segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

25.31 Taça de Portugal (futebol)

O que é que terá a ver com a cidade do Porto, a Taça de Portugal todos os anos entregue a uma equipa de futebol, após um jogo realizado, normalmente, no Jamor?
A prova nos moldes em que, actualmente, é disputada, foi instituída na época 1938/39.

 
 

Taça de Portugal (peça executada, em 1922) - Fonte: “Leitão & Irmão”




A conexão é antiga tendo o seu início cerca de 100 anos antes da data em que foi executado o troféu que premeia o vencedor. Vamos à história.
José Pinto Leitão (1798-1866) com 24 anos, em 1822, registou o punção (marca pessoal de fabrico) “JPL” e abriu o seu negócio na Rua das Flores, o clássico arruamento dos ourives do ouro no Porto.
Bem perto na Confraria de Santo Elói, onde hoje é a Praça do Infante, junto ao Palácio da Bolsa, se faziam à época os exames e as provas para os ourives do ouro.
Em 1837, José Pinto Leitão lança-se definitivamente e em grande escala na actividade que vinha já exercendo (após o seu casamento com Maria Delfina), com a ajuda do seu sogro, um abastado comerciante, de seu nome, José Teixeira da Trindade.
José Pinto Leitão dedica-se, a partir de então, ao trabalho do ouro que vinha do Brasil, com uma loja-oficina aberta na Rua das Flores, dando assim continuidade nesse local ao negócio do seu sogro, destacado cidadão ligado ao comércio com o Brasil e ao negócio do ouro.
Diga-se que José Teixeira da Trindade tinha estabelecido relações particulares com D. Pedro IV de Portugal e I do Brasil, desde o Cerco do Porto em 1832.
Em 1862, são os filhos de José Pinto Leitão, Thomaz Pinto Leitão e Olindo José Pinto Leitão, que tomam conta do negócio e fundam a firma “Leitão & Irmão”.
Em 1872, “Leitão & Irmão” recebe o título de “Ourives da Casa Imperial do Brasil”.
Em 1877, a firma sita na Rua das Flores, começa a dar corpo ao projecto de mudança de instalações para a Praça D. Pedro.
Entretanto, naquele mesmo ano de 1877, a firma abre em Lisboa, no Largo do Loreto ou Largo das Duas Egrejas, hoje, Largo do Chiado, uma sumptuosa loja.
No dia 1 de Dezembro de 1877, D. Luís atribuiu à casa Leitão & Irmão o título de “Joalheiros da Coroa” que adquire um novo punção, com número de ordem 33, sendo actualmente a mais antiga ourivesaria portuguesa com punção próprio.


Punção de “Leitão & Irmão”




Projecto de montra da loja da “Leitão & Irmão”, em 1877, para a Praça D. Pedro – Fonte: “gisaweb.cm-porto.pt”


Publicidade à Ourivesaria “Leitão & Irmão” já na Praça D. Pedro, 42-44, e com instalações também em Lisboa



Publicidade a ourivesarias da cidade do Porto – Fonte “O Illustrado da Tarde” – 28/08/1880; Cortesia de José Leite administrador de “restosdecoleccao.blogspot.com”


Contemporâneas com “Leitão & Irmão”, sita na Praça D. Pedro, são as ourivesarias citadas no quadro publicitário anterior, em 1880.
Nos dias de hoje, a “Leitão & Irmão” continua, apoiada em várias lojas, a exercer a sua actividade na capital.
Entretanto, no Porto, a firma encerrou a actividade há muitos anos (em data que não é possível precisar) transferindo-se integralmente para Lisboa.
São inúmeras as obras célebres e requintadas da “Leitão & Irmão” que ficaram para a história.




Peças célebres executadas por “Leitão & Irmão”


-1888- Cálice oferecido por D. Luís ao Papa Leão XIII, para a comemoração do Seu Jubileu em 1888. Com particular demonstração de agrado, o Papa Leão XIII celebrou a missa do Jubileu com o cálice oferecido pelo Rei de Portugal.


Cálice – Fonte: “Leitão & Irmão”


-1898- Medalha comemorativa dos 400 anos da chegada de Vasco da Gama à Índia.


Medalha - Fonte: “Leitão & Irmão”


-1900- Baixela Barahona, considerada uma obra-maior da ourivesaria portuguesa. O desenho e a modelação foram confiados a Columbano Bordalo Pinheiro, um dos grandes artistas da época.


Baixela Barahona - Fonte: “Leitão & Irmão”


-1907 – Cofre da Cidadania, oferecido ao príncipe D. Luís Filipe durante a viagem real às colónias portuguesas de África em 1907. Foi manufaturado nas oficinas do Bairro Alto pelas mãos de dois mestres prateiros portugueses: João da Silva, um jovem e promissor cinzelador, aprendiz nas oficinas do Bairro Alto e posteriormente formado em Paris e Genéve, e Júlio Rodrigues Pinto, chefe da oficina. Em prata cinzelada e com quatro presas de marfim aplicadas sobre a tampa, assenta em quatro rinocerontes e ostenta nas arestas figuras de nativos.


Cofre da Cidadania - Fonte: “Leitão & Irmão”




-1922- Taça do vencedor do Campeonato de Portugal (futebol), entre 1922 e 1938, depois, Taça de Portugal, em prata cinzelada.

 
“O troféu oficial da Taça de Portugal, datado de 1922, pertence à Federação Portuguesa de Futebol. O troféu, totalizando 20 kg de peso, é constituído por uma taça em prata cinzelada e ricamente ornamentada em estilo manuelino. Consta de um bojo de prata constituído por caravelas e em segundo plano fragatas. Em cima encontram-se brasões alternados contendo a Cruz de Cristo e o Escudo Nacional. Em baixo destaca-se a decoração com quatro florões. As asas do troféu são elaboradamente entrançadas e encimadas pela esfera armilar e a Cruz de Cristo. A ligar o bojo à base estão 4 colunas, cada uma ornamentada com 145 flores-de-lis concluídas nas extremidades por meias canas. A base, feita de madeira, encontra-se ornamentada com 4 florões de prata, coincidentes com os florões do bojo. A base tem a meio um brasão de prata ricamente estilizado e termina com uma peanha de madeira onde anualmente são colocados os nomes dos clubes vencedores em placas de prata”.
Fonte: pt.wikipedia.org/

 
 
Base da original Taça de Portugal (contém vencedores, também, do Campeonato de Portugal) propriedade da Federação Portuguesa de futebol – Ed. Jornal Sol

 
 
Ao vencedor de cada edição da Taça de Portugal é entregue uma réplica, igualmente ornamentada, mas de menor dimensão, que o original. A réplica tem 1,695 kg de peso e mede 58 cm de altura. 


 
 

Taça de Portugal original e a réplica

 
 
O troféu original, em disputa na Taça de Portugal, é o mesmo que presidia ao Campeonato de Portugal (1921-1938), prova que a antecedeu no calendário futebolístico.




-1942 – Coroa de Nossa Senhora de Fátima, uma das mais divulgadas joias portuguesa. Oferta dos portugueses em sinal de gratidão pelos seus filhos terem sido poupados aos dramas da 2ª Grande Guerra. A coroa, em ouro e pedras preciosas, resultado de uma campanha nacional de ofertas confiadas à casa Leitão, foi trabalhada durante três meses por doze artífices e tem cravadas em ouro 313 pérolas e 2679 pedras preciosas. Quase meio século depois, em 1984, esta obra ganhou outro relevo quando o Papa João Paulo II ofereceu a Nossa Senhora de Fátima a bala que o atingiu no atentado de 13 de maio de 1981 no Vaticano. A bala encontrou o encaixe perfeito no espaço vazio, deixado em 1942 na união das oito hastes que constituem a coroa de Rainha.



Coroa de Nossa Senhora de Fátima - Fonte: “Leitão & Irmão”

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

25.30 “Por-fi-ri-os”


Porfírio Augusto de Araújo começaria por abrir uma loja na Rua de Santa Catarina, nº 137 (quase em frente ao Café Majestic), a denominada  “Loja das Gravatas”, na década de 40 do século XX.




Loja das Gravatas, na Rua de Santa Catarina, nº 137



A “Loja das Gravatas” acabaria por mudar para a Rua de Santa Catarina, nº 39, agora com a nova denominação de Porfírios, uma loja que seria a coqueluche dos anos 60 e 70.
“Por-fí-ri-os”, vulgarmente conhecida por “Porfírios”, e também por “Porfírios das Meias”, foi uma loja fundada na Rua de Santa Catarina, por Porfírio Augusto de Araújo, cujo principal artigo era, como se adivinha, as meias.
No filme “A costureirinha da Sé”, um dos 2ºs prémios do concurso “O Vestido de Chita” era oferecido pela “Porfírios das Meias” (Um par de sapatos de nylon).
O 1º prémio era uma máquina de costura.
"A Costureirinha da Sé" é uma longa-metragem portuguesa, realizado por Manuel Guimarães, no ano de 1958.


Cartaz de publicidade ao filme “A Costureirinha da Sé”

 
 
“O filme é uma adaptação de opereta popular de Armando Leite e Heitor Campos Monteiro. A protagonista é a cantora popular Maria de Fátima Bravo, então no auge da sua carreira. A trama conta a história de Aurora, uma jovem das origens humildes do bairro da Sé. Aurora trabalha num atelier de costura e está caida de amores por Armando, motorista de táxi. Mas, o romance causa inveja vizinhança. Há quem queira o rapaz para si. O argumento retrata um Portugal dos anos 50…”
Fonte: pt.wikipedia.org/wiki


Em 1953, nos Por-fí-ri-os, passavam-se no seu interior, filmes para crianças.



Publicidade a sessões de cinema, passadas na loja dos “Por-fi-ri-os” – In jornal “O Comércio do Porto” em 28 de Setembro de 1953





“Por-fi-ri-os”, à esquerda, na Rua de Santa Catarina, nº 39 (próximo da Praça da Batalha) – 1956




Publicidade distribuída no cinema “Monumental”, em Lisboa, em 1956 – Fonte: “restosdecoleccao.blogspot.com”; Colecção de Carlos Caria




Pelo panfleto acima se pode observar que à data, a “Por-fi-ri-os”, já tinha também uma loja em Lisboa. Na capital, a “Por-fi-ri-os”, teve um sucesso enorme, promovendo e realizando grandes passagens de modelos e os concursos das Mini-saias.
A loja na capital era gerida por dois irmãos de Augusto, António e Luís Porfírio.




Logo da “”Por-fi-ri-os”




Finalistas do concurso de Mini-saias da “Por-fi-ri-os”, em 1967, em Lisboa (ganhava quem tivesse mais aplausos)




“Qual o Portuense que não entrou ou comprou alguma coisa nos "gandas malucos": 
Quem diz jardim diz flores; Quem diz praia diz areias; Quem diz paixão diz amores; Quem diz Porfírios diz meias”. 
Fonte: JPortojo




Drugstore da “Por-fi-ri-os” na Rua de Santa Catarina



Ao entrar na loja do Porto, deparávamos-nos com uma secção de peças mais pequenas, cintos, meias e outras bugigangas, seguindo-se um corredor escuro que tentava recrear o ambiente das “boîtes” da altura, que terminava numa secção de homem/senhora, em moldes de “Drugstore”.
Este espaço era composto por barracas de madeira, comercializando cada qual, determinados produtos, onde eram expostos desenhos de clientes, sujeitos mensalmente a um concurso.
As calças à “boca-de-sino”, as famosas mini-saias, as camisas floridas, os collants coloridos, pulseiras, colares, óculos escuros (de aros enormes), cintos (tipo Texas), blusões estampados, etc, tinham venda assegurada.
Os jovens mais politizados, com simpatia por ideologias de esquerda, sobre os artigos da “Por-fi-rios” tinham uma opinião bem definida – “eram artigos pró foleiro”.




O atendimento pelas empregadas da “Porfirios”- Fonte: “restosdecoleccao.blogspot.com”




Publicidade da “Por-fi-ri-os”



Com a abertura do mercado nacional aos produtos estrangeiros, após o 25 de Abril e a instalação entre nós de marcas consagradas, como a Zara, Berska, Stradivarius, etc, a “Por-fi-ri-os” não teve possibilidade de concorrer com elas e as lojas de Lisboa e Porto acabariam por fechar, em 2001.



Concurso dos Vestidos de Chita


A propósito dos Concursos do Vestido de Chita, referido anteriormente, diga-se que foram patrocinados durante várias décadas, pelo Jornal de Notícias e as respectivas finais decorriam com grandes audiências, nos Jardins do Palácio de Cristal, sendo que o texto seguinte nos faz uma descrição do certame.


“Chita é um tecido de algodão barato e de pouca qualidade, estampado com cores fortes, geralmente florais, e tramas simples. As estamparia é feita sobre o tecido conhecido como morim. 
As características principais são cores primárias e secundárias em massas chapadas que cobrem totalmente a trama, tons vivos, grafite delineando os desenhos, e a predominância de uma cor. As cores intensas servem, não só para embelezar o tecido, mas também para disfarçar irregularidades, como eventuais aberturas e imperfeições.
O nome chita vem do sânscrito chintz, surgiu na Índia medieval e conquistou europeus, antes de se implantar no Brasil. Com o fim da guerra, a chita continuava a vestir os trabalhadores braçais e os moradores das regiões rurais, sendo o pano característico das festas populares.
Recordo com alguma nostalgia o tempo dos concursos de vestidos de chita que via frequentemente no teatro ao ar livre do Palácio de Cristal, em noites de verão, em que o calor imperava e muita gente acorria ao evento. As revistas femininas da época ditavam a moda que nos chegava de Paris e ensinavam o comportamento feminino ideal; a mulher era a fada do lar com aptidões para se tornar a submissa dona de casa, como era suposto acontecer naquela época.
O concurso era patrocinado por um jornal da cidade e com toda a projeção que este evento alcançava, as costureiras que nele participavam com modelos muito originais e de grande criatividade, viam o resultado do seu trabalho completamente recompensado ao ser mostrado a milhares de pessoas que adoravam o desfile. Os modelos iam de trajes de passeio até vestidos de cerimónia e de noiva.
Tempos felizes, esses, em que passávamos horas agradáveis sem despender muito dinheiro e a alegria era nota dominante”.
Com o devido crédito “palavrasesentidos.blogs.sapo.pt”


Nos concursos do Vestido de Chita era eleita a Rainha das Costureiras, sendo que o certame implicava uma grande rivalidade entre bairros e freguesias da cidade.
Disso nos dá conta a notícia seguinte:
 
«Rainha das Costureiras: eleita ontem no Palácio de Cristal: a menina Maria Arminda da Silva. Começou a polémica».
In jornal “A Montanha”, 14 Abr.1930, p. 1



No dia 10 de Setembro de 1944, tinha lugar nos jardins do Palácio de Cristal uma grandiosa festa presidida por Maria do Carmo Carmona, esposa do Presidente da República, durante a qual foi eleita como Rainha das Costureiras, Albertina Novais que como vencedora do primeiro prémio do concurso recebe uma máquina de costura "Husqvarna". 
A primeira máquina de costura nacional da marca "Oliva", fabricada em S. João da Madeira, só virá para o mercado em 1948.
Pela mesma época, passou a ocorrer, em moldes semelhantes a eleição no concurso Cantadeiras do Fado, da Rainha do Fado.


 
«Da lista das concorrentes, cada vez maior, destacamos dois nomes, Maria Albertina e Maria Fernanda. Porque destacamos da lista enorme apenas estes dois nomes? Por uma razão simples, mas decisiva – são irmãs. Vivem no mesmo lar, comungam na mesma vida. Lar modesto, sem luxos, em que a única riqueza são as suas canções, os seus fados. É essa a luz que as alumia, que faz desaparecer as suas tristezas. Das duas, qual cantará melhor? Elas, irmãs e amigas, entendem-se bem. A Maria Fernanda, simpática, diz que a Maria Albertina, canta melhor. Mas a Maria Albertina, modesta, protesta: “não é verdade, a tua voz é mais bonita do que a minha”.
Foram inscrever-se, juntas, ao posto do Portuense Rádio Clube. Porque se inscreveram? Responde, arregalando os lindos olhos negros, a Maria Albertina.
– Porque nos inscrevemos? Porque gostamos de cantar.
– Só por isso?
A Maria Fernanda, não podendo conter-se:
– Só por isso, não. A verdade manda Deus que se diga. Foi isso – e pela máquina de costura (…)»
In “Jornal de Notícias”, 16 de Agosto de 1949



A assistência à final do Concurso do Vestido de Chita no Palácio de Cristal, em 1968


As finalistas ao Concurso do Vestido de Chita no Palácio de Cristal em 1968


À data, os Jardins do Palácio de Cristal, tinham um recinto com bancadas, onde se realizavam sessões de variedades, na área hoje ocupada pela Biblioteca Almeida Garrett.



A Candidinha
 

Enquanto ia decorrendo o século XX e iam proliferando o aparecimento dos pronto-a-vestir que permitiam o acesso do povo a artigos mais em conta para a sua bolsa, por outro lado, uma burguesia endinheirada continuava a servir-se em ateliers de alta-costura, as mulheres nas modistas e, os homens, nas alfaiatarias.
Aqui, a moda era ditada pelas capitais europeias e fazia-se pagar bem.
No que diz respeito a modistas, no Porto, uma se destacaria no século XX – a Candidinha.
 
 
“Cândida Celeste Nogueira Alves nasceu no Porto em 1893, e desde jovem se tornou costureira. Rapidamente se torna famosa e ao seu ateliê acorrem as elites femininas da cidade que faziam questão que fosse a Candidinha, como era simpaticamente conhecida, a sua estilista oficial. O termo na época não existia e a palavra modista, era a única que se usava para designar a função, que só passado muitos anos é que se viu projectada para o lugar que ocupa hoje no mundo da moda.
A Candidinha tinha o seu ateliê na Rua da Boa Nova n.º 15, e os bordados também eram uma das suas imagens de marca, quiçá a mais importante. A importância da sua casa podia ser aferida pelo facto de ser uma das poucas no país que estavam autorizadas a usar o nome da casa Dior de Paris.
Quando se dá o 25 de Abril, Candidinha e a sua família foram para o Brasil, onde Candidinha acabou por falecer, em 1980.
A rua que a consagra é recente e é a serventia de uma série de moradias que foram construídas numa zona, até então, ainda não urbanizada da Foz. Por esse motivo, abriu se este arruamento”.
Cortesia do historiador do Porto, César Santos Silva

 
No texto anterior, existe um erro na morada expressa, que será, de facto, Rua da Boa Hora, n.º 15.
Em 3 de Maio de 1949, foi notícia na cidade do Porto um desfile de alta-costura promovido pela Candidinha em sua casa.
Em 29 de Março de 1955, a passagem de modelos promovida pela Candidinha, já tem lugar nas instalações do Hotel Infante de Sagres.



Publicidade à "Candidinha" em 1970



Na publicidade acima apresentada observa-se que Maria F. Marques Gomes já se apresentava como representando o atelier.
Na realidade, em 25 de Março de 1975, cerca de um ano após a revolução, o Diário do Governo, IIIª série, n.º 71, dava conta da formação de uma nova sociedade denominada Candidinha – Alta-Costura, Lda, na qual eram sócios Maria Francelina Nogueira Alves Marques Gomes e Armando Marques Gomes e Manuel Alves Coelho.
 
 

Texto de introdução à formação da sociedade "Candidinha – Alta-Costura, Lda" – Fonte: Diário do Governo, IIIªsérie, n.º 71




Placa Toponímica referente à Rua Cândida Alves, no entroncamento com a Rua Trinitária, à Foz do Douro – Fonte: Google maps



Candidinha no Brasil/Manaus, em Agosto de 1976 - Fonte: Revista "O Tripeiro", 7ª Série, Ano XIII, Nov.1994



terça-feira, 15 de janeiro de 2019

(Conclusão)


Na sua visita ao Porto, Madame Rattazzi hospedou-se no Hotel Francfort que ocupava o local onde está hoje, a estátua conhecida como a “Menina Nua” ou “Juventude”, na Avenida dos Aliados.
No terreno em que estava implantado o hotel (construído em 1851, em pleno Romantismo, por iniciativa do rico negociante da praça do Porto, Luís Domingos da Silva Araújo) tinha existido antes, durante alguns  anos, um cemitério para cães da municipalidade, 
Sobre o hotel Francfort e sobre a sua proprietária, dizia a escritora.





A meio, no gaveto, o Hotel Francfort


Sobre o carácter dos portuenses e a sua relação com a capital, opinava madame Rattazzi.




Aliás, a visão de madame Rattazzi é muito próxima da de Ramalho Ortigão expressa nas “FARPAS”.

“Quando o príncipe reinante e a sua augusta família iam às províncias do Norte, o Porto recebia-os de azul e branco, num grande rasgo de júbilo sublinhadamente plebeu, que entocava a nobreza de pura humilhação perante as magnificências da burguesia dinheirosa e bizarra.
(…) Aqui mora o Faz-Tudo! Solda, gruda, parafusa, martela, arrebita, bota abaixo, reconstitui, engonça, retesa, dá corda, regula, acerta e garante — sempre de lança em punho, feito de pedra, velando potente na fachada dos Paços do Concelho à Praça Nova, por cima da arrecadação das luminárias e das chaves do baluarte feitas de pasta pelo Alba dourador da Rua de Santo António. 
Ramalho Ortigão - As Farpas

Ainda sobre a relação entre Lisboa e o Porto, diga-se que a rivalidade hoje presente, já vem de longe.
Sobre uma visita de um lisboeta ao Porto é o texto seguinte (com uma boa dose de humor), que saiu no “Comércio”, antigo nome de “O Comércio do Porto”, de 14 de Setembro de 1855, anterior, por isso, cerca de 25 anos, às visitas da madame Ratazzi.

“As festas da aclamação em Lisboa prometem ser brilhantes, o que estimamos porque se não somos da capital somos portugueses. Sentimos porém que os festejos nos privem das visitas que às vezes se dignem fazer-nos os nossos compatriotas da metrópole.
É sempre para nós um prazer o ver na nossa província um lisbonense. Não se tenha medo de que o não conheçamos: denunciam-no aqueles meneios, aquela nonchalance e ar de superioridade que constitui o capitalista ou leão de água doce. Estropia, a propósito de qualquer coisa, algumas palavras francesas que ouviu no teatro de D. Fernando, e desce a calçada de Santo António cantarolando Les filles de Marbre. Vota o mais profundo desprezo aos nossos edifícios e sente o mais santo horror pelas Fontainhas e S. Lázaro. Conta as mais romanescas aventuras da Floresta Egípcia e para mostrar até que ponto chega a nossa insipidez aponta a falta do inebriante espetáculo dos touros.
Quando não fala, nem por isso se deixa de conhecer a sua terra natal. É esta a ideia que o domina. Chamem-lhe parvo e pretensioso, mas digam que é lisbonense, que não é provinciano, e ficará satisfeito.
Ele vai à noite ao Guichard, e sente a mais viva indignação ao ver que os garçons dos cafés do Porto não tem os mesmos nomes que os do Marrare e Martinho. Admira sobremodo que o Matta não tenha uma sucursale nesta retrógrada terra.
Quando passa pela Batalha, acomete-o uma saudade pungente pelas noites de S. Carlos, para falar de Alboni que lá esteve e da Grisi que nunca lá foi.
A falta da açorda que papava em Lisboa lembra-lhe a estátua equestre de que se ufana; e a seriedade dos frequentadores do Portuense traz-lhe à memória aquelas noites do Marrare tão cheias de espírito que só há ali, que é perfeitamente da capital. O capitalista fala de tudo com a frivolidade que o caracteriza, e tudo lhe serve para comparar o atraso da província com a alta civilização da capital, porque, seja dito entre parêntesis, raramente o Leão fala em Lisboa, mas sempre na capital. Enfim debaixo da pele do leão, que vestiu, facilmente se descortina a orelha que é sua.
O provinciano reconhece e confere ao lisbonense a superioridade... no ridículo. É por isso talvez que não tem a pretensão de imita-lo. Vanitasvanitatumalfaciaalfaciarum.”
Fonte: “aportanobre.blogs.sapo.pt”

Ainda sobre a relação dos portuenses com os lisboetas escrevia Ramalho Ortigão.


“O portuense não gosta de Lisboa. Não gosta da polícia. Não gosta da autoridade. Da autoridade vinga-se, desprezando-a. Da Polícia vinga-se, resistindo-lhe. De Lisboa vinga-se, recebendo os lisboetas com a mais amável hospitalidade e com a mais obsequiada bizarria.”


Na época das visitas de Madame Ratazzi, a sala de espectáculos de eleição da cidade do Porto era o teatro S. João, que não teve oportunidade de visitar por se encontrar encerrado. No entanto, não deixou de fazer uma breve referência às outras salas de espectáculos.





E acrescentava sobre a actividade artística e modo de a encarar dos portuenses, nomeadamente a independência de pensamento face à capital, na sequência do qual, êxito alcançado por uma companhia em Lisboa, não significava um salvo-conduto para o sucesso no Porto.






Teatro de S. João em 1900 antes do incêndio


Sobre o Palácio da Bolsa disse Madame Rattazzi.




E sobre o imponente Hospital do Conde de Ferreira.



E sobre a disponibilidade dos portuenses para a prática da caridade.




Tendo visitado a Foz do Douro, faz referência a diversas ruas da cidade do Porto, nomeadamente a Rua de S. João e a Rua das Flores, descreve a casa da Quinta da Macieirinha e o seu encontro com o proprietário, Pinto Basto, e anota alguns dos costumes dos portuenses.




Sobre a estadia no Porto da princesa Solms, escreve Artur Magalhães Basto, a propósito de um baile dado em sua honra, no Palacete do Conde de Samodães, na Rua dos Sol, que durante anos foi o local onde funcionou a Escola Comercial Oliveira Martins.




E sobre a visita de madame Rattazzi ao Porto, o caricaturista nascido em Ponte de Lima, Sebastião Sanhudo, fazia publicar no humorístico “O Sorvete” (2º ano, nº 88 – Porto, 1880) um desenho de crítica aos escritos de madame Rattazzi, em que ela era apresentada como um pássaro, por analogia com o título da obra.


Madame Rattazzi com o apôdo “a pássara”, como passou a ser conhecida


A legenda (impressa) da gravura acima diz:
O sábio doutor Costa mostra à Pássara – que viu Portugal d’um golpe – o lindo rio da Viella (nome que lhe dava), os penitentes vermelhos descendo a collina com velas acesas etc”.

Naqueles tempos Rafael Bordalo Pinheiro, já publicava o “António Maria” e o caricaturista apresentava a sua visão de madame Rattazzi.


Princesa Rattazzi em Litografia Colorida de Rafael Bordalo Pinheiro


Por outro lado Guerra Junqueiro na revista “Viagem à Roda da Parvónia”, chama-lhe “Princesa ratazana”.
Mais tarde, veio a público que foi um secretário da princesa que escreveu a obra polémica.

“De resto, quem escreveu o “Portugal à vol d'oiseau» não foi a princeza, mas sim um francez expatriado, que á epoca se achava residindo em Lisboa e era muito da intimidade da suposta-autora, mr. Stenacker”.
Fonte: Ilustração Portuguesa II Série – Nº 808, Lisboa, 13 de Agosto de 1921

Quando a 7 de Fevereiro de 1902, faleceu em Paris, com 71 anos de idade, os portugueses já não se lembravam quem tinha sido madame Rattazzi.