
4. Rua dos Clérigos
5. Rua do Almada
6. Rua Mendo Afonso
7. Rua do Correio
8. Postigo de Santo
Elói
9. Porta de Carros
10. Complexo
conventual (convento, cerca e igreja)
Nota: A linha
amarela representa um troço da muralha Fernandina
O convento dava para
o Largo dos Lóios. Ocupava o terreno desde este largo até à Porta de Carros,
hoje Praça Almeida Garrett. Havia uma pequena passagem entre o convento e a
Muralha que foi fechada devido aos perigos, assaltos e prostituição que aí
havia. Quando a muralha foi demolida o convento ocupou este espaço até à Praça
Nova das Hortas.
Por outro lado em 1794, aproveitando a demolição das
muralhas que cercavam a cidade antiga, os frades pediram autorização para
alterar a fachada voltada para a antiga Praça das Hortas, actual Praça da
Liberdade, autorização que foi concedida e iniciadas as obras de alteração da
fachada, em 1798, não tendo, porém, as mesmas sido concluídas pelos religiosos.
As obras do novo convento coexistiam com o primitivo que
continuava a albergar a congregação.
Após as invasões Francesas, entre 1810 e 1822 o edifício é
ocupado por tropas portuguesas que aí instalaram um hospital militar.
Do convento apenas chegou até hoje, a fachada que os frades
começaram a construir já no séc. XIX. Com a abolição das Ordens Religiosas em
1832 (decreto exarado nos Açores) e devido às Lutas Liberais, os frades
abandonaram as obras e o País. O edificado do convento entrou em ruínas e a
Câmara tratou da sua demolição em 1838.
Em 1838, já após a extinção das ordens monásticas o Largo
dos Lóios foi ligado à Rua das Flores por uma rua que começou por se chamar Rua
D. Maria II e é a actual Rua Trindade Coelho.
Posteriormente a Câmara tomou posse e colocou à venda o
edificado do convento, em hasta pública, sendo o seu comprador Manuel Cardoso
dos Santos, um abastado negociante com fortuna feita no Brasil e que se
comprometeu em acabar a fachada. Após a sua morte, por herança o edifício
passou para a viúva e filhas.
Convento de Santo Elói
e Capela de Nossa Senhora da Consolação – Desenho de Joaquim Villanova –
1833
A partir desse momento passou a ser conhecido como o Palácio
das Cardosas (referente às herdeiras) bem assim como o passeio anexo, que tomou
o mesmo "apelido" popular.
A partir de 1850, começou o Palácio a ser conhecido como o Pasmatório dos Lóios, porque era para ali que marcavam encontro os
dândis, os peralvilhos e os janotas da época para se mostrarem às meninas que
iam à missa ou a "sabat mater", nos Congregados. Para estes
ajuntamentos no pasmatório também contribuíam, e muito, a existência, ali
muito perto, do botequim Guichard que fechou portas em 1857 e o botequim do
Camanho que as teve abertas a partir de 1870.
Por aqueles dois cafés passou muita da nata da
intelectualidade do tempo. Camilo Castelo Branco e o poeta Faustino Xavier de Novais;
o célebre advogado Alexandre Braga e António de Amorim Girão, professor, eram
alguns dos seus frequentadores habituais. Mas havia também lojistas e
mercadores que ali iam para tratar dos seus negócios.
Já nos começos do século XX, um outro grupo começou a tomar
conta do pasmatório.
Era o "Clube dos
Encostados". Eram muitos. Ao findar da tarde, antes da hora do jantar,
lá apareciam. Iam chegando, paulatinamente, um após outro, inconfundíveis no
seu chapéu alto. Agrupavam-se em frente às instalações do antigo Banco Ferreira Alves & Pinto Leite. As conversas abarcavam um
amplo leque de assuntos, da política, às novidades artísticas ou literárias,
mas os mexericos domésticos não passavam em branco.
“(…) Havia entre
"os encostados" lojistas, mercadores, um alfaiate, estudantes,
médicos, jornalistas, nomeadamente do "Diário
da Tarde" que tinha a Redação ali mesmo ao lado e cujos redactores
frequentavam uma alfaiataria mesmo aí situada a “Alfaiataria Costa Lima”
Um acontecimento
fortuito viria a dar origem à alteração do nome do grupo. Foi o caso que, em
1908, andou de visita ao Porto o rei D. Manuel II. Houve um dia em que o
monarca foi assistir ao desfile das tropas em parada na Praça da Liberdade. O
rei presenciou o desfile a cavalo e a montada foi colocada exatamente no local
em que "os encostados" costumavam reunir-se, em frente ao Banco
Ferreira Alves & Pinto Leite. A partir daí, a denominação passou a ser
"Real Clube dos Encostados"”.
Fonte: Germano Silva,
In JN
O Convento de Santo Elói confrontava a sul a actual Praça da
Liberdade que se designou primitivamente por Casal ou Lugar de Paio de Novais,
Sítio ou Fonte da Arca, denominando-se, mais tarde, por Quinta,
Campo ou Sítio das Hortas. Foi ainda Lugar ou Praça da Natividade,
Praça
Nova das Hortas, Praça da Constituição, Praça Nova e
de D.
Pedro IV e, mais recentemente durante algumas semanas, Praça
da República.
Ao longo dos anos, o Largo dos Lóios, surgido em terrenos do
antigo convento, sofreria diversas transformações, como atestam as fotos
seguintes.
Actualmente, toda a zona do Largo dos Lóios foi alvo de uma
recuperação urbanística a cargo do gabinete de arquitectura, Ferreira de
Almeida, no qual, o palacete das Cardosas, foi transformado num hotel de 5
estrelas e, os edifícios de todo o quarteirão, alvo de recuperação.
Sobre esta intervenção urbanística diz Germano Silva:
“Pois é. Vamos
aguardar a ver se as obras que aí vêm irão, ou não, ajudar a desvendar o
mistério que rodeia umas tantas histórias já lendárias de cadáveres enterrados
na cerca do mosteiro e no interior da própria igreja.
É que, logo a seguir à
demolição dos anexos, virão os arqueólogos para pesquisar, entre outros, o sítio
onde se vai construir o parque de estacionamento. O que se pede e se espera é
que esse trabalho se realize com toda a profundidade de modo a que ajude a
esclarecer muitas histórias que ainda permanecem envoltas na névoa do mistério
e da dúvida.
Por exemplo em 1808 o
corpo do general D. Francisco Taranco e Lhano, comandante da divisão da Galiza
que ocupava o Porto, foi sepultado no jazigo que o visconde de Balsemão (o do
palacete da Praça de Carlos Alberto) tinha na igreja dos frades Lóios. Durante
a usurpação de D. Miguel também ali terão sido guardados os restos mortais do
general Bernardo da Silveira. Em 1838 a
igreja foi demolida por estar em ruína e ser uma ameaça pública. Quando se
tentava saber o que fora feita do túmulo do Balsemão e dos cadáveres que lá
estavam, um cronista da época (Peres Pinto) não teve dúvida em afirmar que
essas "ossadas e entulhos estavam a descansar no aterro da praça ou
mercado do Bolhão…"
Mas há notícias de
muitas outras sepulturas no corpo da igreja e na cerca do convento dos padres
Lóios, muitas delas de difícil localização. Por exemplo, "na casa do
Capítulo, junto ao claustro" foi sepultado D. Manuel de Sousa, que foi
arcebispo de Braga; Filipe Gonçalves, cidadão do Porto, "morador defronte
da Porta do Olival, da parte de dentro" teve sepultura em Santo Elói onde
instituiu um morgado a que vinculou as suas casas da "Travessa que vai dos
Coronheiros (actual Rua da Vitória)
para a Rua das Flores. Ao pé de um altar colateral, do lado do Evangelho,
esteve sepultada D. Maria… mulher do dr. Estêvão Monteiro da Costa a qual
morreu em Junho de 1693; e "no cruzeiro, junto às grades" ficava a
sepultura, coberta com lâmina de latão e com as armas dos Correias de Mariz, de
Francisco Correia de Mariz.
António da Costa,
barbeiro e sangrador, morador na Rua dos
Canos (a parte da Rua das Flores que vai da Praça de Almeida Garrett até à
Rua de Trindade Coelho) para ser sepultado em Santo Elói deixou ao convento o
seu casal da Quinta, em S. Cosme, Gondomar.
Enfim, tantas cinzas
veneráveis de cujo destino muito pouco se sabe após a venda do mosteiro e a
demolição da igreja”.
Já em 1691, a municipalidade do Porto e o Capítulo da
Sé-Catedral tinham lançado o projecto de estabelecer no Campo das Hortas,
propriedade do Cabido, uma praça pública, entre a Porta de Carros e o Postigo
de Santo Elói. O projecto não foi por diante, tendo sido retomado em 1709, pelo
então Bispo do Porto, D. Tomás de Almeida, que propõe a abertura de uma praça
de formato quadrangular digna de "rivalizar
com a Plaza Mayor de Madrid".
Tratava-se do primeiro grande empreendimento urbanístico de
Portugal. Chegaram mesmo a efectuar-se os contactos de aforamentos das parcelas
a construir e a lançar os alicerces de alguns dos edifícios, contudo, por
dificuldades várias também este projecto não teve continuidade.
Em 1718 novo projecto foi lançado, cuja realização teve
início quando o cabido da Sé cedeu, a 17 de Fevereiro de 1721 terrenos seus,
expressamente para uma praça.
Novas ruas foram então abertas - a Rua do Laranjal das Hortas
(futura Rua de Santo António dos Lavadouros e posteriormente, Rua
dos Lavadouros, hoje desaparecida) e a Rua da Cruz (actual rua
da Fábrica).
“Da concretização
deste projecto resultaria a Praça Nova das Hortas (ou só Praça Nova) limitada a
Norte por dois palacetes (desaparecidos), onde funcionaram os Paços do Concelho
até 1915; a Sul pela muralha fernandina, destruída mais tarde em 1788 e
substituída por um conjunto monumental - o convento dos Frades de Santo Elói -
cuja fachada sobre a praça constitui o edifício "da Cardosa", só
terminado no século XIX, mas obedecendo ao primitivo projecto - a praça
"tout-court". O lado oriental era ocupado pelo Convento dos
Congregados, e o lado poente só mais tarde foi edificado.
Durante o século XIX,
factores vários - a instalação da Câmara no topo Norte (1819); a inauguração da
Ponte de D. Luís (1887); a extensão da via- férrea até S. Bento (1896) -
contribuem para tornar a Praça definitivamente num importante centro político,
económico e sobretudo social”.
Fonte, Site: “patrimoniocultural.gov.pt”
Em meados do século XIX, a Praça era já o "ponto predilecto de reunião dos homens
graves da política e do jornalismo, da alta mercância tripeira e dos
brasileiros".
Predominavam os botequins: "Guichard", "Porto
Clube", "Camanho", "Suíço", "Europa",
"Antiga Cascata", "Internacional", etc., aos poucos
desaparecidos em consequência da profunda reestruturação daquela área, onde as
entidades bancárias, companhias seguradoras ou escritórios conquistaram o seu
espaço.
O Dr. Eugénio de Andréa da Cunha e Freitas, numa
interessante monografia que escreveu sobre o Convento dos Lóios, termina um dos
capítulos da seguinte maneira:
"… agora, na Casa
de Deus, em vez dos honrados frades de Santo Elói, estão os gordos e opulentos
senhores da Finança e da Indústria, perturbando, na febre do negócio e do
lucro, o eterno descanso de tantas cinzas veneráveis que ali jazem…"
Por outro lado diga-se que, as obras para levantamento da
Avenida dos Aliados, iniciaram-se no dia 1 de Fevereiro de 1916 com a demolição
do edifício que serviu de Paços do Concelho, a Norte da Praça da Liberdade,
acompanhada do desaparecimento das ruas do Laranjal, de D. Pedro, etc.
Ao cimo da Avenida foram erguidos os modernos Paços do
Concelho, edifício em granito e mármore, levado a cabo pela primeira vereação
republicana saída do 5 de Outubro de 1910. Foi um projecto do arquitecto
António Correia da Silva (1920).
No seu todo, resultou um conjunto urbano monumental, de
particular interesse histórico e artístico, que todos hoje usufruem.
Casa da Moeda
É de referir ainda que no convento dos padres lóios em 1832,
durante o cerco do Porto, esteve instalada no edifício a casa da moeda.
Breve história da Casa da Moeda no Porto
Moedas cunhadas no Porto – Fonte: “portoarc.blogspot.pt”; In
História do Porto de Luís Oliveira Dias
Aliás, desde 9 de Junho de 1688 que, por meio de um alvará,
o rei D. Pedro II tinha recomendado à Câmara do Porto o restabelecimento nesta
cidade da Casa da Moeda, que havia sido extinta por volta de 1654, ou seja, nos
últimos anos do reinado de D. João IV.
A padroeira dos moedeiros era Sant'Ana e o altar onde se
venerava a sua imagem ficava na Igreja de S. Lourenço (Igreja dos Grilos) e aí,
tinha sede a sua confraria.
(Continua)
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