Com a crescente onda de demolição de antigos prédios com os
quais estávamos, há muito, familiarizados, fazendo surgir negócios virados
para a maximização do lucro, está a desaparecer, não só património imobiliário,
como unidades comerciais de diferentes ramos de negócio, com particular ênfase,
na zona histórica da cidade.
Já que parece inglória a sua preservação física, procuremos,
pelo menos, fixar alguma memória, através de algumas linhas escritas.
Restaurante “Irmãos
Unidos” (Rua do Campinho, 13 e 15)
“A sua instituição vem
de 16 de Março de 1941. E, desde aí, sempre se manteve num «lugar de proa». O
seu asseio, a sua confecção, os pratos delicados e, ao mesmo tempo, populares,
fizeram deste restaurante uma das «estrelas» da culinária portuense do século
XX. E continua o seu labor, sempre na senda de bem servir. Várias salas
belamente adornadas, dão-lhe um toque chique, embora com ressaibos dum passado
saudoso. Ali, patentes, os dias de glória, que se misturam aos do refrigério do
presente.
Duma confecção
excelente (iscas, por exemplo), toda a ementa tem dignidade. Não é por aqui que
o «gato vai às filhós». E as sobremesas? O pudim francês?”
Cortesia de Guido Monterey, In “Porto 2.”
Restaurante “Irmãos Unidos” – Ed. Guido de Monterey
Hoje, o restaurante “Irmãos Unidos” é, só, uma memória.
Aproveitando as instalações existentes, que foram
remodeladas, está um outro estabelecimento – o “Restaurante Senhor Zé”- cujo
proprietário é alguém, desde muito jovem, ligado ao ramo da restauração, tendo
começado, por sinal, também, na Rua do Campinho, mesmo defronte e sendo, aqui
chegado, com 15 anos de idade, vindo de Arouca.
Assim, quase quatro
décadas depois, José Canelas (senhor Zé) e Maria da Soledade voltavam bem perto
do local onde tinham trabalhado, se conheceram e casaram – O “Restaurante
Montenegro”, vulgo “Mamuda”.
Por isso, desde
1980, abraçaram um outro projecto, ainda na área da restauração, na Rua da
Alegria, esquina com a Rua do Moreira – “A Casa Nanda”, com uma empregada
(Fernanda) da “Mamuda” que daria nome à casa, mas, cuja sociedade acabaram por
abandonar, naturalmente, em 2018.
O casal ocupou,
então, as instalações dos “Irmãos Unidos”, com o objectivo de continuar a
confeccionar as refeições tradicionais da cozinha portuguesa e a servir os seus
clientes, com a qualidade habitual.
Restaurante “Casa Nanda” na Rua da Alegria – Fonte: Google
maps
Restaurante
Montenegro (Mamuda)
Este restaurante situado na Rua do Campinho, fronteiro ao que
é hoje o “Restaurante Senhor Zé”, caracterizava-se pela excelente cozinha, com
fama também na capital e pela figura da cozinheira, apoiada e ajudada por uma
sobrinha (Maria da Soledade, natural de Cabeceiras de Basto).
Os traços físicos da dona e cozinheira faziam jus ao nome –
a “Mamuda”.
Conta-se, a propósito, uma história acontecida com o artista
Vasco Santana, que visitava frequentemente a cidade para apresentar os seus
espectáculos de revista.
«Vasco Santana, o
inesquecível actor cómico português, que os mais novos só conhecem dos filmes
antigos nacionais que a nossa TV por vezes apresenta, era um bom
"gourrat" e um óptimo apreciador da boa mesa, o que fazia jus ao seu
volumoso físico...No Porto, terra com bons restaurantes e largas tradições
culinárias, andava sempre à cata de lugares onde melhor se pudesse comer.
Ouvindo falar certo
dia na "Mamuda", nome porque era conhecido um restaurante de grande
fama, o "Restaurante Montenegro", … e que era assim apelidado em
virtude da dona ter sido por Deus dotada com volumoso peito capaz de fazer
inveja, em "patriotismo", à própria Maria da Fonte ou Padeira de
Aljubarrota, quis saber onde ficava, para lá ir com os amigos e colegas da
"companhia".
Explicaram-lhe o
caminho para lá, mas o nosso Vasquinho não deu com a casa e teve de perguntar.
Logo por azar foi
informar-se com a própria:
- "É capaz de me dizer, por favor, onde é
que fica a "mamuda"? - perguntou com toda a
delicadeza.
- "Mamuda" era a p... que o
p...!" - respondeu-lhe a visada que nem tinha papas na
língua nem gostava que lhe bulissem nas..., no..., enfim, no apelido...
E logo o Vasco
Santana, voltando-se para os parceiros, que tinham ficado à espera:
- "Ó rapazes!...É mesmo aqui...!"»
Fonte: “freamundense.blogspot.com/”
Para a “Mamuda” convergiam muitas figuras ligadas ao teatro e ao fado
como o saudoso Vasco Santana, Raúl Solnado e Amália Rodrigues entre outros.
Vasco Santana e Beatriz Costa
O Restaurante Montenegro foi aberto na década de 40, por Manuel Soares
Montenegro, natural de Arouca, vindo de uma tasca da Rua de Cima de Vila, tendo
sido passado, pouco tempo depois, para as mãos de Bernardino Campos (à data um
empregado de mesa do vizinho “Restaurante Ribeiro”, sito na Praça dos Poveiros), irmão da famigerada “Mamuda”, cujo nome por casamento era, Maria das
Dores Montenegro, natural de Chaves.
Este projecto não vingaria e o restaurante voltaria para as mãos Manuel
Montenegro, tendo durado até 1982, um ano após o falecimento da Maria das
Dores, tendo estado, no último ano, com a gerência de Teresa de Jesus, irmã de
Maria da Soledade que, também fazia, há muitos anos, parte dos que trabalhavam na
“Mamuda”.
À direita da foto era a “Mamuda”, com a Praça dos Poveiros, ao fundo –
Fonte: Google maps
Deste restaurante, ainda haverá quem se lembre da porta de entrada de
vaivém e duma outra do mesmo estilo, que fazia a separação das duas salas de
refeição existentes e, ainda, do seu janelão característico, que abria amplas
vistas para a cozinha.
Outros se lembrarão que, no fim das refeições, sentado numa mesa,
Manuel Soares fazia as somas necessárias para obtenção das contas dos clientes.
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